Acórdão nº 114083/18.7YIPRT.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 26 de Novembro de 2020

Magistrado ResponsávelMARGARIDA SOUSA
Data da Resolução26 de Novembro de 2020
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães: I. RELATÓRIO: X SERRALHARIA CIVIL, LDA., com sede no Lugar …, Monção, apresentou, no Balcão Nacional de Injunções, requerimento de injunção contra J. B.

, alegadamente residente no “Lugar …”, Monção – indicando corresponder essa morada ao domicílio convencionado –, para pagamento da quantia de 11.356,80€, sendo 9.840,00€ relativos a capital, 1.108,80€ concernente a juros de mora e 306,00€ relativo a outras quantias e 102,00€ relativo à taxa de justiça paga.

Invocou, para o efeito que, no decurso do ano de 2015, fabricou, aplicou, forneceu e entregou, ao Requerido, artigos do seu fabrico e comércio, a solicitação deste mediante orçamento, para renovação da caixilharia, num imóvel de sua propriedade, contrato que denominou de “fornecimento de bens ou serviços”.

Indicou como “tribunal competente para a distribuição”, o Tribunal Judicial da Comarca de Viana do Castelo - Unidade Central de Monção.

O Requerido, após citação, deduziu oposição ao requerimento injuntivo apresentado, com os seguintes fundamentos: - invocou a incompetência internacional dos Tribunais portugueses, alegando residir em França e inexistir qualquer domicílio convencionado; - impugnou alguma vez ter encomendado os bens em causa, alegando que a Requerente terá um crédito sobre empresas francesas que o Requerido chegou a administrar mas como não estava a obter o respetivo pagamento decidiu emitir uma fatura em nome do Requerido; - alegou que os valores em falta se deviam à má execução/defeitos da obra por parte da Requerente que, não obstante ter sido interpelada para os eliminar, e sem prejuízo do perigo que apresentava tal obra, recusou fazê-lo, o que teve que ser levado a cabo por outra empresa.

Pediu ainda o Requerido a condenação da Requerente como litigante de má-fé, em multa e indemnização ao Requerido pelas despesas com o processo, nomeadamente honorários de advogado que fixou em 1000,00€, alegando que no preenchimento do requerimento de injunção aquela indica a existência de “domicílio convencionado”, quando tal não corresponde à verdade, além de que, sabendo que a residência habitual do Requerido é em França (tendo a própria mandatária do Requerido solicitado que todas as notificações fossem dirigidas para França), indicou uma morada em Portugal, bem como deduziu pretensão cuja falta de fundamento não podia ignorar.

Em virtude da oposição deduzida, os autos foram remetidos à distribuição, no Tribunal Judicial da Comarca de Viana do Castelo - Unidade Central de Monção, para serem tramitados como ACÇÃO DECLARATIVA ESPECIAL PARA CUMPRIMENTO DE OBRIGAÇÕES PECUNIÁRIAS EMERGENTES DE CONTRATO (artigos 16º, n.º 1 e 17º, n.º 1 do DL n.º 269/98, de 1 de Setembro, na redacção introduzida pelo Decreto-Lei n.º 226/2008, de 22 de Novembro).

Ao abrigo do art. 3.º, n.º3, do C.P.C., a Requerente apresentou requerimento de “Resposta” quanto à matéria de exceção invocada pelo Requerido, pugnando pela sua improcedência, referindo, para além do mais, que o fornecimento dos bens constantes da fatura nº FT 2011-1/1950, foi entregue ao Réu, nas próprias instalações da A., sitas no Lugar ..., freguesia de ..., concelho de Monção.

Realizado o julgamento, foi proferida decisão que, no que para agora interessa, julgou improcedente a exceção da incompetência internacional e parcialmente procedente a ação, condenando O RÉU NO PAGAMENTO À AUTORA DA QUANTIA DE 9.840,00€ (NOVE MIL, OITOCENTOS E QUARENTA EUROS), ACRESCIDO DE JUROS DE MORA VENCIDOS NO VALOR DE 1.589,50€ (MIL QUINHENTOS E OITENTA E NOVE EUROS E CINQUENTA CÊNTIMOS), bem como julgou procedente o pedido de condenação da Autora como litigante de má fé, condenando em multa processual fixada em 3UCs.

Inconformado com a referida decisão, veio o Réu interpor o presente recurso, em cuja alegação formulou as seguintes conclusões: 1- Logo que junta a factura, o recorrente arguiu a ineptidão do requerimento injuntivo, a nulidade de todo o processado, e requereu que fosse determinada a absolvição da instância do Réu, por a factura, ao contrário do alegado no requerimento injuntivo, não discriminar cabalmente os “fornecimentos, produtos e valores e datas de vencimentos”, e ser imperioso destrinçar data, trabalhos e o local, por a A. Também ter mantido relações comerciais com empresas com as quais o recorrente tinha ligação, e para as quais este alegou terem-se destinado todas as encomendas, não sendo possível ao recorrente nem ao Tribunal, em face dos elementos em falta, conhecer todos os factos que permitam compreender a causa de pedir em toda a sua extensão, alegando também estar coarctado o pleno exercício do seu direito ao contraditório, a boa preparação da sua defesa e a salvaguarda do caso julgado.

2- Não tendo a A. no requerimento de injunção, ainda que de forma sucinta, exposto os factos que servem de fundamento à sua pretensão, verifica-se a excepção dilatória de ineptidão do requerimento de injunção (art.º 186.º, n.º 1 e 2 al. a) do CPC), por falta de causa de pedir, omissão que gera a nulidade de todo o processado e é de conhecimento oficioso (art.º 196.º do CPC), o que obstava a que o Tribunal a quo conhecesse do mérito da causa e, por não passível de sanação, teria de conduzir à absolvição do recorrente da instância [art.ºs 278.º, n.º 1, alínea e) e n.º 3, 576.º, n.ºs 1e 2, 279.º,n.º1,576.º,n.ºs1e2,577.ºe578.º,do CPC, pelo que, não se pronunciando sobre a (invocada) excepção, e, da qual teria, de qualquer forma, de ter conhecido oficiosamente, o Tribunal a quo omitiu o devera que está obrigado nos termos do art.º 615., º n.º 1, al. d) do CPC, o que determina a nulidade da sentença.

3- Padece ainda a decisão em crise de nulidade por omissão de pronúncia, nos termos da al. d), do n.º 1 do art.º 615.º, uma vez que, em face da versão do R., vertida nos itens 9.º a 12.º da sua oposição à injunção, era imperioso conhecer e decidir dos contornos do contrato, essencialmente se ele fora celebrado entre as partes, isto é, se o sujeito passivo desta relação jurídica foi mesmo o recorrido, e não apenas conhecer e decidir da “Qualificação do contrato celebrado entre as partes”, como fez a sentença, pelo que, não se tendo esta debruçado acerca da prova, ou falta dela, alegada a esse respeito, deixando de a analisar criticamente, e de a fazer constar dos factos dados como não provados (sendo o caso), incorreu o Tribunal a quo em nulidade, na medida em que deixou de seleccionar matéria com interesse para a boa decisão da causa.

4- O recorrente alegou na sua oposição à injunção a incompetência internacional dos tribunais portugueses para julgarem os presentes autos, nos termos do Regulamento (UE) n.º1215/2012 do Parlamento Europeu e do Conselho de 12 de dezembro de 2012, art.º 5 e 7.º, e requereu a absolvição da instância, em virtude de o Réu residir e trabalhar em permanência em França há longos anos, não tendo residência permanente ou habitual em Portugal, e de os trabalhos – correspondentes a uma prestação de serviços – que a Autora alega ter realizado, terem sido realizados (por aplicados) em território francês, mais alegando que, de qualquer forma, tratando-se de um alegado contrato de empreitada num imóvel propriedade do Réu (contrato no âmbito do consumo), em que o recorrente é o consumidor, e reside em França, os Tribunais portugueses também, por essa razão, são internacionalmente incompetentes (n.º1, al. c) do art.º 17.º e n.º2 do art.º 18.º do referido Regulamento).

5- A decisão em crise, considerou não se verificar a invocada excepção dilatória, nos termos do art.º 7.º do Regulamento, argumentando que se trata de venda de bens, e nesse caso o lugar do cumprimento da obrigação é o lugar onde os bens foram ou devam ser entregues. Porém, ainda que se entendesse tratar-se de um contrato de compra e venda, como o Regulamento manda aplicar como critério de conexão o lugar da entrega dos bens, e este tem de ser entendido como o local da entrega efectiva, o local do destino final da mercadoria (dado que o objetivo fundamental de um contrato de compra e venda é a transferência dos bens, do vendedor para o comprador, operação que só se completa no momento da chegada dos referidos bens ao seu destino final),e não o território em que o vendedor entregou os bens ao transportador, conforme tem sido entendimento da jurisprudência nacional e europeia, e destinando-se os bens a França, como admitem as partes, então o local do cumprimento da obrigação é França, país que é competente para dirimir o presente litígio, tendo procedido a Mma. Sr.a Juiz a errada interpretação da al. a) do n.º 1 do art.º 7.º do Regulamento.

6- Porém, a relação jurídica controvertida, tal como é conformada pelo A, no seu requerimento injuntivo (o que depois acaba por se confirmar com as próprias declarações de parte e depoimento da testemunha S. A.), não respeita à celebração de um contrato de compra e venda, mas de um contrato de empreitada, que, de acordo com o alegado no requerimento injuntivo contemplou também aplicação dos trabalhos no imóvel, imóvel que, a A., após inúmeras insistências, e já em sede de audiência de discussão e julgamento, veio a indicar como se situando em França, e já constava dos autos prova da residência permanente e habitual do R. em França (conforme documentos que o mesmo juntou e consultas à base de dados do ISS e Identificação Civil, juntas em 14.06.2019 e 28.06.2019, além de todos os depoimentos terem confirmado a residência em permanência do R. em França),razões pelas quais nos termos do citado instrumento legal, os tribunais portugueses são incompetentes para decidir a presente acção.

7- A incompetência internacional também teria de ser declarada, de qualquer forma, nos termos do n.º 1.º; al. c) do art.º 17.º e no 2.º do art.º 18.º do referido Regulamento, que estabelece que a A. apenas poderia ter demandado o R. em França, porquanto, o R. reside em França, com carácter de permanência e habitualidade, está em causa um contrato de consumo, em que o R. é o...

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