Acórdão nº 216/20.3T8GMR.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 04 de Novembro de 2021

Magistrado ResponsávelJORGE TEIXEIRA
Data da Resolução04 de Novembro de 2021
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação de Guimarães I – RELATÓRIO.

CONDOMÍNIO DO EDIFÍCIO ...

, pessoa colectiva n.º ………, situado na Praça ..., Edifício ..., ..., representado pela CONDOMÍNIOS & COMPANHIA DE L. M. – ADMINISTRAÇÃO DE IMÓVEIS LDA., com sede na Avenida …, Edifício …, …, Felgueiras, intentou contra J. L. e esposa, M. C., residente na Rua …, Guimarães, a presente acção de condenação sob a forma comum de processo peticionando, pela sua procedência, a condenação dos RR. no pagamento, a seu favor, da quantia de €8.810,80, acrescida de juros moratórios contados à taxa legal desde a citação até efectivo e integral pagamento.

Alega, para tanto, e em síntese, ser a propriedade horizontal do Edifício ... composta por 279 fracções, mas dividida em dois condomínios, um relativo à parte habitacional e outro relativo à parte comercial, este último integrado por 76 das 279 fracções, entre as quais a fracção AG.

Mais alega que entre 06.12.2005 e 08.02.2018 o R. marido foi locatário financeiro da fracção AG, tendo sido acordado entre o demandado e a locadora financeira que todas as despesas relativas ao condomínio ficariam a cargo do locatário financeiro.

Aduz que se encontra em débito para com aquele condomínio as mensalidades (compostas por quota ordinária, fundo comum de reserva e fundo de promoção e marketing) reportadas ao período compreendido entre Novembro de 2013 e Dezembro de 2014 (com excepção das relativas aos meses de Julho e Agosto de 2014), acerto referente aos meses de Janeiro, Fevereiro e Março de 2015 e ainda as mensalidades reportadas ao período compreendido entre Janeiro de 2016 e Fevereiro de 2018, num total de €6.867,50, a que acrescem os juros vencidos desde a data de vencimento de cada uma dessas mensalidades, contabilizados em €492,92 até ao dia 27.09.2017.

Reclama ainda o pagamento de uma penalidade no valor de €750 por falta de pagamento atempado das prestações devidas.

Demanda a R. mulher por, afirma, o R. marido desenvolver na fracção autónoma em causa o seu comércio a retalho de mobiliário e artigos eléctricos e de iluminação, sendo com os rendimentos dessa actividade que provia ao sustento do seu agregado familiar.

Regularmente citados, contestaram os RR., excepcionando por um lado a sua ilegitimidade ad causam por, afirmam, os encargos com o condomínio deverem ser imputados à proprietária da fracção e não a eles, por outro o caso julgado, por os encargos cujo pagamento é peticionado com a presente acção terem sido anteriormente peticionados no âmbito de acção executiva a que foram deduzidos embargos, julgados procedentes pelo Tribunal da Relação de Guimarães, e ainda quer a prescrição das prestações, quer a ineptidão da petição inicial.

Arguiram também a ineficácia das deliberações das assembleias de condóminos que fixaram a obrigatoriedade do pagamento do fundo de promoção e marketing bem como das multas/penalidades, por constarem de um regulamento interno provisório que nunca foi objecto de ratificação, e impugnaram a demais factualidade aduzida, designadamente negando que os proventos da loja fossem utilizados no sustento do agregado familiar, até porque, alegam, esses proventos não cobriam sequer as despesas.

Arguem ainda que abandonaram a fracção autónoma em Agosto de 2017, tendo-a entregado à locadora livre de pessoas e bens em tal data, pelo que nunca poderiam ser responsabilizados pelo pagamento das mensalidades vencidas após essa entrega.

Foi exercido o contraditório relativamente às excepções deduzidas, sendo que por despacho datado de 01.10.2020, a fls. 465ss, foram indeferidas as excepcionadas ineptidão da p.i., caso julgado e prescrição, dispensando-se ainda a identificação do objecto do processo e a fixação dos temas da prova ante a simplicidade da matéria em discussão e o valor atribuído à presente causa.

No decurso da audiência de julgamento o A. desistiu do pedido relativo às mensalidades vencidas entre Outubro de 2017 e Fevereiro de 2018, inclusive, no valor de €944,82, desistência essa objecto de homologação.

Realizado o julgamento, foi proferida sentença em que, respondendo à matéria de facto controvertida, se decidiu julgar a acção nos seguintes termos: “Pelo exposto, o Tribunal decide julgar a presente acção procedente por provada e condena os RR. no pagamento à A. da quantia de €6.672,68 (seis mil, seiscentos e setenta e dois euros e sessenta e oito cêntimos), acrescida de juros moratórios contados desde a data de vencimento de cada uma das prestações em dívida até efectivo e integral pagamento”.

Inconformados com tal decisão, apelam os Réus, e, pugnando pela respectiva revogação, formulam nas suas alegações as seguintes conclusões: 1ª - Na opinião dos recorrentes, a sentença de que se recorre enferma de uma incorrecta interpretação e aplicação do artigo 10º nº 1 alínea b) do DL 149/95, de 24 de Junho e artigo 1424º do Código Civil.

  1. – Com efeito, face à prova produzida, todos os encargos do condomínio reclamados aos recorrentes nos autos devem ser imputados à LOCADORA (entidade bancária), considerando o contrato de locação financeira existente nos autos com nº 2018 260, datado de 6 de Dezembro de 2005, junto à PI; 3ª - Não é totalmente exacta (por estar aquém do que consta no contrato) a conclusão do tribunal recorrido (e o alegado pela Autora no artigo 11º da PI) onde se lê que “todas as despesas relativas ao condomínio são da responsabilidade do locatário financeiro (R. marido)”.

    Pois que da cláusula 4ª, nº 3 do contrato consta que “Todos os encargos relacionados com o imóvel locado ou com o presente contrato serão pagos pela LOCATÁRIA ou por esta reembolsados à LOCADORA, nomeadamente os seguintes: b) Todas as despesas relativas ao condomínio, ou quaisquer outros encargos de que resulte responsabilidade, a qualquer título, para a LOCADORA”.

    1. – De facto, no âmbito do contrato de locação financeira que tem por objecto fracção autónoma em causa, cabe ao locatário por força do disposto no artigo 10º nº 1 alínea b) do DL 149/95, de 24 de Junho, a obrigação de pagar as despesas necessárias à fruição das partes comuns do edifício e dos serviços de interesse comum.

    2. – No entanto, e perante o condomínio, no caso de o locatário financeiro não proceder a esse pagamento, a responsabilidade cabe ao locador financeiro enquanto proprietário da fracção autónoma e condómino em conformidade com o disposto no artigo 1424º do Código Civil.

    3. - Não estando em causa desconsiderar as características específicas do contrato de locação financeira, entendem os recorrentes, no entanto, que a norma do referido artigo 10º alínea b) tem apenas eficácia inter partes e não erga omnes.

    4. - O legislador expressamente aponta para uma eficácia inter partes do diploma pelo que, ressalvando o devido respeito pelo entendimento da douta sentença recorrida, consideramos que a norma em questão se aplica na relação locador/locatário, na qual, por força da lei, é o locatário que responde pelas despesas correntes perante o locador.

    5. - Assim, o artigo 10º ao enunciar que é obrigação do locatário financeiro pagar, em caso de locação de fração autónoma, as despesas correntes necessárias à fruição das partes comuns de edifício e aos serviços de interesse comum reporta-se à relação entre os contraentes, sendo certo que o diploma (o Decreto-Lei n.º 149/95) visa regular o regime da locação financeira e as relações o locador e o locatário; já os artigos 1420º e seguintes do Código Civil, onde se insere o referido artigo 1424º, visam regular os direitos e encargos dos condóminos, resultando deste artigo que é o condómino, ou seja o proprietário (pois quem assume a qualidade de proprietário de fração autónoma será, por inerência, considerado condómino do prédio) o responsável pelo pagamento das despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns do edifício e ao pagamento de serviços de interesse comum.

    6. - Ainda que sobre o locatário, no âmbito do contrato de locação financeira, recaia a obrigação de pagar as despesas correntes necessárias à fruição das partes comuns de edifício e aos serviços de interesse comum, perante o condomínio, terceiro relativamente ao contrato de locação, o responsável em última análise (caso o locatário não pague voluntariamente) será sempre o locador e não o recorrente/locatário.

    7. - O responsável pelas despesas de condomínio, perante o condomínio, é quem figura como proprietário e este é o locador e não o locatário/recorrente; de facto, o locador financeiro do ponto de vista jurídico é o único proprietário da fração autónoma pois que, independentemente da fruição do imóvel pelo locatário, este apenas poderá vir a adquirir no final do contrato de locação financeira.

  2. – Os recorrentes seguem o entendimento seguido por este Venerando Tribunal da Relação de Guimarães, plasmado no Acórdão de 10-05-2018, proferido no processo 501/15.6T8PTL, em que é Relatora a Ex.ma Sra. Desembargadora Raquel Tavares (igualmente disponível em www.dgsi.pt) e onde se decidiu que, perante o condomínio, no caso do locatário financeiro não proceder ao pagamento das despesas necessárias à fruição das partes comuns do edifício e dos serviços de interesse comum, “a responsabilidade cabe ao locador financeiro enquanto proprietário da fração autónoma e condómino em conformidade com o disposto no artigo 1424º do Código Civil”.

  3. – Acresce que assume especial relevância, no caso, o facto provado de que o locador Banco ... pagou ao Autor/recorrido a quantia de €944,82, reportada às quotas ordinárias, fundo comum de reserva e fundo de promoção e marketing referentes aos meses de Setembro, Outubro, Novembro e Dezembro de 2017 e Janeiro e Fevereiro de 2018 – facto provado na alínea dd) dos factos provados.

    1. - Ou seja, o Autor, ora recorrido, não deixou de aceitar e receber do locador a quantia de €944,82, e ao ter aceite aquele montante para pagar aquelas rúbricas, o Autor reconheceu que sobre o locador recaía a obrigação de pagar as quotas ordinárias, fundo comum de reserva...

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