Acórdão nº 5405/19.0T8GMR.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 21 de Outubro de 2021

Magistrado ResponsávelPEDRO MAURÍCIO
Data da Resolução21 de Outubro de 2021
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

ACÓRDÃO (1)* * * * * * *ACORDAM OS JUÍZES DA 1ª SECÇÃO CÍVEL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES* * *1. RELATÓRIO 1.1. Da Decisão Impugnada O Autor H. C.

instaurou a presente acção declarativa de condenação com processo comum contra a Ré X Seguros, SA (actual denominação da Ré, após a fusão da Y Companhia de Seguro, SA na Companhia de Seguros T., SA e alteração da denominação social desta última seguradora para Seguradoras …, SA), pedindo “a condenação da Ré a pagar-lhe a quantia de € 130.852,30, acrescida de juros legais contados desde a citação até efectivo e integral pagamento”, fundamentando a sua pretensão, essencialmente, no seguinte: fazia-se transportar em veículo automóvel que interveio em acidente de viação, estando esse veículo seguro na Ré; e esse acidente ocorreu por culpa exclusiva do condutor do veículo, e causou-lhe danos patrimoniais no valor € 80.000,00 decorrente da perda futura de ganho e no valor de € 832,34 resultante de despesas suportadas com medicamentos, deslocações para tratamentos, taxas moderadoras e meios de tratamento, e causou-lhe danos não patrimoniais no valor de € 50.000,00.

A Ré contestou, pugnando pela improcedência total ou parcial da acção, fundando a sua defesa, essencialmente, no seguinte: não se verifica a totalidade dos danos não patrimoniais reclamados; não existe dano patrimonial futuro que deva ser indemnizado; e os valores indemnizatórios reclamados são exagerados.

Foi proferido despacho saneador, no qual se identificou o objecto do litígio e se enunciaram os temas da prova.

Realizada a audiência final, foi proferida sentença com o seguinte decisório: “Em face do exposto: A. Julgo parcialmente procedente o pedido formulado pelo Autor, condenando a Ré a pagar-lhe a quantia de € 67.332,34 (sessenta a sete mil, trezentos e trinta e dois euros e trinta e quatro cêntimos), acrescida de juros vencidos e vincendos, contados à taxa legal sobre a quantia de € 49.332,34 (quarenta e nove mil, trezentos e trinta a dois euros e trinta a quatro cêntimos), desde a citação, até efectivo e integral pagamento, e contados sobre a parte restante desde a presente data até efectivo e integral pagamento. B. Improcedente a parte restante do pedido deduzido pelo Autor, da qual se absolve a Ré”.

*1.2. Do Recurso da Ré Inconformada com a sentença, a Ré interpôs recurso de apelação, pedindo que “seja ser dado provimento ao recurso, revogando-se a douta sentença sob censura e decidindo-se antes nos moldes apontados”, e formulando as seguintes conclusões no final das respectivas alegações: “I - Não está provado que as sequelas de que o Autor ficou portador acarretarão no futuro qualquer efetiva perda de rendimentos; II - Assim, em face do enquadramento factual resultante da douta sentença, não se pode ter como previsível qualquer dano patrimonial futuro (cfr art. 564º n.º 2do Cod Civil), o que é o mesmo que dizer que nenhum dano haverá a indemnizar neste campo, ou a este título; III - É já, no entanto, possível afirmar que o autor, porque ficou afetado por sequelas, sofreu um dano biológico, consistente numa afetação permanente da sua integridade física, o qual tem de ser indemnizado; IV - A inexistência de uma demonstrada repercussão patrimonial das sequelas, evidencia, a nosso ver, a total irrelevância da retribuição do A, na altura ou depois do acidente, para a fixação da eventual indemnização; V - De facto, se essa incapacidade é inconsequente no estatuto remuneratório do A, ou se não se pode atestar que essa repercussão ocorrerá, não há a mais pequena justificação para que se associe ou se indexe a determinação da respetiva compensação ao salário que, potencialmente, poderia auferir no futuro; VI - De resto, a inadequação do critério usado pelo julgador para fixar a indemnização resulta do facto de o autor nem sequer ter ficado portador de uma incapacidade permanente fixada em percentagem, mas antes em pontos; VII - Assim, no essencial, o julgador acabou por ficcionar que as sequelas de que o Autor ficou portador acarretarão uma redução percentual da sua remuneração, na mesma medida dos pontos atribuídos na TNI, o que, salvo o muito e devido respeito, não é correto; VIII - Entende, por isso, a ora exponente que, numa situação como a do autor, a indemnização pelo dano biológico não deveria ter sido fixada com base na retribuição considerada na douta sentença e, muito menos, deveria consistir numa percentagem dessa retribuição; IX - E considera antes que, neste caso, se deveria ter dado especial relevo ao critério de equidade; X - Por isso, na ponderação do quantum da indemnização, o julgador não pode deixar de ter em consideração alguns elementos; XI - Entre eles estarão, por exemplo, as tabelas financeiras de cálculo de danos patrimoniais que se repercutam no futuro, que podem servir como critério coadjuvante, que permite aferir o máximo da indemnização que seria devida para o caso de se verificar uma efetiva perda de rendimentos; XII - Recorrendo às regras das portarias 377/2008 e 679/2009, a compensação da A pelo dano biológico ascenderia a valor entre 10 978,20€ e 12 773,7€ (cfr tabela IV da portaria 679/09); XIII - Já numa outra vertente, considerando as tabelas financeiras, chegaríamos a valor muito inferior ao alcançado da douta sentença; XIV - No cálculo da indemnização com recurso às tabelas financeiras deve atender-se à idade que o Autor tinha quando ingressou na carreira da PSP, ou seja, 20 anos de idade.

XV - Por outro lado, a idade da reforma situa-se, atualmente, nos 66 anos, sendo de aceitar, no entanto, que se calcule a indemnização até aos 70 anos; XVI - Ademais, uma vez que o recebimento antecipado do valor correspondente à perda de rendimentos futuros corresponde a uma vantagem, deve procede-se à capitalização do valor obtido pela mera multiplicação dessa perda futura pelo número de anos em que ocorrerá, tendo em conta uma taxa de juro adequada, de 2%; XVII - Atendendo a um salário de 665€ mensais, uma esperança de vida ativa de cerca de 50 anos, uma taxa de capitalização de 2% e uma taxa de crescimento de 1%, o capital que se obteria para uma situação de perda efetiva de rendimentos futuros, seria o de cerca de 31 033,33€ (aqui com uma mera redução de um terço no valor final do somatório dos rendimentos perdidos ao longo desse período, tendo em conta a necessidade de capitalização do valor alcançado); XVIII - Recorrendo à tabela financeira constante da portaria 677/99 (Anexo III) e os mesmos critérios (nomeadamente uma retribuição de 665,00€ mensais), o valor a que se chegaria seria o de 24 936,76€ (665,00€ x 14 x 0,10 x 26.784922); XIX - E se recorrermos à tabela de capitalização referente ao cálculo do capital de remição de pensões por incapacidade permanente, mantendo os mesmos critérios, a indemnização ascenderia a 12 695,12€ (800,00€ x 14 x 10% x 13,636); XX - Aliás, mesmo atendendo a um salário de 800,00€ mensais, uma esperança de vida ativa de cerca de 50 anos, uma taxa de capitalização de 2% e uma taxa de crescimento de 1%, o capital que se obteria para uma situação de perda efetiva de rendimentos futuros, seria o de cerca de 37.000€ (aqui com uma mera redução de um terço no valor final do somatório dos rendimentos perdidos ao longo desse período, tendo em conta a necessidade de capitalização do valor alcançado); XXI - Recorrendo à tabela financeira constante da portaria 677/99 (Anexo III) e os mesmos critérios (nomeadamente uma retribuição de 800,00€ mensais), o valor a que se chegaria seria o de 29 999,11€ (800,00€ x 14 x 0,10 x 26.784922); XXII- E se recorrermos à tabela de capitalização referente ao cálculo do capital de remição de pensões por incapacidade permanente, mantendo os mesmos critérios, a indemnização ascenderia a 15 272,32€ (800,00€ x 14 x 10% x 13,636) XXIII - Perante todos os elementos coadjuvantes acima invocados e ainda que se entenda divergir dos critérios das portarias 677/99 (que apontam para uma indemnização a rondar os 10.000,00€ a 12.000€), nunca se poderia exorbitar a verba correspondente à indemnização decorrente das tabelas financeiras para uma situação de efectiva perda de rendimentos; XXIV - Assim, uma vez que as sequelas de que o Autor ficou portador não são, felizmente, graves, consistindo, apenas, em cicatrizes e ligeira rigidez cervical e do ombro, entende a Ré que, em equidade, se impunha a fixação da correspondente indemnização em quantia que não superior à de 27.500,00€, o que se requer; XXV - E mesmo que se entendesse que a verba sugerida não é adequada – o que não se concede - sempre se imporia, em face do que acima se disse, a redução da indemnização arbitrada para valor inferior, o que, subsidiariamente, se requer.

XXVI - A verba atribuída para compensação dos danos morais do Autor é excessiva devendo ser reduzida para 15.000€ o que se requer; XXVII - A douta sentença sob censura violou as normas dos artigos 566º e 486º do Código Civil”.

O Autor contra-alegou, pugnando pela improcedência deste recurso e manutenção da sentença recorrida.

*1.3. Do Recurso do Autor Igualmente inconformado com a sentença, o Autor interpôs recurso de apelação, pedindo que seja revogada “a decisão sob censura e substituindo-a por outra que arbitre ao apelante uma indemnização de € 55.000,00 pelos danos patrimoniais sofridos e uma compensação de € 22.000,00 a título de danos não patrimoniais”, e formulando as seguintes conclusões no final das respectivas alegações: “1. Os montantes fixados na sentença sub specie – quer a título de danos patrimoniais, como de danos não patrimoniais – são muito exíguos, se considerados à luz dos juízos de equidade, a que alude o artº. 496º, n.4, do Código Civil; 2. A indemnização por danos patrimoniais, fundamentada apenas na redução e na perda de rendimento que resulta da lesão e, bem assim, na necessidade de um acréscimo de esforço para a evitar, não valorou a circunstância de que tais danos consubstanciam, 3. Conforme aceite pela Jurisprudência, o dano corporal (dano-evento) não depende da...

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