Acórdão nº 1041/21.0T8VNF-D.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 04 de Novembro de 2021
Magistrado Responsável | ROSÁLIA CUNHA |
Data da Resolução | 04 de Novembro de 2021 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam, em conferência, na 1ª secção cível do Tribunal da Relação de Guimarães: RELATÓRIO Por sentença de 26.2.2021 foi declarada a insolvência de H. M.
na sequência da sua apresentação à insolvência.
No requerimento de apresentação à insolvência o insolvente pediu a exoneração do passivo restante.
*Em 13.4.2021, o Sr. Administrador de Insolvência apresentou o relatório a que alude o art. 155º, do CIRE, no qual propôs que seja concedida ao insolvente a requerida exoneração do passivo restante.
*Por requerimento de 23.4.2021, a credora X, LDA. veio pugnar pelo indeferimento liminar do pedido de exoneração do passivo restante formulado por, em síntese, considerar que o insolvente se absteve de se apresentar à insolvência nos seis meses seguintes à verificação da sua situação de insolvência sabendo, ou não podendo ignorar sem culpa grave, não existir qualquer perspetiva séria de melhoria da sua situação económica (conforme dispõe o artigo 238.º n.º 1 al. d) do CIRE), causando com esse atraso prejuízos aos credores, que não só se viram impossibilitados de recuperar o valor em dívida, como os juros de mora correspondentes, e, no caso concreto da ora Credora Reclamante, além destes, acresceram ainda as despesas por esta incorridas com a propositura de ação executiva para cobrança coerciva das quantias em dívida pelo Insolvente e que correu termos sob o processo n.º 5985/20.8T8VNF, no Juiz 2 do Juízo de Execução do Tribunal de Vila Nova de Famalicão.
*Por requerimento de 6.5.2021, o insolvente pronunciou-se sobre a posição manifestada pela credora, impugnando a veracidade dos factos pela mesma alegados e pugnando no sentido de ser proferido despacho liminar de deferimento do pedido de exoneração do passivo restante.
*Em 29.6.2021 foi proferido o despacho ref. Citius 174063747 que terminou com o seguinte dispositivo: “Consequentemente, há que concluir se verifica, no caso concreto pressuposto para indeferir in limine o pedido de exoneração do passivo restante, ao abrigo do disposto na alínea d) do n.º 1 do artigo 238.º do C.I.R.E.
”*O devedor insolvente não se conformou e interpôs o presente recurso de apelação, tendo terminado as suas alegações com as seguintes conclusões: “I. Vem o presente recurso interposto da decisão proferida pela Meritíssima Juiz da Comarca de Braga – Juízo de Comércio de Vila Nova de Famalicão - Juiz 1, a qual indeferiu liminarmente o pedido de exoneração do passivo restante formulado pelo Recorrente, com fundamento na violação pelo devedor da alínea d) do art.º 238.º do CIRE.
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Entendeu a sentença Recorrida que o Devedor incumpriu com o prazo de 30 dias para se apresentar à insolvência, e que desse atraso resultou dano para os credores.
Não concordamos, vejamos, Da suspensão do prazo para a apresentação do devedor à insolvência: III. A suspensão do prazo de apresentação do devedor à insolvência foi estabelecida na Lei n.º 1-A/2020, depois da sua primeira alteração, pela Lei n.º 4-A/2020, de 6 de Abril, a qual no seu artigo 7.º, n.º 6, al. a) estabeleceu que fica suspenso o prazo de apresentação do devedor à insolvência, previsto no n.º 1 do artigo 18.º do CIRE.
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A Lei n.º 16/2020, de 29 de Maio, que altera pela quarta vez e republica a Lei n.º 1-A/2020, de 19 de Março (medidas excecionais e temporárias de resposta à situação epidemiológica provocada pelo coronavírus SARSCoV-2 e da doença COVID-19), que entrou em vigor em 3 de Junho de 2020, veio, revogar a norma do artigo 7.º (prazos e diligências), a qual foi “substituída” pela nova norma do artigo 6.º-A que estabeleceu que fica suspenso no decurso do período de vigência do regime excecional e transitório o prazo de apresentação do devedor à insolvência, previsto no n.º 1 do artigo 18.º do CIRE.
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A Lei n.º 4-B/2021 de 1 de fevereiro, que procede à nona alteração à Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, alterada pelas Leis n.ºs 4-A/2020, de 6 de abril, 4-B/2020, de 6 de abril, 14/2020, de 9 de maio, 16/2020, de 29 de maio, 28/2020, de 28 de julho, 58-A/2020, de 30 de setembro, 75- A/2020, de 30 de dezembro, e 1-A/2021, de 13 de janeiro, veio revogar esse artigo 6.º-A, e aditou o Artigo 6.º-B, o qual estatui no seu n.º 6 que são suspensos o prazo de apresentação do devedor à insolvência, previsto no n.º 1 do artigo 18.º do CIRE.
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A Lei n.º 13-B/2021 de 5 de abril que cessa o regime de suspensão de prazos processuais e procedimentais adotado no âmbito da pandemia da doença COVID-19, alterando a Lei n.º 1- A/2020, de 19 de março e revogou o atrás citado art.º 6.ºB, veio aditar o artigo 6.º-E que no seu n.º 7 estatui que fica suspenso o prazo de apresentação do devedor à insolvência, previsto no n.º 1 do artigo 18.º do CIRE.
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Assim, desde março de 2020 que o prazo para a apresentação do devedor à insolvência, previsto no n.º 1 do artigo 18.º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, se encontrava, como ainda encontra, suspenso.
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O Tribunal Recorrido incorreu em erro ao afirmar que o Devedor ultrapassou o prazo de que dispunha para se apresentar à insolvência, violando assim o a alínea d) do art.º 238.º do CIRE, porquanto o mesmo estava suspenso.
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Assim, deve revogar-se a sentença recorrida e ser deferida a exoneração inicial do passivo restante do devedor.
Do concreto prazo para a apresentação à insolvência: X. Entendeu a sentença recorrida que, ao insolvente era de aplicar o prazo de 30 dias para se apresentar à insolvência, nos termos previstos no n.º1 do art.º 18.º do CIRE, afirmando que o mesmo era titular de empresa.
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Essa conclusão não assenta em quaisquer factos carreados ao processo, designadamente uma certidão do registo comercial da empresa.
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Logo, trata-se de uma conclusão nula, por desprovida de qualquer prova/fundamento, o que se deixa alegado com as legais consequências.
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Conclui ainda o tribunal recorrido que o comportamento da sociedade e por conseguinte do devedor, se traduz numa série de incumprimentos reiterados. Quais incumprimentos? Que factos conhece o Tribunal para essa afirmação? XIV. Convém esclarecer que a sociedade insolvente a quem o devedor prestou fiança, não é devedora da Credora X nesses montantes, porque nunca lhe foi reconhecido, definitivamente, qualquer crédito.
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No âmbito do processo 6382/17.8T8VNG não foi elaborada/admitida a lista do 129.º do CIRE uma vez que o processo de insolvência foi declarado encerrado, nos termos dos artigos 230.º, n.º 1, al. d), e 232.º do C.I.R.E., por decisão transitada em julgado.
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E, encerrada nesses termos, pode a devedora voltar e ser parte em ações judiciais, podendo os credores demandar judicialmente a sociedade para reconhecimento e pagamento dos seu créditos (cfr. art.s º 232.º e 233.º do CIRE).
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Até hoje, a Credora Reclamante não demandou a sociedade Y, motivo pelo qual não tem qualquer crédito sobre a referida sociedade.
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Assim, o insolvente não estava obrigado a apresentar-se à insolvência, atento o disposto no nº2 do artigo 18.º do CIRE, uma vez que à data não era titular de qualquer empresa.
Do prejuízo da credora: XIX. Ao contrário daquilo que consta no despacho recorrido, a alegada mora do devedor na apresentação á insolvência não conduziu à existência de qualquer dano para os credores.
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Veio a Credora reclamante X alegar “despesas com a propositura de acção executiva para cobrança coerciva das quantias em dívida, no valor de 9.989,46 euros.” XXI. Sucede, porém, que, essas quantias não resultam e qualquer ação/omissão do Insolvente.
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Analisado o doc.3 da reclamação de créditos da X, donde resulta o alegado custo de 9.989,46 euros, verificamos que se trata de uma nota discriminativa do Agente de Execução, que revela uma remuneração tendo em conta que o mesmo iria garantir a cobrança do valor total da execução.
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A rubrica “remuneração variável” tem o valor de € 7.694,40, ao qual acresce IVA à taxa de 23%, perfazendo a quantia de € 9 464,11, corresponde à remuneração adicional devida ao Agente de execução no caso previsto no n.º 10 do art.º 50.º da portaria 282/2013.
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Esse valor apenas seria devido caso o Agente de execução - recupere ou garanta o pagamento para o Exequente -, o que manifestamente não é o caso, atenta a insolvência do devedor e reclamação de créditos da credora.
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Assim, esse valor não corresponde a um efetivado dano, porque a exequente não pagou nem irá efetuar o pagamento constante do mesmo, uma vez que não recebeu a quantia exequenda, não sendo a mesma recuperada ou garantida pelo Sr. AE.
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Assim, analisado criticamente o processo, só podemos concluir que o “alegado” atraso na apresentação à insolvência, não causou qualquer dano à Exequente, Credora nos presentes autos, pelo que não está preenchido qualquer requisito para o indeferimento liminar do pedido de exoneração do passivo, devendo pois revogar-se o despacho recorrido por outro que defira liminarmente o pedido de exoneração.
”*X, Lda. apresentou contra-alegações...
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