Acórdão nº 1014/13.6TBSTS-L.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 13 de Julho de 2021

Magistrado ResponsávelJOSÉ AMARAL
Data da Resolução13 de Julho de 2021
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES I. RELATÓRIO C. D.

interpôs recurso da decisão proferida em 11-05-2021 pelo Tribunal de Família e Menores de Fafe que, em Processo de Promoção e Protecção, aplicou a medida provisória de acolhimento em instituição, pelo período de 3 meses, à menor sua filha L. S.

, nascida em ..-07-2019, apelando a que aquela seja revogada e mantida a de apoio junto da mãe.

Concluiu assim as suas alegações: “PRIMEIRA: Vem o presente Recurso da decisão cautelar que determinou a aplicação da medida provisória de acolhimento em instituição à criança L. S., nascida a ..-07-2019, alterado a medida de acompanhamento junto da mãe, Requerida / ora Recorrente.

SEGUNDA: A decisão ora em crise se encontra fundamentada pois não se extraí de forma concreta qual a motivação do Tribunal para alterar a medida de apoio para acolhimento residencial, viciando a respetiva decisão de nulidade.

TERCEIRA: Nos presentes autos houve falta de contraditório da Requerida que não se pode pronunciar de forma concreta sobre o Relatório Social.

QUARTA: O Relatório Social no qual o douto Tribunal a quo se apoia não se coaduna com a realidade. Porquanto: QUINTA: Contrariamente ao afirmado, a Requerida considerando o bem-estar dos seus filhos alterou de residência por forma a dar melhores condições de habitação aos menores, mais próxima da escola dos menores.

SEXTA: Contrariamente ao Relatório Social referido nos autos a Requerida celebrou contrato de arrendamento e vive com os menores na mesma casa com o seu companheiro, pai da L. S.), que tem emprego na área na restauração e se encontra bem inserido socialmente e tão pouco foi avaliado no Relatório Social, no Requerimento do Ministério Público e na decisão em crise.

Não corresponde à realidade que não foi possível apurar se vivem outras pessoas na mesma habitação, mormente, os senhorios, conforme documentos 1 e 2 que se juntam e cujo teor se dá integralmente por reproduzido.

SÉTIMA: Não corresponde à verdade, que os menores tenham absentismo e descure a higiene e respetiva alimentação. Veja-se decorrer do teor das declarações dos diretores de turma os menores vão bem vestidos, com higiene e levam o lanche diário para a Escola. Conforme doc.3. Não corresponde, à realidade que a menor L. S. não frequenta a crech, pois frequenta, sucede é que por várias vezes ficou doente e com recomendação médica para se manter em casa, de resto, a avaliação pela Técnica é realizada em pleno “pico” da crise SARS Covid 19. Cfr. Docs. 4 a 8.

OITAVA: Por último não se ignore, que todos os eventos do Relatório ocorrem em plena crise pandémica SARS- Covid 19, com confinamento da população em geral, encerramento de escolas, período muito difícil e de adaptação para a população em geral e famílias com crianças em idade escolar em geral, ao nível, social, familiar e económico.

NONA: Ora, a decisão em crise em momento e o Relatório Social em que se apoia em nenhum a sopesam este facto para a melhor compreensão da situação familiar dos menores, antes afirmando considerações genéricas de “acentuadas dificuldades de gestão doméstica e escassas competências parentais e até privação de necessidades básicas, além de que os menores faltam injustificadamente às aulas e a irmã L. S. não frequenta a creche.” que como supra se referiu não correspondem à realidade.

DÉCIMA: Acresce que, cotejando o art.º 3 da LPCJP que dispõe que ”há lugar à intervenção para a promoção dos direitos e proteção da criança quando os pais, o representante legal ou quem tenha a guarda de facto ponham em perigo a sua segurança, saúde, formação, educação ou desenvolvimento, ou quando esse perigo resulte de acção ou omissão de terceiros ou da própria criança ou do jovem a que aqueles não se oponham de modo adequado a removê-lo (art. 3º, nº1, da LPCJP).Considera-se existir o referido perigo, nomeadamente: quando a criança está abandonada ou vive entregue a si própria; sofre maus tratos físicos ou psíquicos ou é vítima de abusos sexuais; não recebe os cuidados ou a afeição adequados à sua idade e situação pessoal; é obrigada a actividades ou trabalhos excessivos ou inadequados à sua idade, dignidade e situação pessoal ou prejudiciais à sua formação ou desenvolvimento; está sujeita, de forma directa ou indirecta, a comportamentos que afectem gravemente a sua segurança ou equilíbrio emocional; assume comportamentos ou se entrega a actividades ou consumos que afectem gravemente a sua saúde, segurança, formação, educação ou desenvolvimento sem que os pais, o representante legal ou quem tenha a guarda de facto se lhes oponham de modo adequado a remover essa situação (art.º 3.º, n.º 2).

DÉCIMA PRIMEIRA: Ora, no caso em apreço, inexiste a situação de perigo prevista no sobredito preceito legal.

DÉCIMA SEGUNDA: A situação desta família não é a ideal, mas por isso é que a medida de acompanhamento junto dos pais foi aplicada e vem sendo sucessivamente prorrogada.

DÉCIMA TERCEIRA: Não obstante, não é especificado qualquer perigo, as crianças não estão doentes, maltratadas, sujas (desarrumado e sujo é diferente), negligenciadas, pois vão à escola e creche, a sua saúde é cuidada como demonstram as várias consultas que os menores realizaram.

DÉCIMA QUARTA: Com efeito, casa desarrumada com três filhos e estando a Requerida grávida é uma quadro normal, o mesmo quanto a uma criança de 19 meses anos suja em casa, pois decorre da experiência comum que uma criança desta idade ainda se está a habituar a comer sozinha e suja-se muito por exemplo a comer uma mera bolacha.

DÉCIMA QUINTA: Na realidade, a Requerida procurou casa melhor, nova escola junto a casa, tem um companheiro que trabalha, com uma família estável.

DÉCIMA SEXTA: Tem efetivamente dificuldades financeiras, mas que foram agravadas pela conjuntura, como sucedeu a uma boa parte das famílias portuguesas.

DÉCIMA SÉTIMA: Nenhum acontecimento que motivasse a alteração da medida ocorreu, a não ser, infelizmente a crise pandémica que o mundo atravessa e que deveria ser sopesada com reflexo na apreciação do caso em concreto, que justifique a alteração da medida, ainda que cautelarmente, para a medida mais grave de acompanhamento residencial e que priva as crianças do seu ambiente familiar que deve ser privilegiado em detrimento de medidas de corte dos laços familiares.

POR TUDO QUANTO EXPOSTO, DEVE A DOUTA SENTENÇA DO TRIBUNAL A QUO SER REVOGADA E SUBSTITUÍDA POR OUTRA QUE MANTENHA A MEDIDA DE APOIO JUNTO DA MAE.

COM O QUE SE FARÁ A COSTUMEIRA JUSTIÇA”.

O Ministério Público, refutando os fundamentos e argumentos esgrimidos e pugnando pela bondade e justeza do decidido, defendeu, na resposta, que o recurso deve ser julgado totalmente improcedente.

Este foi admitido como de apelação, a subir de imediato, em separado, tendo-lhe sido fixado, pelo tribunal recorrido, o efeito devolutivo (artº 124º, nº 2, da LPCJP).

Corridos os Vistos legais e submetido o caso à apreciação e julgamento colectivo, cumpre proferir a decisão, uma vez que nada a tal obsta.

  1. QUESTÕES A RESOLVER Pelas conclusões apresentadas pelo recorrente, sem prejuízo dos poderes oficiosos do tribunal, se fixa o thema decidendum e se definem os respectivos limites cognitivos.

    Assim é por lei e pacificamente entendido na jurisprudência – artºs 5º, 608º, nº 2, 609º, 635º, nº 4, 637º, nº 2, e 639º, nºs 1 e 2, do CPC.

    No caso, decorre das apresentadas que: a) Previamente, importa analisar e decidir se é admissível a requerida junção de documentos; b) Depois, se houve violação do princípio do contraditório quanto ao Relatório Social; c) Se a decisão não se encontra fundamentada de forma concreta, não motivando as razões por que nela se entendeu alterar a medida, e se tal falta implica a sua nulidade; d) Se, essencialmente, as circunstâncias de facto, designadamente as relativas ao “perigo”, não são suficientes para justificar a alteração da medida a que a menor estava sujeita de apoio junto dos pais para de acolhimento residencial e, portanto, deve ser revogada esta e mantida aquela.

  2. FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO Uma vez que, no recurso, se questiona, além do seu acerto, a validade da decisão dele objecto, designadamente ao nível da respectiva matéria de facto e, na verdade, não se contém naquela, pelo menos formalmente, um distinto quadro explicativo organizado onde ela se discrime e motive (à luz das regras dos artº 607º, CPC, e 121º, nº 2, da LPCJP) e que neste capítulo possa ser como tal reproduzido para a seguir ser analisado quanto aos aspectos questionados, opta-se por, aqui e de seguida, a transcrever na íntegra, sem prejuízo do que adiante se há-de decidir quanto a factos: “I - Nos presentes autos de promoção e proteção instaurados relativamente à criança L. S.

    , nascida a ..-07-2019, filha de C. D. e de T. M., devidamente identificada nos autos, foi obtido acordo de promoção e proteção datado de 20-02-2020, sendo-lhe aplicada a medida de apoio junto dos pais, com apoio económico.

    Tal medida foi prorrogada por decisão de 24-11-2020.

    Os presentes autos constituem o apenso ao processo de promoção e proteção instaurado em 28-09-2015 (há mais de 5 anos), relativamente aos menores L. E., nascido em ..-01-2004 (17 anos), L. D.

    , nascido em ..-06-2009 (11 anos), filhos de C. D.

    e F. J., e L. F.

    , nascido em ..-01-2014 (7 anos), este filho de C. D.

    e de C. F., todos devidamente identificados nos autos.

    Relativamente a estes menores, em 3-07-2017 foi determinado a aplicação aos menores das medidas de promoção e proteção de apoio junto dos pais, na pessoa da mãe [art.º 35.º, al. a) da LPCJP].

    Quanto ao jovem L. E., a medida aplicada foi alterada para medida de apoio junto de outro familiar, depois para novo apoio junto da mãe, seguidamente para acolhimento residencial e, finalmente, foi obtido acordo tutelar cível, ficando o jovem aos cuidados e guarda dos tios maternos. E em consequência desse acordo, foi arquivado o processo quanto ao mesmo.

    Já em relação aos menores L. D. e L. F., a medida aplicada de apoio junto da mãe foi...

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