Acórdão nº 691/20.6T8VRL.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 02 de Dezembro de 2021

Magistrado ResponsávelMARIA LEONOR CHAVES DOS SANTOS BARROSO
Data da Resolução02 de Dezembro de 2021
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

I.

RELATÓRIO G. M. intentou acção de processo comum contra IRMÃOS ..., Comércio de Veículos Automóveis, S.A.

PEDIDO: condenação da ré no reconhecimento da justa causa que esteve subjacente à resolução do contrato de trabalho que vigorou entre as partes e no pagamento das seguintes quantias: a título de trabalho prestado em dias feriados, dias de descanso semanal complementar e obrigatório € 11.617,60; a título de retribuição pelo trabalho prestado no dias de descanso compensatório não gozado € 2.974,16; a título de diferenças salariais quanto aos subsídios de férias € 3.945,97 e quanto aos subsídios de Natal € 3.217,57 l; a título de horas de formação não ministrada € 234,54 pelas; a título de restituição do valor retido por falta de aviso prévio, que não era devido, € 1.592,38; a título de indemnização à razão de 45dias pela resolução com justa causa que comunicou à aqui R €4.441,3, tudo acrescido de juros de mora.

CAUSA DE PEDIR: celebrou contrato de trabalho com a R. em 01/06/2015, tendo a partir daí passado a desempenhar funções como vendedor de automóveis, da marca SEAT, isento de horário de trabalho, com dois dias de descanso semanal aos fins-de-semana. Acordaram ainda que o A. auferiria a retribuição equivalente ao salário mínimo nacional, acrescida dum suplementar correspondente a 2 horas de trabalho/dia, pela isenção de horário e um subsídio de refeição de € 2,50/dia de trabalho.

Ao longo da vigência do contrato foi sendo obrigado pela R. a prestar trabalho nos dias feriados e aos fins-de-semana e não só este trabalho não era remunerado, como não lhe era permitido gozar dias de descanso compensatório. No ano de admissão, 2015, não lhe foi permitido gozar o seu período de férias e no ano seguinte, 2016, apenas gozou 23 dias úteis de férias, sendo que de acordo com as escalas de serviço que lhe eram comunicadas não lhe era permitido gozar os dias de descanso a que tinha direito.

Face a esta conduta da R. o A. viu a sua vida pessoal afectada, sendo frequente trabalhar 14 dias e 20 dias consecutivos sem qualquer descanso semanal. Quando apresentou queixas à demandada quanto ao gozo do dia de descanso semanal aos domingos, foi por esta acusado de não estar empenhado como os seus colegas na actividade da empresa, tendo sido ainda alvo de condutas que o pretenderam vexar perante os seus colegas e clientes.

Entre estas condutas levadas a cabo pela R. encontra-se a comunicação de que deixaria de fazer parte da equipa comercial da marca SEAT para passar para a secção de usados, o que constituiu uma despromoção, não lhe sendo possível auferir os mesmos montantes a título de comissão que auferia enquanto vendedor da indicada marca. Deixou também a R. de atribuir outras tarefas ao A. que apenas fazia atendimento a clientes que se dirigissem ao stand, não tendo tido acesso a qualquer formação profissional e tendo sido retirado da listagem dos destinatários das comunicações internas.

Ao comunicar à R. que pretendia gozar licença de parentalidade por via do nascimento do seu terceiro filho, recebeu ordens para se deslocar ao seu local de trabalho e deixar a viatura automóvel com que circulava, tendo-lhe sido atribuída outra com cerca de 20 anos e a partir de Maio de 2019 foi-lhe entregue um outro veículo de 2013, tendo até aí circulado sempre com veículos novos, o que motivou a chacota dos seus colegas.

Em face destes comportamentos da R. o A. viu a sua saúde afectada, pelas longas jornadas de trabalho e sem direito aos seus descansos semanais, tendo passado a ficar isolado dos seus colegas, passando a ser humilhado e ridicularizado pela R. o que culminou em 29/12/2019 com um diagnóstico ao A. de quadro de ansiedade com dores, cansaço extremos e variações de humor. O que lhe determinou uma incapacidade para o trabalho entre 31/12/2019 e 28/02/2020, estando a tomar medicação.

Assim, em 28/01/2020 o A. remeteu à R. comunicação escrita de resolução do seu contrato de trabalho invocando justa causa, com efeitos imediatos.

CONTESTAÇÃO: não correspondem à verdade os factos que lhe são imputados. A relação laboral entre as partes decorreu sempre de forma regular até que a demandada decidiu promover a chefia intermédia um colega do A.. Este entendeu que deveria ter sido ele o promovido, passando a causar mal-estar com aquela chefia e deixando de cumprir o seu horário de trabalho, causando queixas dos seus colegas pelo incumprimento de tarefas de que estava incumbido.

Quanto às funções para que foi contratado, o autor foi admitido ao seu serviço para exercer a actividade de venda de automóveis, sem se que tivesse consignado que pertenceria apenas à equipa da SEAT. Quanto ao horário de trabalho ficou acordado com o A. isenção de horário de trabalho. Mas não foi convencionado que os dias de descanso tivessem que corresponder aos fins-de-semana, pelo que o A. trabalhava por vezes aos fins-de-semana, mas gozava os seus dias de descanso compensatório, não existindo um dia fixo de folga. As escalas não traduzem o trabalho efectivamente prestado pelo A. já que eram sujeitas a alterações, não sendo vinculativas e sendo os dias de descanso rotativos entre os vários colaboradores da R.

No que se refere aos dias de férias relativos ao ano de admissão, traduzem-se em 12 dias de férias tendo um deles sido gozado no ano seguinte.

No que concerne às alterações introduzidas nas funções exercidas, o autor, apesar de apresentar bons resultados em vendas, não cumpria diligentemente os seus compromissos profissionais, pelo que se entendeu ser conveniente coloca-lo noutra secção. Passando a reportar directamente ao conselho de administração de forma a evitar conflitos com a chefia intermédia, tendo passado a exercer as suas funções em local que foi considerado como vantajoso para o efeito e sem que ao demandante lhe fosse vedada a venda de veículos novos, sendo que apesar da comissão pela venda de usados ser mais baixa (face à venda de veículos novos) tal não significa que o rendimento fosse necessariamente menor.

Já quanto aos veículos automóveis atribuídos aos vendedores estes ficam dependentes da respectiva venda e daí que vão sendo trocados por outros, pelo que foi solicitada a devolução do veículo utilizado pelo A., sendo a entrega aos vendedores de veículos de retoma para circularem prática corrente na empresa.

Também quanto ao horário de trabalho que o A. pratica, entende a R. que, sendo o mesmo a remeter à direcção da demandada, as escalas com os dias de descanso a gozar, deu o seu assentimento para que estes dias não fossem sempre gozados aos domingos.

Quanto à carta de resolução do contrato de trabalho invoca que parte dos factos constantes da missiva (3, 4, 5, 7, 8, 9, 11, 13, 15, 16, 24, 32, 33, 34,36, 42) são vagos e conclusivos, não contendo a descrição circunstanciada do modo, tempo e lugar, pelo que, consequentemente, não podem ser atendidos os factos plasmados na petição inicial, não sendo, assim, a resolução lícita – 395º, 1, CT.

Arguiu, ainda, a caducidade do motivo invocado pelo A. para a resolução do seu contrato, tendo em muito excedido o prazo de 30 dias consignado no art. 395º nº 2 do CT, pelo que deverá ser julgado extinto o respectivo direito. Não se confirmando a veracidade da factualidade que fundamenta a justa causa invocada, a mesma deverá ser julgada como inexistente, discordando ainda do modo como o demandante calcula das diferenças salariais referentes aos subsídios de férias e de Natal, já que entende que os montantes por aqueles invocados- comissões- não configuram qualquer retribuição, pelo que não deverão integrar estas remunerações.

Ainda que as condutas que lhe são imputadas correspondessem à verdade, não configurariam qualquer assédio moral, pelo que o demandante carece de fundamento para a justa causa em que baseou a resolução do seu contrato de trabalho, não tendo tido qualquer contacto prévio à resolução com a sua entidade empregadora no sentido de apresentar qualquer reivindicação que entendesse ser justa e apresentando a imediata cessação do seu vínculo laboral.

Os pedidos deduzidos pelo A. deverão ser julgados como improcedentes e ser a mesma absolvida da sua totalidade.

Seguiu-se a prolação de despacho saneador, procedeu-se a julgamento e proferiu-se sentença.

DECISÃO RECORRIDA (DISPOSITIVO): “Tudo visto e nos termos expostos julga-se a presente acção parcialmente procedente por provada e em consequência condena-se a R. a reconhecer a justa causa da resolução comunicada pelo A. para fazer cessar o seu contrato de trabalho e bem assim a pagar-lhe a quantia de € 4.441,31 (quatro mil quatrocentos e quarenta e um euros e trinta e um cêntimos) a título de indemnização e o montante total de € 5.676,75 (cinco mil seiscentos e setenta e seis euros e setenta e cinco cêntimos) a título de créditos laborais vencidos e não liquidados, acrescidas ambas as quantias dos respectivos juros de mora vencidos à taxa legal, desde a citação, e dos vincendos até integral pagamento.

Quanto ao pagamento de trabalho suplementar prestados em dias de descanso complementar e obrigatório e nos feriados e nas quantias relativas à retribuição devida pelo trabalho prestado em dias de descanso compensatório, bem como no pagamento da quantia relativa ao subsídio de refeição referente a esses mesmos dias de trabalho, relega-se a sua determinação para execução de sentença, ao abrigo do preceituado no art. 609º nº 2 do C.P.C. ex vi do art. 1º do C.P.T.

Absolve-se ainda a R. do demais peticionado.

Custas por ambas as partes na proporção do respectivo decaimento, fixando-se a mesma em 2/3 para a R. e em 1/3 para o A.” FOI INTERPOSTO RECURSO POR AMBAS AS PARTES CONCLUSÕES DO RECURSO DA RÉ: 1.º- A Ré invocou a circunstância de a citada carta de resolução não conter uma descrição minimamente circunstanciada dos factos que permitisse, concretamente, à Ré e Recorrente aferir da mesma.

Ora, 2 .º- O Tribunal a quo não se pronunciou sobre tal argumento, tendo antes permitido que os factos que não constam da carta fossem objecto...

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