Acórdão nº 1441/16.7T8BRG.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 30 de Abril de 2020

Magistrado ResponsávelFERNANDO FERNANDES FREITAS
Data da Resolução30 de Abril de 2020
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

ACORDAM EM CONFERÊNCIA NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES A) RELATÓRIO I.- R. M., menor, representado pelos seus pais P. M. e T. P., e com eles resiente em ..., ..., município de Barcelos, intentou a presente acção, com processo comum, contra “Construções X, Ld.ª”, sociedade comercial com sede em Barcelos, pedindo que esta seja condenada a pagar-lhe: a) a título de indemnização pelos danos não patrimoniais, a quantia de € 150.000,00 (cento e cinquenta mil euros); b) a título de indemnização pelos danos patrimoniais, o montante de € 5.970,00 (cinco mil novecentos e setenta euros); c) juros de mora sobre as referidas quantias, à taxa legal em vigor, desde a data da citação até efetivo e integral pagamento.

Fundamenta alegando, em síntese, que a Ré, no exercício da sua atividade industrial de construção civil, construiu e promoveu a venda do prédio constituído em regime de propriedade horizontal, sito na rua da …, n.º …, em ..., ..., tendo os seus pais adquirido à Ré, por contrato de compra e venda que celebraram no ano de 2004, a fração autónoma designada pelas letras «AE», correspondente a um apartamento do tipo T3, sito no 1.º andar esquerdo do edifício acima referido. No dia 16.04.2013, cerca das 17h30m, ele, Autor, quando se encontrava em casa, recebeu uma visita de uma colega do infantário, e após sair do elevador foi a correr pela rampa de acesso a pessoas com dificuldade de locomoção, tendo embatido na janela de vidro incolor da porta de saída. Ao embater no vidro, este quebrou e provocou um corte no pescoço do Autor, que lhe causou a laceração traumática dos grandes vasos. Transportado para o Hospital de São João, no Porto, foi sujeito a uma craniectomia descompressiva para debelar o aumento do volume do cérebro e, depois, a uma cranioplastia de retalho ósseo frontotemporoparietal direito, tendo permanecido internado em coma induzido mais de 3 (três) semanas. Ficou com sequelas de enfarte de hemisfério cerebral direito, hemiparesia esquerda e paralisia facial direita. Em virtude das lesões e tratamentos a que foi submetido, ele, Autor, teve dores e sofrimento, tendo-se tornado uma criança pouco ativa, mal-humorada, ansiosa e agitada.

Alega ainda o Autor que a Ré colocou ou mandou colocar no local um vidro simples, incolor, com 2,85 mts de altura, de espessura reduzida, encaixilhado numa estrutura de alumínio, contrariando o projeto aprovado pela Câmara Municipal ..., com o alvará de construção n.º 1010/2002, colocando, desta forma, em risco a integridade física dos moradores e demais utilizadores do imóvel, mormente a ele, Autor.

Regularmente citada, a Ré apresentou contestação, impugnando as consequências pessoais e emocionais decorrentes do evento para o Autor, e alegando a caducidade do direito que este pretende fazer valer, por terem decorrido mais de cinco anos da data em que a obra foi entregue à administração do condomínio, alegando ainda que desde a entrega da fração até à propositura desta ação nunca houve reclamação de quaisquer defeitos ou desconformidades do edifício, seja quanto às frações próprias, seja quanto às partes comuns.

Mais alegou que a memória descritiva e justificativa relativa ao prédio previa, na versão inicial, para as vidraças, que elas seriam incolores, com a espessura adequada ao vão de aplicação, com o mínimo de 0,04 mm. No entanto, devido a questões térmicas, o projeto foi alterado no sentido de, no que toca aos envidraçados, contemplar «vidro duplo com 5 + 5 mm de espessura de lâmina e caixilho de alumínio, com dispositivo de oclusão nocturna sem boa estanquicidade ao ar», mas apenas no que se refere às frações individuais. Contudo, na planta dos alçados, apresentada com a supramencionada alteração, previa-se, para os envidraçados das partes comuns, nas portas de entrada do edifício, uma grelha de ventilação em alumínio termolacado, onde foi aplicado vidro normal, com espessura superior a 6 mm. Afirma que a obra foi executada de acordo com o projeto, com a única diferença de terem sido colocadas as caixas de correio no local onde estava prevista a grelha de ventilação.

Alega ainda que o acidente descrito ocorreu por culpa exclusiva dos pais do menor, que omitiram o dever de vigilância sobre ele, ao permitir que o mesmo corresse em grande velocidade pelas escadas interiores do prédio e pela rampa destinada à circulação de pessoas com dificuldade de locomoção, ou cabe a culpa do condomínio por incumprimento do dever de manutenção e de cuidado sobre as partes comuns do edifício.

O Autor apresentou resposta, refutando a caducidade do seu direito já que a presente ação é de responsabilidade civil extracontratual. Quanto à omissão do dever de vigilância, alegou que estava vigiado dentro de um espaço fechado que supostamente não oferecia perigo e que se o vidro cumprisse as regras de segurança não quebraria com o embate de uma criança de 4 (quatro) anos com peso reduzido.

Deduziu incidente de intervenção principal provocada do Condomínio do Edifício sito na rua ..., da Administração do Condomínio do Edifício sito na rua ... e da Câmara Municipal ..., alegando que, face ao alegado pela Ré, passou a ter dúvidas fundamentadas sobre o sujeito da relação material controvertida.

Este pedido de intervenção principal foi indeferido.

Foi proferido despacho saneador no qual, conhecendo-se da excepção de caducidade invocada pela Ré, se decidiu pela sua improcedência.

Mais se conheceu do pedido de condenação da Ré em indemnização pelos danos patrimoniais, no valor de € 5.820,00 (cinco mil oitocentos e vinte euros), o qual foi julgado improcedente.

Os autos prosseguiram os seus termos vindo a proceder-se ao julgamento que culminou com a prolação de douta sentença que, julgando a acção parcialmente procedente: 1. Condenou a Ré a pagar ao Autor a quantia indemnizatória de € 150.000,00 (cento e cinquenta mil euros), vencendo juros à taxa legal de 4%, desde a presente decisão até integral pagamento; 2. Absolveu a Ré do restante peticionado.

Inconformada, traz a Ré o presente recurso pedindo a revogação da supra transcrita decisão.

Contra-alegou o Autor propugnando para que se mantenha o decidido.

O recurso foi recebido como de apelação, com efeito devolutivo.

Colhidos, que foram, os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

** II.- Convidada a corrigir as suas conclusões, que se consideraram prolixas e complexas por serem excessivamente expositivas e repetidas, a Apelante/Ré ofereceu novas alegações e concluiu pela forma seguinte: 1. - QUESTÃO PRÉVIA: DAS NULIDADES DA SENTENÇA 1.1 – Das NULIDADES DO ARTIGO 615º N.º 1 ALS. D) e E) DO C.P.C.

  1. - Nos presentes autos, a Apelante foi condenada a pagar ao Apelado a quantia de € 150 000,00 – cento e cinquenta mil euros -, a título de danos não patrimoniais e dano biológico.

  2. - Sucede que, no que concerne aos pedidos deduzidos pelo Autor na sua petição inicial, este não peticionou qualquer pedido por danos patrimoniais atinentes ao dano biológico, pelo que, não compete ao Julgador fazer justiça pelas suas próprias mãos, suprindo as possíveis imprecisões, erros ou desleixos constantes do articulado do Autor, por força do princípio do dispositivo.

  3. - É por isso que, por força do número 1, al. e) do artigo 609º do C.P.C. a sentença não pode condenar em quantidade superior ou em objecto diverso do pedido. No entanto, nos presentes autos, a Apelante foi condenada não só pelos danos não patrimoniais, mas pelo dano biológico, que assume feição patrimonial, conforme decorre do Ac. da Relação de Guimarães, de 15-02-2018, processo n.º 652/16.0T8GMR.G1, in: http://www.dgsi.pt/jtrg.nsf/ 86c25a698e4e7cb7802579ec004d3832/146293d6453aac16802582480036f8b6?OpenDocument 4º - Pelo que, na nossa humilde opinião, há nulidade da sentença por o tribunal recorrido condenar em objecto diverso, nos termos do n.º 1, al. e) do artigo 615º do C.P.C. confronte Ac. do STJ de 18.10.2012, processo n.º 660/04.3TBPTM.E1.S1, in http://www.dgsi.pt/jstj.nsf /954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/5e3f852c66441ebd80257aa00052a07d? OpenDocument 5º - Acresce ainda que, da matéria fáctica dada como provada, o tribunal recorrido ao abrigo dos artigos 5º n.º 2 al. a) e 607º n.º 4 do C.P.C. deu como provados os factos constantes dos pontos 44 a 48, sem que as partes fossem confrontadas com esses factos, através de anúncio pelo tribunal, antes do encerramento da audiência.

  4. - Não tendo, no caso, sido observado esse anúncio (não consta da acta que o tenham sido e ouvida a gravação da audiência, a que procedemos na totalidade, não detectámos que o tenham sido), não foi permitido às partes a possibilidade de produção de prova sobre esses factos, e por isso, a decisão do tribunal de considerar esses factos na sentença, julgando-os e apoiando neles a aplicação do direito, consubstancia a nosso ver uma nulidade por excesso de pronúncia porquanto o tribunal conheceu de questões de que não podia, nessas circunstâncias, tomar conhecimento, entendimento que tem eco na nossa jurisprudência, conforme acórdão do tribunal da Relação do Porto, datado de 30-04-2015, cujo sumário consta do corpo das alegações e que aqui damos por reproduzido e constante no seguinte endereço da internet: http://www.dgsi.pt/jtrp.nsf/56a6e7121657f91e80257cda00381fdf/cef01405dc4382dc80257 e44003b29aa?OpenDocument 7º - Pelo que, também a sentença padece de nulidade por excesso de pronúncia ao dar como provados factos que não foram alegados pelas partes, nomeadamente os constantes dos pontos 44 a 48, nos termos do artigo 615º, n.º 1 al. d) e que aqui expressamente se alega.

    1.2 – DA NULIDADE DA SENTENÇA PREVISTA NO ARTIGO 615º N.º 1 AL. C) DO C.P.C.

  5. - Resulta da matéria de facto dada como provada, que foi dado como provado no ponto 43, que: “Era detetável ao condomínio a desconformidade aludida em 21. (parte do artigo 38º)” 9º - Assim, salvo melhor opinião, é nossa humilde opinião que os fundamentos de facto estão em oposição com a decisão ou até tornam esta decisão ininteligível ou até ambígua, e por isso, a sentença é...

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