Acórdão nº 309/13.3TBVLN-K.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 15 de Junho de 2021

Magistrado ResponsávelELISABETE ALVES
Data da Resolução15 de Junho de 2021
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES I. Relatório Por sentença proferida em 6.05.2014 foi declarada a insolvência de PROMOTORA X, SL – SUCURSAL DE PORTUGAL, NIPC ………, com local de representação no Edifício … ...

, a qual transitou em julgado em 26/05/2014.

No apenso de liquidação, em 11.12.2020, foi apresentado pelo administrador da insolvência requerimento referência electrónica 298763, no qual consignou: « M. C., administrador judicial nomeado nos autos à margem id., vem informar e requerer a Vossa Excelência do seguinte: 1. Em 12/09/2019, o signatário notificou o mandatário do credor (E. F. e E. L.) com direito de retenção sobre a fração AX do imóvel apreendido no presente processo de insolvência, para que informasse se pretendia que a Massa Insolvente cumprisse o contrato promessa de compra e venda (CPCV) celebrado entre o seu constituinte e a sociedade ora insolvente, pelo preço acordado (anexo); 2. Em 23/10/2019, recebeu como resposta que, não sendo cumprido o contrato com o prédio totalmente acabado, poderia o signatário avançar para a venda se assim entendesse, indicando como valor base o valor patrimonial (anexo); 3. Colocado à venda, em 20/03/2020, o senhor E. F., credor/retentor, licitou a fração pelo valor de 59.369,00 €, valor que representou a maior oferta; 4. Em 01/04/2020 e, mais tarde, em junho de 2020, o mandatário do licitante foi informado, que deveria proceder ao pagamento de 20% do valor de licitação; 5. Em julho de 2020, recebeu o AI, como resposta, que não haveria lugar a tal pagamento, uma vez que o seu cliente já tinha pago valor muito superior (sinal do CPCV); 6. Não é esta a opinião do signatário; 7. Aliás, em boa verdade, e apesar de nada impedir a qualquer pessoa a participação em leilão, fica-se ainda na dúvida se esse direito assiste ao senhor E. F., uma vez que o mesmo, como já se demonstrou, desistiu do direito que lhe assistia de cumprir o estipulado no CPCV, podendo-se, eventualmente, entender que o direito do credor terá caducado ou sido renunciado pelo mesmo; 8. O cumprimento deste último beneficiava a massa insolvente, já que havia sido feito por 97.000,00 €, com sinal de 55.164,09 €; 9. Faltava, por isso, pagar 41.835,91 €; 10. A licitação em leilão pelo senhor E. F. foi de 59.369,00 €, pelo que, mesmo pagando os 20% (11.873,80 €), ficaria muito aquém do mencionado no ponto anterior; 11. Neste conspecto, podemos entender, com a devida vénia, que o credor está a agir em manifesto abuso do direito na modalidade de venire contra factum proprium e até, eventualmente, na modalidade de suppressio; 12. Assim, na qualidade de administrador da insolvência, o signatário entende que esta sai beneficiada se for cumprido o CPCV, o que não é a vontade do senhor E. F., conforme antes referido; 13. Nestes termos, vem o signatário requerer a V.Exa, mui respeitosamente, que se digne ordenar a notificação dos credores da insolvência no sentido de se pronunciarem sobre o assunto em crise, nomeadamente: - Se pretendem que o signatário proceda à realização da escritura de compra e venda a favor do retentor em virtude de ter licitado a proposta mais alta do leilão eletrónico, ou, por sua vez; - Se deve considerar que o credor desistiu da compra do imóvel, uma vez que optou pela não celebração do contrato prometido e, por conseguinte, não considerar a licitação efetuada pelo mesmo no âmbito do leilão, sob pena de estarmos perante uma situação de manifesto abuso do direito por parte do credor.» Notificado deste requerimento veio o credor E. F., por requerimento de 17.12.2020- ref.ª electrónica 2994423- dirigido ao tribunal, apresentar resposta, na qual, em súmula, alega que, quando notificado, optou por não cumprir o contrato promessa porque o valor de €97.000,00 era exagerado, tendo em conta que o prédio ainda não se encontra acabado e o valor do mercado é manifestamente inferior.

Sustentou que nunca se negou a cumprir a adjudicação no leilão, contudo não fazia sentido ter que pagar 20%, ou seja €11.873,80, conforme reclamava o Exmº Administrador, porque: invocando o direito de compensação do crédito que detém no valor de € 55.164,09, já se encontravam mais do que pagos os € 11.873,80 reclamados pelo Exmº Administrador. Por fim, caso pagasse esses € 11.873,80, passaria a deter um crédito de € 67.037,89, muito superior ao valor da adjudicação € 59.369,00, pois passaria a ter um crédito privilegiado já reconhecido de € 55.164,09 e um crédito comum no valor de € 7.668,89.

Conclui, requerendo que seja considerado cumprido o previsto nos artigos 164º do CIRE, 824º e 825º do CPC, por já terem sido pagos por direito de compensação e consequentemente seja cumprida a adjudicação por venda judicial ao ora credor, com o pagamento de remanescente, na maior brevidade possível.

~ Por decisão proferida em 28.01.2021 – ref.ª electrónica 46404691-, foi proferido o seguinte despacho, no apenso de liquidação: «Requerimento de 11.12.2020 [37437620]:--- Considerando os factos expostos pelo Sr. AI e constantes dos autos, resulta que o credor E. F. renunciou ao direito que lhe assistia de cumprir o estipulado no contrato-promessa de compra e venda, tendo entretanto desistido da compra do imóvel, não podendo considerar-se a licitação efetuada pelo mesmo no âmbito do leilão, recusando-se a proceder ao pagamento de 20% do valor correspondente.--- Notifique.

D.n.» ~ Inconformado com esta decisão, veio E. F.

, credor da insolvente, dela interpor recurso e formular as seguintes conclusões (que ora se transcrevem): «1-Vem o presente recurso interposto do Douto Despacho que considera que o aqui recorrente “…renunciou ao direito que lhe assistia de cumprir o estipulado no contrato-promessa de compra e venda, tendo entretanto desistido da compra do imóvel, não podendo considerar-se a licitação efetuada pelo mesmo no âmbito do leilão, recusando-se a proceder ao pagamento de 20% do valor correspondente.” 2- Salvo o devido respeito, tal Despacho além de manifestamente infundado, viola os artigos 1º e 99º do CIRE.

3- O recorrente é credor privilegiado, com direito de retenção sobre a fração AX, no montante de € 55.164,09.

4- Tal fração foi colocada á venda em 20/03/2020, por leilão eletrónico, através da leiloeira X.

5- O recorrente/credor fez duas licitações, sendo que a proposta apresentada por este foi a mais alta e superior ao valor base, pelo que foi notificado para proceder ao pagamento de 20% da proposta apresentada, a título de sinal, acrescido da comissão da leiloeira.

6- O recorrente prontificou-se a pagar de imediato a comissão da Leiloeira, no entanto invocou o direito de compensação para não entregar o valor correspondente a 20% a título de sinal, uma vez que o recorrente é credor do montante de € 55 164,09, ou seja, de uma quantia muito superior ao valor reclamado a título de sinal.

7- De igual modo, se prontificou o recorrente a, logo que fosse formalizado o ato da venda, proceder ao pagamento do valor remanescente, tendo em conta o valor da licitação, e que rondaria o montante de € 4 204,91.

8- No entanto, o Administrador da Insolvência recusou-se a reconhecer tal direito de compensação, tendo remetido um requerimento ao processo, e sobre o qual versou o Douto Despacho ora posto em crise.

9- Salvo o devido respeito, o direito de compensação invocado pelo ora recorrente preenche os requisitos quer do artigo 99º do CIRE, quer os do artigo 847º do C.C. , pelo que deveria ter sido levado em conta, quer pelo A.I., quer pela Digníssima Juiz a quo.

10- Por outro lado, da leitura do douto Despacho parece resultar que o credor, ora recorrente, uma vez que renunciara ao direito que lhe assistia de cumprir o contrato-promessa de compra e venda, não poderia licitar no leilão relativo à fração de que é retentor.

11- Com todo o respeito, a ser assim estaríamos perante uma clara violação do princípio da igualdade, corolário máximo do estado de direito, e previsto constitucionalmente.

12- Na verdade, crê o aqui recorrente que não existe qualquer limitação legal ao exercício do direito de licitar num Leilão que é público e aberto a qualquer pessoa.

13- Pelo que, a entender-se assim o que consta do Douto Despacho posto em crise, também neste aspeto andou mal a digníssima juiz a quo.

14- Por outro lado, o recorrente ao licitar celebrou um contrato bilateral com a leiloeira, que vincula o administrador da insolvência, em que prometia comprar o bem pelo preço licitado, acrescido da comissão da leiloeira, e esta prometia vender o bem, pelo preço licitado, uma vez que a proposta era superior ao valor base.

15- O recorrente prometeu comprar o bem pelo preço de € 59.369.00, acrescido da comissão.

16- O Administrador veio reclamar o pagamento de 20%, ou seja, €11.873,80, que acrescidos do crédito privilegiado que o recorrente detém (€55.164,09) daria o total de € 67.037,89, acrescido da comissão à leiloeira.

17- Tal atitude por parte do administrador da insolvência viola o contrato celebrado aquando da licitação.

18- Até se pode dizer mais, tal atitude beneficiaria a credora com garantia hipotecária no remanescente do preço acordado e pago (67.037,89€ – 59.369,00€) no montante de € 7.668,89.

19- Estaríamos perante uma violação ao direito de igualdade entre credores, finalidade pretendida no CIRE.

Assim, e com o Mui Douto suprimento de Vª. Exª.(s) Venerandos Desembargadores, deverá ser julgado procedente o presente recurso, e consequentemente ser revogada a Douta decisão ora posta em crise, sendo substituída por outra que reconheça o direito de compensação invocado pelo aqui recorrente, e que ordene ao Exmo Sr. Administrador da Insolvência que proceda à formalização da venda, com o pagamento do remanescente nessa data.

Assim se fazendo Justiça» ~ Foram apresentadas contra-alegações pelo administrador da insolvente, M. C. e pelo credor «Y, SARL», com as seguintes conclusões, respectivamente: «1. Os recorrentes são credores garantidos reconhecidos nos autos por efeito do direito de retenção no valor de EUR 55.164,09...

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