Acórdão nº 144/09.3TBMCD-A.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 21 de Janeiro de 2021
Magistrado Responsável | FERNANDA PROEN |
Data da Resolução | 21 de Janeiro de 2021 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães I.
Relatório.
Por apenso aos autos de execução de sentença que, sob o n.º 144/09.3TBMCD.1, C. & R., Lda. instaurou contra X – Casa de Repouso, Unipessoal, Lda., para obter desta o pagamento da quantia de € 37.105, 95 (trinta e sete mil, cento e cinco euros e noventa e cinco cêntimos), acrescida dos juros vincendos até integral e efectivo pagamento, veio a executada deduzir oposição mediante embargos, pretendendo que esta se julgue procedente e, em consequência, se ordene a extinção da instância executiva. Mais pediu que a exequente/embargada fosse condenada como litigante de má fé.
Para o efeito e em síntese, alegou factos tendentes a demonstrar que é titular de um contra-crédito que ascende ao montante total de € 28.549,06 (vinte e oito mil, quinhentos e quarenta e nove euros e seis cêntimos) e, ainda, de um outro contra-crédito, no montante de € 52.012,91 (cinquenta e dois mil e doze euros e noventa e um cêntimos).
A exequente/embargada apresentou contestação, impugnando parte dos factos articulados pela executada/embargante.
Foi realizada audiência prévia, na qual se proferiu despacho saneador, se fixou o objecto do litígio e os temas da prova.
Realizado o julgamento, foi proferida sentença, com o seguinte dispositivo: “Pelo exposto, julgo a presente acção (embargos de executada) improcedente e, em consequência, determino que a execução prossiga contra a Executada /Embargante.
Absolvo a Embargada / Exequente do pedido de condenação como litigante de má fé.
Condeno a Executada / Embargante nas custas (artigo 527.º, n.ºs 1 e 2, do C. P. Civil).
Registe e notifique, inclusive, ao senhor agente de execução.”.
*Inconformada com esta decisão, a executada/embargante, dela interpôs recurso e formulou, a terminar as respectivas alegações, as seguintes conclusões (que se transcrevem): “ IV. Conclusões a. Resulta do relatório de peritagem junto aos autos que a reparação do elevador não poderia conduzir à emissão de certificado, sendo para tal necessário a sua substituição; b. Sendo evidente que a reparação do elevador sem emissão do certificado não faz parte do acordado, a decisão de considerar apenas devida a quantia de €4.900, que corresponde às obras no poço do elevador, é ilegal, encontrando-se feita prova de que os custos incorridos para se obter o certificado de conformidade do elevador de €21.086,80; c. De notar que as facturas n.ºs 1522053806, 1522053911, 1522053997 e 1522054036 são facturas válidas e não contestadas; em consequência, das facturas resultam os factos que atestam, nomeadamente que a Recorrente suportou aqueles custos em troca da reparação e substituição do elevador: esse facto tem de ser considerado assente e não foi; d. A decisão recorrida baseia-se no acordo homologado ou sentença proferida, no âmbito do processo n.º 403/13.TBMCD-A, que condenou a Recorrida a pagar à Recorrente as obras ali elencadas, cujo orçamento foi fixado em €61.484,13; e. Resulta dos factos provados que “Qualquer que seja o orçamento escolhido será a requerente a suportar o custo do mesmo, que depois será objecto de desconto na liquidação do processo 144/09.3TBMCD” (Vide artigo 7.º do Acordo); f. Do ponto de vista formal, entende-se que a decisão é nula nos termos da alínea b) e c) do artigo 615.º do Código do Processo Civil (CPC), por falta de fundamentação e omissão de pronúncia, limitando-se a enquadrar de forma genérica e abstracta o artigo 817.º do CC nos factos apreciados, sem ser analisado o propósito e ratio do normativo em face do caso concreto. Encontra-se, assim, a decisão em oposição com o próprio sentido lógico resultante dos factos considerados provados em 2.º a 5.º da decisão e a legislação aplicável, em especial os artigos 729.º do CPC e 847.º e 270.º do CC; g. Do ponto de vista material, entende-se que a decisão é ilegal e inconstitucional, assentando numa interpretação contra legem dos artigos 817.º e 270.º do Código Civil (CC) e na violação do disposto no artigo 20.º da Constituição da República Portuguesa (CRP); h. Atento os factos considerados provados na decisão Recorrida, tais como Qualquer que seja o orçamento escolhido será a requerente a suportar o custo do mesmo, que depois será objecto de desconto na liquidação do processo 144/09.3TBMCD (artigo 7.º do Acordo Homologado), a decisão de que a “Executada/Embargante, em razão dos trabalhos executados, não tem direito à invocada compensação de créditos, pelo que a execução deverá prosseguir.” é absolutamente incompreensível.
i. Na verdade, não pode decorrer do facto Qualquer que seja o orçamento escolhido será a requerente a suportar o custo do mesmo, que depois será objecto de desconto na liquidação do processo 144/09.3TBMCD a conclusão de que Executada/Embargante, em razão dos trabalhos executados, não tem direito à invocada compensação de créditos, pelo que a execução deverá prosseguir, sem que se fundamente legalmente a razão da desconsideração do efeito da obrigação estatuída em função de outro argumento/base legal suficiente para se se considerar que o direito de crédito da Recorrente – facto assente – não tem como consequência o direito de crédito; não há em toda a sentença uma palavra sobre a relação entre a obrigação assumida (suportar o custo do orçamento) e a conclusão de que a Recorrente não tem direito a nada; j. Atenta a total falta de fundamentação e lógica, a decisão recorrida constitui, por isso, uma decisão surpresa, que é absolutamente ilegal e configura a nulidade da sentença (Cfr. Acórdão do tribunal da Relação do Porto, proc. 721/12.5VPRT.P1, de 8.10.2018); k. A interpretação integral do Acordo não impõe como pressuposto do reconhecimento do seu direito de crédito o parecer final do perito. Essa exigência constituía, no âmbito do acordo homologado, uma condição, não um pressuposto, sob pena de nenhum sentido ter o Acordo em si mesmo; l. A decisão é, por isso, obscura e ambígua, não fundamentando os factos provados e a conclusão pela improcedência do pedido, nem tão pouco as consequências práticas em termos de JUSTIÇA dos seus efeitos jurídicos, no caso concreto, revelando-se assim que não se procurou obter JUSTIÇA dentro do quadro legal aplicável.
m. Na decisão recorrida, foi considerado que a Recorrente não pode livrar-se da dívida exequenda por meio de compensação porque nas cláusulas 8) e 9) da Transacção ficou acordado que “O perito, no final da obra emitirá um parecer relativamente à receção definitiva destas obras realizadas” e que “Relativamente a estas obras e obtido parecer favorável do Sr. Perito, a requerente nada mais reclamará.”; n. Sucede que, na decisão recorrida, não se considerou que Lar pode impor o cumprimento da obrigação, pois, não se trata de uma obrigação natural, mas sim de obrigação judicial, a obrigação de pagamento está vencida, tendo sido dado por provado que a C. & R. se encontrava obrigada ao pagamento conforme orçamento escolhido e identificados os valores efectivamente suportados pelo Lar que obrigam a C. & R. a pagamento (factos 1.º a 7.º da base instrutória).
o. Parece (pois a fundamentação é inexistente), no entanto, que na decisão recorrida se terá considerado que a obrigação da C. & R. estaria sujeita a condição suspensiva, por força das cláusulas 8) e 9) do acordo homologado, constituindo uma obrigação sob condição da emissão do relatório final de obra.
p. Ora, da análise da transação que serve de base à oposição à execução, em especial das cláusulas 8) e 9) não é de todo possível extrair que a obrigação de pagamento da C. & R. ficou subordinada a uma condição suspensiva e que a emissão do parecer do perito é condição da existência da obrigação de pagamento que a C. & R. consentiu em 7), sem nenhuma condição associada, estabelecendo-se exactamente o contrário de qualquer condição ao ser estabelecido que a C. & R. assumia a obrigação de pagamento do orçamentado em obras qualquer que fosse o orçamento escolhido.
q. A interpretação das cláusulas 8) e 9) desenvolvida na sentença em análise é ab-rogatória, na medida em que se traduz na negação do sentido e valor do acordo (ignorando-se o indiscutível direito de crédito da Recorrente) e, em consequência, é ilegal.
r. Ademais, parece, também, defensável que a falta do parecer final do Perito não pode constituir uma excepção peremptória, pois, na essência do acordo, as cláusulas 8) e 9) não constituem condições da assunção de dívida pela C. & R..
s. Em face da jurisprudência já firmada sobre a matéria, entende-se que a decisão viola o princípio da legalidade, o princípio da gestão processual e o princípio do contraditório.
t. A decisão é, também inconstitucional pois a sua aplicação prática conduz à negação do direito à tutela jurisdicional efectiva da Recorrente.
u. Em face da decisão proferida, é a seguinte a situação da Recorrente: a) A Recorrente dispõe de um crédito de €61.484,13 sobre a Recorrida, que detêm um crédito de €35.827 sobre a Recorrente; b) A Recorrente está obrigada a pagar à Recorrida €35.827, embora disponha de um crédito de €61.484,13 sobre a Requerida, crédito esse que não foi pago à Recorrente, nem será por falta de bens penhoráveis da Recorrida, como resulta do Processo n.º 388/13.3TBMCD, Tribunal Judicial da Comarca de Bragança e do pedido de insolvência apresentado contra a Requerida – Proc. 49/20.7T8MAC, Tribunal Judicial da Comarca de Bragança, Juízo Macedo de...
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