Acórdão nº 1521/20.4T8GMR-A.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 08 de Abril de 2021
Magistrado Responsável | EDUARDO AZEVEDO |
Data da Resolução | 08 de Abril de 2021 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES Condomínio do Edifício … sito na Rua … requereu em 17.03.2020, contra V. M. e P. C., execução para pagamento da quantia de 6.713,96€, acrescida de juros vincendos, à taxa legal até efetivo e integral pagamento.
Dando à execução uma ata da assembleia de condóminos alegou, em síntese: os executados até 30.01.2019 foram proprietários de fração autónoma; por deliberação da assembleia de condóminos de 23.09.2015, conforme ata nº 15, tinha sido decidido realizar obras de manutenção do edifício cabendo aos mesmos suportar 5.402,10€, valor esse que teria de ser entregue até 31.10.2017; a esse montante, acresce a quantia de 800,00€ a título de multa, para efeitos de pagamento de despesas e custos processuais, incluindo honorários de advogado, solicitador e administrador, conforme consta da ata número onze, por deliberação da assembleia de condóminos de 10.07.2012; encontra-se assim, vencida e não paga, a quantia global de 6.203,00€; é ainda credora de juros moratórios à taxa legal de 4% ao ano, contados desde as datas de vencimento dos valores em dívida, sendo que à data se contabilizavam em 510,96€; e, no dia em que alienaram a fração, 30.01.019, assumiram para com os atuais proprietários, pagar até a aquele momento todas as despesas, quotas extras e outros valores referentes ao condomínio do imóvel.
Os executados opuseram-se mediante embargos no sentido da extinção da execução alegando, em suma: não foram regularmente convocados para a assembleia relativa à ata dada à execução, sendo que a deliberação padece de outras irregularidades formais, o que tudo compromete a exequibilidade do título; os valores relativos a multa/despesas/honorários não são exigíveis em execução com base em ata de condomínio; as obras em causa não foram realizadas na integra, designadamente até terem vendido a fração; em todo o caso, o documento dado à execução não é título executivo, tendo as deliberações perdido o seu alcance face às novas deliberações tomadas em assembleias posteriores; e deve o exequente ser condenado como litigante de má-fé.
O embargado contestou sustentando a exequibilidade da ata dada à execução e a exigibilidade da quantia exequenda.
Proferiu-se despacho saneador altura em que se decidiu: “(…) Do Direito: A primeira questão que se coloca é a da alegada irregularidade das deliberações executadas e da ata nº 15.
No seguimento da jurisprudência dominante – veja-se a título de exemplo o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 4/6/2019 (processo nº 22996/17.3T8PRT-A.P1, acessível no sítio www.dgsi.pt/jtrp) – entendemos que caberia aos executados alegar e provar terem impugnado a deliberação, o que não sucede, pelo que não podem, por esta via, atacar a regularidade da mesma.
Esta limitação nos fundamentos da oposição abrange a questão suscitada quanto à alegada falta de realização das obras, matéria que extravasa o âmbito dos embargos, e que deveria, no decurso dos 4 anos que mediaram entre a deliberação e a venda ter sido alvo de reação – quiçá judicial – dos então proprietários e aqui Embargantes.
Isto posto, e no que tange à legitimidade passiva dos executados, face à venda da fração, importa considerar que as despesas de conservação das partes comuns do edifício e as orçamentadas para os serviços de interesse comum e seguro são pagas pelos condóminos na proporção do valor das suas frações (cfr. art.º 1424º, nº 1 do Cód. Civil), ficando as despesas com as inovações a cargo dos condóminos nos termos fixados pelo artigo 1424.º (cfr. art.º 1426º, nº1 do Cód. Civil).
Tal como defendem os Embargantes/Executados, a obrigação de contribuir para as despesas do condomínio deve ser qualificada como situação jurídica proper rem, porquanto a titularidade de tal obrigação determina-se indireta e mediatamente, pela simples circunstância objetiva da propriedade da fração (a lei fala constantemente em encargos e obrigações do condómino, fazendo derivar a sua titularidade daquela qualidade; é a determinação mediata do sujeito da situação jurídica, característica das situações proper rem) e tal obrigação é inseparável da fração e transmite-se, automaticamente, com esta, isto é, aquele que adquirir a fração adquire a obrigação (o direito acompanha a coisa, em consequência direta da característica acima assinalada e em clara emanação da natureza real desta figura). Para além disso, nos termos do art. 1428º, nº 3, do Cód. Civil, cedendo (ou sendo expropriado) da propriedade da fração, o proprietário liberta-se da obrigação.
Existindo alienação da fração autónoma por parte de um condómino após deliberação da Assembleia de Condomínios a aprovar a realização de obras de conservação e fruição das partes comuns do edifício, mas antes de ser devido o pagamento pelo respetivo condómino da parte que lhe compete nas obras, entende a jurisprudência, à qual aderimos, que caberá ao novo condómino a liquidação da quota-parte do pagamento da obra, salvo se outro for o acordado entre os novos e antigos condóminos.
Como se lê no Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 02-02-2006 (processo nº 364/2006-6, acessível em www.dgsi.pt/jtrl) “A obrigação de contribuir para as despesas, devidas por obras de conservação e fruição das partes comuns do edifício em propriedade horizontal é uma obrigação que recai sobre aquele que for titular da fração integrada no condomínio no momento em que haja lugar ao pagamento da parte do preço que caiba efetuar para a realização das aludidas obras. Poderá suceder, entre outras hipóteses que não interessa considerar, que entre a deliberação de realizar as obras e a conclusão da respetiva empreitada, mas antes de determinado condómino pagar a parte que lhe compete, proceda este condómino à transmissão da sua fração. Se assim suceder, e salvo acordo em contrário entre vendedor e comprador ou compromisso do vendedor, será o novo condómino o responsável pela liquidação da parte do preço imputado à fração de que é titular. Isto porque se considera que esta obrigação “propter rem”, tem como característica a “ambulatoriedade”, no sentido de que a transmissão do direito real de cuja natureza a obrigação emerge implica automaticamente a transmissão desta para o novo titular.”.
No mesmo sentido, decidiu o Supremo Tribunal de Justiça, afirmando que “Nos casos figurados está em causa, segundo parece, o pagamento integral do custo da obra; será suportado pelo alienante se a obra já estiver efetuada; será suportado pelo comprador não estando a obra realizada. As despesas já efetuadas, tanto para os fins indicados no artigo 1411.º/1 ou 1424.º/1 do Cód. Civil não são ambulatórias, correm pelos proprietários que o eram quando foram contraídas; as despesas não efetuadas correm por conta do adquirente, são ambulatórias”. (Processo 10076/03.3TVLSB.L1.S1, Acórdão de 08-06-2017, acessível em www.dgsi.pt/jstj).
É certo que ambos os arestos referem a conclusão da obra. Porém, considerando a forma de funcionamento das administrações de condomínio (e as mais do que conhecidas dificuldades com que se deparam os administradores para reunir as quantias necessárias à realização de obras muitas vezes urgentes e imprescindíveis), é normal – e no caso tal sucedeu – que se estabeleçam prazos de pagamento que terminam antes do início das obras.
Tal destina-se a evitar que, começadas as obras, se veja a administração sem fundos para a terminar, arriscando além disso, a penalização por banda dos fornecedores contratados.
Assim, o que releva para se apurar da responsabilidade do condómino anterior ou presente prende-se com a data em que se venceu a última prestação fixada e que, no caso, ocorreu em 31/10/2017, ou seja, quando eram os executados os proprietários.
Tanto basta para entendermos que eram – como foram – estes que deviam ser demandados para pagamento da quantia respetiva.
Não fosse assim e estaria encontrada a forma de se eximirem os mesmos do pagamento de quantia que há muito eram devedores.
A última questão a apreciar diz respeito à exequibilidade da ata quanto às despesas enunciadas no ponto 8 do requerimento executivo, sendo que, desde já o adiantamos, entendemos assistir razão aos Embargantes.
Dispõe o art. 6º do DL 268/94, de 25/10, que a ata da reunião da assembleia de condóminos que tiver deliberado o montante das contribuições devidas ao condomínio ou quaisquer despesas necessárias à conservação e fruição de partes comuns e ao pagamento dos serviços de interesse comum, que não devam ser suportadas pelo condomínio, constitui título executivo contra o proprietário que deixar de pagar, no prazo estabelecido, a sua quota parte.
No preâmbulo do diploma que atribui força executiva às atas de condomínio (no seguimento da previsão do art. 46º, al. d), do Cód. Proc. Civil) justifica-se a aprovação do mesmo com “A necessidade de desenvolver alguns aspetos do regime da propriedade horizontal, aliada à opção de preservar a integração da disciplina daquele instituto no Código Civil” e, simultaneamente com “objetivo de procurar soluções que tornem mais eficaz o regime da propriedade horizontal, facilitando simultaneamente o decorrer das relações entre os condóminos e terceiros”.
O Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 4/6/2009 (processo nº 1139/06.4TBGDM-A.P1, acessível no sitio www.dgsi.pt/jtrp) esclarece que «Sabendo-se das relações complexas que envolve a propriedade horizontal e das dificuldades (frequentes) criadas ao seu funcionamento, nomeadamente pela atuação relapsa e frequente de alguns condóminos, avessos a contribuir para as despesas comuns, sem que, não obstante, prescindam ou deixem de aproveitar dos benefícios da contribuição dos outros (revelador de, pelo menos, algum deficit de civismo), é criado um instrumento que facilite a cobrança dos valores devidos ao condomínio, legalmente previstos e regularmente aprovados.».
Definindo o título executivo os fins e os limites da execução, de tal modo que do mesmo deve resultar a obrigação do executado, nos termos do art. 10º, nº 5, do...
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