Acórdão nº 623/21.4T8GMR.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 07 de Outubro de 2021

Magistrado ResponsávelMARIA JOÃO MATOS
Data da Resolução07 de Outubro de 2021
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam, em conferência, os Juízes da 1.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães 1.1.

Decisão impugnada 1.1.1. M. M.

, residente na Rua …, n.º … em Guimarães (aqui Recorrente), requereu, na Conservatória do Registo Predial de ..., a rectificação do registo de aquisição de um imóvel (fracção autónoma) em seu nome, nomeadamente por averbamento do seu estado civil no dito registo (que seria de divorciada de A. A., e não de casada com B. V., no regime de comunhão de adquiridos, como erradamente ali constaria).

1.1.2.

A Conservatória do Registo Predial de ...

pediu à Requerente (M. M.) o «Suprimento de deficiências», conforme e-mail respectivo, que aqui se dá por integralmente reproduzido e onde nomeadamente se lê: «(…) Deu entrada nesta Conservatória um pedido de Retificação a que coube a apresentação nº 2304 de 12 do corrente.

Ao ser analisado o processo verifica-se, nomeadamente, que: - O título [escritura pública de compra e venda, e mútuo com hipoteca] foi rectificado quanto ao estado civil da compradora mulher; - Mas do mesmo não resulta que a aquisição é apenas a favor dela; - O prédio foi adquirido pelos dois em compropriedade? Qual o estado civil do comprador B. V.; - O prédio está hipotecado, hipoteca esta constituída pelo casal. Não é possível rectificar sem a intervenção do credor.

(…) Assim e nos termos do nº 2 do artigo 73 do Código do Registo Predial (CRP) fica V. Exª notificado para no prazo de 5 (cinco) dias suprir as deficiências acima apontadas, com a cominação de que o não fazendo o registo será lavrado como provisório ou recusado.

(…)».

1.1.3.

A Requerente (M. M.), perante a Conservadora da Conservatória do Registo Predial de ..., prestou verbalmente os esclarecimentos que entendeu por convenientes.

1.1.4.

A Conservadora da Conservatória do Registo Predial de ... proferiu «Despacho de Qualificação» recusando a rectificação do registo de aquisição pretendida, já que por sua natureza não poderia ser lavrado como provisório por dúvidas (arts. 101.º, n.º 3, a contrario, e 69.º, n.º 2, in fine, ambos do Código de Registo Predial (1)).

Ponderou para o efeito, em síntese, o concreto teor da escritura de compra e venda, e de mútuo com hipoteca, em causa, e o concreto estado civil nela declarado, quanto à aqui Requerente, ali compradora (M. M.), incluindo o regime de bens respectivo; e concluindo que, face aos mesmos, não se estaria perante uma singela rectificação do estado civil do sujeito activo da aquisição, mas antes de efectiva alteração da titularidade do direito de propriedade sobre o imóvel objecto da dita escritura.

1.1.5.

Discordando, M. M.

impugnou judicialmente o despacho referido (art. 140.º do CRP), nomeadamente por entender que: retroagindo o averbamento feito pela Notária que lavrou a escritura de compra e venda em causa (de ser M. M., então, divorciada de A. A.) à data de celebração da mesma, apenas ela poderia ter adquirido o imóvel daquela objecto, conforme aliás constaria da dita escritura de compra e venda; e confundir o despacho de qualificação impugnado o sujeito activo da aquisição (M. M.) com a indicação do seu estado civil (a única coisa cuja rectificação estaria aqui a ser pedida, por ali constar como casada com B. V., quando era - apenas e tão só - divorciada, de A. A.).

1.1.6.

A Conservadora da Conservatória do Registo Predial de ... proferiu despacho de sustentação da sua anterior decisão (art. 142.º-A do CRP), reiterando no mesmo o seu anterior entendimento; e enfatizando ainda que o «facto de se rectificar o estado civil da recorrente na escritura, não permite concluir, como a mesma pretende que é a única titular do direito de propriedade», exigindo a «rectificação que possa envolver prejuízos aos demais titulares inscritos demanda a sua intervenção no processo (artigos 120º e seguintes do C.R.P.)», processo de que aquela «se pode socorrer», ou «obter a rectificação da escritura ao abrigo do artigo 80º do Código do Notariado, que vai igualmente exigir a intervenção de todos».

1.1.7.

O Ministério Público emitiu parecer (art. 146.º do CRP), onde singelamente referiu ir o mesmo «no sentido da concordância com os fundamentos de facto e de direito invocados pela Exmª Srª Conservadora na manutenção do seu despacho de recusa da requerida rectificação».

1.1.8.

Foi proferida sentença, julgando improcedente a impugnação judicial da recusa de registo de averbamento (de estado civil) formulado, lendo-se nomeadamente na mesma: «(…) III. Decisão: Pelo exposto, julga-se improcedente a presente Impugnação Judicial proposta por M. M. Silva Vilar e, consequentemente, decide-se: - Manter, nos seus termos, o Despacho de Recusa do registo do averbamento formulado pela Ap. 1263 ao prédio descrito sob o n.º .../19940210-Q, da freguesia de ..., Guimarães.

Mais decide-se condenar a Impugnante no pagamento das custas processuais que sejam devidas, atenta a proporção do seu decaimento supra apurado (100%) (art.º artigo 527º nº 1 e 2, do CPC) (sem prejuízo de isenção ou dispensa de que possam beneficiar).

Valor da causa: o valor patrimonial do imóvel registado (art.ºs 296.º, 297.º, 301.º n.º2 e 302.º n.º1, 306.º do CPC).

Registe e notifique e d.n..

(…)» *1.2. Recurso 1.2.1. Fundamentos Inconformada com esta decisão, a Requerente (M. M.) interpôs o presente recurso de apelação, pedindo que se concedesse provimento ao mesmo e se revogasse a sentença recorrida, ordenando-se a realização do registo recusado (passando a constar do original que o estado civil do sujeito activo da aquisição registada - ela própria - era de «divorciada»).

Concluiu as suas alegações da seguinte forma (aqui se reproduzindo as respectivas conclusões ipsis verbis): 1 - Da escritura pública levada a registo predial resulta que o prédio em causa nestes autos foi vendido à aqui Recorrente. Não a duas pessoas. Não a um casal.

2 - Por isso que o sujeito ativo da aquisição constante do registo é tão-somente a aqui Recorrente.

3 - Isto é assim porque uma coisa é a identidade do sujeito que adquire e outra são os efeitos patrimoniais decorrentes da aquisição, atento o seu regime de casamento.

4 - Caso da escritura pública constasse o verdadeiro e correto estado civil da Requerente, a aquisição seria sido registada tendo-a a ela como sujeito ativo, não constando do registo o nome de B. V., como não tinha que constar.

5 - Se a aquisição apenas fosse registada depois de averbada na escritura a respetiva correção, obviamente que o nome de B. V. não constaria sequer do registo.

6 - O averbamento efetuado pela Senhora notária retroage à data de celebração da escritura.

7 - Tendo a Recorrente adquirido esta fração no estado de divorciada, apenas ela deveria constar do registo predial como proprietária.

8 - Em face disso, deveria ter-se ordenado a correcção do estado civil da titular inscrita.

*1.2.2. Contra-alegações Não foram apresentadas quaisquer contra-alegações.

*II - QUESTÕES QUE IMPORTA DECIDIR 2.1. Objecto do recurso - EM GERAL O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente (arts. 635.º, n.º 4 e 639.º, nºs. 1 e 2, ambos do CPC), não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso (art. 608.º, n.º 2, in fine, aplicável ex vi do art. 663.º, n.º 2, in fine, ambos do CPC).

Não pode igualmente este Tribunal conhecer de questões novas (que não tenham sido objecto de apreciação na decisão recorrida), uma vez que os recursos são meros meios de impugnação de prévias decisões judiciais (destinando-se, por natureza, à sua reapreciação e consequente alteração e/ou revogação).

*2.2. QUESTÕES CONCRETAS a apreciar Mercê do exposto, e do recurso de apelação interposto pela Requerente (M. M.) uma única questão foi submetida à apreciação deste Tribunal ad quem: · Questão Única - Pode ser rectificado, num registo de aquisição de imóvel (por escritura de compra e venda, e de mútuo com hipoteca), o estado civil do sujeito activo da compra (de casado, em comunhão de adquiridos, para divorciado), sem a simultânea rectificação do estado civil do ali registado como seu cônjuge (igualmente representado no acto, mutuário e constituinte de hipoteca), e sem a intervenção do registado cônjuge e do credor hipotecário? *III - FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO O Tribunal a quo considerou provada a seguinte factualidade, «mormente» por «documentos juntos» (sem que qualquer das partes a haja impugnado, ou este Tribunal da Relação tenha tido fundamento para, oficiosamente, a alterar): 1 - Consta do Livro de Notas para Escrituras Diversas n.º 156-D uma escritura de «COMPRA E VENDA E MÚTUO COM HIPOTECA» (documento junto aos autos, e que aqui se dá como integralmente reproduzido), realizada em 30 de Novembro de 1994, entre M. D., como procurador de Construções D. S., Limitada (identificado como «primeiro outorgante»), J. R...

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