Acórdão nº 395/15.1GAFAF-C.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 18 de Novembro de 2021

Magistrado ResponsávelSANDRA MELO
Data da Resolução18 de Novembro de 2021
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES I- Relatório Reclamante e apelante: M. L.

Exequente e apelada: A. S.

Executado: A. F.

Autos de: apelação em reclamação de créditos por apenso a execução requerimento inicial A Recorrente veio reclamar o crédito de 54.909,59€ (cinquenta e quatro mil novecentos e nove euros e cinquenta e nove cêntimos), alegando para tanto e em síntese, que por documento particular autenticado de confissão de dívida com hipoteca, outorgada em 3 de Setembro de 2015, perante E. N., advogado, o executado e a sua mulher M. S., declararam que se confessavam devedores à reclamante da quantia de € 50.000,00, que naquela data lhe emprestou e que o executado declarou constituir hipoteca voluntária para garantia do bom e pontual pagamento da quantia mutuada sobre os prédios penhorados, as quais foram registadas em 4-9-2015, pelo que o seu crédito beneficia do privilégio decorrente das hipotecas.

impugnação Foi apresentada impugnação, na qual, em síntese, a exequente negou o invocado no requerimento inicial, alegando que todo o acordo foi simulado, para a prejudicar, salientando que na data do documento o executado se encontrava sujeito à medida de coação de permanência em habitação sujeito a meios eletrónicos.

Sentença Após audiência final, foi proferida sentença que decidiu: ---- Declarar a nulidade do ato jurídico correspondente ao contrato particular de confissão de dívida com hipoteca, celebrado entre o reclamado e a reclamante celebrado no dia 03-09-2015 e Cancelar as inscrições no registo predial das hipotecas que incidem sobre os mencionados prédios penhorados nos autos; bem como --- Não reconhecer o crédito reclamado pela reclamante M. L..

É desta decisão que a Recorrente apela, formulando, para tanto, as seguintes conclusões: i. Recurso da matéria de facto: 1- A reclamante/apelante discorda do tratamento fáctico jurídico dado pelo Tribunal a quo, pois no seu entender, os pontos 7, 8, 9, 10, 13, 14, 15, 16, 17, 18 e 19, que figuram da matéria de facto dada como provada, foram incorretamente julgados, devendo passar a constar dos factos dados como não provados, e por consequência, o facto dado como não provado, deveria passar a figurar dos factos provados.

2- O processo de convicção, com o devido respeito, afigura-se-nos ilógico e irracional, violando as regras da experiência comum na apreciação da prova.

3- No nosso entender, a solução para a alteração da matéria de facto, basta-se com a imposição de um ónus perfeitamente lógico e necessário, que levaria à procedência ou improcedência da oposição e impugnação de créditos, e que impendia sobre a impugnante, mas que a nosso ver, não foi cumprido, razão pela qual, se afigura inútil a transcrição de quaisquer trechos, para o desfecho que se pretende.

4- De acordo com a regra geral contida no nº1 do artigo 342º do Código Civil (CC), impugnado um crédito com fundamento na simulação, é sobre o credor reclamante que recai o ónus da prova dos factos integradores de tais requisitos (os elementos que constituem o instituto jurídico da simulação).

5- Não tendo logrado tal demonstração, a exequente/impugnante há-de ver esta questão decidida contra ela.

6- A forma como foi produzida a prova ou a inexistência dela, impõe necessariamente que o juízo prudencial deste Venerando Tribunal, se distancie da decisão de facto prolatada pela Primeira Instância.

7- Tratando-se de um documento particular autenticado, o art. 376º do CC, atribui-lhe força probatória dos documentos autênticos (prevista no art. 371º e 372º do CC), pelo que, estamos perante um documento com força probatória plena.

8- A prova da genuinidade da assinatura faz presumir, nos termos do nº 2 do art. 376.º do CC, a veracidade do seu conteúdo, cfr. douto Acórdão do STJ, de 04/10/94 – CJ/S, Ano II – II – 81/83; e A. Vaz Serra – RLJ, Ano 114 – 287.

9- O contrato de confissão de dívida com hipoteca junto aos autos trata-se de um documento assinado pela reclamante e pelos reclamados (que confirmaram a sua assinatura), pelo que tal declaração ter-se-á de considerar como confissão, declaração que assume força probatória plena de toda a matéria que do mesmo consta (artigo 358º, nº2, 374º, nº1 e 376º, nºs 1 e 2 do CC).

10- Regra geral, se a autoria do documento for reconhecida, faz prova plena quanto às declarações nele atribuídas ao seu autor, na medida em que forem contrários aos interesses do declarante, sem prejuízo da arguição e prova da falsidade do documento (artigo 376.º do Código Civil).

11- Se é verdade que as declarações negociais – de empréstimo, de aceitação, de entrega e de recebimento do capital – constantes do DPA, na sua sinceridade e veracidade, não ficam, com a mera apresentação do DPA, “automaticamente” plenamente provadas, o certo é que, tais declarações negociais não podem ser “destruídas/alteradas” de qualquer maneira e por mera “impugnação” (ainda que de terceiros, em relação aos outorgantes do negócio).

12- O credor impugnado, aqui recorrente, alegou, fundamentou e comprovou a existência do seu crédito sobre o executado, por exibição do documento particular autenticado e a prova de que o montante foi entregue, deu entrada na sua conta bancária) ao executado (cfr. extratos, cópia do cheque e formulário do depósito); 13- O contrato de mútuo é um contrato “real” quanto à sua constituição, ou seja, considera-se concluído com a efetiva entrega da coisa mutuada, como emerge da definição do art.1142º do CC, resultando provado dos documentos juntos.

14- Além disso, a realidade do mútuo (e completude desse negócio) é declarada e atestada pelos próprios mutuários, naquele documento, tendo sido confirmadas, de forma coerente e verosímil pela mutuante em sede de audiência de discussão e julgamento; 15- Sucede que, a autenticidade do documento particular de confissão de dívida com hipoteca e das assinaturas nele apostas não foram impugnados pela exequente/impugnante.

16- Na verdade, a exequente/impugnante, arguiu a falsidade do termo de autenticação, com o fundamento de que, consta do aludido termo, que o executado compareceu no escritório do senhor advogado no dia 3 de Setembro de 2015, quando tal não podia ter ocorrido, pois estava impedido de sair de casa (face ao cumprimento da medida de obrigação de permanência na habitação), e no processo não consta qualquer autorização para que o executado pudesse ausentar-se da residência onde se encontrava a cumprir a aludida medida.

17- Ou seja, a exequente aproveitou o facto de no aludido termo de autenticação existir uma inexatidão do local, para justificar a alegada simulação do negócio jurídico celebrado entre a reclamante e os executados marido e mulher, como se o mesmo nunca tivesse existido.

18- Todavia, a exequente/impugnante não pôs em causa a autoria do documento nem a sua assinatura.

19- Não se apurando se a assinatura aposta naquele documento particular autenticado, era ou não da autoria do executado, a decisão teria de assentar nas regras distributivas do ónus da prova.

20- Incumbia, à exequente/impugnante provar os requisitos da simulação por si invocada.

21- A exequente/impugnante, não provou que a autoria da assinatura aposta naquele documento, não era do executado/reclamado.

22- Sendo certo que, da prova testemunhal, nada foi referido, em concreto, sobre a intencionalidade da divergência entre a vontade e a declaração, o acordo simulatório e o intuito de enganar terceiro, como infra melhor se explanará.

23- Pelo que, ter-se-á de dar como provado a sua elaboração e outorga nos termos exarados no mesmo.

24- O Tribunal a quo, ao admitir que o executado não podia ter assinado o referido documento de confissão de dívida, mesmo não havendo prova nesse sentido, decidiu para além dos factos alegados pela parte, aos quais se tem de cingir, consubstanciando excesso de pronúncia (art.615º, nº1 al.d)), nulidade que argui para todos os efeitos legais.

25- O Mmº Juiz “a quo”, acrescentou às questões a solucionar a autenticidade da assinatura do executado no documento de confissão de dívida com hipoteca, a qual não constava do objeto do litígio, tanto mais que, a assinatura do executado constante do aludido documento, não foram impugnadas, a sua genuinidade não foi posta em causa.

26- O documento particular autenticado foi efetivamente outorgado, é verdadeiro e real.

27- O invocado “erro” no termo de autenticação, mais não é do que um simples lapso de escrita do advogado, no concernente ao local onde efetivamente foi celebrado o documento particular de confissão de dívida, posto ser patente, que no âmbito da sua atividade profissional e prática corrente, por norma, tais documentos são celebrados no seu domicílio profissional.

28- Sendo certo que, a inexatidão do local, constitui apenas uma mera irregularidade, que pode ser sanada a todo o tempo (como se demonstrará), sendo por isso mesmo tal documento válido e eficaz.

29- Aliás, este pequeno lapso, quanto à inexatidão do local, já havia sido clarificado em sede de resposta à oposição, no requerimento com a n/ref.ª 37239469, onde é referido expressamente sob o artigo 3º, que: “Aquando da outorga do documento particular autenticado, que ocorreu em Ardegão, a reclamante não conhecia, nem conhece a impugnante”.

30- Assim, a douta decisão assenta em erro, pois tal matéria não é nova, antes pelo contrário, já tinha sido alegada pela aqui recorrente.

31- Acresce que, o levantamento da quantia de 50.000,00€, em numerário e em tranches e à falta de demais prova, prova apenas isso mesmo, o levantamento do aludido dinheiro, mas não prova qualquer acordo simulatório.

32- Aliás, o facto de ter sido creditada a quantia de 50.000,00€, por transferência bancária de J. V., no dia 27.08.2015, também não prova a existência de qualquer acordo simulatório, pois como esclareceu a reclamante, a aludida conta é uma conta conjunta que tinha com o seu irmão, com dinheiro que lhes tinha sido deixado pelos seus pais.

33- Além disso, a tese de que a reclamante nunca recebeu efetivamente o dinheiro que...

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