Acórdão nº 120/19.8T8CBC.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 13 de Julho de 2021

Magistrado ResponsávelMARGARIDA ALMEIDA FERNANDES
Data da Resolução13 de Julho de 2021
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães I – Relatório M. L.

e mulher, M. T.

, instauraram a presente acção popular, sob a forma de processo comum, contra M. J., R. G., F. G. e I. R.

, peticionando que: a) se declare e que seja reconhecido o direito de propriedade dos autores sobre o prédio urbano inscrito na matriz sob o artigo …º da União das Freguesias de ..., .... e ..., concelho de ... e descrito na C.R. Predial de ...s, freguesia de … sob o nº …; b) se declare e seja reconhecido que o caminho identificado sob os artigos 13º a 22º é uma via pública cuja dominialidade pertence à Autarquia Local – União de Freguesias de ..., .... e ...; c) se condene os réus a reconhecer o sobredito nas alíneas a) e b); d) se condene os réus a demolir o muro de vedação referido sob os artigos 23º a 25º da petição inicial, que construíram em manifesta violação daquele espaço público e assim restituírem o caminho à situação anterior àquelas obras; e) se condene os réus a absterem-se da prática de quaisquer actos que atentem contra o direito de propriedade dos autores e ainda do caminho público existente.

Alegaram para o efeito, e em síntese, que são donos e legítimos possuidores do prédio urbano sito no Lugar de ..., União da Freguesia de ..., .... e ..., do Concelho de ..., que confronta do sul com o caminho público que separa o prédio dos autores do prédio dos réus, caminho que se inicia noutro caminho público, principal do lugar, dirige-se no sentido nascente-poente, com cerca de 100 metros de comprimento, e que serve de acesso a pé e de veículos a cinco casas do lugar, bem como de diversos prédios rústicos.

Invocaram que o caminho se encontra em calçada à portuguesa na maior extensão do seu percurso, que é servido por postes de iluminação pública, obras que foram feitas pela Junta de Freguesia e com o fim público de acesso aos prédios de todos os residentes, sendo a Autarquia Local que o limpa e cuida e que suporta o seu custo, existindo desde tempos imemoriais, estando, como sempre esteve, aberto e acessível a todos que pretendem por ele transitar.

Por fim, afirmaram que a 1ª ré, há cerca de 3 anos, no lado norte daquele caminho e a confinar com o prédio dos réus, construiu ilicitamente um murete de blocos que encimou por rede suportada em esteios, ocupando o caminho público, no comprimento de cerca de 30 metros e na espessura de 20/30 centímetros, impedindo os autores de acederem à via pública, causando prejuízo e violando a propriedade pública sobre o caminho e também dos autores e que, apesar de já terem instado a Junta de Freguesia, obrigando a 1ª ré a retirar aquela vedação, a Autarquia Local nada resolveu.

*Ao abrigo do disposto no art. 13º da Lei nº 83/95, de 31 de agosto, que aprovou a lei que regulamenta o direito de participação procedimental e de acção popular, foi proferido despacho a julgar não ser manifestamente improvável a procedência dos pedidos formulados em b) e c) – quanto a este último ao reporte ao pedido na alínea b) –, d) e e) – este último apenas no referente ao caminho público.

No respeitante aos demais pedidos, foi dado o contraditório aos autores para se pronunciarem sobre a sua inadmissibilidade processual.

*Os autores manifestaram a sua vontade de desistir do pedido formulado sob a alínea a) e ainda de parte dos pedidos formulados nas alíneas c) e e), somente quanto ao que aí se alude ao pedido em a), reformulando o petitório da ação.

*Foi proferido despacho a julgar válida e relevante a desistência parcial dos pedidos e a ordenar o cumprimento do disposto nos art. 15º e 16º da Lei n.º 83/95, de 31 de agosto e no art. 569º do C.P.C.

ex vi art. 12º, nº 2 da Lei 83/95.

*A Câmara Municipal de ...

veio requerer a sua intervenção a título principal no processo, declarando que o aceitava na fase em que se encontrava.

*Os réus deduziram contestação, invocando, em primeira linha, a ilegitimidade passiva da ré R. G. e, consequentemente, pugnando pela sua absolvição da instância.

Em segunda linha, impugnaram os factos constantes da petição inicial, sustentando que o prédio dos autores confronta a nascente com um caminho de servidão, não revestindo o caminho em causa nos autos natureza pública.

Mais alegaram que o muro foi construído há mais de 20 anos e em terreno dos réus, sendo que a Junta de Freguesia reconheceu e reconhece a natureza privada do caminho e os próprios autores também, caminho com origem no caminho público dito da Capela - actual estrada municipal – que antes era térreo, no sentido nordeste-sudoeste, que servia algumas casas e terrenos agrícolas, com cerca de 100 metros, contados desde a estrada até uma zona em que bifurcava para servir terrenos agrícolas.

Acrescentaram que nesses primeiros 100 metros, o caminho estava integralmente implantado nos prédios da ré R. G. e da 1ª ré e seu marido, existindo do lado poente um muro em pedra que, nos últimos 50 metros, o suportava, pois, o prédio contíguo situava-se num plano inferior, muro que, pelo menos nessa zona, integrava o prédio dos réus.

Ainda, descreveram que, junto à casa dos réus, e entre ela e um outro edifício seu, o caminho passa por um terreiro que utilizavam para diversos fins, nunca ninguém tendo posto em crise a titularidade de tal parcela de terreno, que era exclusivamente utilizada pelos seus donos e para passagem dos titulares da servidão, esclarecendo que a razão material subjacente à presente acção se prende com o facto dos autores pretenderem utilizar a parcela para acesso carral à parte agrícola do seu prédio.

Narraram, também, que as três casas entretanto construídas do lado poente do caminho têm devido acesso, sendo que, dos documentos constantes dos processos de licenciamento requeridos pelos autores para construção, ampliação e reconstrução consta a informação de que o caminho em causa é particular, tendo quase a totalidade dos moradores de ...

apresentado um abaixo assinado junto da Câmara Municipal defendendo a titularidade pela 1ª ré do terreno fronteiro à casa e por onde passa um caminho de servidão, na sequência de um diferendo entre autores e réus por causa da construção do muro de vedação pela 1ª ré em 2000, para o qual requereu um licenciamento.

Por fim, que há 3 ou 4 anos o caminho foi calcetado, não tendo os réus autorizado o calcetamento a partir do início da sua casa de habitação, tendo sido colocado, na mesma ocasião, um poste da Eletricidade …, e que, apenas os moradores e os titulares do direito de servidão de passagem utilizavam e utilizam o caminho.

Terminam, pugnando, pela improcedência da acção e pela absolvição dos réus dos pedidos.

*Os autores responderam à excepção invocada pelos réus pugnando pela sua improcedência e impugnaram os documentos juntos pelos réus com a sua contestação.

*Foi proferido despacho ao abrigo do artigo 590º, nº 3 do C.P.C. notificando os autores para procederem à cabal identificação do prédio dos réus e à junção da certidão do registo predial actualizada do referido imóvel, o que fizeram, e foi determinada a rectificação do art. 14.º da petição inicial.

*No dia 08/01/2020 foi proferido despacho a dispensada a realização de audiência prévia, foi indeferida a excepção dilatória de ilegitimidade passiva da ré R. G., foi proferido despacho saneador, foi identificado o objecto do litígio e foram enunciados os temas da prova.

Foi admitida a prova indicada pelas partes nos articulados e designadas datas para a realização da audiência de julgamento.

*Procedeu-se a audiência de julgamento, após a qual foi proferida sentença, cuja parte decisória, na parte que interessa, reproduzimos: “Nestes termos, julga-se a presente ação totalmente improcedente, por não provada e, em consequência, decide-se absolver os réus dos pedidos formulados pelos autores. (…)”*Não se conformando com esta sentença vieram os autores dela interpor recurso de apelação, apresentando alegações e formulando as seguintes conclusões: “

  1. Vem a presente apelação interposta da douta sentença de fls., que julgou totalmente improcedente a acção, por não provada e, em consequência, absolveu os RR. dos pedidos formulados; b) Os apelantes não se conformam com a presente sentença, pois ante a matéria de facto provada a decisão de direito sempre deveria ser outra, “in casu” decidindo pela natureza pública do caminho cuja dominialidade pertence à Autarquia Local – União de Freguesias de ..., .... e ...; c) Ora, entendeu o Tribunal “a quo” ser de concluir, que o caminho em causa nos autos, nunca constituiu um caminho público, por ser utilizado, essencialmente, pelos proprietários dos prédios urbanos e rústicos a que dava acesso, não obstante estar aberto e acessível a quem por ele pretendesse transitar; d) Esta posição do Tribunal “a quo”, é errada, porquanto não considerou ou valorizou adequadamente o meio em causa, no caso, de ser um meio rural, com poucos habitantes e com um “modus vivendi” diferente dos grandes aglomerados e cujas necessidades de deslocação são as próprias de quem vive nesses...

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