Acórdão nº 3497/19.1T8GMR.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 05 de Novembro de 2020

Magistrado ResponsávelJOSÉ AMARAL
Data da Resolução05 de Novembro de 2020
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Relator: José Fernando Cardoso Amaral (nº 444) Adjuntos: -Des.ª Dr.ª Helena Maria de C. G. de Melo Des. Dr. Eduardo José Oliveira Azevedo Acordam na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães: I. RELATÓRIO A executada A. O.

deduziu, em 02-09-2019, embargos à execução que contra si foi movida, na qualidade de avalista de duas letras oferecidas como títulos executivos, por J. C. Acessórios Texteis Unipessoal, Ldª.

Como fundamento da sua oposição, alegou que “nunca prestou o seu aval nos títulos”, existe “grosseira falsificação da letra e da assinatura” apostas no verso das mesmas e à sua autoria imputadas, há mesmo discrepâncias notórias “a olho nu” com as assinatura dos aceites, o que é “ainda mais visível no confronto […] com o seu cartão de cidadão e com os documentos” por si assinados, do que até apresentou queixa-crime.

Pediu a condenação da exequente como litigante de má-fé.

Juntou tais documentos e requereu a realização de perícia.

No mesmo articulado requereu, com fundamento no disposto na alínea b), do nº 1, do artº 733º, do CPC, e alegando que os documentos juntos constituem “princípio de prova” da falsidade, que a execução fosse suspensa, requerimento esse então indeferido por se ter julgado não ser “evidente” tal desconformidade.

No prosseguimento dos autos recebidos, foi realizada perícia à letra e assinatura pelo Laboratório de Exame de Documentos e Escrita Manual, do Departamento de Biologia, da Faculdade de Ciências da Universidade do Porto.

Do respectivo relatório consta como “muito provável” a hipótese de a assinatura do verso de cada uma das letras (no aval) “não ser do punho” da embargante, como “provável” que o seja “do punho de J. D.” e, ainda, também como “provável” serem as expressões alusivas ao aval “do punho” daquele referido J..

A exequente requereu a realização de segunda perícia.

Não obstante, a executada, com base naquele relatório, requereu de novo a suspensão da execução.

Foi, então, proferido o seguinte despacho (15-06-2020): “Veio a executada dizer/requerer “Que em face da junção aos autos do relatório pericial de exame de letra e assinatura, e das conclusões aí apontadas, se ordene a sustação das diligências de execução, nomeadamente as diligências de penhora de salários, e de venda da casa de morada de família, e por forma a evitar o agravar da situação patrimonial da Executada”.

Notificado o exequente pronunciou-se “Precisamente por não poder concordar com o resultado da perícia realizada, a exequente requereu a realização de segunda perícia, pelos factos e fundamentos ali referidos, aguardando ainda despacho a esse respeito.

Por isso, não deverá sustar-se quaisquer diligências de execução”.

Uma vez que o alegado pela executada não permite que se ordene a suspensão da execução, indefere-se o requerido.

Notifique.”.

Em recurso dele, a executada pede a sua revogação e que, deferindo-se o requerimento, se ordene a suspensão, tendo concluído assim as suas alegações: “A- A lei processual prevê que seja suspensa a execução fundada em documento particular quando tal seja requerido pelo Executado e seja presente princípio de prova da falsidade, nos termos da al. b) do n.º 1 do Art.º 733º do CPC; B- Quando o juiz indeferir a suspensão da execução, por entender que o princípio de prova oferecido não se revela como padecendo de evidente falsificação, tal não determina que o processo não possa mais ser objecto de suspensão, dado que, até por via de prestação de caução a qualquer momento, e antes de concretizada a venda, pode ser objecto de suspensão o processo de execução; C- Por maioria de razão, quando no processo conste prova pericial da qual decorre a falsidade da assinatura do executado, deve ser ordenada a suspensão da execução, como forma de obstar a que seja colocado em situação de menor força o executado que foi objecto de execução fundada em documento contendo a assinatura falsificada; D- Com efeito, tal decorre desde logo da natureza equitativa do processo assegurada pelo n.º 4 do Art.º 20º da CRP, devendo ser interpretada a lei à luz de tal preceito, e do equilíbrio da posição das partes; E- A decisão em recurso viola, por interpretação não conforme do disposto no Art.º 733º n. 1 al. b) do CPC, o Art.º 20º n. 4 da CRP; Termos em que deve o presente recurso merecer provimento, como é de J U S T I Ç A”.

Não consta que tenham sido produzidas contra-alegações.

O recurso foi admitido como de apelação, a subir de imediato, em separado, com efeito devolutivo.

Corridos os Vistos legais e submetido o caso à apreciação e julgamento colectivo, cumpre proferir a decisão, uma vez que nada a tal obsta.

  1. QUESTÕES A RESOLVER Pelas conclusões apresentadas pelo recorrente, sem prejuízo dos poderes oficiosos do tribunal, se fixa o thema decidendum e se definem os respectivos limites cognitivos.

    Assim é por lei e pacificamente entendido na jurisprudência – artºs 5º, 608º, nº 2, 609º, 635º, nº 4, 637º, nº 2, e 639º, nºs 1 e 2, do CPC.

    No caso, o problema colocado pela executada/recorrente consiste no seguinte: a execução pode ainda ser suspensa, a seu requerimento, quando, no decurso da instrução dos embargos por si deduzidos com fundamento na falsidade da letra e da assinatura à mesma imputadas nos títulos cambiários exequendos, se obtém relatório de exame pericial por si requerido do qual resulta ser “provável” a falsidade da autoria da frase expressiva do aval e “muito provável” a da subscrição respectiva, não obstante lhe ter sido antes indeferido requerimento formulado no articulado inicial baseado em outros documentos oferecidos como “princípio de prova” julgados como “não evidentes” da falsidade? A espartana, quase nula, fundamentação, de facto e de direito, da decisão recorrida [1], suscita a dúvida sobre qual o preciso alcance objectivo em que se ancorou o juízo empreendido pelo tribunal a quo e, portanto, se a questionada temática é susceptível de reapreciação e pronúncia pelo tribunal ad quem.

    Na realidade, ao referir tão laconicamente que “o alegado … não permite” o requerido, fica-se sem saber, com certeza e clareza, se a razão de ser do assim decidido se deveu ao entendimento de que não existe sequer norma legal a que a situação exposta possa ser subsumida (e de que, portanto, o sistema tal exclui liminarmente); se à consideração de que a previsão hipotética mais próxima dela – a da alínea b), do nº 1, do artº 733º, CPC – não abrange e não opera nesta fase dos embargos; ou se apenas contempla “documento que constitua princípio de prova” como se refere na sua letra (e não a prova pericial, entretanto, produzida e invocada); ou, ainda, se as conclusões da perícia obtidas não constituem justificação bastante para a preencher e ser decretada a suspensão; ou até se, pela circunstância de ter sido já formulado e indeferido o primeiro requerimento, não pode ser apresentado um novo.

    Seja como for, a verdade é que a recorrente, como se extrai das suas alegações e conclusões, questiona uma por si pressuposta “interpretação” da norma “em tal sentido”, ou seja, no de que, não obstante ter...

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