Acórdão nº 898/19.9T8PTL.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 04 de Novembro de 2021

Magistrado ResponsávelJORGE SANTOS
Data da Resolução04 de Novembro de 2021
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na 3ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães I – RELATÓRIO A. C.

, solteira, maior, residente na Rua …, Viana do Castelo, por si e na qualidade de legal representante de seu filho menor, V. C.

, consigo residente, veio intentar contra X – Companhia De Seguros, S.A., NIPC ………, com sede no Largo do … Lisboa, acção com processo comum, alegando em síntese que no dia 23 de Dezembro de 2018, pelas 22h45m, faleceu V. J., com 27 anos de idade (nascido a -/08/1991), no estado de solteiro, sendo que à data, vivia em união de facto com a autora A. C. desde 2013, sendo que a relação amorosa entre ambos se iniciou a 2011, na sequência da qual nasceu, a -/10/2017, o autor V. C..

Tal falecimento ocorreu na sequência de acidente de viação, ocorrido ao km 18,400 da auto-estrada A27, no sentido Viana do Castelo – Ponte de Lima, na União de Freguesias de ... e ..., concelho de Ponte de Lima, na qual circulava o dito V. J., no seu veículo automóvel ligeiro de passageiros de matrícula DQ. A vítima efectuava manobra de ultrapassagem pela faixa esquerda, dentro da velocidade permitida naquele troço e, quando retornava à faixa direita, perdeu o controlo do veículo, entrou em despiste pelo lado direito, embateu no talude, capotando até ficar imobilizado por cima das chapas de protecção lateral.

Desse acidente resultou então a morte imediata do aludido V. J.. O acidente ocorreu uma hora após o sinistrado ter jantado com seus pais e sua irmã, C. V., esta residente na Bélgica, que veio a Portugal passar a quadra Natalícia, na residência daqueles, em ..., Ponte de Lima. Após o jantar, o sinistrado foi à residência dos pais da autora, na freguesia de ..., Viana do Castelo, deixar o filho de ambos (o ora autor V. C.) aos cuidados de sua mãe, posto o que voltava para Ponte de Lima, quando ocorreu o acidente.

Mais alega que o sinistrado, com 61 kg de peso e 1,68m de altura, não tinha hábito de consumo de álcool (conforme declarou no questionário clínico), sendo que, nessa noite, bebeu um copo de vinho tinto a fim de assinalar o regresso de sua irmã.

Refere que a 20 de Abril de 2012, o falecido V. J. e a então “Y – Companhia de Seguros, S.A.” (entretanto adquirida por fusão pela ora ré) celebraram um Contrato de Seguro de Vida, titulado pela apólice nº ../00803771, no âmbito do qual aquele transferiu para a ré o risco infortunístico de morte, morte por acidente e invalidez total e permanente superior a 66%.

O contrato de seguro conheceu o seu início de vigência às 00 horas do dia 20 de Abril de 2012, apresentando as seguintes características relevantes para a presente lide: 1) Prazo de vigência: 45 (quarenta e cinco) anos; 2) Renovação; tácita, anual, na data aniversária, de 20 de Abril; 3) Tomador e pessoa segura: V. J.; 4) Capital seguro: 50 000,00 € (cinquenta mil euros), devido ao(s) beneficiário(s) indicado(s) pelo malogrado V. J., a que corresponde o n.º da apólice …/00803771; 5) Beneficiários em caso de morte: os ora autores, V. C. e A. C.; 6) Coberturas: morte, morte por acidente, invalidez total e permanente de grau igual ou superior a 66% - no máximo até ao fim do ano civil em que a pessoa segura complete 65 (sessenta e cinco) anos, garantindo o pagamento ao(s) beneficiário(s) designado(s) do capital seguro em caso de morte; 7) Condições Gerais: as obtidas pelo signatário após o sinistro, quer a versão vigente à data da contratação, quer a versão actual, redigida a 2015.

Desde então que o “falecido” V. J. cumpriu pontualmente o contrato de seguro, liquidando os prémios mensais, por débito directo da sua conta da Caixa ..., S.A..

Aquando da contratação, o segurado não indicou quaisquer beneficiários em caso de morte, sendo estes os respectivos herdeiros legais mas posteriormente, a 19 de Dezembro de 2017, o malogrado V. J. inscreveu como beneficiários os aqui autores, A. C. e o filho de ambos, V. C..

Dias após o acidente, a 27/12/2018, a autora A. C. participou o sinistro, mediante o preenchimento e entrega de formulário próprio na agência da ré em Ponte de Lima, que originou o processo de sinistro nº 803771, porém, a 10/07/2019, foi a autora surpreendida com a resposta da ré a negar o pagamento do capital seguro, nos seguintes termos “Reportando-nos ao processo em referência, informamos que não nos é possível proceder ao pagamento da indemnização solicitada, uma vez que não estão reunidas as condições de acionamento do seguro de Vida. De facto, estão excluídas do âmbito de todas as Coberturas do Seguro as “ações ou omissões praticadas pela Pessoa Segura quando acuse consumo de produtos tóxicos, estupefacientes ou outras drogas fora de prescrição médica, bem como quando lhe for detetado um grau de alcoolemia no sangue superior a 0,5 gramas por litro”. Para melhor esclarecimento, por favor consulte o artigo 2º, nº 5.1, alínea b, das Condições Gerais do Seguro Vida, disponíveis em www.X.pt” (III – Do não cumprimento dos deveres de informação pela ré).

No entanto, alega que a cláusula de exclusão de cobertura invocada pela ré não é válida, pois que nunca foi dada a conhecer ao segurado, nem este a aceitou especificamente, inserindo-se num contrato de adesão, sendo desconhecida tal cláusula de exclusão da cobertura invocada pela ré para se eximir à sua responsabilidade, pois que esta nunca foi comunicada nem aceite pelo segurado.

Antes do sinistro, a ré nunca entregou ao segurado cópias das condições gerais, quer da versão vigente em 2012, quer da versão actual.

As únicas informações prestadas pela ré seguradora ao falecido V. J. circunscreveram-se ao habitual nestes casos: montante mensal do prémio a pagar, valor do capital seguro e que este seria pago em caso de morte ou invalidez permanente do segurado.

Como tal, foi incumprido pela ré o dever de informação que sobre ela impende, pelo que deverá a referida cláusula constante do art. 2º, nº 5.1, alínea b) das Condições Gerais (de ambas as versões) ser excluída do Contrato de Seguro, devendo em consequência ser a ré condenada a pagar aos autores beneficiários o valor de capital seguro, de 50 000,00 €. Mas mesmo que a ré houvesse comunicado a cláusula ao sinistrado, sempre esta deveria ser considerada nula, por abusiva, por faze impender um ónus excessivo sobre o segurado/consumidor, devendo ter-se por não escrita.

Por outro lado, a circunstância de o falecido V. J. pretensamente acusar grau de alcoolemia de 0,68 g/litro (+-) foi indiferente ao acidente, porquanto tratou-se de um despiste.

Junta prova.

Citada a Ré, veio esta referir que no dia 24 de Dezembro de 2018 o infeliz V. havia ingerido bebidas alcoólicas e conduzia o veículo de matrícula DQ, apresentando uma taxa de 0,78, correspondendo a 0,10 gramas de álcool por litro de sangue, o que lhe dificultava o campo de visão; lhe diminuía os reflexos, a agilidade para a condução e a segurança do veículo que tripulava e o impedia de efectuar manobras tendentes a evitar acidentes e de regular a velocidade do que conduzia e de calcular distâncias.

Nos termos das condições gerais da apólice em todas as coberturas, nomeadamente de morte por acidente, estão excluídas da garantia da apólice: “5.1. b) – acções ou omissões praticadas pela pessoa segura quando acuse consumo de produtos tóxicos, estupefacientes ou outras drogas fora de prescrição médica, bem como quando lhe for detectado um grau de alcoolémia no sangue superior a 0,5 gramas por litro”.

Ao infeliz V. foram comunicadas e explicadas todas as condições que se aplicavam ao contrato de seguro titulado pela apólice referida, assim como a respectiva "nota informativa" e que lhe foi entregue, sendo que, no "Boletim de adesão" o infeliz V. declarou que: "declaro que me foram prestadas as informações pré-contratuais legalmente previstas, tendo-me sido entregue, para o efeito, o documento respectivo, para delas tomar integralmente conhecimento, e bem assim, que me foram prestados os esclarecimentos de que necessitava para a compreensão do contrato, nomeadamente sobre as garantias e exclusões, sobre cujo âmbito e conteúdo fiquei esclarecido".

Deve por isso a acção ser julgada não provada e improcedente, absolvendo-se a Ré do pedido.

Junta prova.

Após solicitação do tribunal, veio a Ré referir que o falecido apresentava uma taxa de 0,78g/l (0,78 gramas por litro de sangue), com margem de erro correspondente a 0,10 gramas de álcool por litro de sangue, ou seja, com uma taxa de álcool no sangue compreendida entre o intervalo de 0,68 g/l e 0,88g/l (gramas de álcool por litro de sangue) - cfr. Relatório da autópsia junto com a p.i. e que se dá por integralmente reproduzido para todos os legais efeitos.

Alegação que foi impugnada pelos AA.

Elaborou-se despacho saneador.

Realizou-se a audiência final de acordo com todos os formalismos legais, conforme se infere da respectiva acta.

Foi proferida sentença que decidiu julgar a acção totalmente improcedente por não provada e em consequência absolver a ré dos pedidos formulados.

Inconformados com a sentença dela vieram recorrer os AA. formulando as seguintes conclusões: I. Vem o presente recurso interposto da sentença revidenda que julgou a acção improcedente, absolvendo a ré-recorrida, por considerar, em síntese, que (i) as cláusulas excludentes da cobertura do seguro foram explicadas ao aderente (ii) que mesmo que assim não fosse, nunca a cláusula em questão poderia ter-se por inaplicada ao contrato em apreço, já que a lei sanciona contraordenacional e penalmente a condução sob o efeito de álcool.

  1. No modesto entender dos impetrantes, a sentença recorrida padece de erro na apreciação da prova e bem assim na aplicação do direito, já que, por um lado foram violadas normas jurídicas e por outro, padece de erro na determinação da norma jurídica aplicável ao caso.

  2. Quanto à matéria de facto, foram incorrectamente julgadas as alíneas a), b), c) e e) dos Factos Não Provados, que deveriam ter sido considerados Provados, aditando-se à respectiva matéria os pontos 21º), 22º), 23º) e 24º): 21º) A cláusula de exclusão de...

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