Acórdão nº 124/07.3TBPTL-A.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 21 de Janeiro de 2021
Magistrado Responsável | FERNANDA PROENÇA |
Data da Resolução | 21 de Janeiro de 2021 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães I. Relatório.
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A., casado, que também usa profissionalmente o nome de I. A., advogado, CP n.º …, com domicílio profissional na Rua de …, em Monção, em causa própria, intentou a presente acção declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, no Juízo Local Cível de Ponte de Lima, Comarca de Viana do Castelo, contra F. S. e mulher A. R., residentes no lugar …, freguesia de …, Concelho de Ponte de Lima e Comarca de Viana do Castelo, peticionando ao Tribunal que na procedência da acção se condenem os réus a pagar ao autor a quantia de 18.183,37 € (dezoito mil cento e oitenta e três euros e trinta e sete cêntimos), acrescida de juros legais vincendos, desde a data da propositura da acção até efectivo e integral pagamento.
Em síntese alegou que no exercício da sua profissão de Advogado prestou aos réus os serviços descriminados na petição inicial e que dizem respeito aos processos aos quais foi apensada a presente acção.
*Regularmente citados os réus contestaram, invocando a prescrição presuntiva dizendo que as quantias peticionadas se encontram pagas a por isso nada devem. Concluíram pela improcedência da acção.
*O autor respondeu à excepção dizendo, no essencial, que a prescrição presuntiva apenas inverte o ónus da prova do pagamento, e que o instituto não é aplicável aos autos.
*Foi proferido despacho saneador.
*Realizado o julgamento, foi proferida sentença, com o seguinte dispositivo: “Decisão.
Em face do exposto, julga-se a presente acção totalmente improcedente por não provada e, em consequência decide-se absolver os Réus do pedido.
Custas da acção a cargo do Autor (cfr. artigo 527.º, do C.P.Civil).
Registe e notifique.”.
*Inconformado com esta decisão, o autor dela interpôs recurso e formulou, a terminar as respectivas alegações, as seguintes conclusões (que se transcrevem): “Pelo que, em conclusão: 1. A sentença deve ser anulada; 2. Admitido o depoimento de parte, não pode o Tribunal revogar o despacho que admitiu este meio de prova, mesmo que o requerente deste meio de prova falte ao julgamento, pois, cabe ao Juiz assegurar que a audiência de julgamento decorra de acordo com o que foi decidido na audiência prévia - arts. 591º, n.º 1, al. g), e 602º, n.º 2, al. a), do CPC; 3. Não está dado como provado na sentença recorrida quando é que terminaram os serviços prestados pelo A. aos RR.; 4. Está provado que os RR. são sócios-gerentes de uma sociedade comercial e, antes da constituição dessa sociedade, o R. marido exercia a mesma actividade em nome individual e por exercer essa atividade, com intuito lucrativo é que os RR. Foram demandados no âmbito das acções declarativas patrocinadas pelo A.; 5. A prescrição presuntiva foi criada para proteger os consumidores contra o risco de satisfazer duas vezes dívidas de que não é usual exigir recibo ou guardá-lo durante muito tempo – art. 312º do C.Civil; 6. A nossa lei consagra a prescrição presuntiva fundada na presunção de cumprimento, com justificação na enorme dificuldade do consumidor provar o cumprimento das obrigações assumidas no quotidiano, face à prática generalizada de não exigir documento de quitação ou de não o guardar; 7. Os RR. não são consumidores comuns, são gerentes de uma sociedade comercial e antes o R. marido exercia uma atividade industrial em nome individual, o que faz deles cidadãos experientes e conhecedores da realidade fiscal e contabilística; 8. Além disso, a obrigação exigida nos autos não é daquelas que quotidianamente se pratica, mas que saem desse quotidiano, atendendo, ao seu valor.
Nestes termos, a sentença recorrida deve ser anulada e praticarem-se todos os actos processuais requeridos e admitidos no processo; se, assim, não se entender, deve ser proferido Acórdão a revogar a sentença e condenar os RR. no pagamento do valor peticionado, por não se verificar a prescrição presuntiva, atendendo à situação profissional dos recorridos.”.
*Os réus apresentaram contra-alegações, terminando com as seguintes conclusões, que se transcrevem: “Conclusões I. A questão invocada pelo Recorrente na sua “Questão prévia” extravasa o objecto do presente Recurso de Apelação, cujo âmbito se deve circunscrever à sentença a quo, uma vez que aquela questão foi já alvo de pronúncia pelo Tribunal a quo e de impugnação pelo Recorrente, a qual foi extemporânea e, consequentemente, legalmente inadmissível, tendo-se formado caso julgado.
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Assim, o Recurso em sindicância é parcialmente inadmissível, na medida em que não se circunscreve à douta sentença proferida pelo Tribunal a quo, tentando o Recorrente aproveitar o presente Recurso de Apelação para, de forma oblíqua, trazer à liça uma questão sobre a qual já se formou caso julgado.
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O alegado crédito do Recorrente sobre os Recorridos encontra-se prescrito, com base na prescrição presuntiva de pagamento do art. 317.º, al. c) do Código Civil.
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Nos termos do artigo 312.º do Código Civil, a prescrição presuntiva funda-se na presunção de cumprimento da obrigação cuja satisfação se pretendia.
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A razão de ser deste regime especial assenta em considerações de ordem prática, colhidas da experiência comum e conexionadas com o tipo de relações contratuais (seus sujeitos e objecto) que estão em causa.
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Decorrido o prazo legal, presume, pois, a lei que o pagamento está efectuado, dispensando, assim, o devedor, da prova deste.
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A presunção de pagamento por banda do devedor faz deslocar o ónus da prova do não pagamento para o credor, passando a competir a este ilidir essa presunção mediante prova em contrário, demonstrando que aquele não pagou, embora nos termos restritivos e limitados indicados nos artigos 313.º e 314.º do Código Civil.
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O sujeito beneficiário da presunção de cumprimento é o consumidor ou o devedor médio e, in casu, os Recorridos terão de ser considerados consumidores ou devedores como quaisquer outros, sendo certo que não são “devedores profissionais” e a alegada dívida não resulta da sua actividade profissional, a qual é a de exploração, serração de granitos e afins e respectiva comercialização.
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Estando em causa a prestação de serviços jurídicos, no âmbito da actividade da advocacia, os quais são caracterizados pela sua complexidade técnica e científica, o beneficiário dos serviços surge necessariamente como parte contratual mais débil, menos informada e, consequentemente, mais desprotegida, pelo que, in casu, face à especial qualidade dos serviços prestados, os Recorridos terão de ser encarados juridicamente como qualquer outro devedor ou consumidor.
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A mencionada prescrição aproveita a todo e qualquer devedor, não limitando a lei a sua aplicação a pessoas singulares ou colectivas, quer na sua letra, quer no seu espírito, sendo certo que ubi lex non distinguit, neque interpres distinguere potest.
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Os serviços contratados pelos Recorridos ao Recorrente e por este prestados enquadram-se na actividade da advocacia, que é uma profissão liberal, indiscutivelmente subsumível ao disposto na alínea c) do artigo 317.º do Código Civil.
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A lei não exige qualquer qualidade do prestador dos serviços ou de quem os recebe (ao contrário do que está consagrado na al. b) de mesma disposição legal).
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A este propósito, o Acórdão do Tribunal da Relação da...
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