Acórdão nº 1880/17.6T8VRL.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 13 de Julho de 2021

Magistrado ResponsávelANA CRISTINA DUARTE
Data da Resolução13 de Julho de 2021
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães I. RELATÓRIO J. M. intentou ação declarativa contra “Companhia de Seguros X, SA” pedindo que a ré seja condenada a pagar-lhe: - a quantia de € 60.000,00 a título de indemnização por danos não patrimoniais; - a quantia de € 75.000,00 para ressarcir a IPP como dano patrimonial relativo à limitação funcional que afeta e afetará a autora na sua condição física e psíquica e com rebate na sua atividade geral e profissional; - a quantia de € 1.920,53 por despesas médicas e em fármacos; - a quantia de € 760,00 por despesas de combustível e ao desgaste do veículo por força das deslocações às sessões de fisioterapia; - as quantias de € 875,00, € 1.320,00, € 1.200,00 e € 1.606,56, respetivamente por privação de aumentos salariais, não recebimento de comissões e prémios e perdas salariais; - os danos futuros, patrimoniais e não patrimoniais, previsíveis por prováveis que, por ainda não serem passíveis de quantificação, se relega a sua liquidação para execução de sentença; - todas as despesas futuras médicas, medicamentosas, fisiátricas e outras que a autora venha a despender e a suportar por causa das lesões e em razão das sequelas decorrentes do sinistro viário, designadamente para tratar a cervicalgia crónica e obstar ao agravamento da aludida perda de funcionalidade escapular, pagamento esse a ser feito pela ré mediante a apresentação pela autora de documento comprovativo da realização das mesmas; - a pagar juros à taxa legal, sobre as indicadas quantias, desde a data da citação até efetivo e integral pagamento.

Alegou, para tanto, que foi vítima de acidente de viação, cujo único responsável conduzia viatura segura na ré, tendo sofrido os danos que descreve e quantifica.

A ré contestou, aceitando a responsabilidade do seu segurado no sinistro e a sua responsabilidade pelo pagamento dos prejuízos dele emergentes, mas impugnando os danos, por desconhecimento ou por quantificação excessiva.

Foi dispensada a audiência prévia e definidos o objeto do litígio e os temas da prova.

A autora apresentou ampliação do pedido, pretendendo a condenação da ré no pagamento de despesas que suportou com consultas de fisioterapia, tratamentos e medicação, nos anos de 2018 e 2019, no valor de € 532,94. A ré respondeu, impugnando por desconhecimento.

A ampliação do pedido foi admitida, para que os factos respetivos sejam apreciados com os demais em discussão nos autos.

Teve lugar a audiência de julgamento, após o que foi proferida sentença que julgou parcialmente procedente a ação e condenou a ré a pagar à autora a quantia global de € 51.064,04, a título de ressarcimento pelos danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos em consequência do acidente em discussão nos autos, quantia acrescida de juros, à taxa legal, a contar desde a citação da ré.

A ré, atualmente designada “Y Seguros, SA”, interpôs recurso, tendo finalizado a sua alegação com as seguintes Conclusões: 1. O primeiro motivo que nos força a subir até à Justiça de Vossas Excelências prende-se com a apreciação levada a cabo pela Meritíssima Juiz da primeira instância do conjunto da prova produzida nos autos, no que tange a factualidade vertida nos pontos 14º, 18º e 34º da Matéria de Facto Provada, visando a impugnação de parte da decisão proferida sobre essa matéria de facto.

  1. No que se reporta ao ponto 14º dos Factos Provados, crê a apelante que o mesmo enferma de um manifesto lapso, no que tange a data de 02.01.2014, já que, como decorre dos autos – nomeadamente do ponto 1º dos Factos Provados e de toda a documentação existente no processo – o acidente protagonizado pela autora ocorreu no dia 02.11.2014 e não no dia 02.01.2014.

  2. Assim e porque se trata de matéria consensual entre as partes, deverá ser rectificado o ponto 14º dos Factos Provados, substituindo-se a data de “02.01.2014” que ali vem indicada, pela data de “02.11.2014”.

  3. Por outro lado, ressalvando sempre o devido respeito por opinião diversa, afigura-se à aqui recorrente que a factualidade vertida no ponto 18º dos Factos Provados não tem qualquer suporte na prova produzida nos autos.

  4. Na verdade, não decorre dos registos clínicos existentes nos autos, ou da prova testemunhal que, em consequência do presente sinistro, a autora tenha ficado a padecer de uma hérnia na cervical.

  5. De resto, o relatório pericial médico colegial de fls. 236 a 240 – que constitui o principal elemento de prova no que tange o apuramento das lesões e sequelas sofridas pela autora na sequência do presente sinistro – não confirma a existência dessa lesão, na sequência do acidente sub judice.

  6. A prova pericial foi, de facto, a única que verdadeiramente, com propriedade, foi produzida sobre estas matérias, até pela especificidade técnica que as mesmas encerram.

  7. Em face do exposto, não poderá a matéria de facto vertida no ponto 18º dos Factos Provados manter-se no elenco dos Factos Provados – por falta de suporte na prova produzida – devendo antes ser dali eliminada e incluída no conjunto dos Factos Não Provados.

  8. No que tange o ponto 34º dos Factos Provados, não pode a aqui recorrente conformar-se com a inclusão na sua redacção das seguintes expressões: “…e obrigam-na a sujeitar-se a várias consultas, exames médicos, tratamentos clínicos e medicamentosos.”.

  9. Recorrendo, mais uma vez, ao meio de prova que, a nosso ver, oferece maior credibilidade no que a estas matérias de cariz técnico diz respeito, dele resulta que, como única sequela do presente sinistro, a autora ficou a padecer de cervicalgias que apenas implicam a toma de medicação analgésica ou infamatória ocasional, em períodos de agudização da dor.

  10. Em parte alguma do mencionado relatório se prevê a necessidade de a autora se sujeitar, no futuro, a consultas, exames médicos, ou tratamentos clínicos, com vista a debelar a mencionada sequela, sendo certo que a restante prova produzida nos autos tão pouco aponta nesse sentido.

  11. Em face do exposto, deverá a redacção do indicado ponto dos Factos Provados ser alterada nos seguintes termos: “34º As lesões físicas ao nível da cervical, que lhe causaram e ainda causam dor, obrigaram a autora a sujeitar-se a várias consultas, exames médicos, tratamentos clínicos e medicamentosos e obrigam-na à toma de medicação analgésica ou anti-inflamatória em períodos de agudização da dor.” 13. A aqui recorrente também não se conforma com a decisão da primeira instância na parte em que a condenou a pagar à recorrida a indemnização de 10.000,00€, pelo défice funcional permanente/dano biológico de que a mesma ficou a padecer em consequência do acidente dos autos.

  12. A este propósito cumpre salientar que não se provou que as sequelas de que a autora ficou portadora a impeçam de exercer a sua actividade profissional habitual, sabendo-se apenas que as mesmas implicam esforços suplementares.

  13. Do mesmo modo, face à factualidade que vem dada como provada, também não se provou que tais sequelas acarretem qualquer perda de rendimentos, nem foram dados como demonstrados quaisquer factos que tornem previsível essa perda no futuro.

  14. Perante os factos provados, não há qualquer dano a indemnizar por perda futura de rendimentos decorrente da incapacidade permanente que afecta a autora, a qual somente acarreta danos de natureza não patrimonial.

  15. Neste contexto, o dano biológico da autora deverá, apenas, corresponder a mais um elemento a ter em consideração na quantificação da compensação pelos danos morais, não se justificando a atribuição de uma compensação autónoma.

  16. Ao analisar a douta sentença, verifica-se que na quantificação da compensação por danos não patrimoniais a Meritíssima Juiz teve em consideração não só o sofrimento físico da autora no período de cura (tratamentos, dores, etc..), como, também, as consequências definitivas do acidente no seu organismo.

  17. Ou seja, o Tribunal a quo acabou por arbitrar à autora duas indemnizações pelo mesmo dano, o que não pode, em justiça, suceder.

  18. Deste modo, entende a recorrente que se impõe a revogação da douta sentença, quer na parte em que atribuiu à autora a indemnização pelos seus danos não patrimoniais, quer na parte em que lhe fixou uma compensação pelo seu dano biológico, devendo antes ser-lhe atribuída uma compensação única pelos seus danos não patrimoniais, incluindo o seu dano biológico e bem assim, o sofrimento físico subsequente ao acidente.

  19. Ou, pelo menos, impõe-se que ambas as compensações (por dano biológico e danos morais) sejam reduzidas, porque excessivas.

  20. Mesmo que assim não se entenda, o que apenas se admite para efeitos do presente raciocínio, e salvo o devido respeito pelo entendimento sufragado pela decisão recorrida – e que é muito, crê a recorrente que o montante indemnizatório fixado à autora pelo dano biológico se mostra exagerado, atenta a realidade a indemnizar.

  21. Não existindo uma efectiva perda de rendimentos, a quantificação da compensação do dano biológico da autora deve ser feita, essencialmente, com recurso à equidade.

  22. Para o efeito, deverão ser utilizados elementos coadjuvantes, como os critérios da portaria n. 377/2008, de 26 de Maio, das tabelas financeiras e das decisões judiciais em casos análogos.

  23. Recorrendo às regras da aludida portaria, a compensação devida à autora pelo dano biológico ascenderia a um valor compreendido entre os 2.544,18€ e os 3.158,94€ (cfr tabela IV da portaria 679/09).

  24. Já fazendo apelo às tabelas financeiras – utilizadas quando ocorre uma efectiva perda de rendimentos em função da incapacidade – haveria que entrar em linha de conta com os seguintes factores que vêm dados como demonstrados: - a idade da autora à data da alta: 35 anos; - o valor do seu rendimento anual líquido: 6.592,74€ (conforme pontos 46 e 53 dos Factos Provados); - o défice funcional permanente: 3 pontos.

  25. Tendo em consideração, ainda, que o recebimento imediato da indemnização corresponde a uma vantagem que impõe a capitalização da verba arbitrada, que não seria de esperar que a autora, atenta a profissão que...

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