Acórdão nº 4695/10.9TBGMR-B.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 11 de Março de 2021

Magistrado ResponsávelMARGARIDA SOUSA
Data da Resolução11 de Março de 2021
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães: I. RELATÓRIO: G. C. e mulher A. T. deduziram embargos de terceiro, por apenso à execução intentada por Banco ..., SA contra M. C. e S. M., onde, no dia 02 de fevereiro de 2012, havia sido penhorada a fração autónoma designada pela letra “A” – correspondente a uma habitação, 1º piso, com logradouro, sito na Rua de ..., na freguesia de ..., concelho de Vizela, descrita na Conservatória do Registo Predial de Vizela sob o número ... e inscrita na matriz predial urbana sob o artigo ….

Formularam, a final, as seguintes pretensões: Nestes termos e nos melhores de direito, devem os presentes embargos ser recebidos com todas as consequências legais, nomeadamente a suspensão dos termos do processo principal e restituição de posse, e, a final, serem julgados procedentes, por provados, devendo em consequência: - Ser admitida a intervenção provocada como Ré da “Imobiliária e Construção S. M., Lda”; - Ser declarada a nulidade dos negócios de compra e venda dos imóveis atrás identificados, com fundamento nas invocadas simulações, decretando-se a sua restituição aos embargantes; - Decretado o cancelamento de todas as inscrições, quer de aquisição, quer de hipoteca ou penhora registadas, e que tenham sido lavradas após as inscrições de aquisição a favor dos embargantes nos prédios 00...-A/ ... e 00343/...; - A exequente/embargada ser condenada a reconhecer que os embargantes são donos e legítimos possuidores dos bens supra descritos, e, consequentemente, os embargantes restituídos na posse dos aludidos bens, tudo com custas e procuradoria pelos embargados.

Fundamentaram as suas pretensões no facto de terem adquirido e registado a seu favor o imóvel penhorado nos autos, relativamente ao qual exercem igualmente a posse desde 1984, sendo simulado o negócio através do qual eles o venderam à “Imobiliária S. M., Lda”, simulação de que a Exequente tinha conhecimento. Mais alegaram que, posteriormente, com o conhecimento da exequente e com intenção de os prejudicar, foi a fração novamente vendida, desta vez aos ora Executados, a favor de quem foi a mesma registada, sem que vendedora ou compradores tenham querido realizar efetivamente o negócio e sem que haja sido paga ou recebida qualquer quantia.

Os embargos foram recebidos, determinando-se, até decisão final, a suspensão da execução quanto à dita fração autónoma.

Os Embargados foram notificados, tendo apenas sido oferecida contestação pelo Exequente Banco ..., SA, na qual pugna pela improcedência dos embargos, alegando, em suma, que desconhecia qualquer acordo simulatório, tendo confiado na veracidade das declarações prestadas e no teor das descrições prediais que resultam das certidões motivo pelo qual entregou aos executados o montante necessário à aquisição da fração penhorada e estes receberam o mesmo, dando de garantia para o pagamento a mesma fração que, face ao incumprimento, foi penhorada.

Proferiu-se decisão admitindo a intervenção requerida tendo a Imobiliária S. M., Lda. sido citada.

No seguimento de incidente de habilitação de cessionário, foi admitida a intervir nos autos a Hipoteca X S.A.R.L., em substituição do Banco ..., SA.

Conhecido o falecimento da Embargante, correu termos incidente de habilitação de herdeiros, findo o qual se julgaram habilitados o seu marido, aqui Embargante, G. C., e os seus filhos M. A., V. C. e C. F..

Designou-se data para julgamento, tendo, nos dias que antecederam a data sido dado conhecimento aos autos da instauração de ação especial de acompanhamento de maior a favor do Embargante G. C..

Determinou-se, nos termos e para efeitos de assegurar a representação legal do embargado, se aguardasse pela nomeação de acompanhante naqueles autos, a qual, verificada a respetiva nomeação e a medida aplicada, foi nomeada curadora do referido Embargante nos autos.

Efetuada a audiência de discussão e julgamento, foi proferida sentença a julgar os embargos totalmente improcedentes.

Inconformado, o Embargante G. C. interpôs o presente recurso, em cuja alegação formulou as seguintes conclusões: 1 – Ao ter sido recusada pelo tribunal a quo a prática dos actos requeridos pelos embargantes em sede de audiência de julgamento, foram violadas nos presentes autos, os artºs 526º, nº 1 e 452º, nº 1, o artº 6º do CPC, mas ainda os artºs 4º, 7º, nºs 1 e 4, todos do CPC, violações essas que constituem nulidade processual dado que essa violação é susceptível de influir no exame da causa ou na sua decisão (artº 195º do C.P.C.), decisões essas que admitem recurso por contenderem com os princípios da igualdade ou do contraditório, com a aquisição processual de factos ou com a admissibilidade de meios probatórios (artº 630º, nº 2 do C.P.C.); 2 - Poderia e deveria mesmo, ao abrigo das citadas disposições legais, o tribunal a quo, ponderadas as razões invocadas, ter determinado o cumprimento do requerido pelos embargantes, possibilitando a estes a possibilidade de contribuírem para a justa resolução do litígio.

3 - Ao não aceder aos pedidos formulados pelos embargantes impediu o tribunal a quo o recorrente de aceder a meios até aí desconhecidos ou inacessíveis que, estando no momento ou em tempo útil, ao dispôr do tribunal, lhe possibilitariam fazer prova dos requisitos da simulação e obter uma decisão diversa da proferida, mais justa e equitativa.

4 - Padece ainda a decisão dos autos de nulidade por violar a disposição constante do nº 1, al. c) do artº 615º do C.P.C. dado que, na decisão da matéria de facto e em concreto no que concerne aos pontos de facto das alíneas j), k), l), m), s) t) e u), que reportam a posse ao período que decorre entre os anos 80 e a actualidade, não pode deixar de se considerar que tal prova é incompatível com a conclusão de que tais actos só constituem verdadeira posse até 30/9/2004, data em que ocorreu a (não provada e simulada) transmissão da propriedade, pelo que, se verifica ambiguidade e obscuridade que torna a decisão ininteligível.

5 - O recorrente impugna a matéria de facto e pretende, em concreto, ver alterada a parte final da alínea l), concretamente a parte em que se refere “o que fizeram até 30/9/2004”; 6 – Entende o recorrente que deveriam ter sido considerados provados os seguintes factos: j) Os embargantes, desde 24 de Janeiro de 1983, por si e em continuação dos respectivos antecessores, têm usado e fruído a fracção referida em e), sem interrupção, k) dela aproveitando todas as suas utilidades, fruindo-a e pagando os respectivos impostos, l) à vista e com o conhecimento geral, sem oposição de quem quer que seja, como se de coisa sua se trate e com a convicção de quem são seus donos, o que fazem ainda hoje.”; 7 - Face aos depoimentos gravados e transcritos, dúvidas não subsistirão de que os embargantes ocupam a fracção penhorada desde pelo menos o início dos anos 80, aí tendo permanecido mesmo após terem sido celebrados os contratos de compra e venda dos autos e que tiveram por objecto a fracção em causa, ocupando-a contudo não como meros detentores mas sempre com o corpus e o animus de quem é proprietário, agindo como tal, defendendo o seu direito como tal e por todos reconhecido com tal, até aos dias de hoje.

8 – Extrai-se ainda daqueles depoimentos que aqueles que figuram nos contratos de compra e venda como adquirentes (interveniente e os executados) nunca praticaram qualquer acto material que, indiciasse a posse do imóvel ou que, sequer, indiciasse intenção de a vir a exercer; 9 – Errou o tribunal a quo quando considerou que a posse dos embargantes, em nome próprio, cessou em 30/9/2004, não só porque tal circunstância não emerge da prova produzida (emerge exactamente o contrário, ou seja que essa posse ocorre ainda no presente) mas também porque, tendo por assente o exercício dos poderes de facto “corpus da posse” sobre o bem em questão desde 1983 até ao presente - factos provados m) s) t) e u) –o “animus da posse” também se presume de acordo com o preceituado no artº 1252º do C.C.; 10 - Ainda que não entenda conforme se conclui na conclusão anterior, sempre seria de considerar-se que, considerando o facto de quer a interveniente quer os executados nunca terem manifestado ou exercido qualquer acto de posse sobre a fracção, no período compreendido entre a data de outorga dos contratos (30/9/2004) e a actualidade, tal posse haveria que ser considerada como posse por intermédio de outrem (artº 1252, nº 1 do C.C.), pelo que, ao não considerar tal norma e os efeitos que dela decorrem, errou novamente o tribunal a quo.

11 - Não concorda e não aceita o recorrente a tese defendida na sentença dos autos de que os embargantes perderam a posse da coisa, não só pelas razões que se expuseram no dispositivo deste recurso e que assentam no facto de os embargantes nunca terem perdido tal posse, mas também porque, tal tese enferma de erro clamoroso pois considera, erradamente, que os embargantes não alegaram, não provaram e nem sequer praticaram actos positivos de oposição à posse em nome de outrem, o que é facilmente contrariado pela simples constatação de que dos próprios autos, e em concreto da própria petição de embargos, resultam praticados tais actos positivos de oposição à posse de outrem e, mais do que isso, as contrapartes nem sequer deduziram contestação aos mesmos, pelo que, haverá que concluir-se que aqueles que nem sequer questionaram tal posse! 12 – Forçoso será pois concluir-se que, mesmo que tenha ocorrido a alegada “perda de posse” por parte dos embargantes, a mesma foi recuperada mediante oposição categórica contra aqueles em nome dos quais (na versão da sentença em crise) possuíam e que, relativamente à qual, nem sequer reagiram, pelo que, mais uma vez, se verifica que errou o tribunal a quo quando concluiu que ocorreu perda da posse por parte dos embargantes, errou quando considerou que mesmo que tal perda tivesse ocorrido a mesma não foi recuperada e, consequentemente, errou quando concluiu que a perda da posse impede a aquisição por usucapião.

13 - São ainda...

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