Acórdão nº 6823/17.4T8VNF-A.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 12 de Setembro de 2019
Magistrado Responsável | JOSÉ AMARAL |
Data da Resolução | 12 de Setembro de 2019 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães: I. RELATÓRIO (…) instaurou, no Tribunal de VN de Famalicão, execução para pagamento de quantia certa contra (…) SA”, actual “…”, peticionando o pagamento da quantia de €9.039,77, acrescida de juros vincendos contados desde a citação.
Para o efeito, o exequente apresentou, como título executivo, uma sentença e respectivo acórdão que a apreciou, sustentando que deles resulta, além do mais, a condenação da executada, a título de dano pela privação do uso de veículo, a pagar-lhe a quantia de €26,66 por dia, desde 06-04-2012 até efectivo cumprimento, sendo que a executada apenas lhe pagou, em 21-11-2016, a quantia de €36.000,00 (por 1350 dias de privação do uso, considerando como termo o dia 17-12-2015 e em função do valor diário referido), faltando pagar, no seu entender, €9.039,77, correspondente à privação do uso, à dita razão diária, entre 18-12-2015 e o dia em que foi feito o pagamento da prestação principal (valor do carro sinistrado), ou seja, 21-11-2016.
A executada seguradora veio, por apenso, deduzir embargos de executado, nestes alegando que pagou tudo aquilo a que foi condenada, para tal interpretando o título executivo no sentido de que, como consta da letra do Acórdão, apenas foi condenada, quanto a tal dano, no pagamento da referida quantia fixa (por equidade) e total (€36.000,00), e não no valor diário pretendido pelo exequente e a contabilizar até 21-11-2016.
O exequente contestou, refutando os argumentos da embargante e sustentando a sua interpretação da sentença/acórdão exequendos com o sentido de que a indemnização pela privação do dano não foi reduzida àquele montante mas apenas no seu quantitativo diário, nem limitada àquele data, mantendo-se até ao efectivo pagamento.
Considerando bastantes os elementos reunidos, o tribunal a quo proferiu saneador-sentença, que culminou na seguinte decisão: “Nestes termos, vistos os princípios expostos e as indicadas normas jurídicas, julgam-se os presentes embargos de executado totalmente procedentes e, em conformidade, determina-se a extinção da execução.
Custas pelo exequente.
Notifique e registe. ” Não se conformando, o exequente interpôs recurso para esta Relação, alegando e concluindo: “1. Decorre da fundamentação do douto acórdão proferido pelo T.R.G. em 18-12-2015, dado em execução, que o montante da indemnização pelo dano da privação do uso do veículo do embargado/exequente foi ali calculado á razão de 26,66€ por cada dia de privação do uso decorrido entre a data do sinistro (06-04-2012) e a data do acórdão (18-12-2015).
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Dessa fundamentação, em especial daquela onde o Tribunal da Relação de Guimarães expõe o raciocínio como chegou ao montante de € 36.000,00, decorre que a indemnização fixada atendeu aos dias decorridos, não tendo o tribunal querido fixar um quantia limite para tal indemnização.
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Ao interpretar o referido douto acórdão do modo com o sentido consubstanciado na sentença recorrida, o tribunal recorrido entrou em clara contradição com a fundamentação daquele acórdão do T.R.G. e incorreu em erro de julgamento.
E, em conformidade com tais conclusões, concedendo provimento á apelação, revogando a douta sentença e julgando improcedentes os embargos á execução, FARÃO JUSTIÇA.” Não houve resposta.
Foi admitido o recurso como de apelação, com subida imediata, nos autos e efeito meramente devolutivo.
Corridos os Vistos legais, cumpre decidir, uma vez que nada a tal obsta.
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QUESTÕES A RESOLVER Pelas conclusões apresentadas pelo recorrente, sem prejuízo dos poderes oficiosos do tribunal, se fixa o thema decidendum e se definem os respectivos limites cognitivos.
Assim é por lei e pacificamente entendido na jurisprudência – artºs 5º, 608º, nº 2, 609º, 635º, nº 4, 637º, nº 2, e 639º, nºs 1 e 2, do CPC.
No caso, importa apreciar e decidir se o título executivo que serve de base à execução de que estes embargos são apenso deve ser interpretado com o sentido de que a indemnização nele fixada a título de privação do uso do veículo sinistrado deve computar-se no valor correspondente ao produto do número de dias corridos desde que a apelada faltou ao pagamento do seu valor, à razão de 26,66€/dia e até à data desse pagamento e, se portanto, falta pagar ainda o valor exequendo peticionado ou se, pelo contrário, tal indemnização foi fixada no valor global e definitivo de 36.000€ já pago e, portanto, manter-se a decidida procedência dos embargos e consequente extinção da acção executiva.
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FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO Não tendo sido impugnada a factualidade fixada na sentença recorrida mas entendendo-se necessário ampliá-la, fixa-se, com base naquela e nos documentos juntos inquestionados, como provada a seguinte [1]: 1) O recorrente, na petição inicial da acção declarativa em que veio a obter o título executivo que serve de base a esta execução pediu, além do mais, a “condenação da ré a pagar-lhe a quantia de 50.602,50€, correspondente ao valor do capital contratualmente garantido e a quantia de 3.216,29€ de juros vencidos contados desde 6 de Abril de 2012 até à propositura da acção, à taxa de 8% ou, em alternativa à condenação no pagamento de juros, a condenação no pagamento ao autor de uma indemnização pela privação do veículo à razão de 40,00€/dia desde o dia 6 de Abril até à data do efectivo pagamento da indemnização devida”.
2) Como fundamento alegou que celebrou com a ré um contrato de seguro “multi-protecção auto”, com o capital de 50.602,50€, cuja apólice lhe garantia indemnização por danos no seu veículo dela objecto, vulgo “danos próprios”, sendo que este ficou totalmente destruído por um incêndio mas a ré não lhe pagou o dito valor nem lhe disponibilizou veículo de substituição.
3) Na sentença de 1ª instância julgou-se como provado e vigente o contrato, o valor do veículo seguro, a perda total deste, a participação subsequente do sinistro, o não pagamento da indemnização, a indisponibilidade consequente, pelo autor, de qualquer viatura e, ainda, que o aluguer de um veículo idêntico tem o custo de 40,00€ por dia.
4) Na fundamentação jurídica dessa sentença, entendeu-se que o não pagamento pontual pela ré do valor do veículo seguro e perdido, tal como era sua obrigação gerada pelo contrato, e a privação dele resultante do incumprimento dessa obrigação corresponde a mora, pelo que “tem o autor o direito de exigir da ré o valor do prejuízo que para si resultou da falta atempada de pagamento” mas que esta não é ressarcível com os juros “em dobro” (8%) e nos moldes peticionados (pedido julgado improcedente) mas sim mediante o pagamento do valor que custaria o aluguer de um idêntico para uso do autor, ou seja, nos moldes do pedido “alternativo”.
5) Para tal considerou, além do mais, que “Houvesse a ré cumprido a tempo e horas, como lhe era exigível por força da lei, e disporia o autor do montante necessário à aquisição de um veículo de substituição, evitando-se deste modo os danos que a privação do uso de um veículo lhe causou” (página 19 da sentença); que “o autor deixou de usufruir do uso de um veículo desde 06 de Abril de 2012 (data em que a seguradora deveria ter procedido ao pagamento da indemnização devida pelo incêndio do seu), sendo que, até à data de propositura da acção, decorreram 290 dias, tendo direito ao recebimento da quantia de 11.600,00€ (290 x 40,00€ = 11.600,00€) e a que se vencer desde esta data e até efectivo pagamento. Este é o valor do dano sofrido pelo autor decorrente da falta de diligência e prontidão da ré na regularização do sinistro e, concretamente, no incumprimento do prazo legalmente estipulado para a conclusão e resolução do processo, correspondendo à indemnização da privação do uso do veículo.
” (página 21); e ainda que, nos termos do artº 406º, do CC, “…o autor goza do direito a ser indemnizado pela ré da quantia de 50.602,50€, correspondente ao valor do capital contratualmente garantido e a quantia de 40,00€/dia pela privação do veículo desde o dia 6 de Abril até à data do efectivo pagamento da indemnização devida” (página 21).
6) Acrescentou também (página seguinte): “Ao valor de 50.602,50€ deve ser deduzido o valor de 755,00€ atribuído ao salvado que ficou na posse do autor” e que “Sobre a quantia de 49.847,50€ acrescem os juros de mora, à taxa legal, contados desde 6 de Abril de 2012, data em que a indemnização deveria ser satisfeita e até integral pagamento”.
7) Em conformidade, no dispositivo final da dita sentença, datada de 11-05-2015, o tribunal de 1ª instância, decidiu: “Julgar a acção, parcialmente procedente por provada e, em consequência, condenar a ré Companhia de Seguros X, SA, a pagar ao autor C. J., a quantia de 49.847,50 (…), correspondente ao valor do capital contratualmente garantido, deduzido o valor do salvado, e a quantia de 40,00€ (…) por dia pela privação do veículo desde o dia 6 de Abril de 2012 e até à data do efectivo pagamento da indemnização devida.
Sobre a quantia de 49.847,50€ (….), acrescem os juros de mora, à taxa legal, contados desde 6 de Abril de 2012 e até integral pagamento”.
8) De tal sentença, interpôs recurso a ré seguradora, constando das conclusões apresentadas, entre o mais, sobre o tema, que: – foi alegado que o contrato de seguro, sendo facultativo, não cobria a paralisação do veículo, tal não consta da apólice, pelo que nunca o autor teria direito a qualquer valor a esse título e não pode ser a ré condenada a pagar qualquer quantia (1ª a 5ª); tal facto (inexistência de cobertura da paralisação do veículo) é essencial (6ª); a interpretação da lei feita na sentença de que o alegado incumprimento contratual dá lugar ao pagamento da privação do uso é excessiva (7ª); mesmo assim, só haveria lugar a danos efectivos (8ª); estes não foram demonstrados em concreto (9ª); tal não foi provado nem a indisponibilidade configura dano indemnizável (12ª a 16ª); nem se provou que tenha sido alugado qualquer veículo (18ª); ainda assim e à cautela, a quantia diária de 40,00€ é excessiva, adoptando a jurisprudência o...
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