Acórdão nº 5250/19.3T8GMR-A.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 04 de Novembro de 2021

Magistrado ResponsávelFERNANDO BARROSO CABANELAS
Data da Resolução04 de Novembro de 2021
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam os juízes do Tribunal da Relação de Guimarães: I – Relatório: Em 12 de julho p.p., o Juízo de Comércio de Guimarães prolatou sentença com o seguinte dispositivo: Nestes termos, decide este Tribunal: Qualificar como culposa a insolvência de X Unipessoal, Lda.

  1. Será abrangido pela qualificação como culposa o gerente de facto R. C.

e a gerente de direito M. C.; B) Declarar o gerente R. C.

inibido para o exercício do comércio durante 5 anos, bem como para a ocupação de qualquer cargo titular de órgão de sociedade civil ou comercial, associação, fundação privada de atividade económica, empresa pública ou cooperativa; C) Determinar a perda de quaisquer créditos sobre a insolvência ou massa insolvente detidos pelos gerentes R. C.

e M. C. bem como determinar que sejam restituídos à massa quaisquer bens ou direitos recebidos em pagamento desses créditos; D) Condenar os gerentes R. C. e M. C.

a indemnizar os credores da insolvente no montante dos créditos não satisfeitos, até às forças do respetivo património.

E) Declarar a gerente de direito M. C. inibida para o exercício do comércio durante 2 anos, bem como para a ocupação de qualquer cargo titular de órgão de sociedade civil ou comercial, associação, fundação privada de atividade económica, empresa pública ou cooperativa; Custas a cargo da massa insolvente – art.º 304.º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresa.

Registe e notifique.

Inconformada com a decisão, M. C. interpôs recurso, formulando as seguintes conclusões sintetizadas: I. O Tribunal a quo qualificou como culposa a insolvência de X Unipessoal, Lda., abrangendo “o gerente de facto R. C. e a gerente de direito M. C.”, condenando, consequentemente, a aqui Recorrente, M. C., à inibição de exercer comércio durante 2 anos, bem como de ocupar qualquer cargo titular de órgão de sociedade civil ou comercial, associação, fundação privada de atividade económica, empresa pública ou cooperativa. Assim como, determinar a perda de quaisquer créditos sobre a insolvência ou massa insolvente detidos pela gerente, M. C.. E, por fim, condenar a Recorrente a indemnizar os credores da Insolvente nos montantes dos créditos não satisfeitos, até às forças do respetivo património.

  1. Sucede que a Douta decisão não deu como provados determinados factos cuja prova foi feita em audiência de julgamento e baseou-se em factos antagónicos à verdade material, pois que a sentença é constituída por factos incorretamente julgados (estes basilares da motivação do Tribunal), que impunham uma decisão contrária à doutamente proferida, quando confrontados com os meios probatórios carreados aos autos.

  2. Conquanto, tendo em consideração os documentos e depoimentos carreados aos autos, o Tribunal deveria, para além dos então dados como provados, ter dado igualmente como provado que: “1. A Requerida era tão só uma operária da sociedade.

    1. E não praticava quaisquer atos de gestão de relevo na devedora, nem tinha quaisquer funções de chefia.

    2. A oponente, tratando-se de uma pessoa completamente analfabeta, julgava que era uma simples funcionária.

    3. Quando a filha foi despedida e procurou auxílio jurídico para ser ressarcida dos seus créditos laborais, a Requerida tomou conhecimento de que era na verdade titular e gerente da sociedade, aqui insolvente.

    4. Bem como, constatou que o Sr. R. C., já havia constituído uma outra sociedade, designada “F. C., Unipessoal, Lda.”.

    5. Não foi ela que procedeu ao levantamento daquelas quantias, muito menos rececionou tais quantias, resultantes da atividade da sociedade.” ISTO PORQUE IV. O Tribunal a quo achou que o depoimento das testemunhas, C. F., M. P., S. N., A. A., C. P. e A. C., foi prestado de forma isenta e segura, as quais resumem-se: ao facto da Recorrente, M. C., ser apenas uma empregada, cujas funções eram de colar tela; quem dava as ordens, pagava os salários e falava com os fornecedores era o SENHOR R. C. e sua esposa, CT.. Veja-se o depoimento da testemunha, C. F., realizado no dia 14 de junho de 2021, que consta dos minutos [00:52] aos minutos [01:28], do minuto [09:24] ao [10:09] do minuto [02:24] ao minuto [02:55].

  3. Efetivamente, esta testemunha afirma com toda a convicção que a D.ª M. C. não era gerente de facto da sociedade, até porque, para ele, esta não tinha capacidades para executar tais funções, nem Responsabilidade limitada nunca praticou atos de gestão, tipicamente reconhecido de um sócio/gerente de uma empresa -Ver minuto [01:19] ao minuto [01:28] do seu depoimento.

  4. Tanto é assim que, a testemunha, C. F., tomou conhecimento da mudança de sociedades pelo SR. R. C., e não pela Requerida M. C., não obstante este estar diariamente com a mesma, dado que era ele, quem lhe dava boleia na ida ao trabalho e no regresso a casa (minuto [01:43] ao minuto [01:51]). E só desconfiou que a Requerida pudesse, eventualmente, ser a gerente da sociedade “X”, quando assistiu à IMPOSIÇÃO pelo Requerido, R. C., para que a Requerida, M. C., assinasse uns documentos – veja-se a gravação do seu depoimento no minuto [04:40] ao minuto [05:17] -, sendo sua convicção que a Requerida não tinha a mínima noção do que estava a assinar e quais as suas inerentes consequências.

  5. No mesmo sentido, as testemunhas M. P., S. N., S. F., A. A., A. C. asseveraram que as contratou, quem lhes dava ordens, que lhes pagava o salário e quem falava com os clientes e fornecedores era o SR. R. C. e sua esposa, CT. – Vide gravação do seu depoimento prestado nos minutos [02:27] aos minutos [03:11] da testemunha M. P.; vide gravação dos depoimentos das testemunhas S. N. e S. F., nos minutos [00:53] a [00:58] e [01:25] a [01:59] - O que demonstra que a Recorrente não sabia que era sócia e gerente da sociedade, sempre pensando, até à data do despedimento da filha, que era uma mera funcionária.

  6. Pela prova produzida e aqui chamada à colação, o Tribunal a quo deveria ter dado como provado que a Requerida era tão-só uma operária da sociedade, bem como não praticava quaisquer atos de gestão de relevo na devedora, nem tinha quaisquer funções de chefia.

    MAIS, IX. As referidas testemunhas afirmaram que a Recorrente, M. C., apenas tomou conhecimento de que era sócia e gerente da sociedade “X”, quando a filha, ao ser despedida, se dirigiu ao Sindicato para reivindicar os seus direitos. Até então estava na completa ignorância. - Veja-se a gravação do depoimento da testemunha M. P., mormente os minutos [03:12] até aos minutos [04:16] e [04:28] até [05:00] e da testemunha C. P., prestado aos minutos [01:16] até aos minutos [02:34] da testemunha, S. N., com início a [02:20] até [03:02] e a [03:57] a [04:50].

    ACRESCE QUE, X. A testemunha, M. P., declarou inclusive que, quando “explodiu” o escândalo sobre o despedimento da filha da M. C., o Requerido, R. C., e a esposa, CT., mantiveram a versão de que eram eles os donos da sociedade – vide gravação do seu depoimento prestado a [04:28] até [05:00].

  7. Face ao exposto, o tribunal a quo não podia ter dado como não provado o facto da Oponente achar que era uma simples funcionária, pois que da prova produzida em audiência de julgamento é indiscutível que a Requerida, M. C., desconhecia por completo que tinha constituído uma sociedade e que era a gerente da mesma. Assim, salvo o devido respeito por melhor opinião, entende a Requerida que o ponto 3 e 4 dos factos não provados, devem passar para a lista dos factos dados como provados.

  8. No que tange ao ponto 5 dos factos não provados, as testemunhas, S. N. e S. F., afirmaram que, quando o SR. R. C. decidiu fechar a empresa “X”, que lhes ofereceu emprego numa outra sociedade denominada “F. C.” – veja-se, na gravação dos seus depoimentos os minutos [02:58] aos [03:41] e os minutos [04:30] aos minutos [04:53]. Tendo então ficado provado que o SR. R. C., já havia constituído uma outra sociedade, designada “F. C.”, razão pela qual não se aceita que o ponto 5, no seu todo, seja dado como não provado.

    CONTUDO, XIII. Já não se pode dar a mesma credibilidade ao depoimento prestado pela Contabilista, a DRA. E. L., pelo facto do seu testemunho desta não foi de todo isento e imparcial, conquanto a mesma teve um discurso pouco coeso, bastante esquivo e hesitante, demonstrando inclusive uma relação extremamente comprometida com o SR. R. C.. Na verdade, a contabilista falou de forma hesitante, notava-se insegurança e receio de se comprometer no seu depoimento, pois que o seu discurso não fluía naturalmente, existia muita relutância em falar sobre o assunto. Mais, aquela testemunha não se lembrava sequer do nome da sócia e gerente da sociedade insolvente “X”, apenas se lembrando do nome do SENHOR R. C., de forma espontânea, sem quaisquer hesitações! – vide sua gravação nos minutos [01:07] aos minutos [01:43], o que contraria o afirmado - nos minutos [13:14] a [13:21] -, quando pelas suas próprias palavras: com a contratação dos seus serviços inicia-se uma relação de trabalho.

  9. Ora, tal comportamento só pode ser explicado com o facto de esta ter sempre estado em conluio com o SENHOR R. C., ou pelo menos, ter conhecimento desde o início que o Requerido enganou a Requerida e que, quem na verdade geria a sociedade insolvente “X”, era o SENHOR R. C. e sua Esposa. Tanto é que, a certo ponto do seu depoimento, mais precisamente, no minuto [13:14] ao minuto [13:30], a contabilista mostra pouca convicção sobre o facto da Requerida ter tido consciência do que estava a fazer e a assinar, quando foi pela primeira vez ao seu gabinete, não tendo deixado claro que lhe deu os esclarecimentos a que se encontrava adstrita. Apenas deixou bem claro uma coisa: quem efetivamente tratava de todos os assuntos, nomeadamente os contabilísticos era o SENHOR R. C., mediante procuração outorgada a seu favor – Vide depoimento nos minutos [05:47] a [06:11].

  10. Outro contrassenso é facto da Contabilista dizer que não estranhou o SR. R. C. levar a Requerida, M. C., para dar início de uma atividade de uma outra sociedade, cuja atividade e sede, curiosamente, era exatamente a...

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