Acórdão nº 435/12.6TBVPA.G2 de Tribunal da Relação de Guimarães, 16 de Dezembro de 2021

Magistrado ResponsávelMARIA CRISTINA CERDEIRA
Data da Resolução16 de Dezembro de 2021
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães I. RELATÓRIO Junta de Freguesia de X, actualmente Junta de Freguesia de Y e X, intentou a presente acção declarativa, sob a forma de processo ordinário, contra Parque Eólico de W, S.A. e Conselho Directivo dos Baldios do B., pedindo a condenação dos Réus a: a) Reconhecer o direito de propriedade comunitária dos compartes da freguesia de X sobre os terrenos baldios situados para Norte da linha de delimitação referida nos artºs 12º a 14º da petição inicial; b) Reconhecer que 3 aerogeradores e o edifício de rés-do-chão de apoio ao parque eólico, edificado pela 1ª Ré no local referido nos artºs 15º e 16º da petição inicial, bem como a saibreira identificada no artº. 18º do mesmo articulado, se encontram implantados no terreno baldio da A., e que um quarto aerogerador da 1ª Ré se encontra implantado sobre a aludida linha de delimitação com o baldio do 2º Réu; c) Ser a 1ª Ré condenada a comprovar todos os pagamentos que fez até ao presente aos compartes da freguesia de B., relativos aos quatro aerogeradores e edifício supra referidos; d) Ser o 2º R. condenado a entregar à A. todas as quantias que recebeu até ao presente da 1ª Ré, relativamente aos três referidos aerogeradores, metade do quarto, implantado na dita linha de delimitação dos dois baldios e bem como pelo mencionado edifício de apoio ao parque eólico, e ainda a quantia que recebeu pela alienação do saibro referido no artº. 18º da petição inicial ou o respectivo valor monetário caso tal produto haja sido objecto de outro negócio jurídico, Quantias essas acrescidas de juros à taxa legal, contados desde a citação dos RR. até à respectiva entrega à A., a liquidar a final pela secretaria judicial por simples operação aritmética; e) Ser a 1ª Ré condenada a passar de imediato a entregar à A. todas as verbas que vêm pagando ao 2º R. relativas aos três aerogeradores e metade do quarto, bem como pelo dito edifício.

Para tanto alega, em síntese, que os compartes da freguesia de X, concelho de Ribeira de Pena, são donos e legítimos possuidores de uma extensa área de monte, sobretudo com mato, pastagens e arvoredo, circundante das povoações que integram a freguesia, que constitui o seu baldio, sob a gestão e administração da A., o qual confronta, no seu extremo sudoeste, com o baldio da freguesia de B., concelho de Mondim de Basto.

A delimitação e demarcação entre ambos os baldios é estabelecida pela linha que liga os pontos acordados e consignados no “auto de delimitação e demarcação entre os concelhos de Ribeira de Pena e Mondim de Basto” de 22 de Outubro de 1938, que consta da acta relativa à sessão da Câmara Municipal de Ribeira de Pena de 27 de Outubro de 1938, conforme descrito nos artºs 12º a 14º da petição inicial, sendo que o baldio dos compartes da freguesia de X fica para Norte daquela linha e o do 2º R. fica para Sul da mesma.

Acrescenta que em meados de 2011, no terreno baldio dos compartes da freguesia de X, para Norte da referida linha de delimitação, a 1ª Ré instalou três geradores para produção de energia eólica e construiu um edifício de rés-do-chão com 35 m2 para apoio ao parque eólico, sem autorização da A., bem como instalou um quarto gerador sobre a própria linha de demarcação com o terreno baldio dos compartes da freguesia de B..

Por usa vez, o 2º R. facultou a terceiros a extracção de vários camiões de saibro, em número não inferior a 100, do terreno baldio da A., próximo da referida linha de delimitação entre os dois baldios.

Após invocar factos tendentes a demonstrar a aquisição originária, por via da usucapião, pelos compartes da freguesia de X, particularmente os moradores de M., desde há mais de 100 anos, dos terrenos baldios que se estendem por vários hectares nas imediações daquela aldeia, situados a Norte da descrita linha de delimitação, refere que essa linha foi sempre pacificamente respeitada e aceite pelos compartes de ambas as freguesias e concelhos e reivindica os rendimentos derivados da implantação e exploração dos mencionados aerogeradores, edifício de apoio e saibreira, pagos ilegitimamente ao compartes da freguesia de B..

O R. Conselho Directivo dos Baldios do B. contestou, impugnando a factualidade alegada na petição inicial e sustentando, em suma, que os aerogeradores e o edifício a que a A. se reporta estão implantados em terrenos que integram os baldios usados e fruídos pelos compartes da freguesia de B., por si representados, dentro dos limites da superfície administrativa daquela freguesia, conforme resulta da certidão de teor do prédio rústico inscrito sob o artigo matricial ..., onde o referido parque eólico se situa, e da Carta Administrativa Oficial de Portugal (CAOP).

Acrescenta que o saibro a que a A. se refere no seu articulado foi todo ele extraído dentro dos limites do baldio do 2º R., tendo sido, no entanto, em quantidade bem menor à indicada pela Autora.

Alega, ainda, factos inerentes à aquisição originária (por usucapião), pelos compartes do 2º R., do direito de propriedade comunitária sobre os terrenos baldios dos quais faz parte o local onde foram instalados os ditos aerogeradores, construído o edifício de apoio e extraídos os referidos saibros.

Conclui, pugnando pela improcedência da acção e absolvição dos RR. do pedido.

A Ré Parque Eólico de W, S.A. também apresentou contestação, alegando, em síntese, que celebrou com o 2º R. um contrato de cessão de exploração, cujo objecto foram os baldios de B. por forma a neles instalar um parque eólico, e iniciou a construção do parque eólico na convicção de que este se encontrava dentro dos limites dos baldios de B. e contratados pela Ré.

Impugna o demais alegado na petição inicial.

Conclui, pugnando pela improcedência da acção e sua absolvição do pedido.

A A. apresentou réplica, reiterando o alegado na petição inicial e pugnando pela improcedência das excepções deduzidas pelo 2º Réu.

Realização a audiência preliminar, foi proferido despacho saneador, no qual se fixou o valor da causa, tendo sido seleccionada a matéria de facto assente e organizada a base instrutória, que sofreu reclamação por parte do 2º R., a qual foi parcialmente atendida por despacho de fls. 152.

Realizou-se a audiência de discussão e julgamento, com observância do legal formalismo.

Após, foi proferida sentença que julgou a presente acção improcedente e, em consequência, absolveu os réus Parque Eólico de W, S.A. e Conselho Directivo dos Baldios de B. dos pedidos.

Inconformada com tal sentença, a Autora dela interpôs recurso para este Tribunal da Relação, tendo em 2/09/2020 sido proferida decisão sumária nesta instância superior, que concluiu no sentido da procedência parcial do recurso e determinou a anulação da sentença com o consequente prosseguimento dos autos, designadamente para apuramento da existência do “animus possidendi” tendente à prova da aquisição da propriedade dos baldios por usucapião e subsequente apreciação do demais peticionado nos autos, por insuficiência da fundamentação da decisão da matéria de facto e de direito, quanto à análise crítica de toda a factualidade alegada e por consequência da prova produzida.

Em cumprimento do determinado por este Tribunal da Relação, foi reaberta a audiência de julgamento em 8/01/2021, para reinquirição de 6 testemunhas arroladas pela A. e alegações finais, tendo posteriormente sido proferida sentença que julgou a presente acção improcedente e, em consequência, absolveu os réus Parque Eólico de W, S.A. e Conselho Directivo dos Baldios de B. dos pedidos.

Inconformada com tal decisão, a Autora dela interpôs recurso, extraindo das respectivas alegações as seguintes conclusões [transcrição]: 1 - Vem o presente recurso interposto da douta sentença que julgou improcedente a presente acção instaurada pela A. em virtude de com a mesma nos não podermos conformar; Com efeito, 2 - Modestamente nos parece que a prova produzida e dada como provada, conjugada com aquela que foi subestimada e que podia e deveria ter sido considerada, salvo o mais elevado respeito, importará uma decisão contrária à prolatada, determinante da procedência parcial desta acção. Por isso, 3 – Por via deste recurso, visam os recorrentes a impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto e sobre a matéria de direito.

4 - A autora recorreu a juízo para defesa dos direitos e interesses legítimos da respectiva comunidade de compartes em que se integram os directamente prejudicados com a conduta dos RR relativos ao seu baldio, que são os da povoação de M., nos termos, fundamentos e pedido da petição inicial que aqui se dá por integrada.

5 – Os RR contestaram a acção e, ante os termos e fundamentos alegados, peticionaram a improcedência da acção e a sua consequente absolvição dos pedidos, 6 – Limitando-se a impugnar a delimitação indicada pelaA, 7 – Apesar de a terem respeitado até à contratação que fizeram da instalação do parque eólico em apreço, nunca tendo sustentado que a divisão dos baldios fosse pela demarcação administrativa, 8 – Acabando contudo por vir posteriormente indicar como divisão dos seus baldios com os da A., uma linha recta do “Marco ...” à Capela de ..., da aldeia da A., só porque um documento que trouxeram à lide se referia a uma terra com tal nome, 9 – Em total subestima do facto que bem conhecem e é do conhecimento geral dos habitantes dos dois concelhos confinantes, que tal demarcação nunca podia sequer ser possível por atravessar uma imensidão urbana e rústica do concelho de Ribeira de Pena.

10 – Sustenta a A. nesta lide como causa de pedir que os compartes por ela representados, designadamente os da povoação de M., são os exclusivos donos e legítimos possuidores de uma extensa área de monte, sobretudo com mato, pastagens e arvoredo, circundante das povoações que integram a freguesia, terreno esse que constitui o seu baldio, sendo por isso a sua propriedade comunitária.

11 - E assim se arroga a A. porquanto, como demonstrou e vem provado nos autos, os moradores da freguesia...

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