Acórdão nº 899/18.4T8VCT.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 19 de Novembro de 2020

Magistrado ResponsávelJOSÉ DIAS
Data da Resolução19 de Novembro de 2020
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Guimarães.

  1. RELATÓRIO.

    Caixa ..., CRL, com sede na Praça … Viana do Castelo, instaurou a presente ação declarativa, com processo comum, contra J. P., residente no Lugar …, freguesia de ..., …, P. P., residente a Rua …, Quinta do ..., freguesia do … Almada, Terras ... – Agroturismo, Lda., com sede no Lugar ..., freguesia de ..., Monção, M. S., residente no Lugar ... freguesia de ..., Monção, J. E., residente na Rua …, Quinta do ..., freguesia de … Almada, C. M., residente na Estrada … Monção, A. B., residente no Lugar ..., freguesia de ..., Monção, e M. J., residente no Lugar …, freguesia de ..., Monção, pedindo que se: a- declare nulas e de nenhum efeito as declarações objeto da escritura de justificação notarial de 05 de setembro de 2016, transcrita no ponto 29º da petição inicial; b- determine o cancelamento do registo da aquisição a que se refere a Ap. 59, de 2016/10/28, sobre o prédio descrito no registo predial sob o n.º ..., freguesia de ..., Monção; c- declare que a Autora é legítima proprietária do prédio urbano identificado no ponto 1º da petição inicial, prédio esse que integra o imóvel objeto da escritura de justificação; d- condene os Réus P. P., J. P. e M. S. e a Ré sociedade a entregarem à Autora o “imóvel” objeto da justificação; e- condene todos os Réus a pagar à Autora a indemnização já calculada de 65.000,00 euros, acrescida de indemnização no valor diário de 70,00 euros, que se vencer a partir dessa data e até à tomada de posse efetiva do imóvel objeto da justificação.

    Para tanto alega, em síntese, que o Réu J. P., por escritura de partilha celebrada em 26/04/2000, por óbito de M. E., e por escritura e partilha subsequente a divórcio celebrada com a sua ex-mulher, M. C., adquiriu a propriedade plena sob a totalidade do prédio inscrito na matriz sob o art. ... e descrito na Conservatória do Registo Predial sob o n.º ...; Em 26/1/2007, o Réu J. P. anexou a esse prédio um prédio contíguo, destinado a armazém, inscrito na matriz predial sob o art. ...º; Em 28/04/2008, o Réu J. P. solicitou à Autora um financiamento para a reconstrução e ampliação do referido prédio já com o art. ...º anexado, tendo, nessa sequência, a Autora procedido à avaliação deste, no conjunto e no estado em que este se encontrava, e em 28/08/2008 concedeu-lhe um primeiro empréstimo de 150.000,00 euros, destinado a obras de reconstrução e ampliação do prédio; Para garantia do pagamento das obrigações emergentes desse empréstimo, o Réu J. P. constituiu a favor da Autora hipoteca sobre o conjunto desse prédio, integrado já pelos prédios inscritos na matriz sob os arts. ... e ...; Em 07/05/2009, a Autora concedeu ao Réu J. P. um segundo empréstimo, no montante de 150.000,00 euros, destinado à continuação das obras e para garantia das obrigações emergentes deste, tendo aquele Réu constituído a favor da Autora sobre o conjunto desse prédio uma segunda hipoteca; Por sentença de 02/09/2014, o Réu J. P. foi declarado insolvente; No âmbito desse processo de insolvência, a Autora comprou o conjunto desse prédio pelo preço de 253.000,00 euros e inscreveu essa aquisição, no registo, em seu nome; Acontece que quando se apresentou para tomar a posse efetiva do prédio, os Réus J. P. e M. S. invocaram a existência de um contrato de arrendamento a favor da Ré sociedade; A Ré intentou em 08/01/2016, ação contra os Réus J. P., M. S. e a sociedade Ré pedindo a declaração da nulidade e/ou a caducidade desse arrendamento, ação essa que ainda se encontra em curso; Por efeito da perícia que se realizou nesse último processo, a Autora tomou conhecimento que em 05/09/216, os Réus celebraram uma escritura de justificação em que o Réu P. P. arroga-se dono e legítimo possuidor de um prédio urbano, sito na freguesia de ..., Monção, inscrito na matriz sob o art. ..., por lhe ter sido doado verbalmente pela avó em 1995, pretendendo ter adquirido o direito de propriedade sobre esse prédio por usucapião; Com base no título assim adquirido, o Réu P. P. logrou inscrever o direito de propriedade sobre o identificado pretenso prédio em seu nome; Acontece que as declarações constantes da referida escritura de justificação são falsas, constituindo o pretenso prédio objeto dessa escritura a parte sul do prédio dado de hipoteca pelo Réu J. P. à Autora no âmbito daqueles dois financiamentos e que esta comprou no âmbito do processo de insolvência do Réu J. P.; Os Réus J. P. e P. P. outorgaram aquela escritura de justificação, conluiados com os restantes Réus, com o intuito de subtrair ao prédio urbano da Autora toda a parte sul deste; As declarações constantes da escritura de justificação são falsas, uma vez que o Réu P. P. nunca foi dono do prédio objeto da escritura de justificação, este nunca lhe foi doado verbalmente pela avó, que nem sequer o possuía, sequer nunca o Réu P. P. entrou na posse desse pretenso prédio; É a Autora que por si e antecessores, está na posse pública, pacífica, de boa fé e à vista de todos do conjunto do prédio que lhe foi dado em hipoteca pelo Réu J. P. no âmbito dos dois financiamentos e que esta adquiriu, por compra, no âmbito do processo de insolvência deste, há mais de 25 e mais anos, na convicção de que este lhe pertence e que adquiriu o respetivo direito de propriedade por usucapião; Ao atuarem conluiados da forma descrita, todos os Réus causaram à Autora prejuízos, cuja indemnização reclama.

    Em 04/04/2018, a Autora juntou aos autos transação celebrada entre aquela e os Réus A. B. e M. J. em que os últimos declaram que “depois de citados nesta ação e melhor informados, designadamente, face aos documentos que instruem a petição inicial, verificam que incorreram em lapso nas declarações prestadas na escritura de justificação impugnada, as quais não correspondem com a realidade” e “reconhecem que assiste razão à Autora quanto aos fundamentos da impugnação que formula na ação. Em consequência, aceitam, reconhecem e confessam os três primeiros pedidos formulados pela Autora na petição”, declarando por sua vez a Autora que “desiste do pedido de indemnização formulado contra estes réus na quinta posição do seu pedido final, formulada na petição”.

    Essa transação foi homologada por sentença proferida em 05/04/2018, entretanto transitada em julgado.

    Os Réus P. P. e J. E. contestaram, defendendo-se por exceção e por impugnação.

    Invocaram a exceção dilatória da sua ilegitimidade passiva para a presente ação, alegando que nunca souberam, tomaram conhecimento ou parte, negociaram ou subscreveram os dois contratos de mútuo alegados pela Autora, sequer nas hipotecas de garantia para esses contratos de mútuo, desconhecendo qual o destino do dinheiro alegadamente emprestado pela Autora ao Réu J. P.; Impugnaram parte da factualidade alegada pela Autora, sustentando que o prédio objeto da escritura de justificação fosse propriedade ou estivesse na posse do Réu J. P., alegando que o prédio objeto dessa escritura de justificação já tinha sido desanexado, em vida de M. E., do prédio inscrito na matriz urbana sob o art. ..., que o doou verbalmente ao Réu J. P., seu neto, e reafirmando o teor das declarações constantes da escritura de justificação.

    Concluem pedindo que a ação seja julgada improcedente e aqueles absolvidos do pedido.

    A Ré M. S. contestou, defendendo-se por exceção e por impugnação.

    Invocou a exceção dilatória da ilegitimidade passiva sustentando que na petição inicial nenhum facto lhe é associado a título singular, mas exclusivamente na qualidade de legal representante da sociedade Ré. Mais alega que nenhuma participação teve na escritura de justificação notarial, nos contratos de mútuo, escrituras de habilitação de herdeiro, partilhas, sequer ocupou o prédio, teve acesso ao mesmo ou impediu a Autora de o ocupar.

    Conclui pedindo que seja absolvida da instância e, subsidiariamente, do pedido.

    O Réu J. P. contestou impugnando parte da facticidade alegada pela Autora sustentando que apenas é proprietário de 2/3 indivisos do prédio urbano inscrito na matriz sob o art. ... e do armazém, este inscrito na matriz urbana sob o art. ..., tendo sido este direito indiviso que foi dado em garantia à Autora no âmbito dos contratos de mútuo que com aquela celebrou; Mais alegou ter conhecimento que a sua mãe, M. E., antes de falecer, doou o prédio inscrito na matriz sob o art. ...º, objeto da escritura de justificação, ao sobrinho do contestante, o Réu P. P., que para tanto o desanexou do prédio inscrito na matriz sob o art. ..., sendo que, desde essa doação, foi o Réu P. P. que sempre foi considerado dono desse prédio objeto da escritura de justificação, onde não foram efetuadas quaisquer obras, mediante recurso aos financiamentos que lhe foram concedidos pela Autora, sequer esse prédio foi objeto das hipotecas que constituiu a favor da última, nunca tendo esse concreto prédio estado na sua posse.

    Conclui pedindo que seja absolvido do pedido.

    Realizou-se audiência prévia em que a Autora se pronunciou quanto às exceções dilatórias da ilegitimidade passiva invocadas pelos Réus P. P., J. E. e M. S., pugnando pela improcedência destas, fixou-se o valor da presente ação em 50.001,00 euros, proferiu-se despacho saneador, em que se julgou improcedente as mencionadas exceções dilatórias da ilegitimidade passiva dos Réus P. P., J. E. e M. S., fixou-se o objeto do litígio e os temas da prova, que não foram alvo de reclamação, e conheceu-se dos requerimento de prova apresentados pelas partes.

    Realizada a perícia requerida pela Autora, teve lugar audiência final, a qual foi reaberta com os seguintes fundamentos: “Durante a elaboração, em curso, da sentença dos presentes autos avolumaram-se as dúvidas que já tinham surgido no decurso da audiência de discussão e julgamento relativamente à titularidade dominial do prédio descrito na Conservatória do Registo Predial sob o nº ..., da freguesia de ..., concelho de Monção. Como se sabe, o Tribunal ordenou, oficiosamente, que se oficiasse à respetiva Conservatória...

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