Acórdão nº 125/20.6T8AMR-G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 20 de Maio de 2021
Magistrado Responsável | JOSÉ ALBERTO MOREIRA DIAS |
Data da Resolução | 20 de Maio de 2021 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES Relatório L. T.
e mulher, E. T., residentes na Rua … Amares, instauraram a presente ação declarativa de simples apreciação, com processo comum, contra Banco ..., S.A., com sede na Rua … Porto, pedindo que se declare a extinção das obrigações assumidas pelos Autores relativamente ao Réu e, por efeito, seja oficiado à Central de Responsabilidades de Crédito a eliminação de todos os registos de incumprimento das responsabilidades assumidas pelos Autores a favor do Réu.
Para tanto alegam, em síntese, terem constituído em 2001, a sociedade “X – Sociedade de Construções, Lda.”, de quem foram sócios e gerentes desde a data da sua constituição até 28/02/2008, altura em que essa sociedade foi declarada insolvente; Em 08/05/2006, o Réu celebrou com aquela sociedade um contrato de abertura de crédito de conta dinâmica, mediante o qual lhe concedeu uma facilidade de crédito, sob a forma de conta corrente caucionada, no montante de 200.000,00 euros; Para garantia do cumprimento das obrigações assumidas pela sociedade emergentes desse contrato, foi entregue ao Réu uma livrança em branco, subscrita pela sociedade e avalizada pelos Autores, ficando o Réu autorizado, em caso de incumprimento do identificado contrato, a preencher essa livrança pelo valor que então se encontrasse em dívida; Acontece que a sociedade não pagou nenhuma das prestações emergentes daquele contrato, pelo que o Réu considerou-o como definitivamente incumprido e vencidas todas as prestações dele emergentes e preencheu a livrança, apondo-lhe como data de vencimento o dia 30/07/2008, e como montante em dívida 214.480,05 euros; Apresentada essa livrança a pagamento, a mesma não foi liquidada pela sociedade, sequer pelos Autores; Em 06/11/2006, o Réu concedeu à mesma sociedade um outro empréstimo, sob a forma de conta corrente, de 100.00,00 euros, e para garantia do cumprimento das obrigações assumidas pela sociedade emergentes desse contrato, esta subscreveu uma livrança em branco, avalizada pelos Autores, ficando o Réu autorizado a preenchê-la, em caso de incumprimento; Esse contrato não foi cumprido, pelo que em 07/07/2008, o Réu deu aquele por definitivamente incumprido e vencidas todas as prestações dele emergentes e preencheu a livrança, apondo-lhe a quantia de 30.796,75 euros; Uma vez apresentada essa livrança a pagamento, a mesma não foi paga pela sociedade subscritora, sequer pelos Autores; A sociedade “X” foi declarada insolvente em 25/02/2008; Em 05/12/2008, o Réu instaurou execução contra os Autores, dando à execução as duas mencionadas livranças, mas essa execução foi declarada extinta, por deserção, em 15/07/2014; Em 18/11/2015, os próprios Autores foram declarados insolventes, tendo essa insolvência sido qualificada como culposa e foi indeferido o pedido de exoneração do passivo restante; Nessa insolvência, o Réu reclamou o crédito global sobre os Autores (aí insolventes) de 647.717,67 euros, mas esse crédito não chegou a ser julgado verificado e graduado, dado que o processo de insolvência foi encerrado por insuficiência da massa; O crédito do Réu sobre os Autores decorrente da conta corrente caucionado mostra-se vencido desde 29/02/2008, e o crédito decorrente do empréstimo sob a forma de conta corrente venceu-se em 06/01/2008; Por sua vez, o Réu apôs naquelas livranças avalizadas pelos Autores, como data de vencimento, respetivamente, o dia 07/07/2008 e 30/07/2008; À data da reclamação de créditos no processo de insolvência em que eram devedores/insolventes os aqui Autores, encontravam-se decorridos mais de sete anos sobre a data de vencimento das obrigações em causa; Volvidos mais de três anos desde a data da declaração da insolvência dos Autores, o Réu não instaurou contra aqueles, nenhuma ação para ver o seu crédito reconhecido e obter a condenação dos últimos ao respetivo pagamento; A ação executiva que o Réu instaurou contra os Autores encontra-se extinta, por deserção, há mais de seis anos; O crédito do Réu sobre os Autores, enquanto avalistas da sociedade “X”, encontra-se, assim, prescrito, não podendo já ser reclamado judicialmente dos mesmos; Acontece que o Réu comunicou os incumprimentos decorrentes da falta de pagamento das prestações vencidas em cada um dos mencionados contratos à Central de Responsabilidade de Crédito do Banco de Portugal, quer quanto à sociedade “X”, quer em relação aos Autores, estes na qualidade de avalistas; Apesar das responsabilidades dos Autores se encontrarem extintas, por prescrição, continuam registadas e publicitadas naquela Central de Responsabilidade de Crédito, o que lhes causa prejuízos vários.
O Réu contestou aceitando os factos alegados pelos Autores e que os créditos que detém sobre os últimos, enquanto avalistas da sociedade “X”, se encontram prescritos, mas sustenta que não existe fundamento legal para a procedência da ação, isto porque “não é por estar completado o decurso do tempo que leva à prescrição, que o devedor se pode opor ao cumprimento por ter acontecido a extinção do direito, mas única e simplesmente por não poder ser-lhe civilmente exigível, por ter ficado destituído da respetiva tutela jurídica; o direito permanece, embora a correspondente obrigação passa a ser natural; a prescrição não faz extinguir o direito, mas apenas impede o seu exercício judicial”, concluindo que “o decurso dos prazos prescricionais invocados pelos Autores não tiveram como consequência a extinção do respetivo direito na titularidade do Banco aqui Réu e, por isso, não tiveram como efeito a extinção das obrigações ou das responsabilidades assumidas pelos Autores”.
Mais advoga que o dever de comunicação ao Banco de Portugal e à Central de Responsabilidades de Crédito, continua a existir em relação a responsabilidades, dívidas e obrigações que tenham prescrito.
Conclui pedindo que a ação seja julgada improcedente.
Por requerimento entrado em juízo em 18/09/2020, intitulado de “Resposta”, os Autores expuseram os argumentos jurídicos que, na sua perspetiva, levam que a argumentação jurídica aduzida pelo Réu na contestação não proceda e antes demandam que se conclua pela procedência da presente ação.
Por despacho de 21/09/2020, o Juízo Local Cível de Amares, fixou o valor da presente causa em 312.350,63 euros e, declarou aquele tribunal incompetente, em razão do valor, para conhecer da presente causa, declarando competente para o efeito o Juízo Central Cível da Comarca de Braga.
Transitado em julgado essa decisão e remetidos os autos para o Juízo Central Cível de Braga, em 30/01/2021, proferiu-se despacho em que não se admitiu a “resposta” apresentada pelos Autores por ser legalmente inadmissível, e determinou-se que, após trânsito, essa resposta fosse desentranhada dos autos e devolvida ao respetivo apresentante.
Mais se dispensou a realização de audiência prévia e proferiu saneador-sentença, em que se julgou a presente ação improcedente, constando esse saneador-sentença da seguinte parte dispositiva: “Pelo exposto, julga-se a ação improcedente e, consequentemente, não se declara a extinção das obrigações assumidas pelos autores relativamente ao réu, nem se determina a notificação da “Central de Responsabilidade de Crédito” para proceder à eliminação de todos os registos de incumprimento das responsabilidades assumidas pelos autores a favor do réu.
*Custas pelos autores – artigo 527º, n.ºs 1 e 2, do Cód. Proc. Civil Valor da ação: €312.350,63.
Registe e notifique”.
Inconformados com o assim decidido, os Autores interpuseram o presente recurso de apelação, em que formulam as seguintes conclusões: 1.ª - O tribunal a quo não esteve bem ao não admitir o seu requerimento apresentado ao abrigo do direito ao contraditório porque, diferentemente do que parece ter sido o seu entendimento, o requerimento em causa não configura qualquer réplica e os recorrentes não poderiam ter respondido à contestação do recorrido nem na audiência prévia, nem na audiência final, porque o tribunal decidiu o mérito da ação logo após a fase dos articulados - vd. n.ºs 3 e 4 do art.º 3.º e arts. 552.º, 569.º e 584.º do CPC 2.ª - Ao decidir como decidiu, o tribunal de 1.ª instância contrariou jurisprudência anterior, desconsiderou os efeitos da prescrição e desvirtuou o regime das obrigações naturais, permitindo que o recorrido exerça tutela privada não permitida por lei e que coaja os recorrentes a liquidarem o seu crédito prescrito - vd. arts. 402.º, 403.º e 404.º do CC - vd. Ac. do TRL de 24.11.2016, proc. n.º 1301/13.3TJLSB.L1.-2 - vd. Antunes Varela, As Obrigações em Geral, vol. I, 10.ª ed., 2003, pp. 734 -736 3.ª - O recorrido estava legalmente obrigado a comunicar a prescrição do seu crédito relativamente aos recorrentes à Central de Responsabilidades de Crédito na parte relativa à descrição da “situação do crédito” - vd. ponto 5.2 da Instrução n.º 21/2008 do Banco de Portugal 4.ª - Uma vez que o crédito do recorrido está reconhecidamente prescrito, não deve o mesmo continuar a constar da “lista negra”, devendo enquadrar-se no conceito de “dívidas perdoadas pelas entidades participantes”, e, como tal, excluídas de qualquer tipo de comunicação à Central de Responsabilidades de Crédito - vd. alínea i. do ponto 3.3.1 do ponto 3.3 da Instrução do Banco de Portugal n.º 17/2018 5.ª - Mas mesmo que assim não se entendesse, sempre se deverá concordar que as dívidas prescritas não integram o conceito de saldo decorrente de qualquer uma das operações de crédito previstas no n.º 2 do art.º 3.º do DL n.º 204/2008 6.ª - A decisão merece ainda reparo na parte em que firmou que o tribunal não tem legitimidade/competência para oficiar à Central de Responsabilidades de Crédito pela eliminação dos registos de incumprimento das responsabilidades assumidas pelos recorrentes para com o recorrido, porque impediu a efetivação do direito dos recorrentes, deixando à inteira disposição do recorrido a comunicação da prescrição da dívida e permitindo a continuação de uma atuação abusiva e de tutela...
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