Acórdão nº 2888/17.7T8VCT.G2 de Tribunal da Relação de Guimarães, 11 de Março de 2021

Magistrado ResponsávelRAQUEL BAPTISTA TAVARES
Data da Resolução11 de Março de 2021
EmissorTribunal da Relação de Guimarães
  1. RELATÓRIO J. B.

e mulher S. P.

intentaram a presente acção de condenação sob a forma de processo comum contra C. P.

e mulher M. H.

peticionando: a) Seja reconhecido o direito de propriedade dos Autores sobre o prédio identificado no artigo 1º da petição inicial; b) Sejam os Réus condenados a reconhecer o direito de propriedade dos Autores sobre o prédio identificado no artigo 1º da petição; c) Sejam os Réus condenados a absterem-se de executarem o projecto licenciado pela Câmara Municipal Hab. com o nº. LEHAB – 36/2013, que prevê o alteamento das paredes do seu prédio nas partes que confinam com o prédio dos AA e de alterarem a localização e configuração actual do beiral do seu prédio que beneficia de uma servidão de estilicídio, contrastante com o estatuto do direito de propriedade dos AA sobre o prédio identificado no artigo 1º desta petição; e, d) Sejam os Réus condenados a reconhecer que não têm o direito de, unilateralmente, verem constituído a favor do seu prédio, identificado no artigo 5º da petição, um direito de servidão sobre o prédio dos Autores identificado no artigo 1º desta petição, impondo a este a constituição de uma servidão non aedificandi que passe a onerar o prédio dos Autores e a restringir estes no exercício dos direitos que a lei lhes confere e lhes faculta enquanto proprietários plenos deste prédio.

Alegam, para tanto e em síntese que são donos e legítimos possuidores do prédio urbano descrito no artigo 1.º da petição inicial, e os Réus donos e legítimos possuidores do prédio descrito no artigo 5.º do mesmo articulado, os quais são confinantes.

Que a favor da configuração actual do beiral do telhado do prédio dos Réus existe uma servidão de estilicídio a favor dos Autores e que os Réus pretendem realizar as obras autorizadas no processo de licenciamento de obras de edificação – Hab com o nº. LE-HAB – 36/2013, obras que foram aprovadas por Despacho de 18 de Março de 2014, conforme alvará de obras de construção nº. 27/2014 e rectificadas por despacho de 26 de Março de 2015, com termo do licenciamento concedido pelo Município para a sua realização em 15-09-2015 (melhor descritas no artigo 16 da petição inicial).

Mais alegam que tais obras além de invadirem o espaço aéreo do prédio dos Requerentes, vão proceder ao alteamento do telhado do seu prédio para criação de espaço habitacional no vão do telhado, sem procederem ao afastamento lateral ao prédio dos Autores, além de que na edificação pretendida fazer pelos Réus vai existir aumento de volumetria, alteamento das paredes e aproveitamento do vão do telhado com a criação de espaço habitacional, os quais, ao serem construídos, têm que respeitar as distâncias mínimas previstas na lei entre fachadas de edificações nas quais existam vãos de compartimentos de habitação (de 10 m), o que não acontece no caso concreto.

Regularmente citados, os Réus vieram contestar impugnando que com as obras de reconstrução que pretendem realizar no seu imóvel vão invadir ou ocupar espaço aéreo do imóvel dos Autores bem como alterar ou agravar o modo de exercício e a extensão da servidão de estilicídio, que onera o imóvel dos Autores em proveito do seu identificado prédio urbano.

Alegam ainda que o imóvel dos Autores foi edificado há mais de 100 anos e estes não pretendem, nem vão alterar as suas paredes exteriores, voltadas para o imóvel dos Autores pelo que não deve, nem pode haver lugar a qualquer afastamento lateral dessas paredes, pois vão ser apenas restaurados mas nunca alterados, como não vai haver alteamento das aludidas paredes exteriores do prédio dos Réus mas apenas a alteração parcial da configuração do seu telhado e nunca do seu beiral, que se manterá exactamente como se encontra desde a sua construção inicial.

Mais alegam que já dirimiram no processo de suprimento de consentimento n.º 8/14.8TBMLG, que correu termos no Tribunal Judicial de Melgaço, toda a factualidade respeitante à existente e confessada servidão de estilicídio, que onera o imóvel dos Autores em proveito do prédio urbano dos Réus bem como ao eventual agravamento desta servidão com as obras de reconstrução que estes pretendem realizar no seu prédio, ao nível do telhado, nessa lide os ora Autores já alegaram que as obras que os Réus querem realizar causava a ocupação do espaço aéreo do seu imóvel e o agravamento da existente servidão de estilicídio, bem como a ilegalidade do processo de licenciamento.

Foi realizada a audiência prévia onde foi proferido despacho saneador e despacho a identificar o objecto do litígio e a enunciar os temas da prova.

Veio a efetivar-se a audiência de discussão e julgamento com a prolação de sentença nos seguintes termos, no que concerne à parte dispositiva: “NESTES TERMOS, O TRIBUNAL DECIDE: ▪ JULGAR A ACÇÃO TOTALMENTE IMPROCEDENTE POR ESTAR O TRIBUNAL IMPEDIDO DE CONHECER DO MÉRITO POR FORÇA DA AUTORIDADE DO CASO JULGADO; ▪ CONDENAR OS AUTORES NO PAGAMENTO DAS CUSTAS PROCESSUAIS; ▪ REGITE E NOTIFIQUE; ▪ OPORTUNAMENTE, ARQUIVE E DÊ BAIXA”.

Os Autores, inconformados, apelaram da sentença tendo sido proferida, em 29 de janeiro de 2020, decisão singular por este Tribunal da Relação de Guimarães julgando procedente o recurso e, em consequência, decidindo julgar não verificada a autoridade de caso julgado, revogar a sentença na medida em que julgou verificada a autoridade de caso julgado e se absteve de conhecer do mérito e determinar que os autos baixassem à 1ª Instância para aí ser proferida nova sentença que proceda à fixação a matéria de facto e, conhecendo de mérito, decidisse as questões suscitadas nos presentes autos.

Veio a ser proferida sentença pela 1ª Instância nos seguintes termos, no que concerne à parte dispositiva: “JULGAR PARCIALMENTE PROCEDENTE, POR PARCIALMENTE PROVADA, A PRESENTE ACÇÃO E, CONSEQUENTEMENTE: RECONHECER OS AUTORES COMO DONOS E LEGÍTIMOS PROPRIETÁRIOS DO PRÉDIO IDENTIFICADO EM 1.; ABSOLVER OS RÉUS DO DEMAIS PEDIDO; *CONDENAR OS AUTORES NO PAGAMENTO DAS CUSTAS PROCESSUAIS;*REGISTE E NOTIFIQUE; OPORTUNAMENTE, ARQUIVE E DÊ BAIXA”.

Inconformados, apelaram novamente os Autores da sentença concluindo as suas alegações da seguinte forma: “Em conclusão: 1. A, aliás douta, sentença recorrida, desde logo, é nula, em vista do que dispõe a alínea d), do n.º 1, do art. 615º CPCivil, ao deixar de se pronunciar sobre questões que devesse apreciar, por não incluídas em “III. QUESTÕES A DECIDIR” ou noutra sede dessa decisão o mais inserto no douto Despacho Saneador, a propósito, designadamente, quanto ao “i. Objecto” e “ii) Temas da prova”, a vincular e prevalecer, porque transitado em julgado e como se afere da sua simples leitura, conforme disposto no art. 628º CPCivil – que, destarte, foi violado.

  1. É de manter, na íntegra, os factos tidos como provados, que aqui se dão por integrados e reproduzidos e, bem assim, os tidos por não provados em 2..

  2. Contudo, devem ser alterados para factos provados os factos que o Tribunal a quo aí deu como não provados em 1., pois da análise de toda a prova produzida vê-se e conclui-se que “As obras elencadas em 10. terão as seguintes consequências: I. aumento de beiral com consequente invasão do espaço aéreo pelo prédio 3. no prédio 1.; II. criação de espaço habitacional no vão do telhado; III. aumento da quantidade de chuva que cai do prédio 3. no prédio 1. (devido ao aumento da superfície onde a chuva cai e escorre para cair no prédio 1. e ao alteamento da cobertura); e, IV. aumento da velocidade da água que virá a cair no prédio 1. devido à maior inclinação da pendente do telhado”.

  3. Na verdade, a conclusão que imediatamente antecede transcreve os concretos pontos de facto que se têm por incorrectamente julgados – cfr. art. 640º n.º 1 b) CPCivil – devendo sobre eles ser proferida decisão de sentido diametralmente oposta, tendo-os como provados.

  4. Atente-se, contudo e antes do mais, que a, aliás douta, sentença por força do em 2. de factos tidos por não provados e à míngua de qualquer referência conexa em sede de factos tidos provados, desconsidera, totalmente, a existência duma qualquer servidão, de estilicídio ou outra, constituída a favor do prédio dos aqui apelados, quando, consabidamente, este está implantado ‘em cima’ das estremas sul e poente do prédio dos ora apelantes, conforme evidenciado no facto provado 7., o que, por si só, vale por dizer que a decisão proferida jamais poderia sustentar o desfecho que atingiu!!! 6. Os concretos meios probatórios constantes do processo e do registo de gravação realizada que impõem decisão sobre os referidos concretos pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida são os seguintes: a) Processo de licenciamento de obras de edificação – Hab com o nº. LE-HAB – 36/2013, autuado por linha; b) Relatório de Perícia subscrito por Arq. A. E., de 31.10.2018; c) Relatório de Perícia subscrito por Eng. C. J. e por Eng. J. C., de 02.11.2018; d) Esclarecimentos do perito Eng. C. J., prestado na sessão de Audiência de Julgamento de 17-06-2019, gravado através do sistema integrado de gravação digital disponível na aplicação informática do Juízo de Competência Genérica de Melgaço do Tribunal Judicial da Comarca de Viana do Castelo, das 15:00:41 horas às 15:23:53 horas, com o ficheiro 20190617150040_1477275_2871855, entre 00:00:00 e 00:23:11, conforme transcrito nas alegações; e) Esclarecimentos do perito Eng. J. C., prestado na sessão de Audiência de Julgamento de 19-02-2019, gravado através do sistema integrado de gravação digital disponível na aplicação informática do Juízo de Competência Genérica de Melgaço do Tribunal Judicial da Comarca de Viana do Castelo, das 12:26:47 horas às 13:04:03 horas, com o ficheiro 20190219122647_1477275_2871855, entre 00:00:00 e 00:37:15, conforme transcrito nas alegações; f) Esclarecimentos do perito Arq. A. E., prestado na sessão de Audiência de Julgamento de 19-02-2019, gravado através do sistema integrado de gravação digital disponível na aplicação informática do Juízo de Competência Genérica de Melgaço do...

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