Acórdão nº 6946/19.5T8VNF-A.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 06 de Maio de 2021

Magistrado ResponsávelMARIA JOÃO MATOS
Data da Resolução06 de Maio de 2021
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES I - RELATÓRIO 1.1.

Decisões impugnadas 1.1.1. I. V.

(aqui Recorrente e Recorrida), residente na Rua …, em Vila Nova de Famalicão, propôs a presente acção declarativa, sob a forma de processo comum, contra Sociedade Predial e Agrícola dos Viveiros X, Limitada (aqui Recorrida e Recorrente), com sede na Avenida …, Vila Nova de Famalicão, pedindo que: · se declarassem nulas, ou subsidiariamente, se anulassem, as deliberações aprovadas na sessão extraordinária da assembleia geral da Ré, realizada no dia 18 de Outubro de 2019 (nomeadamente, as relativas à recusa de exercício do seu direito de exoneração de sócia respectiva e de alteração do artigo 3.º do Pacto Social, repristinando anterior redacção do mesmo).

Alegou para o efeito, em síntese, ser titular de participações sociais no capital da Ré.

Mais alegou que, tendo sido realizada, no dia 18 de Outubro de 2019, uma sessão da sua assembleia geral extraordinária, foram aprovadas na mesma diversas propostas, nomeadamente pertinentes à recusa do seu pedido de exoneração de sócia respectiva, de instauração em juízo de uma acção com vista a reconhecer a inexistência desse seu direito, de revogação de prévia alteração do artigo 3.º do Pacto Social (repondo a sua redacção primitiva), e de instauração em juízo de uma acção com vista ao reconhecimento da legalidade de outras deliberações prévias (tomadas noutra ocasião).

Por fim, alegou padecerem tais deliberações de aprovação de diversos vícios (tal como outras anteriores, já impugnadas em acção prévia e própria, tendo ainda requerido a dissolução e liquidação administrativa da Ré, na Conservatória do Registo Comercial ...), nomeadamente por serem insanavelmente abusivas (visando apenas a satisfação dos sócios que as votaram, em prejuízo da Sociedade e dela própria) e ilegais (incluindo a reclamação de um efeito retroactivo, que não podem possuir); e terem, por isso, que ser consideradas nulas, ou - subsidiariamente - anuláveis.

1.1.2.

Regularmente citada, a Ré (Sociedade Predial e Agrícola dos Viveiros X, Limitada) contestou, pedindo que: · se declarasse suspensa a instância, por pendência de causas prejudiciais; · e (não ocorrendo, com a decisão de causa prejudicial, a extinção desta instância, por inutilidade superveniente da lide) se julgasse a acção improcedente (fosse por procedência das excepções deduzidas, fosse por falta de prova dos fundamentos alegados pela Autora), sendo ela própria absolvida do pedido.

Alegou para o efeito, em síntese, encontrarem-se já pendentes duas acções judiciais, uma com vista à anulação de prévias deliberações suas (propostas pela Autora) e outra com vista à apreciação da validade formal e substantiva do pedido de exoneração de sócia formulado por aquela (proposta por si própria); e ainda um processo administrativo de dissolução e liquidação respectiva (proposta pela Autora).

Mais alegou consubstanciarem tais acções e processo administrativo causas prejudiciais do conhecimento de mérito nos presentes autos, que por isso deveriam ser conformemente suspensos.

Alegou ainda a Ré agir a Autora nestes autos em manifesto abuso de direito, nomeadamente ao pretender simultaneamente a sua exoneração de sócia respectiva e o reconhecimento da invalidade da deliberação social que repristinou a redacção inicial do artigo 3.º do Pacto Social (quando foi fundada na sua alteração que requereu a dita exoneração); e não ter alegado facto, ou factos suficientes, para fundarem a sua pretensão (limitando-se a lançar suspeições, e a imputar intenções, aos seus demais sócios e gerentes).

Por fim, a Ré impugnou a maioria da factualidade alegada pela Autora, para fundar o seu pedido (nomeadamente, a imputação de propósitos e intenções aos seus sócios gerentes, que votaram favoravelmente as deliberações impugnadas).

1.1.3.

A Autora (I. V.) respondeu, pedindo que as excepções deduzidas fossem consideradas improcedentes; e reiterando o seu pedido inicial.

Alegou para o efeito, em síntese, não consubstanciarem as demais acções judiciais e o processo administrativo pendente causas prejudiciais em relação aos presentes autos (podendo quanto muito estes consubstanciarem causa prejudicial em relação à acção proposta pela Ré, com vista ao reconhecimento da inexistência do seu direito a exonerar-se dela); e ter aduzido suficiente matéria de facto para fundar o seu pedido (como desde logo resultaria da extensão da impugnação que lhe foi feita pela Ré).

1.1.4.

Em sede de audiência prévia, foi proferido despacho: fixando o valor da causa em € 30.000,01; e saneador, em que nomeadamente se indeferiu o pedido de suspensão da instância (por pendência de causa prejudicial) e se conheceu parcialmente do mérito da causa (julgando improcedente o pedido de declaração de nulidade das deliberações tomadas na assembleia geral extraordinária da Ré, realizada no dia 18 de Outubro e 2019, e aqui impugnadas), lendo-se nomeadamente no mesmo: «(…) Da questão prévia da existência de causas prejudiciais que impliquem a suspensão da presente instância: (…) Conhecendo: Vejamos, em primeiro lugar, a alegada prejudicialidade decorrente da pendência do Processo Administrativo de Dissolução e Liquidação.

Ora, resulta da informação pedida pelo Tribunal que, efectivamente, deu entrada na Conservatória do Registo Comercial ... um processo administrativo de dissolução e liquidação apresentado pela aqui Autora. Nesse processo não foi proferida qualquer decisão.

Relembremos que as sociedades comerciais se extinguem apenas com o registo do encerramento da liquidação.

Ora, não vemos como a pendência do processo administrativo de dissolução possa ser considerada uma causa prejudicial, tendo em conta o objecto destes autos. De facto, poderá acontecer, no futuro, que a sociedade seja dissolvida e liquidada. O que importaria a inutilidade superveniente da presente lide, caso ainda estivesse pendente. No entanto, enquanto tal não acontecer, inexiste qualquer fundamento legal para fazer cessar o andamento destes autos. Não acompanhamos, pois, a Ré quando esta afirma que a apreciação do pedido aqui deduzido é inútil. Pelo contrário: o conhecimento desta causa mantém plena utilidade.

*O que dizer, agora, da necessidade de suspender estes autos, aguardando-se pelo desfecho do processo n.º 6653/19.9T8VNF? Ora, como nos parece claro, aquele pleito trata-se da ação cuja interposição foi objecto de deliberação e de aprovação na assembleia de 18/10/2019 e cuja validade está aqui a ser discutida. Não vemos que o desfecho daqueles autos impeça o andamento destes.

Pelo contrário: Eventualmente, o apuramento da (i)legalidade da deliberação aqui em crise poderá ter efeitos na tramitação daqueles autos.

*Por fim, resulta dos autos que corre termos no Juiz 2 deste Tribunal acção de impugnação de deliberações sociais, em que é Autora a aqui Autora e Ré a aqui Ré, no âmbito da qual a primeira pede que o Tribunal declare nulas ou anuláveis as deliberações sociais tomadas nas assembleias gerais da Ré de 25/6/2019 e de 11/7/2019. Uma das deliberações aqui em crise reporta-se à revogação de uma das deliberações cuja legalidade está ali a ser discutida (a alteração do objecto social). Uma vez mais, considera-se que não existe qualquer fundamento que justifique a suspensão destes autos, podendo-se, eventualmente, entender naqueloutros que a decisão aqui a tomar se repercute no seu desfecho. No entanto, não nos cabe a nós tomar posição quanto a essa questão.

Improcede, pois, o pedido de suspensão da presente instância, atenta a inexistência de qualquer causa prejudicial.

*(…) O estado dos autos permite conhecer, desde já, de parte do mérito da causa que se prende com o pedido de declaração de nulidade das deliberações sociais identificadas pela Autora e tomadas na assembleia geral da Ré de 18/10/2019.

Objecto do litígio: O objecto do litígio centra-se na verificação dos pressupostos legais que permitiriam a declaração de nulidade das deliberações sociais identificadas pela Autora no artigo 336.º da petição inicial, tomadas na assembleia geral de 18/10/2019.

(…) Ora, apenas no artigo 333.º da petição inicial, a Autora inicia a sua alegação relativamente às deliberações que aqui estão em crise. Nesses últimos artigos, até final, não invoca qualquer facto que pudesse ser subsumível à violação dos bons costumes na acepção supra enunciada.

Por outro lado, não indica qualquer preceito legal imperativo que tenha sido violado e que o não pudesse ser, mesmo com a vontade unânime dos sócios. Na verdade, a menção vaga à alteração da ordem de trabalhos não importa a violação de qualquer norma imperativa. Em primeiro lugar, o artigo 378.º do CSC por ela citado reporta-se à inclusão de novos assuntos na ordem do dia e não ao englobamento das matérias agendadas no segundo a quinto pontos da ordem do dia. Em segundo lugar, a unificação daqueles pontos da ordem de trabalhos foi proposta pelo sócio C. M. que presidiu à assembleia por ser aquele que possuía uma maior fracção de capital (cfr. artigo 248.º, n.º 4 do CSC). Ora, o presidente da mesa está ”vinculado, nos termos da lei, a respeitar o thema deliberandum que lhe tenha sido requerido” (cfr. Pedro Maia, O Presidente das Assembleias de Sócios, Problemas do Direito das Sociedades, Almedina, pág. 442) e cabe-lhe zelar pelo regular e ordenado decurso da reunião da assembleia geral (cfr., pág. 466). O Presidente “pode livremente decidir pôr à discussão, simultaneamente, dois ou até mais assuntos que se encontrem ligados entre si” (cfr. op. cit., pág. 454) e a assembleia pode deliberar, por maioria simples, a votação conjunta de pontos da ordem do dia, desde que não viole direitos individuais dos sócios (cfr., op. cit., pág. 467).

Alicerçando-nos nestas considerações, não vislumbramos que tenha sido violada qualquer norma imperativa que respeitasse à alteração/unificação de diferentes pontos da ordem de trabalhos.

Em suma: a Autora não alega factos que pudessem necessitar de prova...

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