Acórdão nº 5824/17.7T8GMR-I.G2 de Tribunal da Relação de Guimarães, 18 de Junho de 2020

Magistrado ResponsávelSANDRA MELO
Data da Resolução18 de Junho de 2020
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acórdão I - Relatório Autor e Apelante: A. P.

, residente no Lugar … Cabeceiras de Basto Ré e apelada: MASSA INSOLVENTE DA IMOBILIÁRIA X, LDA., representada pelo Ex.mo Senhor Administrador de Insolvência Dr. J. R., com domicílio profissional na Rua do …, Santa Maria da Feira O Autor apresentou a presente ação de impugnação de resolução, ao abrigo do disposto no artigo 125º do CIRE, pedindo que seja revogada a resolução em benefício da massa insolvente notificada pelo Administrador da Insolvência e relativa à compra e venda do bem imóvel que descreve (fração I), outorgada por escritura pública, no dia 04.10.2016, no Cartório Notarial da Notária L. M., devendo, em consequência, manter-se o direito de propriedade do Autor.

Invocou, em síntese, que prescreveu o direito de arguir a resolução, porquanto o Sr. Administrador de Insolvência tinha conhecimento do negócio cuja resolução declarou há mais de seis meses; a notificação da resolução padeceu de vícios que lhe retiraram toda a eficácia e a tornam nula; o contrato de compra e venda não foi e não é prejudicial à massa insolvente e o autor agiu de boa fé.

Foi apresentada contestação, impugnando de facto e de direito o invocado na petição inicial, sufragando a notificada declaração de resolução do contrato.

Após a realização da audiência final, veio a ser proferida sentença julgando a ação improcedente, por não provada, e absolvendo a Ré do pedido. Esta foi objeto de recurso, no âmbito do qual foi proferida decisão sumária que apreciou a decisão sobre a caducidade do contrato e a impugnação da matéria de facto e determinou a ampliação da mesma.

Veio a ser proferida nova sentença, que também julgou a ação improcedente, por não provada e absolveu a Ré do pedido.

Inconformado com essa decisão, o Recorrente apresentou recurso, que culminou com as seguintes conclusões i. Recurso da matéria de facto: 1- A matéria constantes das alíneas c), d), g), h), i), k), p) e q) dos factos provados, “alinham” em dois sentidos diferentes. Nuns casos apontam o A. como credor e como contabilista; noutros casos colocam a Conti..., nesse papel; 2- Importa esclarecer, se o A./recorrente era o contabilista da insolvente e também da firma J. G., Lda., ou se ao invés era a firma Conti..., a responsável pelos serviços contabilísticos desta; 3- Se a assunção de dívidas por parte da insolvente, pertencentes à firma J. G., Lda., resultaram de compensações efetuadas entre a insolvente e esta e se nelas se incluíram as dívidas à contabilidade ou contabilista; 4- Se o A. apenas pagou o montante de 10.000,00€, ou se efetuou mais alguma entrada em dinheiro; 5- Se entre a firma Conti... e o A. foram efetuados os necessários acertos de contas, tendo em conta que a fração adquirida foi-o pelo A. e não por aquela; 6- Dessas alíneas decorre ainda, a existência de dívidas da insolvente e da firma J. G., Lda. a favor do A. e depois é igualmente dito que o A. não possuía nenhum crédito da insolvente; 7- Impõe-se, por isso, uma arrumação diferente da matéria de facto e coerência no conjunto da mesma; 8- E a verdade é que as contradições são inúmeras e têm necessariamente que ser corrigidas; 9- Deve ter-se em conta os depoimentos das testemunhas, J. G. de [00:00:04 a 00:05:31], de A. M. de [00:05:44 a 00:06:51], prestados em 17/12/2019, no que toca à situação financeira da insolvente e ainda no que se refere ao negócio relativo à compra e venda do apartamento; 10- Devem ser tidos em conta também, os depoimentos das testemunhas A. J. de [00:01:09 a 00:02:43] e de M. B. de [00:00:45 a 00:06:23], prestados a 17/12/2019, estes depoimentos, juntamente com o depoimento de J. G., devem ser tidos em conta para a questão relativa ao preço do apartamento: 11- Deve ser eliminada a alínea s) dos factos provados; 12- Em circunstância alguma se pode considerar que o negócio em causa nos presentes autos beneficiou o A./recorrente e muito menos com o fundamento que consta dessa alínea, que nem sequer é um facto, mas uma suposição; 13- A opção pela escritura de compra e venda, ao invés de dação em pagamento resulta precisamente do facto de a dação em pagamento ter que ser efetuada entre o A./recorrente e a firma Conti…; 14- Entre eles – A. e Conti..., é que teve que efetuar-se uma dação em pagamento, coisa que o tribunal “a quo”, nunca quis saber se existiu ou não. De todo o modo esse problema é alheio ao tribunal e aos presentes autos; 15- A forma como a Conti... foi ou não compensada pelo seu sócio e gerente, o aqui recorrente, é um problema que não cabe no âmbito dos presentes autos, no nosso entender; 16- O que é facto é que a prova produzida e supratranscrita vai no sentido de que a insolvente, através dos seus gerentes, liquidou uma dívida que possuía perante a entidade que lhe efetuava a contabilidade e ainda à firma J. G., Lda., que era igualmente credora da insolvente e entre estas foram efetuados os necessários e devidos acertos de contas; 17- E tanto assim é, que o Mto. Juiz “a quo”, no incidente de qualificação, cuja sentença desde já importa ter em conta para a decisão neste processo, concluiu que a mesma foi fortuita; 18- É óbvio e evidente que se o constante da alínea s) dos factos provados, neste apenso, correspondesse à verdade, teria forçosamente o Mto. Juiz “a quo”, que ter considerado, no apenso de qualificação, que a insolvência foi culposa; 19- Dúvidas não subsistem que a insolvente não sofreu nenhum prejuízo com o negócio que realizou com o A.; 20- A insolvente viu os seus serviços de contabilidade serem realizados e, como não dispunha de meios financeiros para os pagar – atente-se que foi até ameaçada que não mais lhe fariam a contabilidade, negociou com o que dispunha. Não tinha dinheiro, mas tinha frações, ainda que em fase de construção. E assim, conseguiu que o A., enquanto sócio gerente da Conti..., continuasse a garantir-lhe o apoio técnico na área da contabilidade, mediante a venda de uma fração, com o pagamento da diferença, que acordaram ser os 10.000,00€, que este pagou aquando da escritura pública; 21- Deve ser eliminada a matéria dos factos não provados; 22- Na sequência do supra alegado, não faz qualquer sentido a manutenção dos factos indicados como não provados; 23- Resulta evidente que o A., por via dos serviços prestados pela firma de que é sócio e gerente, a Conti..., ficou com um crédito junto da insolvente, crédito esse que foi compensado, com a aquisição do apartamento, objeto da compra e venda realizada entre as partes; 24- Em face de todo o exposto e da prova produzida em audiência de discussão e julgamento, bem como com os elementos documentais existentes nos autos e ainda, tendo em consideração a decisão tomada no âmbito da qualificação da insolvência, deve a matéria de facto assente, ser corrigida nos termos supra propostos; ii. Do recurso da matéria de direito: Da inexistência de fundamento para a resolução de negócio em benefício da massa insolvente ao abrigo do disposto nos arts. 120º e 121º, nº1 als. b) e f) ambos do CIRE: 25- O artº 120º, nº 1, do CIRE estabelece que podem ser resolvidos em benefício da massa insolvente os atos prejudiciais à massa praticados dentro dos dois anos anteriores à data do início do processo de insolvência.

26- Pressupondo, esta resolução de que trata o art.º 120º, a má-fé do terceiro, esta última presume-se, contudo, quanto a atos cuja prática ou omissão tenha ocorrido dentro dos dois anos anteriores ao início do processo de insolvência e em que tenha participado ou de que tenha aproveitado pessoa especialmente relacionada com o insolvente, ainda que a relação especial não existisse a essa data (nº 4 do artigo).

27- A ação de impugnação da resolução em benefício da massa insolvente prevista no artigo 125º do CIRE é uma ação de simples apreciação ou declaração negativa, visando a demonstração da inexistência ou da não verificação dos pressupostos legais da resolução declarada pelo Administrador da Insolvência na carta resolutiva, pelo que impende sobre este o ónus da prova da verificação dos pressupostos da resolução operada, como constitutivos do direito que se arroga (art.º 343.º, n.º1, do Código Civil), cabendo à impugnante, autora, o correspondente ónus de contraprova (art.º 346.º do Código Civil).

28- Sucede que, da matéria de facto dada como provada, o Administrador de Insolvência não conseguiu provar os factos constitutivos do direito que se arroga, tanto mais que a insolvência foi qualificada como fortuita.

29- Em contrapartida, o recorrente demonstrou que adquiriu de boa-fé o aludido imóvel e pagou o preço, desconhecendo em absoluto a situação da insolvência da Ré.

30- A compra e venda ocorrida em 04/10/2016, cerca de 1 ano e tal antes da insolvência, tendo o preço sido pago com dinheiro próprio do Autor (30.000,00€), e o restante descontado em dívidas que a Ré tinha com a contabilidade da qual o Autor era gerente, sem que este pudesse sequer desconfiar ou prever de uma eventual situação de insolvência, não constitui de modo algum um ato prejudicial à massa, e por isso mesmo a resolução em benefício da massa insolvente é ilícita, o que implica que a ação de impugnação tem de proceder.

Termos em que, deve o presente recurso ser julgado procedente, revogando-se em consequência a douta sentença recorrida e substituindo-a por outra que, julgue a ação totalmente procedente, por provada com as legais consequências.” A Recorrida apresentou contra-alegações que culmina com pedido de improcedência do recurso apresentado, mediante as seguintes conclusões: “1 – Douta sentença recorrida não merece censura nem reparo de qualquer natureza.

2 - Aliás, traduz um espelho fiel de toda a prova carreada para os autos pelo Recorrente e pela Recorrida, portanto de uma forma clara e assertiva uma adequada subsunção dos factos no direito aplicável.

3 – O Recorrente, sócio, gerente e principal responsável pela Agência Conti..., Lda., vem agora, depois de ter apresentado uma nova versão no recurso anterior, contradizer-se novamente, e agora...

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