Acórdão nº 7129/18.7T8BRG.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 06 de Maio de 2021

Magistrado ResponsávelLÍGIA VENADE
Data da Resolução06 de Maio de 2021
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES . I RELATÓRIO (reproduzindo o elaborado em 1ª instância, que não obstante a sua extensão permite perceber a posição das partes nos articulados com relevo para a compreensão da decisão).

“- ARQUIDIOCESE ..., pessoa colectiva de direito canónico NIF ………, com sede na Rua … Braga, instaurou a presente acção declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, contra: - MUNICÍPIO ..., autarquia local de natureza territorial NIF ……… com sede na Praça …, pedindo que sendo julgada procedente a acção se declare que: a) A Autora é a exclusiva e legítima dona do prédio denominado “Parque de ...”, situado no Lugar de ..., União das Freguesias de ... e ..., concelho de Braga, descrito na 2.ª C.R.Predial ... sob o n.º ...... (anterior descrição predial n.º .... no Lº-...) e inscrito na matriz sob o art. .....º (anterior art. ....º, que teve origem no pretérito art. ...º), com a área de 24.000 m2, composto ao centro pela Capela de ... e respectivo alpendre, e ainda espalhados pelo logradouro da capela, por um cruzeiro, um edifício social, um coreto e um quiosque, alminhas e um lago; b) É ilícita e abusiva a utilização e parcial ocupação que o Réu faz desse prédio; c) O Réu está obrigado a abster-se de utilizar, fruir, usar e ocupar esse prédio; d) O Réu está obrigado a abster-se de perturbar o gozo, fruição, uso e utilização que a Autora vem fazendo e continuará a fazer desse prédio; e) O Réu está obrigado a restituir à Autora a parte do prédio que ocupou com parque de estacionamento no estado em que se encontrava, livre e devoluto de pessoas e bens.

- se condene o réu a: a) A restituir à Autora a identificada parte do prédio ora reivindicado, livre e devoluta de pessoas e bens.

Para justificar a sua pretensão alegou, em síntese, que é legítima dona e proprietária do prédio denominado “Parque de ...”, situado no Lugar de ..., União das Freguesias de ... e ..., concelho de Braga, descrito na 2ª Conservatória de Registo Predial ... sob o n.º …. (que corresponde à anterior descrição predial nº .... no Lº- ...) e inscrito na respectiva matriz predial sob o artigo urbano ....º (anterior artº ...º urbano, que teve origem no pretérito art.º ....º).

Esse prédio tem a área de 24.000 m2 (área coberta de 729,80 m2 e área descoberta de 23.270,20 m2) e é composto, ao centro, pela Capela de ... Batista e respectivo alpendre, e ainda espalhados pelo logradouro da capela, por um cruzeiro, um edifício social, um coreto e um quiosque, alminhas e um lago.

Este prédio sempre esteve delimitado, desde o início do Estado Novo (1926) com um muro em toda a sua extensão.

O direito de propriedade deste prédio, com a área total de 24.000 m2, está inscrito em nome da Fábrica da Igreja Paroquial de ... – ARQUIDIOCESE ..., na Conservatória do Registo Predial ..., desde 7 de Fevereiro de 2012.

Desde 13.01.1904 que o direito de propriedade deste prédio se encontrava inscrito na Conservatória do Registo Predial ... em nome de Confraria de ..., através da apresentação n.º 3 de 1904.01.13, pessoa jurídica de direito canónico extinta por decreto do Arcebispo Primaz de ... de 13.01.2013.

Por via desse decreto, os respectivos bens integraram-se na Fábrica da Igreja da Paróquia de ..., pertencente ao Arciprestado de ... e ARQUIDIOCESE ....

Independentemente da presunção decorrente do registo, a verdade é que esse prédio sempre pertenceu e pertence à autora, desde tempos imemoriais, há mais de 30, 40, 50 e mais anos.

A Capela de ..., situada no aludido prédio foi construída em 1490, dela fazendo parte o respectivo adro circundante (o Parque de ...).

Desde o Séc. XV e até ao Séc. XIX a Igreja Católica foi proprietária dessa Capela de ... e Parque de ... (adro da capela e zona circundante), tendo os respectivos uso e fruição.

Aliás, o Parque de ... integrava a Quinta ..., que foi no Século XIX e parte do Século XX, o espaço reservado para o Arcebispo ... ocupar durante o período das férias estivais.

O Parque de ... e sua Capela de ... esteve inscrito na matriz predial urbana da freguesia de ... sob o artigo n.º ..., em nome da Confraria de ... desde 1904 e afecta à Fábrica da Igreja Paroquial de .... A área envolvente à capela - adro da capela e zona circundante, estava inscrita sob os artigos rústicos nºs .. (área 9.900 m2) e 27 (área 18.200 m2.), com a área total de 28.100 m2.

Por força da fusão das freguesias de ... e ... do Souto, foi criada a União das Freguesias de ... e ..., a partir de 2013, da qual o Parque de ... faz parte integrante, ficando o prédio inscrito na matriz desta União de freguesias.

Assim, por si e por antepossuidores, mercê de válidas e sucessivas transmissões, está a autora, na qualidade de proprietária, na legítima posse e detenção do referido prédio, ininterruptamente e há 10, 15, 20, 30 e mais anos.

Assim o fruindo, administrando e transformando, à vista de todas as pessoas, como se fosse coisa sua, na certeza e convicção de que não lesa direito alheio, e sem oposição ou restrição por parte de quem quer que seja.

A autora vem pagando taxas e impostos relativamente ao mencionado prédio, e requereu isenção de IMI à Autoridade Tributária, invocando a Concordata.

A autora paga a energia eléctrica e a água que consome no aludido prédio, e para lá requisitou os contadores de água e energia eléctrica.

Desde tempos imemoriais a Capela de ... e sua zona envolvente vem sendo utilizada pela Igreja Católica, para o culto religioso designadamente para o culto católico. O que sucedia semanalmente, ano após ano e nas festas católicas.

Desde então e até hoje, os sacerdotes e os fiéis católicos continuam a utilizar essa Capela de ..., o adro e zona envolvente do parque para o culto religioso católico.

Desde há décadas, designadamente desde 1943, a autora vem efectuando obras de manutenção e conservação do prédio, suportando os inerentes encargos.

Além disso, a autora efectuou o pagamento de remoção de árvores, recebeu o produto proveniente da venda da madeira resultante do abate das árvores ali existentes. E procedeu a cortes e à poda de árvores circundantes à capela.

Há alguns anos, a autora chegou a determinar o encerramento da feira à volta da Capela e colocou um funcionário a vigiar o local.

Em 2001 o pároco de ..., na qualidade de proprietário do prédio, solicitou à Câmara Municipal ... a colaboração a título gratuito no arranjo da parte exterior do Parque de ... e que procedesse à poda da copa de algumas árvores (tílias) implantadas na zona envolvente da capela (adro).

A Câmara Municipal ... encarregou uma equipa de técnicos para proceder à poda dessas árvores, a pedido desse pároco da paróquia de ....

No entanto, como esses técnicos em vez de podarem as árvores procederam ao seu abate, o pároco de ... apresentou queixa e protestou junto do Presidente da Câmara Municipal, o qual veio a determinar a abertura de um processo de inquérito, o qual terminou com um despacho de instauração de processo disciplinar contra o funcionário camarário responsável pelo abate das árvores.

O pároco de ... procedeu ainda à venda, a um madeireiro, da madeira dessas árvores abatidas, e que estavam implantadas na zona envolvente da Capela de ... (adro) no prédio da autora.

Entretanto, há cerca de 10 anos, um ramo de uma árvore implantada na zona envolvente da capela caiu sobre um veículo de um transeunte, que a autora teve que indemnizar, porque o MUNICÍPIO ... lhe remeteu a responsabilidade pelo pagamento de prejuízos causados pela queda dessa árvore.

Em 2016 o Arciprestre da Igreja Ortodoxa em Portugal solicitou à autora a edificação de um monumento aos mortos que veio a ser construído no Parque de ..., por autorização da autora.

Em 21.02.2014 a autora e a “X – Associação Portuguesa de X” celebraram contrato de comodato ou de concessão de utilização do ajuizado prédio, por dois anos, para desenvolver no prédio actividades desportivas.

Sucede que no dia 13.04.2018 o MUNICÍPIO ... procedeu a ocupação de parte do prédio do Parque de ..., na zona envolvente à Capela de ... (adro). E, nas traseiras do monumento ao 25 de Abril e no acesso à Capela de ..., instalou um barracão, onde manteve durante o dia um guarda, como vigilante das viaturas que pretendem estacionar no Parque.

Aliás, o réu instalara em parte do Parque de ... um parque de estacionamento para o público, delimitando-o fisicamente do resto do prédio da autora. O que fez, usando e utilizando o prédio da autora, além de ter colocado uma nova rede de vedação nesse parque de estacionamento.

Já em 9.08.2011 o MUNICÍPIO ... iniciou a realização de obras de requalificação, designadamente, dos pavimentos e espaços verdes, no “Parque de ...”. E. no dia 11.8.2011, o réu aplicara vedação em malha sol escorada por traves de madeira, de modo a cercar parte da zona do “Parque de ...”, limitando o seu acesso através de porta com fechadura. E colocara máquinas no local e, pelo menos, um contentor de obras no mesmo espaço.

O que obrigou a ARQUIDIOCESE ... a interpor uma providência cautelar de embargo de obra nova contra o MUNICÍPIO ..., que correu termos sob o n.º 5393/11.1TBBRG pelo 3.º Juízo Cível de Braga em 9.08.2011.

* A ré contestou alegando, em suma, que desde pelo menos os inícios de 1800 que o Parque de ... (doravante apenas Parque) constituía um espaço de livre acesso ao público, sem restrições, e era mantido, conservado e cuidado exclusivamente pela Câmara Municipal ....

Naquele período pelo Parque passava a estrada que ligava Braga a Guimarães, sendo que ainda existiam duas pontes que faziam a travessia do Rio Este, uma delas (a mais pequena) entretanto desaparecida.

Era a Câmara Municipal ... quem fazia a limpeza do local, a conservação, a poda de árvores, o ajardinamento, a pavimentação de vias, a colocação de passeios, etc., tudo para o melhor usufruto possível do público, que ali acedia indiscriminadamente e sem autorização de quem quer que fosse.

O Parque sempre esteve separado da Quinta ..., não sendo nem nunca tendo sido sua parte integrante.

Em...

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