Acórdão nº 2010/19.5T8BRG.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 25 de Novembro de 2021
Magistrado Responsável | MARIA CRISTINA CERDEIRA |
Data da Resolução | 25 de Novembro de 2021 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães I. RELATÓRIO A. L. e mulher M. L. intentaram a presente acção declarativa sob a forma de processo comum, contra BANCO A, S.A., pedindo a condenação deste a pagar/restituir aos AA. a quantia de € 1.736.266,09 (sendo € 1.622.678,59 de capital e € 113.587,50 de juros contados desde 8/04/2014 até à data da propositura da presente acção), acrescida de juros de mora vencidos e vincendos sobre o capital reclamado de € 1.622.678,59 até integral e efectivo pagamento.
Para tanto alegam, em síntese, que em 22/11/1978 celebraram com o Banco A S.A. (doravante Banco A) um contrato de abertura da conta com o n.º ......../000.3, tendo este, de forma abusiva, não autorizada e sem o conhecimento dos AA., lançado a débito e efectuado diversas transferências para outras contas bancárias de que os mesmos não eram titulares, bem como não lançou a crédito quantias monetárias que os AA. haviam depositado na conta supra identificada, movimentos estes efectuados entre a data da abertura de conta até à data de encerramento da mesma e descriminados nos artºs 20º e 34º da petição inicial.
Mais alegam que em 30/09/2003 foi debitada na referida conta dos AA. e por estes paga a importância € 8.190,49, pela devolução do efeito nº. .........3.8, com vencimento naquela data, referente a uma letra aceite por X, Lda. e descontada por V. C., letra essa que tinha domiciliação numa conta do Banco A de Vila Nova de Famalicão, e que nada tinha a ver com os Autores.
Em 10/07/2001 foi efectuado um depósito no valor de 9.360.000$00 na conta aberta em nome dos AA., com o nº. ......../000.1, sendo que tal quantia nunca foi levada a crédito na aludida conta.
Referem, ainda, que por Deliberação do Conselho de Administração do Banco de Portugal de 3 de Agosto de 2014 foi constituído o Banco Réu, ao abrigo do n.º 5 do artº. 145º-G do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras (doravante RGICSF), aprovado pelo DL 298/92 de 31/12.
Por força dessa mesma Deliberação, conjuntamente com a Deliberação da mesma entidade de 11 de Agosto de 2014, foram transferidos para o Banco A, S.A., nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 1 do artº. 145º-H do RGICSF, conjugado com o artº. 17º-A da Lei Orgânica do Banco de Portugal, os activos, passivos, elementos extrapatrimoniais e activos sob gestão do Banco A, decorrendo das referidas Deliberações do Banco de Portugal, conjugadas com os nºs 9 e 11 do artº. 145º-H do RGICSF, a sucessão do Banco A nos direitos e obrigações do Banco A.
Acrescentam que a situação concreta que se discute nos presentes autos não tem acolhimento nas diversas sub-alíneas da alínea B) do ponto 20 da informação do Banco de Portugal (doravante BdP) resultante da Deliberação do Conselho de Administração de 29 de Dezembro de 2015, sendo que à data da Deliberação do Banco de Portugal esta responsabilidade que pela presente acção se reclama do R., não se tratava de uma responsabilidade contingente ou desconhecida do Banco A.
O então Banco A figurava, na qualidade de Réu, na acção intentada pelo aqui Autor, com a intervenção da aqui Autora mulher, que correu termos no Tribunal Judicial da Comarca da Póvoa de Lanhoso com o n.º 400/06.2TBPVL, e na qual se peticionava que aquele R. fosse condenado a pagar/restituir a totalidade das quantias indevidamente retiradas/debitadas da conta bancária dos AA., requerendo que a liquidação da totalidade dos prejuízos causados fosse relegada para execução de sentença.
À data da supra mencionada Deliberação do BdP, já o Banco A, nessa mencionada acção, havia sido condenado por acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Guimarães, já transitado em julgado, a restituir ao Autor a totalidade das quantias por si indevidamente retiradas/debitadas ou não creditadas na conta daquele, não estando tal processo judicial mencionado no Anexo 2 da informação do BdP resultante da Deliberação do Conselho de Administração de 29 de Dezembro de 2015.
O R. Banco A contestou, excepcionando o caso julgado relativamente ao pedido, fundado na responsabilidade civil do R. contestante, de condenação deste no pagamento/restituição de quantia certa aos AA., alegando para o efeito que correu termos no Tribunal Judicial da Comarca da Póvoa de Lanhoso a acção n.º 400/06.2TBPVL, proposta pelos aqui Autores contra o Banco A, com o mesmo pedido e a mesma causa de pedir da presente acção, na qual: - foi proferida sentença na 1ª instância em 18/05/2012, condenando o aí R. BANCO A a pagar aos AA. a totalidade das quantias por si indevidamente retiradas/debitadas ou não creditadas na conta daqueles, cuja liquidação relegou para execução de sentença; - interposto recurso para o Tribunal da Relação de Guimarães, veio este, por acórdão de 11/07/2013, transitado em julgado, anular parcialmente o julgamento no que concerne a alguns factos da base instrutória, a fim de se sanarem contradições/obscuridades, ordenar a ampliação da matéria de facto permitindo ao Tribunal “a quo” proceder oficiosamente a averiguações, podendo o julgamento abranger outros pontos da matéria de facto com o fim exclusivo de evitar contradições na decisão; - a repetição do julgamento, porém, não chegou a concretizar-se porque, em 1 de Agosto de 2014, foi decidido pelo Conselho do Banco Central Europeu suspender o estatuto de contraparte do Banco A e por Deliberação do Banco de Portugal foi determinada a constituição do Banco A, não tendo sido proferida decisão de mérito sobre qualquer dos pedidos formulados pelos AA., como, aliás, reconheceu o STJ no seu acórdão de 6/03/2014 proferido no âmbito do recurso de revista; - com a constituição do Banco A, foi proferido, a impulso dos AA., o despacho judicial de fls. 934 daqueles autos, que declarou a substituição processual do R. BANCO A pelo banco de transição Banco A; - chamado à lide, o Banco A reclamou da decisão de modificação subjectiva da instância, dando origem ao despacho judicial de 31/07/2017, no qual se decidiu que o anterior despacho de fls. 934, “(…) violou o caso julgado no sentido de que o tribunal de 1ª instância deve obediência a decisão proferida por tribunal superior”, sendo esta questão “de conhecimento oficioso e, intraprocessualmente, a todo o tempo (…), declarando essa violação”, e dando sem efeito o despacho proferido a fls. 934 e ss. e os actos seguintes dele dependentes ou que o executem, para além de fixar como partes naquela acção os AA. e o Banco A S.A. – Em Liquidação; - tal despacho foi objecto de recurso, conhecido por acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 8/03/2018, que manteve a decisão recorrida; - foi proferida sentença em 18/07/2018, transitada em julgado, que declarou “extinta a instância por impossibilidade legal superveniente da lide”, ao abrigo do disposto nos artºs 277º, al. e) do CPC e 85º do CIRE, “o que torna processualmente inadmissível qualquer substituição processual e inútil a apreciação da ampliação do pedido, pois tal substituição e ampliação pressupõem que a acção possa prosseguir”; - arguida pelos AA. a violação de caso julgado com o argumento de que a sentença proferida a 18/07/2018 contraria “decisão superior”, foi tal requerimento indeferido por despacho de 15/10/2018, transitado em julgado.
Mais alega que o trânsito em julgado da sentença proferida no supra aludido processo impede os AA. de renovarem na presente lide a discussão que desenvolveram na primeira acção.
O Réu invoca, ainda, a sua ilegitimidade passiva por não poder assumir uma responsabilidade que o BdP expressamente retirou da sua esfera, como decorre da Deliberação do seu Conselho de Administração de 3 de Agosto de 2014 que sujeitou o Banco A à aplicação de uma medida de resolução, nos termos do disposto no artº. 145º-C do RGICSF, tendo sido determinada, entre outros pontos, a constituição do Banco A (doravante BANCO A) e a transferência de alguns activos, passivos, elementos extrapatrimoniais e activos sob gestão do Banco A para o Banco A.
No uso do poder que a lei lhe faculta, na mencionada Deliberação do Conselho de Administração do BdP de 3 de Agosto de 2014, com a redacção dada pela Deliberação de 11 de Agosto de 2014, o Banco de Portugal decidiu, em função das circunstâncias específicas do caso concreto, quais os activos e passivos do Banco A transferidos para o Réu BANCO A, exceptuando, de forma expressa, “quaisquer responsabilidades ou contingências do Banco A, nomeadamente as decorrentes de fraude ou da violação de disposições ou determinações regulatórias, penais ou contra-ordenacionais”, não tendo a responsabilidade que os AA. reclamam na mencionada acção e nesta sido transferida para o Banco A.
Por outro lado, impugna a alegada actuação do Banco A sem o conhecimento e/ou autorização dos AA., arguindo que mesmo que se entendesse que o Banco R. tinha agido com culpa, sempre aquela estaria neutralizada pela culpa dos AA., por terem tido condições para, no decurso dos vários anos a que se reportam os factos alegados (essencialmente de 1998 a 2003), conhecer os movimentos realizados e omitidos, sem que tenham esboçado qualquer reacção, excluindo assim a obrigação de indemnizar, nos termos do artº. 570º do Código Civil.
Alega, ainda, que constitui abuso de direito por parte dos AA. instaurarem a presente acção contra o R. Banco A volvidos 22 anos dos primeiros factos objecto da acção, 13 anos da entrada da primeira acção contra o Banco, 7 anos do primeiro acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães que anulou parcialmente o julgamento da 1ª instância e depois de sucessivas vezes os AA. terem submetido estes factos à apreciação das instâncias superiores que os apreciaram.
Conclui, defendendo a procedência das excepções invocadas pelo R. e pugnando pela improcedência da acção e sua absolvição.
Os AA. apresentaram resposta, na qual pugnam pela improcedência das excepções de caso julgado e ilegitimidade do R. Banco A, alegando que a questão da responsabilidade do BANCO A decorrente da matéria factual alegada e...
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