Acórdão nº 446/19.0T8CHV.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 23 de Abril de 2020

Magistrado ResponsávelANIZABEL SOUSA PEREIRA
Data da Resolução23 de Abril de 2020
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES:*I- RELATÓRIO: 1.Nos presentes autos, M. R.

e a esposa J. C.

, N.I.F. n.ºs …… e ……, residentes em …, Rue …, França, instauraram acção declarativa, sob a forma de processo comum, contra M. T.

e o marido M. P.

, N.I.F. n.ºs …… e ……, residentes na Rua do …, n.º .., …, ... e R. S., LDA.

, N.I.P.C. n.º ……, com sede na Rua … Porto, peticionando que seja reconhecido o seu direito de preferência na transmissão do prédio rústico sito na união de freguesias de ..., ... e ..., concelho de ..., inscrito na matriz predial sob o artigo ....º e descrito na Conservatória do Registo Predial sob o n.º ..., efectuada pelos réus M. T. e M. P. a favor da sociedade ré, operando-se a substituição da primitiva adquirente pelos autores.

Para tanto, alegam, em súmula, que são proprietários do prédio rústico sito na mesma freguesia, inscrito na matriz predial sob o artigo ....º, o qual possui área inferior à unidade de cultura, e que esse prédio confina, do seu lado norte, com o prédio do artigo ....º, tendo este imóvel sido vendido pelos réus M. T. e M. P. à sociedade ré, pelo preço de € 10.000,00, mediante escritura pública de compra e venda outorgada em 24/08/2017, no Cartório Notarial de R. J., sem que tivesse sido previamente comunicada tal alienação aos proprietários do prédio do artigo ....º, motivo pelo qual se mostra violado o direito de preferência previsto no artigo 1380.º, n.º 1, do Código Civil.

*2. A sociedade ré apresentou contestação (fls. 76-83), na qual, em síntese, suscitou a seguinte defesa exceptiva: - os autores não procederam ao depósito do preço devido, no prazo previsto no artigo 1410.º, n.º 1, do Código Civil, o que implica a caducidade do seu direito de acção; - foi inobservado o prazo de 6 meses para a instauração da acção de preferência, pelo que caducou o direito que os autores fizeram valer; - os anteriores proprietários do prédio do artigo ....º renunciaram ao exercício do direito de preferência.

Posteriormente, os réus M. T. e M. P. ofereceram contestação (fls. 104-105v), na qual manifestaram aderir à posição sufragada pela sociedade ré.

*3. Os autores exerceram o contraditório (fls. 123-128), pugnando pela não verificação da defesa exceptiva aduzida pelos réus.

* 4. O tribunal proferiu despacho saneador com a seguinte decisão: “

  1. Julgar verificada a excepção de caducidade do direito de acção de preferência e, em conformidade, julgam-se improcedentes os pedidos formulados pelos autores M. R. e J. C. contra os réus M. T., M. P. e R. S., LDA., os quais se absolve em conformidade de tais pretensões; b) Condenar os autores M. R. e J. C. no pagamento das custas processuais – cfr. artigos 527.º, n.ºs 1 e 2, do C.P.C.”*É desta decisão que vem interposto recurso pelos AA, os quais terminam o seu recurso formulando as seguintes conclusões ( que se transcrevem): “ o Meritíssimo Juiz a quo, deveria ter considerado o preço pago nos 15 dias posteriores à entrada da PI, uma vez que o valor se encontrava depositado nos cofres do tribunal antes até da propositura da ação, única e exclusivamente para o pagamento do preço do prédio sobre o qual os recorrentes pretendem exercer o direito de preferência e não fazer depender a consideração do pagamento do preço, resultante da transferência de um processo para os presentes autos, de uma declaração de autorização cuja exigibilidade não consta de nenhum normativo legal, pelo que a douta sentença nunca se poderia fundamentar no atraso na entrega de documentos exigidos pelo tribunal.

Acresce que, incumbia ao tribunal, sendo sua intenção considerar a caducidade por falta de pagamento do preço, dar a possibilidade aos recorrentes de se pronunciarem sobre a intenção e fundamento apresentado pelo tribunal para por termo à ação.

A douta sentença recorrida viola assim o estabelecido no nº 1 do artigo 6º CPC, uma vez que o tribunal deveria ter relevado o lapso que foi assumido pelos recorrentes, os quais, em cumprimento do dever de cooperação, logo que se aperceberam da falta de junção das declarações de autorização solicitadas, se apressaram a juntá-las aos autos, tendo estas sido aceites na sua plenitude, logo com toda a sua força probatória.

TERMOS EM QUE DEVE SER DADO TOTAL PROVIMENTO AO PRESENTE RECURSO, SUBSTITUINDO-SE A SENTENÇA RECORRIDA POR ACÓRDÃO QUE JULGUE A AÇÃO PROCEDENTE, COM TODAS AS DEMAIS LEGAIS CONSEQUÊNCIAS.

SERÁ FEITA ASSIM INTEIRA E SÃ JUSTIÇA” *A Ré sociedade apresentou contra-alegações, com as seguintes conclusões ( que se transcrevem): “A. Os Recorrentes autores não procederam ao depósito do preço devido no prazo previsto no artigo 1410.º, n.º 1, do Código Civil, assim como não impulsionaram os autos nos termos determinados pelo Tribunal, e, em conformidade, deve concluir-se pela caducidade do direito de ação que vieram fazer valer nestes autos.

B. E não o fizeram porque não estavam em condições financeira para o fazer, como resulta confessado no artigo 65º da petição inicial.

C. Devendo, assim, improceder tudo quanto ex adverso é avançado pelos Recorrentes nas suas conclusões, por não assistir qualquer razão recursiva aos mesmos, devendo manter-se a douta sentença proferida pelo Tribunal de primeira instância in totum.”*O recurso foi admitido como apelação, com subida nos próprios autos e com efeito devolutivo.

O recurso foi recebido nesta Relação, considerando-se devidamente admitido, no efeito legalmente previsto.

Assim, cumpre apreciar o recurso deduzido.

II- FUNDAMENTAÇÃO A questão essencial a decidir no presente recurso, em função das conclusões recursivas é a seguinte: da questão da caducidade do direito de ação de preferência, nomeadamente é a de saber se o "depósito do preço" a que alude o n. 1 do art. 1410 do CC pode ser considerado satisfeito com o simples pedido de transferência de depósito autónomo ( pelo valor do preço da venda, mais despesas) feito junto de outro processo, uma vez que não foi utilizado naquele processo em que os AA são terceiros.

Outras questões são as seguintes: - da necessidade da alteração oficiosa da matéria de facto; - da violação ou não do art. 6º do CPC; - da violação ou não do princípio do contraditório.

*Para a apreciação da questão elencada, é importante atentar na matéria que resultou provada e que o tribunal recorrido descreveu nos termos seguintes: “Com base nos documentos carreados para os autos (artigo 607.º, n.ºs 4 e 5, do C.P.C.), é a seguinte a factualidade assente: 1.

M. G., M. M., M. A., M. E., A. T., A. L., J. N., M. L., F. T. e A. P. instauraram acção declarativa, sob a forma de processo comum, contra M. T., M. P. e R. & S., Lda., a qual correu termos neste Juízo sob o n.º 2596/18.1T8VRL.

  1. Na petição inicial do processo n.º 2596/18.1T8VRL foram deduzidos os seguintes pedidos: “A- Reconhecido o direito de preferência aos AA, na venda do prédio rústico, composto por olival, pinhal, mato e uma instalação agrícola, sito em ... da atual União de freguesias de ... ... e ..., inscrito na respectiva...

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