Acórdão nº 1137/21.8T8VCT.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 18 de Novembro de 2021

Magistrado ResponsávelJOSÉ ALBERTO MOREIRA DIAS
Data da Resolução18 de Novembro de 2021
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam, em conferência, os Juízes do Tribunal da Relação de Guimarães, no seguinte: I. RELATÓRIO.

S. I., residente na Rua …, instaurou a presente ação especial de inquérito judicial contra X Investimentos, Lda., com sede no Lugar …, pedindo que se ordene a realização de inquérito judicial à sociedade requerida, para averiguação dos pontos de facto (que identifica) e nomeando-se o perito ou peritos que devem realizar a investigação.

Para tanto alega, em síntese, ser sócia da sociedade Requerida, com uma quota de mil euros, correspondente a 10% do capital social desta, a qual tem como gerente, desde a sua constituição, o também sócio M. C., que é titular de uma quota de 4.500,00 euros, correspondente a 45% do capital social da sociedade, sendo o restante capital social detido pela mulher do último, Maria, a qual, por sentença transitada em julgado, é beneficiária de medida de acompanhamento, por razões de saúde, sendo seu acompanhante o identificado sócio e gerente M. C.; Por carta de 15 de março de 2021, enviada para a sede da sociedade Requerida, e nela rececionada no dia seguinte, a Requerente notificou o gerente da sociedade Requerida para que lhe prestasse diversa informação (que discrimina), a fim de esclarecer as relações que se estabeleceram entre a Requerida e a sociedade HabiY, Lda., de que são sócios os sócios da sociedade Requerida e de que é único gerente M. C., atento o risco de os negócios por este celebrados, em nome das sociedades suas representadas, configurarem negócios consigo mesmo, com os riscos daí advenientes, a que acresce o facto da sociedade Requerida possuir um estabelecimento de alojamento local, instalado em imóvel pertencente à sócia Maria, em condições desconhecidas pela Requerente, que terão sido estabelecidas em negócio consigo mesmo, uma vez que a sócia Maria está impossibilitada de gerir autonomamente os seus interesses desde, pelo menos, 2013; Acontece que, até ao presente, o gerente da sociedade Requerida não deu qualquer resposta àquela carta, considerando-se recusada a informação solicitada; A recusa daquela informação ocorre em contexto em que a assembleia geral anual da sociedade Requerida, convocada para 31/03/2021, foi adiada sine die, depois de a Requerente ter pretendido, sem sucesso, aceder aos documentos de prestação de contas da sociedade.

A Requerida contestou, defendendo-se por impugnação e por exceção.

Impugnou parte da facticidade alegada pela Requerente; Excecionou alegando que a Requerente não alegou que aquela tivesse efetivamente recusado a informação solicitada, limitando-se a alegar que a informação não lhe foi prestada e que não foi dada qualquer resposta à carta em que solicitava a prestação da informação, o que não equivale a qualquer recusa de sua parte em prestar essa informação; Acresce que a Requerente se limitou a realizar junto daquela um pedido de informação absolutamente genérico e vago de toda a vida da sociedade Requerida dos últimos cinco anos, seja porque pretende conhecer, ponto por ponto, todos os valores, faturas, pagamentos, recibos, garantias, funcionários inerentes a tais contratos e negócios, seja que entidade for, vindo apenas agora, na petição inicial, a justificar a sua pretensão, uma vez que, na carta em que solicitou a informação, não apresentou qualquer justificação para o pedido de informação aí formulado; Atendendo à generalidade e ambiguidade do pedido de informação solicitada pela Requerente, a Requerida, em 19/03/2021, informou-a que não seria possível reunir toda a informação requerida, no tempo que lhe foi exigido e, bem assim, que estava a analisar a possibilidade de aquela poder aceder a toda a informação pretendida, porquanto verifica-se justo receio da Requerente usar a informação que solicitou para fins estranhos à sociedade e em prejuízo desta; A Requerente criou várias sociedades (identificadas pela contestante), que têm um objeto social coincidente com o da sociedade Requerida, de que é gerente e sócia maioritária, e através das quais configurou e logrou realizar contratos de empreitada e realizar projetos com clientes da sociedade Requerida e da HabiY, clientes esses que foram angariados pelas últimas, e com os quais a Requerente travou conhecimento no âmbito da atividade realizada nessas sociedades, tendo acesso e conhecimento ao segredo do negócios entre aquelas sociedades, incluindo à informação que concretiza; A Requerente valeu-se do conhecimento adquirido na HabiY e na sociedade Requerida para, através das empresas criadas para o efeito, passar a contratar diretamente com estas, excluindo a HabiY e a sociedade Requerida do negócio, o que causou prejuízos às últimas; Acresce que as sociedades constituídas pela Requerente, foram-no com recurso a verbas investidas pela HabiY e pela sociedade Requerida para expansão do seu negócio para o mercado externo, tendo a Requerente mascarado a constituição dessas sociedades enquanto sociedades/parceiros locais da HabiY e da sociedade Requerida, quando após a Requerente ter deixado de ser remunerada enquanto diretora de projetos, esses supostos parceiros locais deixaram de contactar com a HabiY e com a sociedade Requerida, que veio a descobrir tratar-se de sociedades comerciais da Requerente, constituídas com recurso a verbas próprias da HabiY e da sociedade Requerida.

Conclui pela improcedência da ação.

Por requerimento entrado em juízo em 25/05/2021, a Requerente pronunciou-se quanto aos documentos juntos pela Requerida em anexo à contestação, concluindo que com a junção e invocação dos referidos documentos, a Requerida “altera dolosamente a verdade dos factos, de forma a influir na decisão da causa, numa clara litigância de má fé, que não poderá deixar de ser sancionada com multa exemplar, que satisfaça as exigências de prevenção geral e especial”.

Por despacho proferido em 26/05/2021, convidou-se a Requerente a concretizar especificamente quais os pontos concretos das informações que solicitou e cuja informação lhe foi efetivamente recusada, qual a relevância concreta de tais informações e, bem assim para esclarecer se, alguma vez, solicitou ou consultou a escrituração, livros e documentos da sociedade em causa.

Por requerimento entrado em juízo em 04/06/2021, a Requerente informou que todas as informações especificadas no art. 9º da petição inicial e que se traduzem nos pontos de facto a averiguar, foram recusadas, uma vez que não foram prestadas nos 15 dias a contar da receção da carta, nem sequer até hoje; que essas informações visam permitir à Requerente conhecer a vida da sociedade Requerida, relevando para aquilatar da eficiência da gestão desta, pela análise das relações contratuais mais relevantes que esta estabelece, em particular, com a HabiY, cujo gerente é o mesmo, e com entidades públicas, e ainda pela análise do quadro de pessoal da sociedade Requerida e das condições de remuneração dos seus trabalhadores e gerente e, bem assim, dos termos em que se processa a exploração do estabelecimento “House ...”, o que se torna especialmente relevante dado que a Requerente não solicita nem consulta a escrituração, livros e documentos da sociedade Requerida desde, pelo menos, 2017.

Por sua vez, a Requerida respondeu ao pedido de condenação daquela como litigante de má fé, concluindo pela improcedência desse pedido.

Designou-se data para inquirição das testemunhas arroladas pelas partes, “designadamente, com vista a aferir da efetiva recusa e/ou da licitude da recusa, antes de ordenar que a requerida preste informações ou a realização de qualquer inquérito”.

Inquiridas as testemunhas, em 22/07/2021 proferiu-se sentença em que se proferiu despacho saneador tabelar, fixou-se o valor da presente causa em 5.001,00 euros, e em que se julgou o pedido de informação solicitado pela Requerente totalmente procedente e condenou-se a sociedade Requerida como litigante de má fé e, após trânsito, determinou-se o arquivamento dos autos, constando essa sentença da seguinte parte dispositiva: Em conformidade com o exposto, julga o Tribunal totalmente procedente o pedido de informações solicitado por S. I. à sociedade X Investments, Ld.ª, ao abrigo do disposto no artigo 1049º, n.º 1, do Cód. Proc. Civil, termos em que se determina que, no prazo de 30 [trinta] dias aquela última preste/disponibilize à primeira, na qualidade de sócia, as seguintes informações:--- Discriminação dos contratos celebrados entre a sociedade e quaisquer autarquias locais ou outras entidades públicas, nos últimos 5 anos, com indicação da data de celebração, entidade adjudicante, objeto do contrato, designadamente da obra a que respeita, se esse for o caso, do seu valor e do tipo de procedimento que conduziu à adjudicação;--- Discriminação dos contratos celebrados entre a sociedade e a HabiY – Construções, Lda., nos últimos 5 anos, com indicação da respetiva data de celebração, objeto, designadamente da obra a que respeitam, se esse for o caso, e do seu valor;--- Discriminação, com indicação do respetivo número, valor, data de emissão, data de vencimento e data de pagamento, das faturas emitidas pela sociedade a quaisquer autarquias locais ou outras entidades públicas;--- Discriminação de todos os contratos celebrados pela sociedade, nos últimos cinco anos, que correspondam a subcontratação, total ou parcial, de obras que lhe tenham sido adjudicadas por autarquias locais ou outras entidades públicas;- Discriminação, com indicação do respetivo número, valor, data de emissão, data e vencimento e data de pagamento, das faturas emitidas pela sociedade à HabiY – Construções, Lda.;--- Discriminação, com indicação do respetivo número, valor, data de emissão, data de vencimento e data de pagamento, das faturas emitidas pela HabiY – Construções, Lda. à sociedade;--- Discriminação, com indicação do respetivo número, valor, data de emissão, data de vencimento e data de pagamento, das faturas emitidas por quaisquer subempreiteiros à sociedade; Discriminação das garantias bancárias...

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