Acórdão nº 5740/16.0T8VNF-A.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 25 de Março de 2021

Magistrado ResponsávelANA CRISTINA DUARTE
Data da Resolução25 de Março de 2021
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães I. RELATÓRIO R. F., na execução que lhe move “Banco ..., SA”, deduziu oposição por embargos de executado, pedindo que se declare extinta a fiança por si prestada nos contratos de mútuo que o exequente dá à execução.

Alega que o banco exequente quando foi citado na qualidade de credor hipotecário para reclamar créditos em execução movida contra a co-executada, nada lhe comunicou, vindo o imóvel a ser vendido a terceiro por valor muito inferior àquele que o próprio banco lhe atribuiu na avaliação que efetuou aquando da celebração dos mútuos, impedindo, assim, o embargante de exercer o seu direito de regresso sobre a devedora principal pelo facto de esta não ter qualquer património, para além de nunca o ter informado do vencimento da obrigação principal.

O embargado contestou para dizer que com a penhora do imóvel hipotecado, se consideram vencidas e exigíveis as obrigações que as hipotecas asseguram, sem necessidade de qualquer interpelação, o que o embargante bem sabia pois foi subscritor dos mútuos, para além de que o imóvel foi vendido com observância de todos os requisitos legais e o valor da venda foi integralmente imputada à dívida, não se aplicando o disposto no artigo 653.º do Código Civil, pois o credor tudo fez para ser ressarcido na execução hipotecária.

Após a audiência prévia, teve lugar a audiência de julgamento, tendo sido proferida sentença que julgou improcedentes os embargos, ordenando o prosseguimento da execução.

O embargante interpôs recurso, tendo finalizado a sua alegação com as seguintes Conclusões:

  1. O presente recurso restringe-se à reapreciação da questão da obrigação de comunicação ao Executado da reclamação de créditos no âmbito da execução, que por sua vez, resultou no incumprimento do contrato de mútuo (por falta de pagamento da prestação que se venceu em Novembro de 2013) e consequente resolução do contrato e exigência das prestações vencidas e vincendas.

  2. Ficou provado que no dia 20 de Julho de 2007, entre o Banco e o ora Recorrente foi celebrado um «CONTRATO DE FIANÇA» mediante o qual este declarou constituir-se como fiador e principal pagador, responsabilizando-se solidariamente pelo pagamento de tudo o que viesse a ser devido ao Banco em consequência de dois contratos de mútuo, no montante de €150.000,00 e € 120.000,00 renunciando ao benefício da excussão prévia.

  3. Ficou estipulado no documento complementar daquele contrato que «A presente hipoteca poderá ser executada: (…) b) se o imóvel ora hipotecado vier a ser alienado, onerado, arrendado, total ou parcialmente, objecto de arresto, execução ou qualquer procedimento cautelar ou acção judicial, caso em que se consideram igualmente vencidas e exigíveis as obrigações que assegura.».

  4. O prédio dado em hipoteca no contrato de mútuo com a Executada C. A., ex-cônjuge do aqui Recorrente, foi penhorado.

  5. Por sua vez, o Banco apresentou a reclamação de créditos, no valor global de €256.691,87, na qual alegou a existência dos 2 contratos de mútuo, tendo sido reconhecidos e graduados para serem pagos logo após o pagamento das custas da acção executiva.

  6. Foi realizada a venda executiva e aceite a proposta da «X, SA», no montante de €138.110,00, sendo a proposta de valor mais elevado.

  7. Em resultado da venda, o banco recebeu a quantia de € 136.196,82.

  8. O Banco enviou ao Recorrente diversas cartas, antes da entrada da execução, que remeteu para a morada Rua …, n.º …, todavia, não provou que o Embargante houvesse tomado conhecimento das mesmas.

  9. O facto de o bem dado em hipoteca ter sido objeto de execução não importava, por si só, o vencimento imediato da dívida, assim como não importava, automaticamente, a falta de pagamento de alguma das prestações vencidas.

  10. Esta delimitação do âmbito do concurso de credores, dá-nos a finalidade que é visada com a sua convocação: visto que a penhora será, normalmente, seguida da transmissão dos direitos do executado livres de todos os direitos reais de garantia que os limitam (art. 824º, nº2 CC), os credores vêm ao processo, não tanto para fazerem valer os seus direitos de crédito e obterem pagamento, como para fazerem valer os seus direitos reais de garantia.

  11. Por via de regra, o direito de execução só se pode exercer quando o devedor não paga voluntariamente, mas não se trata de um princípio absoluto, existindo uma hipótese em que os credores podem recorrer ao processo de execução, sem o devedor se encontrar ainda em mora: os credores preferentes têm o direito a entrar no concurso de credores ainda que não estejam vencidos os seus créditos.

  12. No caso dos presentes autos, por escritura de mútuo e fiança, o exequente mutuou à co-executada a quantia de € 256.691,87 por um determinado prazo, tendo sido acordado o respetivo reembolso em prestações mensais e sucessivas que se iriam vencendo ao longo do prazo acordado.

  13. Sendo certo que, o facto de ter existido uma execução – no âmbito da qual foi penhorado e vendido o imóvel dado em hipoteca para garantia do crédito exequendo, e na sequência da abertura do concurso de credores, o exequente ter sido “obrigado” a aí reclamar o seu crédito sob pena de perder a garantia de que dispunha, e de, na sequência de tal reclamação, o seu crédito ter sido parcialmente satisfeito pelo produto do imóvel dado em hipoteca – não beliscaria, por si só, o benefício do prazo concedido à mutuária.

  14. Também é certo que, o Banco fez constar da cláusula décima do contrato de mútuo que “A presente hipoteca poderá ser executada:(…) b. “se o imóvel ora hipotecado vier a ser alienado, onerado, arrendado total ou parcialmente, objeto de arresto, execução ou qualquer outro procedimento cautelar ou ação judicial, casos em que se consideram igualmente vencidas e exigíveis as obrigações que assegura.” O) Tal cláusula atribuiu ao Banco a “faculdade” de resolução do contrato no caso de vir a ocorrer a apreensão do imóvel, sendo que a intenção ou decisão de resolver o contrato com tal fundamento só é eficaz se comunicada à parte contrária (artigo 224º do CC).

  15. Ora, sendo a dívida reduzida por força do pagamento ocorrido na referida execução, o executado, ora recorrente, poderia continuar a usufruir do plano de pagamento acordado, a não ser que a exequente tivesse exercido o direito de resolução que lhe é conferido pelo contrato em caso de penhora do imóvel hipotecado, resolução que a exequente não alega ter efetuado (nem no requerimento executivo inicial, nem na contestação que deduz aos embargos).

  16. Sem conceder, sempre se dirá que, o simples facto de não ser paga atempadamente uma das prestações acordadas não importa o vencimento “automático” das restantes.

  17. O artigo 781º do CC, ao determinar que a falta de pagamento de uma das prestações importa o vencimento imediato das restantes, deve ser interpretado no sentido de que o inadimplemento do devedor gera o direito do credor de exigir dele a satisfação daquelas prestações, e não no sentido de que o não pagamento de uma das prestações no prazo acordado determina, por si só a entrada em mora quanto ao cumprimento das demais[.

  18. O referido artigo atribuiu ao credor uma mera faculdade, que o credor pode exercer ou não.

  19. Pode optar por esperar mais uns meses, confiando que a dificuldade de pagamento seja temporária e que o devedor tenha capacidade económica para retomar o pagamento regular das prestações acordadas.

  20. Alega a Exequente no seu requerimento executivo que “Os Executados não pagaram a prestação vencida em 25 de Novembro de 2013, quanto a cada empréstimo…” e que “O valor global reclamado nos referidos autos foi parcialmente amortizado, tendo ficado reduzido ao montante de capital…”, pelo que, “O Banco Exequente tem, pois, o direito de haver de todos os Executados, em regime de solidariedade, e estes têm a obrigação de pagar-lhe o remanescente do capital em dívida acrescido dos respectivos juros…”.

  21. Daqui retira-se a conclusão que o Banco terá pretendido exercer a faculdade que lhe era conferida pela cláusula 10ª, alínea a) do documento complementar ao contrato de mútuo e pelo artigo 781º, de vencimento imediato das prestações restantes.

  22. No entanto, atento o exposto, o exercício de tal faculdade sempre se encontraria dependente da interpelação do devedor, ou seja, da comunicação ao devedor de face ao não pagamento de determinadas prestações, considerou, ou iria considerar, vencidas todas as demais.

  23. O que não veio a acontecer, conforme se alcança dos factos não provados, o Exequente/Embargado não fez prova desse facto (sendo certo que era a este a quem incumbia o ónus da prova).

  24. Se por hipótese tal comunicação tivesse sido efetuada á executada C. A. (o que nem sequer está alegado), e que terá ocorrido o vencimento antecipado das restantes prestações acordadas, levantar-se-á, então, a questão de saber se tal perda de prazo acarretaria, sem mais, tal efeito, relativamente ao fiador.

  25. Ora, diz-nos a jurisprudência dominante que a necessidade de notificação do fiador é essencial, especialmente naqueles casos em que, por haver renúncia ao benefício de excussão se entende que o fiador é um coobrigado e que responde ao lado do devedor principal.

    A

  26. Tal entendimento encontra o seu apoio no artigo 782º do Código Civil e na doutrina de Fernando de...

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