Acórdão nº 3522/19.6T8GMR-B.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 18 de Março de 2021

Magistrado ResponsávelHELENA MELO
Data da Resolução18 de Março de 2021
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES I – Relatório M. C.

e F. P.

, vieram deduzir embargos de terceiro contra: 1) A. C.

e mulher, M. G.

; 2) C. F.; 3) M. O.; 4) M. L.; e 5) A. F., peticionando que se declare extinta a execução apensa, uma vez que não foram demandados na acção declarativa cuja sentença é dada à execução, detendo a posse sobre o imóvel em causa nos autos.

Para tanto, alegaram em síntese, que detém a posse efetiva sobre o imóvel em causa nos autos, porquanto celebraram um contrato de comodato com os primeiros executados, pais da embargante e sogros do embargante, residindo no prédio, efectuando o pagamento das despesas da habitação e efectuando diversas benfeitorias no imóvel.

Mais alegaram que a ordem judicial que os embargados pretendem ver executada nos autos principais ofende a posse dos embargantes, os quais não foram parte no acção cuja sentença é dada à execução, não fazendo a mesma caso julgado quanto aos mesmos.

Alegaram ainda que tiveram conhecimento da execução da sentença em 04.09.2019, pelo que os embargos são tempestivos.

Os embargados apresentaram contestação, invocando que os embargantes não estão na posse do prédio em causa nos autos, sendo meros detentores, e mesmo que estivessem, tal não afastava as servidões que o oneram e que a sentença dada à execução reconheceu. Mais alegam que as servidões para as quais a abertura de acesso se destina, se situam no logradouro do prédio urbano, em nada afectando a casa de morada dos embargantes.

Invocaram também que os embargantes tinham conhecimento da acção declarativa, tendo o embargante marido intervindo em tal processo na qualidade de testemunha dos 1º e 2ª embargantes, litigando com má fé, devendo ser condenados a pagar uma indemnização no valor de € 1000,00 aos 3º, 4º, 5º e 6º embargados e os embargos de terceiro serem julgados improcedentes.

Foi dispensada a realização da audiência prévia e foi proferido despacho saneador, onde se se julgou a instância válida e regular, dispensando-se a enunciação do objecto do litigio e dos temas da prova.

Realizou-se a audiência final e após foi proferida decisão julgando os embargos totalmente improcedentes.

Os embargantes não se conformaram e interpuseram o presente recurso de apelação, tendo terminado a suas alegações com as seguintes conclusões: 1. O Tribunal a quo fundamentou a resposta dada à matéria de facto, na sentença dada à execução, no contrato de comodato e na prova testemunhal, designadamente, no depoimento de S. C., P. T., L. M., J. C.

e M. E.

.

  1. No depoimento prestado por “S. C.

    , amiga da embargante mulher, que asseverou que a embargante e o marido residem em tal imóvel, que é dos pais da mesma, há mais de cinco anos, desconhecendo a que título residem em tal casa e se pagam ou não despesas da mesma.” 3. “Este depoimento foi corroborado pelo depoimento prestado por P. T.

    , amigo dos embargantes, que assegurou que os embargantes procedem ao pagamento da TV cabo e procederam à realização de pequenas obras, como, por exemplo, pintaram os quartos.” 4. “A testemunha L. M.

    , agente da GNR, colega de trabalho do embargante marido, assegurou que foi chamado ao local em causa nos autos, sendo que ficou com a percepção que residiam naquele local os embargantes (…).

  2. “A testemunha J. C.

    , amigo dos embargantes, assegurou desconhecer a que título os embargantes vivem no imóvel em causa nos autos, assegurando que os embargantes realizaram algumas obras no imóvel, como uma cozinha nova e dois quartos, muito embora não tenha conseguido precisar, de um modo seguro, que são os embargantes que procedem ao pagamento das despesas.” 6. “A testemunha M. E.

    , assegurou que o imóvel pertence aos pais da embargante mulher, assegurando que como a casa não se encontrava toda mobilada, os embargantes compraram alguns móveis, mas os quartos e a segunda cozinha já existiam quando foi visitar o imóvel, o que ocorreu após o casamento dos embargantes.” 7. A sentença em crise refere que “decorre do teor dos depoimentos prestados, que os embargantes residem no imóvel dos autos (…), pagando algumas despesas inerentes ao seu uso.

  3. Mais refere que “não foi efetuada qualquer prova credível que permita afirmar que os embargantes têm a qualidade de possuidores do referido imóvel, sendo certo que não foi junta qualquer prova documental que permita concluir pela verificação das características da posse (animus e corpus).” 9.

    Conclui a sentença recorrida, que os recorrentes são possuidores precários ou meros detentores, acrescentando que, “muito embora os mesmos tenham o corpus possessório, uma vez que residem no imóvel, não resultou demonstrado que estavam a atuar como titulares do direito real correspondente aos atos praticados”.

  4. A posse é integrada por dois elementos distintos: o corpus, o seu elemento material e o animus, consistente na intenção de exercer sobre a coisa como seu titular, o direito real correspondente àquele domínio de facto.

  5. A relação entre pessoa e coisa, não tem sequer que se traduzir por atos materiais; basta apenas que se mantenha um estado de facto em que não surjam obstáculos a essa atuação.

  6. Esta sempre foi a atitude dos recorrentes relativamente aos embargados seus pais e sogros.

  7. Do depoimento das testemunhas arroladas pelos recorrentes e supra transcritos da sentença em crise e dos documentos juntos a fls. 15, resulta que aqueles praticavam diversos actos materiais no imóvel.

  8. Não existe um único depoimento que mencione que tais atuações eram obstadas por quem quer que fosse, designadamente, pelos embargados pais e sogros dos recorrentes.

  9. Resulta dos depoimentos das mencionadas testemunhas que os recorrentes até obras de reconstrução e ampliação fizeram no imóvel.

  10. No mínimo, ter-se-á de entender - até pelo facto dos pais e sogros dos embargantes/recorrentes serem visitas frequentes do imóvel em apreço, que tais actos materiais foram consentidos, não tendo, por isso, estes jamais praticado qualquer acto que impedisse ou obstasse à prática de actos materiais pelos recorrentes.

  11. Para além do elemento corpus, para que a posse seja completa, é necessário que se verifique o animus domini, isto é, a intenção do possuidor de exercer o direito como se fosse proprietário.

  12. O animus não pode ser confundido com a convicção de ser titular do direito, mas antes, é preciso que a atuação dos recorrentes, ou seja, como se fossem titulares do direito real respetivo, o que, modestamente, não nos suscita dúvidas, até pelo tipo de obras que realizaram no imóvel, pelas aquisições que fizeram para o imóvel, etc.

  13. Sendo certo que a prova do animus pode ser muito complexa, é estabelecida uma presunção legal que nos diz que, em caso de dúvida, “se presume a posse naquele que exerce o poder de facto”.

  14. Daqui decorre, que o exercício do corpus faz presumir a existência do animus.

  15. A sentença em crise, quanto a esta parte bem andou, ao considerar que, (…) muito embora os mesmos tenham o corpus possessório, uma vez que residem no imóvel (…)”.

  16. Apesar de não nos suscitarem dúvidas acerca da existência...

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