Acórdão nº 29/12.6TBPTL.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 28 de Janeiro de 2021

Magistrado ResponsávelRAQUEL BAPTISTA TAVARES
Data da Resolução28 de Janeiro de 2021
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES I. Relatório M. T.

, casada, advogada, A. P., solteira, advogada, J. S., solteiro, técnico de informática, J. F.

, solteiro, designer, e T. C.

, solteira, advogada- estagiária, residentes na Av.ª … n.º …, Póvoa de Varzim, vieram intentar contra A. G.

e marido M. P.

, residentes na Estrada …, n.º … e M. G.

e marido H. B.

, residentes na Av.ª …, Castelo Branco acção com processo ordinário, pedindo seja dado como provado que os Autores de boa-fé, executaram obras no Anexo n.ºs 1 e 2, tendo no primeiro construído e ampliado uma nova casa de habitação e construído no Anexo n.º 2, uma loja, um alpendre e uma adega, seja declarado que o valor das obras é superior ao valor dos anexos antes da realização destas, seja reconhecido que os Autores têm o direito a adquirir os anexos ou construções dos Réus constituído pelas construções referidas na douta sentença proferida nos autos de acção sumária com o n.º 1642/ 03 do Tribunal Judicial de Ponte de Lima e melhor identificadas no croquis junto, por acessão industrial imobiliária e mediante o pagamento aos Réus da quantia que se fixar por vistoria ou avaliação dos bens e das obras realizadas pelos Autores, seja ordenado o cancelamento da descrição predial, podendo os Autores inscrever os anexos a seu favor na Repartição de Finanças de Ponte de Lima e regista-los na Conservatória do Registo Predial, sejam os Réus condenados a reconhecerem e acatarem esse direito e em indemnização por danos morais a fixar em execução de sentença.

Para o efeito invocam os Autores a acessão industrial imobiliária ao abrigo do disposto no artigo 1340.º do Código Civil, alegando que fizeram obras nos citados anexos e de que o valor de tais obras excede o valor dos mesmos, por isso os adquiriram pela via da acessão industrial imobiliária.

Regularmente citadas as Rés contestaram, invocando que o direito ao exercício desta acção se acha precludido, face à sentença proferida na acção n.º 1642/03. 8TBPTL que correu termos no 1.º Juízo deste tribunal e que reconheceu a propriedade às Ré dos alegados anexos 1 e 2.

Mais alegam que as obras levadas a cabo pelos Autores foram executadas de má-fé e do que se trata são de benfeitorias as quais deviam ser peticionadas pela via reconvencional da citada acção ou então se assim não entendessem poderiam invocar a acessão industrial imobiliária o que não aconteceu.

Foi proferido despacho saneador no qual foi decidido relegar para a decisão final o conhecimento da excepção e foi seleccionada a matéria assente e controvertida, tendo a mesma sido objecto de reclamação a qual foi atendida.

Veio a efectivar-se a audiência de discussão e julgamento com a prolação de sentença nos seguintes termos, no que concerne à parte dispositiva: “Em face do exposto julgo a presente ação improcedente, julgando extinta a instância nos termos do disposto na alínea a) do artigo 277.º do Código do processo Civil.

Custas da ação a cargo os autores por terem dado causa total á mesma.

Registe e notifique.” Inconformados, apelaram os Autores da sentença, tendo sido proferido Acórdão que julgou improcedente o recurso no que diz respeito à nulidade da sentença por excesso de pronúncia, por obscuridade e ininteligibilidade e pela consideração da prova produzida no processo instaurado pelos Réus em 2003, nos termos invocados pelos Recorrentes; determinou ainda a exclusão da matéria de facto dos pontos 35), 37) e 38) dos factos provados por conterem apenas formulações genéricas e conclusivas e anulou a sentença recorrida determinando a repetição parcial do julgamento quanto aos pontos 24), 56), 57), 60), 61), 62), 63), 81), 82) e 83) dos factos provados, sem prejuízo da apreciação de outros pontos da matéria de facto com o fim de evitar contradições, designadamente os pontos da matéria de facto não provada que com aqueles se interligam, de forma a eliminar as contradições existentes nos termos expostos.

Veio a efectivar-se a audiência tendo as partes requerido a junção aos autos de um acordo escrito quanto à matéria de facto em discussão, prescindindo da produção de prova.

Foi proferida sentença nos seguintes termos, no que concerne à parte dispositiva: “Em face do exposto julgo a presente ação improcedente, julgando extinta a instância nos termos do disposto na alínea a) do artigo 277.º do Código do processo Civil.

Custas da ação a cargo os autores por terem dado causa total á mesma.

Registe e notifique.” Inconformados recorreram novamente os Autores, concluindo as suas alegações da seguinte forma: “1. A douta sentença é nula, porquanto decidiu parte da matéria de facto de forma obscura ou conclusiva, tornando tal decisão ininteligível, designadamente, no que respeito aos pontos 35, 37 e 38 da matéria de facto, cuja resposta não expurgou considerações subjetivas e formulações genéricas e conclusivas.

  1. A douta sentença é ainda nula porque patenteia contradição notória entre diferentes decisões da matéria de facto e porque considerou a prova produzida no âmbito do processo n.º 1642/03 como factos assentes nos presentes autos, violando o princípio da aquisição processual (art. 413.º, CPC) e ainda o princípio da eficácia extraprocessual das provas (art. 421.º, n.º1, CPC).

  2. A tal respeito, entre outros, encontra-se a contradição entre o ponto 24 de matéria de facto e os pontos 62 e 63 da matéria de facto provada.

    Sem prescindir, Do Direito 4. O caso julgado resultante do trânsito em julgado da sentença proferida num primeiro processo, não se estende aos factos aí dados como provados para efeito desses mesmos factos poderem ser invocados, isoladamente, da decisão a que serviram de base, num outro processo.

  3. Os fundamentos de facto não adquirem, quando autonomizados da decisão de que são pressuposto, valor de caso julgado, de molde a poderem impor-se extraprocessualmente.

  4. O reconhecimento judicial do direito de propriedade sobre um imóvel não prejudica o exercício do direito potestativo de acessão imobiliária, a realizar pelo Réu, que viu ser reconhecimento o anterior direito ao Autor, em processo anterior.

  5. Tendo a reconvenção natureza facultativa, não deve resultar da sua não dedução qualquer efeito preclusivo, tanto mais que a acessão imobiliária pode ser concretizada numa pretensão reconvencional, bem como poderá igualmente ser apreciada em ação autonomamente interposta depois de na primeira ação ser reconhecido o direito de propriedade.

  6. Os prédios aqui em discussão foram adjudicados a cada um dos sujeitos processuais em processo de inventário, decidido no Supremo Tribunal de Justiça, em que não foi discutida a composição desses imóveis.

  7. Ademais, ambos os prédios em discussão tinham sido adjudicados à antecessora dos AA, sendo que, por pedido dos ora Recorridos que o seu quinhão fosse composto por bens, o prédio rústico foi-lhes adjudicado posteriormente, que havia sido licitado ainda e também pelos Autores.

  8. O processo de inventário é um caminho em direção a uma partilha justa e equilibrada de um património cujo titular desapareceu e que se radicou em vários sucessores, mas não tem por finalidade gerar mais indivisões e litígios entre os herdeiros.

  9. Impor-se aos Autores que, no processo n.º 1642/03, oferecessem um pedido reconvencional de reconhecimento do direito de propriedade pela via da acessão industrial imobiliária, seria impor que os Autores ficcionassem que duas construções contíguas ao logradouro do seu prédio e claramente separadas do prédio rústico, viessem a ser interpretadas e julgadas como parte integrante desse prédio rústico.

  10. E não poderia ser exigível que ficcionassem tal hipótese por dois motivos: quer porque, aquando da adjudicação no âmbito do processo de inventário, a composição e descrição do prédio rústico encontrava-se perfeitamente delimitada, não constando dela qualquer construção; quer porque os Réus, nesse processo de inventário, não licitaram em bens e ainda declararam não prescindir do pagamento de tornas.

  11. Assim, o efeito preclusivo dos meios de defesa apenas abarca o que constitui matéria de exceção que integre factos modificativos ou extintivos apostos à pretensão do autor, dele se excluindo as pretensões autónomas, outra razão pela qual não deve proceder a exceção de autoridade de caso julgado.

  12. As benfeitorias e a acessão são fenómenos paralelos que se distinguem pela existência ou inexistência de uma relação jurídica que vincule à pessoa a coisa beneficiada.

  13. Em bom rigor, benfeitoria consiste num melhoramento feito por quem está ligado à coisa em consequência de uma relação ou de um vínculo jurídico como, por exemplo, o proprietário, o possuidor, o locatário, o comodatário, o usufrutuário, entre outros. Por outro lado, a acessão imobiliária é um fenómeno que vem do exterior, de um estranho, de uma pessoa que não tem contacto jurídico com ela, podendo ser um mero detentor ocasional.

  14. Nesta perspetiva, o instituto da acessão industrial imobiliária não é apenas um modo de aquisição do direito da propriedade. É também um mecanismo de resolução de um conflito de direitos da mesma natureza, gerado pela sobreposição de duas propriedades: a do dono da obra e a do dono do prédio, no qual a obra foi incorporada, ascendendo o valor da obra dos Autores aos 60.000,00€, em contraposição ao valor das construções existentes, que se fixou em 7.825,00€.

    Acresce que, 17. Os Recorrentes agiram de boa-fé, pois conforme resulta da prova documental, quando os Recorridos instauraram a ação, que correu sob o proc. n.º 1642/03, contra os Autores, já as obras se achavam finalizadas.

  15. Tanto que o prédio urbano, perfeitamente delimitado e com o logradouro contíguo a tais construções em discussão, nunca permitiria concluir, até de acordo com as regras da experiência comum, que aquelas pertencessem, afinal, a um prédio rústico afastado e numa cota superior.

  16. Estão, por isso, reunidos todos os pressupostos exigidos pelo regime da acessão industrial imobiliária, devendo, para tal, declarar-se que aos Recorrentes...

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