Acórdão nº 4/19.0T8VRL.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 18 de Março de 2021

Magistrado ResponsávelANTÓNIO SOBRINHO
Data da Resolução18 de Março de 2021
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES I – Relatório; Apelante: J. V. e esposa I. S. e A. L. (réus); Apelado: Caixa ..., CRL (autora); A apelada/autora instaurou acção sob a forma de processo comum contra os apelantes/réus, pedindo que: 1. Se declarasse nulo, por vício de simulação, o negócio denominado de compra e venda das frações autónomas designadas pelas letras “A” e “B”, que fazem parte do prédio descrito no registo predial sob o n.º ..., freguesia e concelho de Vila Pouca de Aguiar, objeto da escritura transcrita no ponto 42.º da p.i; 2. Se determinasse o cancelamento das inscrições de aquisição a favor do réu A. L., a que se refere a Ap. 2307 de 14 de março de 2018, incidente sobre as referidas duas frações; 3. Caso assim não se entendesse, -Se julgasse procedente a impugnação pauliana do mesmo negócio de compra e venda, reconhecendo-se à autora o direito à restituição dessas frações autónomas na medida do seu interesse, podendo executá-las no património do réu A. L..

Realizada a audiência de julgamento, foi proferido sentença, na qual se decidiu o seguinte: «Declaro nulo, por vício de simulação, o negócio denominado de compra e venda das frações autónomas designadas pelas letras “A” e “B”, que fazem parte do prédio descrito no registo predial sob o n.º ..., freguesia e concelho de Vila Pouca de Aguiar, objeto da escritura transcrita no ponto 42.º desta petição inicial; Determino o cancelamento das inscrições de aquisição a favor do réu A. L., a que se referem as Aps. 2307 de 14 de março de 2018, incidente sobre as duas frações em causa.

Após trânsito, promova o registo da presente decisão - arts. 2º, n º 1, a), 3º, n º 1, b) e c), 8º-B, n º 3, a) e 8º-C, n º 3, do CRP.

Custas a cargo dos R.R. - art. 527º, n º 1 a 3, do C.P.C. ».

Inconformados com tal decisão, dela interpuseram recurso de apelação os réus, em cuja alegação formula as seguintes conclusões que se transcrevem: 1ª. Os Réus não se conformam com o douto despacho proferido em 21-09-2020, que não admitiu a junção aos autos de quatro documentos / quatro contratos de arrendamento, requerida pelos RR na respetiva audiência de julgamento; nem com a douta sentença datada de 11-11-2020, que declarou “nulo, por vício de simulação, o negócio denominado de compra e venda das frações autónomas designadas pelas letras “A” e “B”, que fazem parte do prédio descrito no registo predial sob o n.º ..., freguesia e concelho de Vila Pouca de Aguiar”, o que fundamenta o presente recurso.

Do recurso do douto despacho proferido em 21-09-2020, que não admitiu a junção aos autos de quatro documentos / quatro contratos de arrendamento, requerida pelos RR na audiência de julgamento: 2ª. Conforme haviam protestado no artº 31º da contestação, na audiência de discussão e julgamento de 21-09-2020 os RR requereram a junção aos autos de quatro contratos de arrendamento relativos às frações autónomas designadas pelas letras “A” e “B” (do prédio urbano inscrito na matriz predial da freguesia de Vila Pouca de Aguiar sob o artº .. e descritas na CR Predial de … sob o nº .../19870624), outorgados pelo Réu A. L., na qualidade de proprietário e senhorio, e, respetiva e sucessivamente, com as sociedade comercial “V. F., Lda”, e com a sociedade comercial “R. T., Unipessoal, Lda”, enquanto locatárias – cfr. docs. 1 a 4, que se juntam.

  1. Por douto despacho proferido nessa mesma data, o Meritíssimo Juiz do Tribunal a quo não admitiu a junção de tais documentos – cfr. Ata de 21-09-2020.

  2. Conforme resulta da fundamentação de fls 14, parte final, e 15, para justificar a prova dos factos nºs 36, 37 e 38, a douta sentença aludiu também à circunstância de tais contratos de arrendamento não terem sido juntos aos autos.

  3. Desta forma, paradoxalmente, o Ilustre Tribunal a quo não admitiu a junção dos contratos de arrendamento aos autos, mas, posteriormente, veio invocar a sua inexistência como um dos aspectos para fundamentar a prova daqueles mesmos factos.

  4. Tendo em conta aquela fundamentação, a existência de tais contratos de arrendamento nos autos era essencial para a descoberta da verdade material dos factos em apreço e para a justa composição do litígio.

  5. Incumbindo ao Meritíssimo Juiz do Tribunal a quo “realizar ou ordenar, mesmo oficiosamente, todas as diligências necessárias ao apuramento da verdade e à justa composição do litígio” (nos termos dos artºs 411º, e 6º, nº 1, do NCPC, que consagram o princípio do inquisitório), e verificando-se que a existência de tais contratos de arrendamento era essencial para a descoberta da verdade material, na medida em que a sua ausência nos autos influiu na prova dos factos nºs 36, 37 e 38, deveria ter sido admitida a junção de tais contratos de arrendamento na audiência de discussão julgamento de 21-09-2020.

  6. Pelo que, com o devido respeito, impõe-se a revogação do douto despacho que decidiu pela não admissão de tais contratos de arrendamento, com as legais consequências.

    Do recurso da douta sentença proferida em 11-11-2020 - Da impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto, no que diz respeito aos factos dados como provados sob os pontos 36, 37 e 38: 9ª. Os recorrentes consideram que foram indevidamente julgados os pontos 36, 37 e 38 da matéria de facto dada como provada, que fundamentaram a declaração de nulidade, por vício de simulação, do negócio denominado de compra e venda das frações autónomas designadas pelas letras “A” e “B”.

  7. Na respetiva “Motivação da decisão de facto”, a douta sentença considerou que “A factualidade de 36 e 37, resulta da prova documental, conjugada com a prova pericial e testemunhal e os depoimentos de parte prestados, analisados à luz das regras da experiência comum.” (cfr. fls 10, parte final).

  8. Como resulta da fundamentação constante de fls 11 a 16, para prova de tais factos a douta sentença relevou então os depoimentos das testemunhas R. S. e P. N., e o depoimento de parte do Réu A. L..

  9. Para prova de tais factos a douta sentença expressou aí um conjunto de alusões / trechos de tais depoimentos que, visível e notoriamente, não são suficientes, não justificam, e não fundamentam por si só minimamente que, com base neles, se possa dar como provada a matéria constante dos pontos nºs 36 a 38 da matéria de facto.

  10. Por ser assim, a douta sentença padece de falta de fundamentação da resposta á matéria de facto contida nos pontos 36, 37 e 38, nos termos do artº 607º, nºs 3 e 4 e 154º, do CPC.

  11. O que deverá reconduzir a que seja dada como não provada a matéria constante dos pontos 36, 37 e 38 da matéria de facto.

  12. POR OUTRO LADO, a verdade é que aquelas partes / trechos dos depoimentos das testemunhas R. S. e P. N., e do Réu A. L., a que alude a douta sentença, não expressam o real e verdadeiro sentido do seu respetivo teor integral.

  13. Da análise do teor completo daqueles depoimentos resulta inequívoco que dos mesmos não é possível dar-se como provada qualquer da matéria constante dos pontos 36 a 38 dos factos dados como provados, e, pelo contrário, dos mesmos depoimentos resulta inequívoco: . QUE os RR J. V. e mulher quiseram efetivamente vender as referidas duas frações, que, correspondentemente, o Réu A. L. quis efectivamente comprar; . QUE as declarações manifestadas na escritura foram emitidas de forma verdadeira e real, e sem qualquer intuito de enganar a Autora; - QUE, aquando da escritura, os RR não sabiam, nem pretendiam, com a sua celebração, impedir ou dificultar a possibilidade de a Autora cobrar os créditos que tinha sobre os 1ºs RR.

  14. TAL é o que resulta: . Do depoimento da testemunha R. S. – depoimento gravado no sistema de gravação digital integrado, em uso no Tribunal, com a duração e 00":01" a 09":22" / cfr. Ata da Audiência de Discussão e Julgamento de 13-07-2020.

    . Do depoimento da testemunha P. N. – depoimento gravado no sistema de gravação digital integrado, em uso no Tribunal, com a duração de 00":01" a 09":22" / cfr. Ata da Audiência de Discussão e Julgamento de 13-07-2020.

    . Do depoimento do Réu A. L. – depoimento gravado no sistema de gravação digital integrado, em uso no Tribunal / único produzido durante a Audiência de Discussão e Julgamento de 3-11-2020 – Cfr. Ata de 3-11- 2020.

  15. Naqueles pressupostos, na evidente ausência de prova necessária e suficiente que suporte os factos dados como provados sob os nºs 36, 37 e 38, tal matéria deverá agora ser doutamente julgada como não provada, o que deverá determinar, só por si, a douta revogação da sentença e a declaração de improcedência da ação.

    SEM PRESCINDIR, acresce que: 19ª. Da fundamentação da douta sentença de fls 11 a 16 verifica-se ainda que, com base nos trechos / aspectos dos depoimentos aí referidos - que, como se disse, são, manifestamente insuficientes para prova dos factos nºs 36, 37 e 38 -, o Ilustre Tribunal a quo aludiu a factos e circunstâncias que não constam provados nos autos, tirou ilações, e presumiu então como provada a matéria daqueles mesmos factos.

  16. Reconhecendo a fls 16 que não existiu prova directa da simulação da compra e venda, presumiu todavia a prova daqueles mesmos factos, naqueles termos, com o que declarou a existência de simulação e a decorrente nulidade do contrato de compra e venda celebrado a que se refere o ponto 34 dos factos provados.

  17. ORA, ao dar como provada a factualidade dos pontos 36, 37 e 38 com base em ilações não assentes em factos realmente conhecidos e/ou comprovados nos autos, a douta sentença fez um uso censurável das presunções judiciais, em clara violação do disposto no artº 349º, do Código Civil, que impõe que as ilações podem firmar um facto desconhecido, mas apenas quando tal decorrer de factos conhecidos.

  18. Como se referiu, tais presunções nem sequer estão suportadas nos trechos / aspectos dos depoimentos das testemunhas R. S. e P. N., e do depoimento de parte do Réu A. L., os quais, como também se disse, não suportam minimamente a prova daqueles factos.

  19. TODAVIA, ainda que se considerasse (em situação meramente hipotética) que a parte daqueles...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT