Acórdão nº 1040/10.7TBVVD-F.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 02 de Dezembro de 2021

Magistrado ResponsávelLÍGIA VENADE
Data da Resolução02 de Dezembro de 2021
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam os Juízes da 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães: I RELATÓRIO.

Nos presentes autos de prestação de contas relativas ao processo de insolvência da sociedade CONSTRUTORA ...

, LDA., veio a Sra. Administradora de Insolvência Dra. M. C. apresentar contas, nos termos do artº. 62º, nºs. 2 e 3, do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas (CIRE). Do mapa então apresentado consta, além do mais, valores referentes a honorários de contabilidade e honorários de perito avaliador.

Cumprido o artº. 64º, nº. 1, do CIRE, e apresentados os autos ao M.P., este promoveu que “se notifique o Ex.ma AI para vir aos autos em 10 dias: - juntar um “resumo de toda a receita e de toda a despesa” que relacionou na conta corrente, como o prescreve o artigo 62º, nº 3 do CIRE, do qual possa extrair-se a justificação para tão elevadas despesas, designadamente com auxiliares; - demonstrar a existência de prévia autorização expressa da comissão de credores para o seu recurso a auxiliares a expensas da massa insolvente e das condições em que o fez; - juntar notas de honorários e faturas/recibos do patrocínio judiciário obrigatório;”.

Em resposta veio a Srª Administradora dizer: “Relativamente aos serviços do Contabilista Certificado (CC), informa-se que de forma a dar pontual cumprimento às obrigações fiscais junto da Autoridade Tributária, a massa insolvente manteve os serviços prestados pelo CC da sociedade. Quanto a esta matéria, informa-se V. Exa. que, tal facto foi devidamente reportado aos autos, por via do estado da liquidação já supra identificados sob o n.º Doc.8 e Doc.9), não tendo, salvo, manifesto lapso, sido alvo de oposição por parte de nenhum dos credores. Aliás, como é sabido a Autoridade Tributária impõem que os administradores de insolvência apresentem a declaração de alterações modelo 1887 (leia-se: declaração de alterações de atividade) e deem cumprimento às obrigações em sede de IRC, designadamente, as previstas no art.º 89.º, art.º 104, n.º 1, art.º 117.º, n.º 1, al.s b) e c) e n.º 10, art.º 118.º, n.ºs 5 e 7, art.º 120.º, art.º 121.º e art.º 123.º do CIRC e as obrigações em sede de IVA, designadamente, as previstas no art.º 32.º, art.º 29.º, n.º 1, al. b) e art.º 3.º e 4.º, art.ºs 19.º a 26.º, art.º 78.º, art.º 44.º, art.º 22.º do CIVA.

Assim, o administrador da insolvência ver-se-ia na contingência de providenciar pela elaboração da contabilidade da insolvente e, neste contexto: remeter todas as declarações fiscais que estejam em falta à data da insolvência; elaborar a contabilidade da insolvente, caso esta não esteja em dia; e continuar a elaborar a contabilidade da insolvente, após a declaração de insolvência, até para análise da mesma e posterior elaboração, se fosse o caso, do relatório sobre o incidente de qualificação de insolvência, que à data de 2011, era de elaboração obrigatária.

Hoje em dia, a signatária já não efetua tal procedimento, pois à data ainda não se encontrava em vigor a atual redação do artigo do artigo 65.º, n.º3 do CIRE, nos termos do qual após a assembleia de credores e com o encerramento da atividade cessam as obrigações declarativas do devedor, pelo que ao administrador competia manter tais ónus, sob pena de responsabilização pessoal e reversão da responsabilidade da devedora. (…) Quanto aos honorários do perito avaliador, a contratação de tais serviços resultou da necessidade de determinar o valor base de venda dos imóveis apreendidos, no sentido de a venda dos mesmos ser projetada por valores adequados aos valores de mercado, uma vez que na sua grande maioria se reportavam a imoveis/lotes de terrenos para construção e terrenos com benfeitorias. Ora, considerando que a signatária não se encontra habilitada para a realização da avaliação de imóveis, esta recorreu à coadjuvação de um Perito Avaliador.

Todavia, vem informar V.Exia que, conforme resulta do documento que se anexa sob o documento n.º 10, agora junto, os membros da comissão de credores foram devidamente notificados pela AJ, no sentido de ratificarem a contratação de tais serviços, realçando-se que nenhum dos membros manifestou oposição, pelo que foi aprovada.” Juntou documentos, constando dos docs. 8 e 9 –informações dirigidas ao processo –que constituiu um TOC para prosseguir com as obrigações fiscais a que a sociedade está obrigada. Consta ainda do doc. 10 –mail dirigido aos membros da comissão de credores informando (além do mais) que recorreu à coadjuvação dos serviços de um perito avaliador no sentido de ser promovida a realização de uma avaliação aos imóveis apreendidos, tendo o respetivo relatório de avaliação sido já remetido; pelo que “requer se dignem no prazo máximo de 5 dias ratificar a contratação dos serviços prestados pelo perito avaliador, e caso não o façam considerará como tácita a ratificação.” O Ministério Público pronunciou-se no sentido da aprovação só parcial das contas, dizendo, além do mais, que: “ Quando existam serviços prestados por terceiros contratados, designadamente para inventariação de bens, contabilidade, avaliação e arquivo, independentemente de os serviços se justificarem ou não, importa apurar se as despesas estão correta e integralmente refletidas na documentação com que o sr. AI instruiu a prestação de contas e se houve lugar ao cumprimento do disposto no artigo 55.º, n.º 3 do CIRE.

Este tem sido, aliás, o rigoroso entendimento deste Tribunal na prática judiciária.

Importa não esquecer que decorre do artigo 55.º do CIRE a ideia da pessoalidade do cargo do administrador, tendo a lei optado por uma solução que favorece o maior controlo da atividade do administrador e do modo do seu exercício, em consonância com a responsabilidade pessoal a que agora irrevogavelmente o submete em conformidade com o artigo 59.º do CIRE.

Ora, no caso dos autos, A Ex.ma AI não solicitou (e por isso não obteve) prévia autorização à comissão de credores (o que ela admitiu no requerimento com a refª 11533661 para contratar os serviços de contabilista, até para cumprir obrigações que não eram responsabilidade da Ex.ma AI mas apenas da pessoa coletiva declarada insolvente e dos seus representantes legais nos termos do artigo 65º, nº 2 do CIRE, desprezando a prescrição do nº 3 do mesmo artigo- cfr. doc 28-399,30€, Doc 135-738,00€, doc 136-307,50€, Doc 157-307,50, Doc. 177-307,50€, Doc 196 - 307,50€, Doc. 222-307,50€, Doc. 236-615,00€, Doc. 247-307,50€, Doc. 248-307,50€, Doc. 258-307,50€, Doc. 264-307,50€, Doc. 283-307,50€, Doc. 284-307,50€, Doc. 299-307,50€, Doc. 300-307,50€, Doc. 330-307,50€, Doc. 331-307,50€ e Doc.332-307,50€) e de perito avaliador (para proceder à avaliação dos imóveis apreendidos para a massa- cfr. Doc nº 139- 1.850,00€).

Assim, estas despesas não se encontram autorizadas.” A insolvente e os credores nada disseram.

*Instruídos os autos, foi proferida decisão que: A. Julgou válidas as contas da administração da massa insolvente da sociedade CONSTRUTORA ...

, LDA. com as seguintes ressalvas: a. O total de despesas da massa é de €373.952,43 (trezentos e setenta e três mil novecentos e cinquenta e dois euros e quarenta e três cêntimos); e, b. O saldo de liquidação é de €392.034,30 (trezentos e noventa e dois mil e trinta e quatro euros e trinta cêntimos).

  1. Autorizou a Sra. Administradora de Insolvência a retirar do saldo de liquidação as quantias de €1.592,06 (mil quinhentos e noventa e dois euros e seis cêntimos) a título de despesas, e de €1.000,00 (mil euros) a título de remuneração fixa, devendo juntar o respectivo recibo aos autos.

*Inconformada, a Srª Administradora apresentou recurso, terminando as alegações com as seguintes -CONCLUSÕES-(que se reproduzem) “1. A AI sempre foi rigorosa e zelosa das suas obrigações, em prol da defesa dos interesses da generalidade dos credores, procurando beneficiar a Massa Insolvente e a sua frutificação em todas as suas condutas.

  1. Exemplo disso foram os juros obtidos com a frutificação do capital em depósitos bancários no valor de quase 7.000,00€ (sete mil euros).

  2. Igualmente sucedeu com a conclusão de obras e trabalhos em curso, pois apesar de ter sido votada a liquidação da empresa, a AI, por decisão conjunta com a Comissão de Credores, levou a cabo a conclusão de algumas obras.

  3. Ora, para conclusão das referidas obras a AI manteve em funções diversos trabalhadores, que executaram os trabalhos, adquiriu bens a fornecedores, entregou as declarações de impostos, IVA, procedeu à declaração das remunerações para a Segurança Social e respetiva liquidação.

  4. Pagamento de salários a trabalhadores. – cfr. documentos da prestação de contas 7 a 18, 22, 23 e 24, 55 a 58, 101 a 104 e 116 a 120 6. Pagamento de contribuições para a segurança social. – cfr. documentos 36 e 78A, da prestação de contas 7. Pagamento de retenções na fonte de salários de trabalhadores. – cfr. documentos 40 e 87 8. Declarações de IRC e IES e pagamentos respetivos. – cfr. documentos 5, 231 e 290 da prestação de contas.

  5. Ou seja, durante este período de conclusão de obras, impôs-se a manutenção duma série de obrigações declarativas, que somente por intermédio de contabilistas poderiam ser cumpridas, por imposição legal, motivo pelo qual se recorreu aos serviços de contabilista para que procedesse ao cumprimento de tais obrigações.

  6. Foi o contabilista contratado quem procedeu à emissão de recibos de vencimento dos trabalhadores, comunicação das remunerações à segurança social, submeteu as declarações IES, declaração de IRC, guias de liquidação de IVA e a AI procedeu ao pagamento das inerentes quantias.

  7. Todas essas despesas foram aprovadas pelo Tribunal sem...

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