Acórdão nº 98/20.5T8VNC-A.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 13 de Julho de 2021

Magistrado ResponsávelESPINHEIRA BALTAR
Data da Resolução13 de Julho de 2021
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam em Conferência na Secção Cível da Relação de Guimarães (1) J. C. e esposa demandaram, através de processo comum, J. P. formulando os seguintes pedidos: 1. Condenar-se o réu no corte da sebe existente no seu prédio descrito no 2º artigo desta petição inicial, na parte confinante com o prédio dos autores descrito no artigo 1º e ao longo de toda a respetiva extensão, para uma altura não superior a 2,5 metros, assim como a abster-se futuramente de deixar crescer a mesma para além desta altura.

  1. Condenar-se, ainda o réu no corte dessa sebe, e igualmente ao longo de toda a sua extensão, nas partes ou parcelas em que tal sebe invade o espaço aéreo daquele prédio dos autores, ou seja, em que vai para além da estrema entre o prédio do réu e o prédio dos autores, assim como a abster-se futuramente de deixar que a mesma invada esse prédio dos autores.

Alegam, em síntese, que são proprietários de um prédio urbano composto por casa de habitação e logradouro e inscrito na respetiva matriz predial sob o artigo 102, sito em X, que confronta do lado nascente com o prédio urbano do réu, composto por casa de habitação e logradouro, inscrito na respetiva matriz predial sob o artigo 529 e sito em X, onde, do lado confrontante, foi plantada uma sebe composta, sobretudo, por cedros, que tem, atualmente, cerca de 10 metros de altura.

A sebe apresenta-se com grande densidade de ramagens, galhos e troncos, invadindo, em partes da sua extensão, o prédio dos autores, introduzindo-se galhos e ramos para lá da divisão metálica a dividir os dois prédios, ensombrando, durante todo o ano, o prédio dos autores, ficando mais frio e húmido, para além de caírem sobre o seu prédio ramos, galhos e outros detritos.

Os autores notificaram, por escrito, o réu para que procedesse ao corte da aludida sebe, o que até à data não o fez.

O réu, na sua contestação, suscita a incompetência do tribunal em razão da matéria, uma vez que está em causa o cumprimento de um artigo do Regulamento do Município, o que envolve questão de direito público, traduzida numa relação administrativa, cuja decisão compete ao foro administrativo, para além de invocar o abuso de direito pela inação dos autores e impugnar os factos.

Os autores, na sua resposta às exceções alegaram, em síntese, no que concerne à incompetência, que a questão é de direito civil traduzida numa relação de vizinhança, e quanto ao abuso de direito, as árvores foram crescendo, só há poucos anos se tornaram insuportáveis.

A 13 de dezembro de 2020 foi proferido despacho saneador que julgou improcedente a exceção dilatória de incompetência do tribunal em razão da matéria.

Inconformado com o decidido, o réu interpôs recurso de apelação formulando as seguintes conclusões: “A. PRELIMINAR: DA NATUREZA DO PEDIDO DE CONDENAÇÃO DO RÉU, NA CONFIGURAÇÃO DADA PELOS AUTORES, E DO SENTIDO DA DECISÃO RECORRIDA

  1. Pretendem os Autores que o Tribunal venha a condenar o Réu «no corte da sebe existente no seu prédio descrito no artigo 2º desta petição inicial, na parte confinante com o prédio dos Autores descrito no artigo 1º, e ao longo de toda a respectiva extensão, para uma altura não superior a 2,50 metros, assim como a abster-se futuramente de deixar crescer a mesma para além dessa altura» – versando o 1º) Pedido enunciado pelos Autores –, b) Mais pedem os Autores que o Tribunal venha a condenar o Réu «no corte dessa sebe, e igualmente ao longo de toda a sua extensão, nas partes ou parcelas em que tal sebe invade o espaço aéreo daquele prédio dos Autores, ou seja, em que vai para além da estrema entre o prédio do Réu e o prédio dos Autores, assim como a abster-se futuramente de deixar que a mesma invada esse prédio dos Autores» – cfr. o 2º) Pedido deduzido pelos Autores , c) No respeitante ao 1º) pedido formulado pelos Autores Recorridos, correspondente à condenação do Réu no corte em altura das árvores localizadas no seu prédio, até ao limite de 2,50 metros, em toda a sua extensão, e, bem assim, na abstenção, no futuro, da manutenção das árvores a uma altura superior ao limite indicado, o Réu Recorrente invocou a incompetência absoluta do Tribunal recorrido, por entender que a pretensão deduzida pelos Autores Recorridos se achava compreendida na esfera jurisdicional dos Tribunais Administrativos e Fiscais, e já não da jurisdição comum.

  2. Como tal, exceção dilatória, reconhecida nos termos da alínea a) artigo 96.º e da alínea a) do artigo 577.º, ambos do CPC, sancionada, nos termos do n.º 1 do artigo 99.º e do n.º 2 do artigo 576.º, ambos do CPC, com a absolvição do Réu da instância.

  3. No que a uma tal pretensão concerne, os Autores amparam a transgressão imputada ao Recorrente na circunstância de, alegadamente, este conservar no seu prédio aquelas árvores a uma altura superior à admitida no Regulamento Municipal de Urbanização e Edificação de X (doravante “Regulamento”), aprovado pela respetiva Assembleia Municipal em 27-04-2012, e publicado em 23-05-2012, como tal estabelecida na alínea a) do n.º 3 do artigo 88.º daquele diploma, f) Disposição que, encerrando indiscutível configuração de uma norma de Direito Público, convoca, no seu racional, uma preocupação de interesse público com reflexo no espaço municipal, g) Disposição, outrossim, que institui com os seus administrados – e nessa qualidade, que não outra inconcebível, se vêm os Autores, no final do dia, apresentar-se diante os presentes autos – uma verdadeira e genuína relação de Direito Administrativo – uma relação jurídica administrativa –, cuja apreciação e exame, nos termos legais, se acha cometida à ordem jurisdicional administrativa.

  4. Donde, a ser bem entendida a pretensão aduzida pelos Autores – quando tomada na configuração que, responsavelmente, lhe pretenderam outorgar –, não se afigura ao Recorrente consubstanciar o pedido formulado, no plano objetivo, mais do que um pedido de condenação do aqui Recorrente no específico cumprimento daquela disposição regulamentar.

  5. Não beneficiam, ao invés, os Autores Recorridos, na exata qualidade de administrados, da titularidade de qualquer direito subjetivo ou interesse legalmente protegido difundido pelo sentido de uma tal disposição, que lhes não outorga qualquer direito particular, pelo que lhes não assiste, nos termos aportados na Petição Inicial, a faculdade de transmutar a ânsia de resgatar o pleno respeito pela disposição municipal – e os Autores pedem, precisamente, a condenação do Recorrente no corte em altura dos cedros até àquele limite fixado no Regulamento! – num falso interesse de ordem privada.

  6. Aquando do exercício do contraditório, os Autores Recorridos prescindiram de oferecer uma perspetiva circunstanciada sobre a matéria de exceção invocada ou de rebater, em concreto, os parâmetros de delimitação da jurisdição administrativa propugnados pelo Recorrente, limitando-se a alegar que em causa estaria a discussão de uma relação de vizinhança e que a disposição regulamentar pelos mesmos invocada houvera sido convocada a título meramente complementar, exercício que resume um condenável artifício de camuflagem do real objeto da demanda e um arrepio às regras legais de distribuição de competência jurisdicional.

  7. Sobre a matéria de exceção recaiu decisão do Tribunal a quo, o qual, no Despacho...

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