Acórdão nº 778/20.5T8BRG.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 18 de Março de 2021
Magistrado Responsável | HELENA MELO |
Data da Resolução | 18 de Março de 2021 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES I – Relatório L. A.
intentou contra R. O.
, ação para atribuição de casa de morada de família, pedindo que lhe seja dada de arrendamento a fração “F” destinada à habitação, tipo T3, com entrada pelo número de polícia ..., descrito na Segunda Conservatória do Registo Predial ... sob o número ..../20110527 – …, e inscrita na matriz predial urbana sob o artigo ...., da Freguesia ...., concelho de Braga, a qual é propriedade do requerido.
Alegou, em síntese, que: - viveu com o requerido em união de facto entre Outubro de 2011 e Julho de 2018, altura em que se separaram; - dessa união de facto têm duas filhas, S. O., nascida a -.05.2014 e R. A., nascida em -.08.2016; - desde que iniciou a união de facto com o requerido, sempre residiu com as suas filhas menores na fracção que constitui a casa de morada de família e cuja atribuição requereu; - a requerente ficou a residir com as filhas na casa de morada de família quando o requerido se separou de si; - em 07 de Novembro de 2019, foi acordado e homologado a Regulação das Responsabilidades Parentais, no âmbito do processo n.º 4820/19.4T8BRG – Juiz 2 – Juízo de Família e Menores de Braga; - em dia 21 de janeiro 2020, o requerido, comunicou-lhe, via telemóvel, que tinha de sair da casa com as filhas, até ao dia 31 de janeiro de 2020, pois tinha encontrado comprador para a casa e ia seguir com uma nova vida; - no dia 28 de Janeiro recebeu uma interpelação do requerido para entrega imediata da casa, informando que já tinha sido emitida ordem de cancelamento dos contratos de fornecimento de água, luz e gás, a produzir efeitos a partir de 31 de Janeiro de 2020; - a casa de morada de família é pertença do requerido, adquirida mediante recurso a crédito bancário, pagando o requerido a quantia mensal aproximada de € 380,00; - a requerente está atualmente desempregada, auferindo um subsídio social no valor de 14,52€/dia; - no âmbito das medidas ocupacionais de emprego, a requerente encontra-se a prestar trabalho no Agrupamento de Escolas ...., através de um contrato CEI; - o requerido, por sua vez aufere um salário base no valor de 2.308,00€, acrescido de isenção de horário de trabalho e vários subsídios, o que lhe permite auferir mensalmente a quantia de 3.117,76€; - a filha S. O. encontra-se a frequentar o ensino pré-escolar, na Fundação ..., freguesia ...., concelho de Braga; - a filha R. A. encontra-se a frequentar a creche também da Fundação ...; - por forma a permitir que a requerente possa procurar emprego, realizar entrevistas e formação profissional; - desde que cessou a união de fato é a Requerente que suporta todos os gastos com luz, água e gás; - o requerido não tem pago a prestação alimentícia à filhas; - o requerido ainda não alterou o seu domicílio fiscal, privando a requerente de receber as prestações de Abono de Família e de poder recorrer aos apoios à habitação disponibilizados pela autarquia (…); - tem várias dificuldades económicas, sendo quem suporta as despesas com as filhas.
Foi realizada tentativa de conciliação entre requerente e requerido, não tendo sido possível chegar a acordo.
Notificado para contestar, o requerido deduziu oposição, pugnando pela não atribuição da casa de morada de família à requerente.
Em síntese, alegou que: -após a cessação da união de facto foi acordado entre as partes que a requerente ficaria a residir com as filhas no imóvel de sua propriedade, até que este o vendesse, tendo sido convencionado que, atento o valor que o requerido estava a suportar com a prestação do crédito contraído para aquisição daquele imóvel, fariam o encontro de contas e, deste modo, este não entregava o valor respeitante a alimentos às menores e, por sua vez, a requerida não entregava o valor respeitante à renda devida pela ocupação da residência.; - entretanto, celebrou contrato promessa de compra e venda da referida fracção autónoma, em 15 de Janeiro de 2020, contrato promessa de compra e venda esse, levado a registo predial, junto da Conservatória de Registo Predial, e foi a aquisição prometida provisoriamente registada a favor dos promitentes compradores, mediante a Ap. 2547 de 2020/02/07; - quando foi confirmada pelos compradores a vontade de adquirir o imóvel, comunicou-o à requerente a qual informou que mudara de ideias e que não iria sair do imóvel, tendo insistido junto daquela para o fazer, indicando-lhe, inclusive, que teria de proceder ao cancelamento dos contratos de fornecimento de electricidade, água e de gás, junto dos respectivos fornecedores e que se encontram em nome seu nome; - o prazo que conseguiu negociar com os promitentes compradores para a outorga do contrato definitivo de compra e venda, foi de quatro meses a contar de 15 de Janeiro de 2020, ou seja, até 15 de Maio de 2020; - perante a posição assumida pela requerente nestes autos, procedeu ao pagamento das prestações de alimentos às filhas menores respeitantes aos meses alegadamente em divida, acrescida do valor correspondente a metade das despesas com a creche e com o infantário que as filhas frequentam, no valor de €75,00 (setenta e cinco euros) por mês; - faz parte do agregado familiar da requerente a mãe e padrasto, os quais contribuem para as despesas, como sejam as despesas da água, electricidade, gás, alimentação e demais despesas correntes, devendo os rendimentos daqueles também ser ser considerados, posto que consubstanciam meios financeiros que permitem à requerente arrendar um imóvel, sito em Braga sendo certo que, aquela não pode ater-se ao mercado de arrendamento de uma só zona de Braga, podendo inclusivamente fazê-lo noutras zonas, como sejam as zonas sitas nos concelhos limítrofes.
Em 19.05.2020, o requerido juntou requerimento aos autos onde deu conhecimento de que, em 18.05.2020, tinha procedido à venda do imóvel que constitui o objecto destes autos, e que, consequentemente deixou de ser o titular do direito de propriedade do mesmo, pelo que os autos deveriam ser declarados extintos por impossibilidade superveniente da lide.
Ao abrigo do disposto no artigo 221º, do CPC, o ilustre mandatário do apelado procedeu à notificação da ilustre mandatária da apelante do referido requerimento.
Em 4 de Junho de 2020, a requerente veio pronunciar-se sobre a contestação apresentada pelo requerido, pugnar pela sua condenação como litigante de má fé e requerer a realização de diligências probatórias.
Por requerimento de 18.06.2020, o apelado veio pugnar pela inadmissibilidade legal do requerimento apresentado pela requerente e insistir pela extinção da lide.
Em 30.06.2020 foi proferido despacho onde se ordenou a notificação do requerido para proceder à junção de certidão da Conservatória do Registo Predial actualizada relativa ao imóvel objecto dos autos.
Após, foi proferida sentença julgando extinta a instância por inutilidade superveniente da lide.
É desta sentença que a apelante veio interpor o presente recurso, terminando as suas alegações com as seguintes conclusões: 1- A Recorrente não se conforma com a douta sentença por considerar que a mesma é nula por excesso de pronuncia, nos termos do disposto no art.615.º, n.º 1 alínea d) por violação do disposto no art. 588.º, n.º 4 do C.P.C. e do disposto no art. 3.º do C.P.C..
2- A aqui Recorrente deu entrada contra o ora Recorrido de uma ação de atribuição da casa de morada de família, peticionando que fosse reconhecida e declarada a dissolução da união de facto entre as partes; que fosse reconhecido que a fração autónoma “F”, descrita na Conservatória do Registo Predial ... sob o n.º ..../… e inscrita na matriz predial urbana sob o artigo .... da freguesia ...., concelho de Braga, foi casa de morada de família das partes; e que lhe fosse atribuída a casa de morada de família através da celebração de um contrato de arrendamento.
3- O ora Recorrido apresentou a sua contestação que foi notificada à Recorrente a 13/03/2020.
4- Em 19/05/2020, o Recorrido apresentou um articulado superveniente no qual referiu que procedeu à venda da fração que fora casa de morada de família, pelo que, não estando verificados os pressupostos do art. 1793.º, n.º 1 do C.C. deveria a ação ser extinta por inutilidade superveniente da lide.
5- Por força da conjugação do disposto nos arts. 990.º e 588.º do C.P.C. o articulado apresentado pelo Recorrido é um articulado superveniente, sujeito a despacho de admissão pelo Tribunal a quo e posterior notificação à parte contrária.
6- Até ao momento, o Tribunal a quo ainda não proferiu qualquer despacho a admitir o articulado superveniente.
7- Em 29/06/2020 a Recorrida é notificada do despacho que ordena que o Recorrido junte aos autos a certidão atualizada da Conservatória do Registo Predial, o que fez.
8- Após tal junção, o Tribunal a quo profere a sentença de que se recorre, tendo considerado desnecessário cumprir uma disposição legal, ou seja, pronunciar-se sobre a admissão ou não do articulado superveniente e consequente notificação desse despacho à aqui Recorrente, bem como da sua notificação para se pronunciar no prazo de 10 dias.
9- O Tribunal a quo omitiu a prática de um ato que a lei impõe, tendo, na sequência de tal omissão, proferido a sentença de que se recorre; sentença esta que, em consequência, é nula por excesso de pronúncia, nos termos do disposto no art. 615.º, n.º 1 alínea d) do C.P.C..
10- Caso assim não se entende, o que só se admite por mera lógica de raciocínio, a sentença de que se recorre é ainda nula por violação do princípio do contraditório.
11 - O princípio do contraditório, previsto no n.º 3 do art. 3.º do C.P.C., é um princípio basilar do nosso Estado...
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