Acórdão nº 1615/20.6T8VNF-A.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 11 de Novembro de 2021

Magistrado ResponsávelJOSÉ CRAVO
Data da Resolução11 de Novembro de 2021
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães *1 – RELATÓRIO Em apenso à acção executiva n.º 1615/20.6T8VNF, fundada em confissão de dívida, para obter o pagamento da quantia de 6.943,69 € (seis mil novecentos e quarenta e três euros e sessenta e nove cêntimos), acrescida dos juros vincendos até integral e efectivo pagamento, veio a executada, M. C.

, deduzir oposição à execução mediante embargos (1), contra o exequente L. G.

, pretendendo que esta se julgue procedente e, em consequência, se ordene a extinção da instância executiva.

Mais pediu que o exequente/embargado fosse condenado como litigante de má fé. Para o efeito e em síntese, alegou factos tendentes a demonstrar que é titular, por sub-rogação, de um contra-crédito.

Deduziu ainda oposição à penhora.

O exequente/embargado apresentou contestação, impugnando parte dos factos articulados pela executada/embargante.

Foi marcada a realização da audiência prévia, na qual se gorou a conciliação das partes, tendo tido as mesmas a possibilidade de se pronunciarem sobre as questões em discussão nos autos.

Posteriormente foi proferido despacho saneador, e porque se tivesse entendido permitir o estado dos autos proferir decisão, passou-se de imediato a conhecer do mérito dos embargos, que foram julgados improcedentes, tendo-se consequentemente determinado o prosseguimento da execução, mais se tendo julgado improcedente a oposição à penhora.

*Inconformada com essa decisão, a embargante interpôs recurso de apelação contra a mesma, cujas alegações finalizou com a apresentação das seguintes conclusões: 1.

Entende a executada/embargante que o julgador a quo decidiu mal quando julgou inadmissível a compensação invocada pelo facto de o contra-crédito em causa não se encontrar ainda judicialmente reconhecido; 2.

Entende a executada/embargante que o contra-crédito invocado e cuja compensação se pretende é exigível nos termos e para os efeitos do artigo 847.º, do Código Civil, servindo por isso de fundamento legítimo à oposição à execução mediante embargos de executado e deve nessa medida ser aceite e julgado procedente; 3.

Para operar a compensação de créditos não se exige que o contra-crédito invocado esteja prévia e judicialmente reconhecido mas tão só que o mesmo seja judicialmente exigível; 4.

De jure condito, no nosso sistema legal não subsiste nenhuma norma jurídica que imponha qualquer tipo de restrição para que só seja admissível a compensação entre créditos judicialmente reconhecidos, mesmo em sede de embargos de executado; 5.

Sobre esta questão da «exigibilidade judicial» para efeitos de compensação de créditos, o Supremo Tribunal de Justiça vem-se pronunciando maioritariamente no sentido de que não é necessário o prévio reconhecimento judicial, mas apenas que o mesmo crédito esteja em condições de, nos termos do artigo 817.º, do Código Civil, ser judicialmente reconhecido; 6.

O fundamento e único fundamento para sustentar a decisão de rejeição da excepção de compensação de créditos se reduz ao facto de o contra-crédito da executada/embargante invocado em sede de embargos não se mostrar prévia e judicialmente reconhecido; 7.

O julgador a quo não evidenciou qualquer outra razão de jure condito que sustentasse a decisão de rejeitar a invocada compensação, além do facto de o contra-crédito não estar ainda judicialmente reconhecido; 8.

O julgador a quo olvidou que na contestação dos embargos oferecida pelo exequente/embargado a fls... dos presentes autos, este não negou e ou invocou a inexistência do invocado contra-crédito por parte da executada/embargante, mas tão só centrou a sua defesa na questão da prestação do consentimento para que a compensação produzisse os seus efeitos, afirmando que nunca em momento algum prestou o mesmo; 9.

O julgador a quo não cuidou de aferir em concreto se contra o invocado crédito da executada/embargante se verificava alguma excepção peremptória ou dilatória se o mesmo é ou não exigível em ação judicial de cumprimento, maxime dos requisitos do artigo 847.º, do Código Civil, nada referido na douta sentença; 10.

O julgador a quo limitou-se a reconduzir a (in)admissibilidade da compensação somente à questão do crédito não se encontrar previamente reconhecimento judicialmente, o que não se aceita nem concede; 11.

A compensação constitui um verdadeiro direito potestativo, dependendo da declaração de uma das partes à outra para se tornar efectiva - art. 848.º do Código Civil - e que in casu ocorreu como se afere dos documentos juntos com o articulado de embargos, sob os Documentos n.ºs 13, 14, 15 e 16 - pelo que é absolutamente inócua a prestação de consentimento por parte do devedor; 12.

Andou mal o julgador a quo ao considerar que a compensação do contra-crédito invocado pela executada/embargante com o crédito exequendo não era admissível pelo facto de o primeiro não estar ainda judicialmente reconhecido, uma vez que, por um lado, a lei não exige tal reconhecimento judicial prévio mas somente que o dito contra-crédito seja susceptível de ser exigido judicialmente como é de facto, impondo-se assim somente a verificação dos pressupostos para tal; 13.

Ao julgador impunha-se verificar se o contra-crédito invocado se encontrava vencido e não pago e nessa medida era susceptível de ser exigido judicialmente ao invés de verificar se havia uma prévia decisão judicial que o reconheceu, facto que a lei, como já se disse, não exige nem faz depender para a sua compensação; 14.

No nosso sistema legal não subsiste nenhuma norma jurídica que imponha qualquer tipo de restrição para que só seja admissível a compensação em sede em embargos/oposição com um contra-crédito judicialmente reconhecido; 15.

A norma do artigo 847.º, número 1, alínea a), do CC, basta-se com a “possibilidade do crédito do executado sobre o exequente, estar vencido e não pago, facultando-lhe o recurso imediato à tutela judicial, tanto por via da instauração da ação declarativa condenatória no cumprimento do contracrédito, como de ação executiva, havendo para o efeito o suficiente título executivo” (Vide a este propósito o douto acórdão do Tribunal da Relação de Évora, 20/10/2016, consultável in www.dgsi.pt); 16.

A jurisprudência do Tribunal da Relação de Évora, de 20/10/2016, defende que no âmbito de oposição à execução baseada em título diverso de sentença, o credor pode deduzir oposição à execução por embargos, alegando contra-crédito vencido e não pago a compensar com o crédito exequendo que poderá provar por qualquer meio admissível em processo declarativo; 17.

O direito adjectivo constituído não realiza qualquer distinção entre a compensação de créditos no processo civil declaratório e a compensação de créditos no âmbito do processo executivo; 18.

O legislador não estatuiu qualquer regra segundo a qual o executado só pode invocar a compensação de um contra-crédito com o crédito exequendo se estiver munido de um título executivo; 19.

A norma do artigo 847.º, número 1, do Código Civil não prevê qualquer distinção, ainda que ténue, entre a compensação de créditos no processo declarativo e no processo executivo; 20.

O julgador a quo partiu do pressuposto que a ausência de um contra-crédito já reconhecido judicialmente era fundamento e causa para rejeitar a invocada compensação o que é a todos os títulos incorreto e até contra legem; 21.

O julgador a quo ao interpretar a norma do artigo 847.º, número 1, do Código Civil, no sentido de que o contra-crédito invocado em sede de oposição à execução e não reconhecido judicialmente não é admissível para compensação deu sentido inconstitucional à referida norma, inconstitucionalidade que expressamente se invoca e argui; 22.

Entende a executada/embargante que a douta sentença padece de erro e decidiu mesmo contra legem ao considerar como considerou que, pese embora as penhoras tenham sido realizadas no período de vigência do Decreto-Lei n.º 10-A/2020, de 13 de março, ulteriormente integrado na Lei n.º 1-A/2020, publicada no Diário da República n.º 56/2020, 3º Suplemento, Série I de 2020-03-19 e da Lei n.º 4-A72020, com efeitos a partir de 09 de março de 2020, mesmo assim, serão de manter com fundamento no facto de aquela não ter alegado qualquer prejuízo para a sua subsistência; 23.

Entende a executada/embargante que as penhoras realizadas nos presentes autos de execução, tendo sido efectuadas no período em que já vigorava a suspensão de prazos processuais e a não prática de actos processuais, ainda que por aplicação do regime das férias judiciais, do que resulta estatuído no artigo 7.º, n.º 1, na sua redação inicial, terão de ser levantadas porque foram praticadas no período abrangido pela proibição legal da prática de actos e diligências de natureza executiva; 24.

In casu impunha-se ao julgador aferir se a penhora podia ou não ter sido realizada, isto é, se foi lícita ou ilicitamente realizada face às imposições legais estabelecidas no período em que as mesmas foram realizadas e não a de saber se a executada invocou ou não prejuízo grave para a sua subsistência, uma vez que, tal não é sequer requisito das normas jurídicas em causa; 25.

O julgador a quo “contornou” a questão submetida a juízo da apreciação legalidade ou ilegalidade dos atos de penhora realizados com a questão lateral de saber se a executada alegou ou não um prejuízo irreparável, tudo como se tal alegação fosse fundamento ou justa causa para colmatar a ilegalidade cometida pela Ex.ma Sr.a Agente de Execução em conluio com o exequente; 26.

Nos presentes autos, a AE quando realizou as penhoras estava impedida pela lei de fazer, uma vez que, por força do efeito decorrente da suspensão legal, imediata e excecional, resultante do Decreto-Lei n.º 10-A/2020, de 13 de março, ulteriormente integrado na Lei n.º 1-A/2020, publicada no Diário da República n.º 56/2020, 3º Suplemento, Série I de 2020-03-19 e da Lei n.º 4-A72020, com efeitos a partir de 09 de março de 2020; 27.

A Ex.ma Sr.a Agente de Execução, quando atuou, sabia e não ignorava que os atos de...

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