Acórdão nº 1228/18.2T8PTL.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 05 de Novembro de 2020

Magistrado ResponsávelJOS
Data da Resolução05 de Novembro de 2020
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam, em conferência, os Juízes do Tribunal da Relação de Guimarães.

Relatório J. P.

e mulher, M. S., residentes em …, França, instauraram a presente ação declarativa, com processo comum, contra A. L.

e mulher, A. P., residentes na Rua ..., Lisboa, C. L., residente na Rua ..., Lisboa, e J. B.

e mulher, M. M., residentes na Rua … e …, Ponte de Lima, pedindo que se reconheça aos Autores o direito de preferência na compra e venda do prédio descrito no art. 1º, al. c) da petição inicial, substituindo eles, Autores, aos 3ºs Réus, mediante o pagamento do preço, IMT, escritura e registo, no montante global de 707,53 euros, e se ordene o cancelamento do registo a favor dos 3ºs Réus quanto ao mencionado prédio.

Para tanto alegam, em síntese, que por escritura de compra e venda de 20/07/2018, os 1ºs e 2º Réus venderam aos 3ºs Réus 144/688 partes indivisas dos prédios rústicos identificadas nas alíneas a) e b) do art. 1º da petição inicial, pelo preço, respetivamente, de 600,00 euros e 400,00 euros e, bem assim o prédio rústico aí identificado na alínea c) desse art. 1º, este pelo preço de 500,00 euros; Acontece que os Autores são proprietários do prédio rústico descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o n.º … e inscrito na matriz sob o art. …º, que tem uma área de 1.295 m2 e que confina com o prédio rústico identificado no art. 1º, al. c) da p.i., o qual, por sua vez, tem uma área de 602 m2, gozando estes de preferência nessa compra e venda celebrada entre os Réus, cujo projeto não lhes foi comunicado.

Os Réus contestaram defendendo-se por exceção e por impugnação.

Defenderam-se por exceção alegando que o prédio identificado no art. 1º, al. c) da petição inicial e os direitos indivisos dos prédios aí identificados estiveram há venda durante vários anos, ainda em vida do anteproprietário destes, J. A., pai dos 1ºs e 2º Réus, tendo os Autores sido sempre conhecedores da disponibilidade de venda e do preço pretendido por J. A. e nunca tomaram qualquer iniciativa em adquirir esse prédio e, bem assim os direitos indivisos sobre os prédios identificados no art. 1º, als. a) e b) da petição inicial, e sempre souberam que J. A. fazia gosto que o prédio continuasse na família e da vontade deste em o vender à sobrinha M. M. (a 3ª Ré-mulher); Sabendo do especial carinho que seu pai, J. A., tinha pela sobrinha M. M. e da vontade deste que as suas propriedades continuassem na família, os 1ºs e 2º Réus resolverem tentar cumprir aquela que tinha sido a vontade do seu entretanto falecido pai e estabeleceram um preço especial pelo qual estavam dispostos a ceder à prima M. M. o prédio e os direitos indivisos sobre os outros prédios objeto da escritura pública de compra e venda que veio a ser celebrada; O negócio foi pensado entre os 1ºs e 2º Réus como um misto de venda, porque implicava o pagamento de um preço simbólico pela prima M. M., e de doação, porque significava prescindirem do valor de mercado do prédio e dos direitos indivisos; Contactada a prima M. M. e o marido desta (os 3ºs Réus), estes manifestaram interesse em ficar com o prédio e com os direitos indivisos; Como o 3º Réu-marido andasse à procura de um terreno para instalar um estaleiro para guarda de equipamentos e depósitos de materiais que utiliza na atividade da construção civil, os 3ºs Réus aceitaram ficar com o prédio identificado no art. 1º, al. c) da petição inicial, com o intuito de nele construírem o referido estaleiro, pelo que, no caso, verifica-se a exceção do art. 1381º, al. a) do CC; Invocaram a exceção do abuso de direito, alegando que os Autores sabem que o prédio esteve à venda durante pelo menos dez anos e nunca manifestaram qualquer interesse em o comprar; sabem que o valor desembolsado pelos 3ºs Réus foi ditado por razões sentimentais e familiares, uma vez que foi feito com o intuito de satisfazer a vontade do falecido pai dos 1ºs e 2º Réus; sabem que esse valor não tem qualquer correspondência com o valor real do prédio e que o destino que os 3ºs Réus pretendem dar àquele não é a agricultura, mas antes a instalação e funcionamento de um estaleiro de apoio à atividade de construção civil a que se dedica o 3º Réu marido, pretendendo os Autores aproveitar-se dessa circunstância para sob o manto de um suposto direito legal de preferência, se apropriarem de uma propriedade, que nunca cuidaram em comprar e pagar um preço que sabem não ter qualquer correspondência com o valor real do imóvel e a cuja fixação presidiram razões sentimentais e familiares, procurando, desta forma, locupletar-se de forma injustificada à custa do património alheio; Impugnaram parte da facticidade alegada pelos Autores.

Concluem pedindo que a ação seja julgada improcedente.

Os 3ºs Réus deduziram reconvenção, a título subsidiário, para o caso da ação vir a proceder, pedindo a condenação dos Autores-reconvindos a pagar-lhes a quantia total de 6.387,61 euros, correspondente ao valor de mercado do prédio objeto da preferência e todos os custos associados à respetiva transmissão, acrescida de juros e mora, à taxa legal, desde a data da notificação da reconvenção aos Autores reconvindos até integral e efetivo pagamento.

Os Autores reconvindos replicaram, impugnando a facticidade alegada pelos Réus-reconvintes a título de exceção e de reconvenção.

Concluem como na petição inicial e pedindo que se julgue improcedente a reconvenção.

Os Réus reconvintes responderam à réplica, mas essa resposta foi desentranhada dos autos, por ser legalmente inadmissível, por despacho que entretanto transitou em julgado.

Realizou-se audiência prévia, em que se admitiu a reconvenção, fixou-se o valor da ação em 7.095,14 euros, proferiu-se despacho saneador, fixou-se o objeto do litígio e os temas da prova, que não foram alvo de reclamação, conheceu-se dos requerimentos probatórios apresentados pelas partes e designou-se data para a realização de audiência final.

Realizada audiência final, proferiu-se sentença julgando a ação totalmente improcedente e absolvendo os Réus do pedido, constando essa sentença da seguinte parte dispositiva: “Nos termos e pelos fundamentos expostos, decide-se julgar a presente ação totalmente improcedente, por não provada e, em consequência, absolver os réus do peticionado pelos autores.

*Custas a cargo dos autores”.

Inconformados com o assim decidido, os Autores interpuseram o presente recurso de apelação, em que formulam as seguintes conclusões: A- Os autores, aqui recorrentes, interpõem recurso da sentença proferida pelo Tribunal a quo, por discordarem da decisão que recaiu sobre a matéria de facto e de direito que determinou a absolvição dos réus.

B- O regime da discordância dos recorrentes inicia-se com o facto de os mesmos perfilharem o entendimento de que os autos contêm na íntegra elementos necessários para a ação ser julgada provada e procedente de acordo com o sistema legal vigente, C- O que pressupõe que, em sede de recurso, haja uma verdadeira apreciação crítica da decisão a quo que recaiu sobre a matéria de facto e de direito. É este controlo que se pretende fazer pelo presente recurso, com vista a uma decisão de procedência da ação.

D- Expurgada dos factos destituídos de relevância para a decisão da causa, afigura-se como incorretamente julgados a matéria dada como provada nos pontos 7), 10), 11), 12), 16, e a não dada como provada nos pontos a), b), j), pontos que influenciam de forma flagrante o desfecho da ação.

E- Existem nos autos, entre outros, os seguintes meios de prova: 1 – Através de escritura pública de compra e venda celebrada entre os réus (no Cartório Notarial ..., da Notária S. R., exarada de folhas noventa e cinco e seguintes do Livro de notas para escrituras diversas número ... - A - documento junto aos autos a fls. 8 a 10), foram alienados três prédios, NO DIA 20 DE JULHO DE 2018 - como consta no ponto 1) dos factos dados como provados; 2 – Através do contrato de arrendamento referido em 12 dos factos provados que data de 31 DE AGOSTO DE 2018, foi dado de arrendamento o prédio objeto de discussão e relativamente ao qual os autores invocam o direito de preferência; 3 – No documento referido no ponto 16 dos factos dados como provados consta um pedido de Alvará de Licenciamento de Ocupação aprovado a 27 DE MARÇO DE 2019, documento este junto em sede de audiência prévia.

4 – E ainda um documento, de teor de informação técnica, referente a esse pedido 1/19 (referido no ponto 16 dos factos provados), no qual se pode ler que o pedido de licença apenas deu entrada nos serviços municipais no dia 22 DE JANEIRO DE 2019 (um dia depois da apresentação da contestação).

F- Verifica-se na análise destes meios de prova errada apreciação das mesmas. O fim do prédio objeto da preferência tem que se verificar no momento da aquisição. Essa pretensão e motivação têm que se verificar à data da aquisição e, além disso, tem que ser possível no momento da aquisição e, consequentemente, os adquirentes têm de ter consciência e conhecimento disso.

G- Como podemos ler no Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra Proc. 408/15.7T8LMG.C1, de 23/05/2017: “… IV – Contudo esta intenção não pode resumir-se a um mero estado subjetivo, devendo poder existir uma possibilidade real, física e legal, desse destino diferente da cultura do prédio verificar-se.

… VI – Não tendo os Réus logrado provar que a sua intenção de constituírem uma moradia unifamiliar no prédio em cuja aquisição os Autores pretendem preferir era legalmente admissível no momento em que foi celebrado o respetivo negócio de compra e venda, não se encontra demonstrada a causa impeditiva do direito de preferência prevista no art.º 1381º, 2.ª parte do C. Civil.”.

H- Como provam os documentos juntos aos autos pelos próprios réus, à data da aquisição nenhuma intenção podia existir de destinar a parcela a outro fim que não o cultivo, pela simples questão que nada sabiam sobre essa possibilidade.

I- Não podem elementos pedidos subsequentemente sobre a legalidade física, real e legal provar um estado...

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