Acórdão nº 143/16.9T8MAC.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 19 de Novembro de 2020
Magistrado Responsável | ANTÓNIO BARROCA PENHA |
Data da Resolução | 19 de Novembro de 2020 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães: I. RELATÓRIO M. G.
intentou a presente ação declarativa comum contra M. O.
e marido A. R.
; e L. F.
(1ºs réus); e M. P.
(2ª ré), pedindo:
-
Que se declare que é dono e legítimo possuidor do prédio rústico identificado no artigo 1.º da petição inicial e que o mesmo confina pelo lado norte com o prédio rústico propriedade dos 1.ºs réus (enquanto herdeiros de L. F.), a que corresponde o artigo matricial ...
, da União de Freguesias de ...
, concelho de Macedo de Cavaleiros; b) Que se reconheça que, por tal confinância, lhe assiste o direito de preferir na venda que os 1.ºs réus efetuaram à 2.ª ré do prédio correspondente àquele artigo matricial ...
, pelo preço de € 1.230,36, através de escritura pública, operando-se, consequentemente, a substituição do autor na posição jurídica da adquirente 2ª ré.
Para o efeito, alega o autor, em suma, que, sendo ele proprietário de um prédio rústico confinante, a norte, com o prédio rústico que corresponde ao artigo matricial ...
(para o que invocou quer a presunção registal, quer a aquisição originária, por usucapião), tomou conhecimento, no mês de abril de 2016, que este segundo prédio tinha sido vendido pelos 1.ºs réus M. O. e L. F. à 2.ª ré, através de escritura pública de compra e venda celebrada no dia 26 de março de 2014, e que os termos desse negócio nunca lhe foram comunicados pelos 1.ºs réus, nem por outrem.
Mais alegou que os prédios em causa se destinam e são aptos para cultura, designadamente para castanheiro manso e cereais, que ambos têm uma área inferior à unidade de cultura fixada para a zona/região do país (nomeadamente de sequeiro) e que a sua junção permitirá a obtenção de uma área mais próxima da área de cultura.
Por último, também alegou o autor que, tanto quanto é do seu conhecimento, a 2.ª ré não é proprietária confinante com o prédio adquirido aos 1.ºs réus.
A 2.ª ré apresentou contestação, negando, em síntese, que ao autor assista o direito de preferir na aquisição do prédio rústico por si comprado aos 1.ºs réus, porquanto: (1) esse prédio integra um conjunto de quarenta prédios por si adquiridos aos 1.ºs réus por um preço global, os quais, encontrando-se dispersos entre si, constituíam, ao tempo do negócio de compra e venda e da respetiva escritura, uma exploração agrícola de tipo familiar ou casal rústico de tipo familiar, pois (1.1) era ela quem, desde 2005, ajudada pelos seus filhos e genro, vinha explorando esses prédios habitual e predominantemente com o seu próprio trabalho, enquanto meeira/parceira dos 1.ºs réus; (1.2) o prédio em causa é importante para o conjunto dos prédios alienados e para o seu sustento e dos seus filhos; (1.3) aí colhia anualmente à volta de 200 quilos de castanha, no valor de € 300,00; (2) no ano de 2005, celebrou com os 1.ºs réus M. O. e o irmão L. F. um contrato verbal de parceria agrícola, sem prazo de duração, que nunca foi reduzido a escrito porquanto a 1.ª ré e o marido lhe disseram que não era necessário, sendo que esse contrato era válido no âmbito da legislação então vigente, assistindo-lhe, por isso, direito de preferência que se sobrepõe ao direito do autor, no âmbito do disposto nos artigos 33.º e 28.º do Decreto-Lei n.º 385/88, de 25.10.
Para o caso de eventual procedência da ação e a título subsidiário, a 2.ª ré deduziu reconvenção, alegando que, (1) em novembro de 2015, resolveu arrancar os castanheiros secos que se encontravam plantados no prédio em causa, deixando apenas dois, e plantar cem castanheiros novos, no que despendeu € 160,00 no arranque dos castanheiros secos, € 460,00 no amanho e aplicação de corretivo de solo do terreno, € 860,00 na compra e plantação das novas árvores, o que resultou no aumento do valor do solo em € 2.100,00; (2) tais trabalhos/obras/plantações são úteis e não podem ser levantadas sem detrimento do prédio e das próprias árvores; (3) despendeu em encargos notariais da escritura e pagamento de IMT o equivalente a € 299,37.
Terminou, pedindo que o autor/reconvindo fosse condenado a indemnizá-la na quantia global de € 3.580,00 e a pagar, também, o valor referente aos encargos com a escritura/registo (considerando que o valor referente ao IMT já se encontra depositado à ordem dos autos).
O autor replicou, negando, com relevo e nuclearmente, que existia qualquer exploração agrícola de tipo familiar ao tempo da venda do prédio objeto da preferência que o abrangesse, uma vez que: (1) os 1.ºs réus M. O. e irmão L. F. eram donos de outros prédios além do conjunto de prédios que venderam à 2.ª ré; (2) a exploração agrícola daqueles réus abrangia muitos outros prédios rústicos localizados quer na freguesia de ...
, quer noutras freguesias de Macedo de Cavaleiros, quer, ainda, na freguesia de ...
(...
), que aqueles herdaram intacta do seu pai, L. M., mas que foram vendendo a outras pessoas; (3) os 1.ºs réus não exploravam diretamente os prédios por si alienados; (4) o prédio em discussão não assume relevo económico nem no conjunto dos prédios que constituíam o casal agrícola do Dr. O., nem no conjunto dos prédios que foram alienados à 2.ª ré.
Por outro lado, também contrapôs o autor que o sobredito contrato de parceria agrícola, caso existisse, seria proibido por contrário a lei imperativa e nulo por falta de forma, não podendo ser invocado em juízo.
No que respeita à reconvenção, o autor apenas reconheceu que a 2.ª ré plantou 50 a 55 castanheiros, aceitando pagar por essa plantação € 325,00 (€ 125,00 pelos castanheiros e € 200,00 pelas obras de plantação), mas podendo, em alternativa, a 2.ª ré proceder ao seu levantamento.
Em último, quanto aos encargos de escritura/registo, alegou não serem devidos.
Saneados os autos por despachos de 15.11.2017 e 10.01.2018, aí se fixou o valor da causa em € 6.048,21, se delimitou o objeto do litígio e se enunciaram os temas da prova.
Foi determinada uma verificação não judicial qualificada com vista a dar-se resposta a vários factos que se mostram alegados, designadamente, cujo relatório encontra-se junto a fls. 203 a 213.
Em 18.03.2018, viria a falecer o 1.º réu L. F.
, cuja habilitação de herdeiros teve lugar em apenso (A), sucedendo-lhe a 1.ª ré M. O..
Procedeu-se à realização da audiência de julgamento.
Na sequência, foi proferida, a 27.03.2020, sentença, na qual se pode ler na sua parte decisória, o seguinte: “Nestes termos, julgo totalmente procedente a ação e parcialmente procedente a reconvenção e, em consequência: A.
Declaro o autor dono e legítimo possuidor do prédio rústico sito na União de Freguesias de ... e ..., concelho de Macedo de Cavaleiros, composto de terra de centeio cada 3 anos, com 2 castanheiros, sito em “...”, inscrito na matriz predial rústica sob o artigo ... e registado a favor daquele na Conservatória do Registo Predial de … com o n.º .../20120224, o qual confronta do lado norte com o prédio descrito infra; B.
Reconheço que ao autor assiste o direito de preferência na alienação do prédio rústico, composto de terra de mato com castanheiros, sito na União de Freguesias de ...
, em “...
”, inscrito na matriz predial rústica respetiva sob o artigo ...
, concretizada através da escritura pública de compra e venda celebrada em 26-03-2014, pelo preço de € 1.230,36, no Cartório Notarial a cargo da Licenciada A. G., sito na Alameda …, em Macedo de Cavaleiros; e, em consequência C.
Determino que o autor passe a ocupar a posição de adquirente do prédio descrito na alínea B em substituição da 2.ª ré, devendo a esta ser entregue o valor que se mostra depositado nos autos após trânsito em julgado; D.
Condeno o autor no pagamento à 2.ª ré da quantia de € 160,03 (cento e sessenta euros e três cêntimos) e absolvo-o do restante pedido reconvencional; E.
Condeno o autor em 2%, os 1.ºs réus em 18% e a 2.ª ré em 80 % das custas. (…) ” Inconformada com o assim decidido, veio a 2ª ré M. P.
interpor recurso de apelação, nele formulando as seguintes CONCLUSÕES 1.
Há erro de julgamento da matéria de facto, porque da prova carreada para o processo – nomeadamente dos documentos juntos e do depoimento de parte do autor e dos depoimentos das testemunhas, integralmente gravados no sistema informático do Tribunal “a quo” – numa análise global e ponderada, segundo as regras da experiência comum: a)- não devia e não deve ser dada como provada toda a matéria, que foi levada ao ponto n.º 3 dos factos dados como provados, mas sim e apenas a matéria seguinte: Os identificados prédios, de sequeiro, “A” e “B” têm áreas não concretamente apuradas e o autor, M. G.
não cultiva os prédios rústicos, de que é proprietário, nomeadamente o prédio “A”, que estão a monte, ou seja estão sem ser cultivados e o mesmo destino terá o prédio “B”, ou seja o terreno, adquirido pela ré, M. P., objeto da ação de preferência, se se mantiver a decisão proferida.
Como se alega na motivação deste recurso de fls. 2 até fls. 7 e resulta dos depoimentos e excertos de gravação aí referidos, destacando-se os seguintes: do autor, M. G.
, id. a fls. 5, excertos de depoimento e momentos de gravação, mormente entre 04.55 e 05.21. Ver ainda excertos entre 03.00 e 03.17; 06.08 e 07.50.
Da testemunha, J. S.
, id. a fls. 3, excertos de depoimento e momentos de gravação entre 3.34 e 6.47; 17.03 e 18.20. Da testemunha, A. M.
, id. a fls. 4, excertos de depoimento e momentos de gravação entre 03.30 e 04.04; 22.45 e 23.13. Da testemunha, M. R., id. a fls. 4, excertos de depoimento e momentos de gravação entre 03.00 e 03.50. Da testemunha, N. V., id. a fls. 4, excertos de depoimento e momentos de gravação entre 05.10 e 06.00; entre 15.18 e 15.53. Da testemunha, M. O.
, id. a fls. 5, excertos de depoimento e momentos de gravação entre 03.22 e 04.21.
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– devia e deve ser dada como provada a matéria, com a redação infra, que o Meritíssimo Senhor Juiz “a quo” levou aos factos não provados, sob a alínea e/: “a alienação dos quarenta prédios adquiridos pela segunda ré, M. P.
por escritura de 26.03.2014 abrange um conjunto de prédios que, ao...
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