Acórdão nº 1382/17.0T8BGC.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 15 de Outubro de 2020

Magistrado ResponsávelESPINHEIRA BALTAR
Data da Resolução15 de Outubro de 2020
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam em Conferência na Secção Cível da Relação de Guimarães (1) M. F., divorciada, NIF ……, residente em .., Avenue …, France; L. A., casada, NIF ......, residente no Bairro …; A. F., solteiro, maior, NIF ……, residente em .., Rue …, France; L. M., casado, NIF ……, residente em .., Rue …, France, interpuseram contra a RÉ: X – Companhia de Seguros, S.A., NIF ……, a presente ação de indemnização em sede de responsabilidade civil emergente de acidente de viação, pedindo por danos não patrimoniais a quantia de € 60.000,00 mais €10.000,0 pelo sofrimento da sua mãe ocorrido no período entre o acidente e a sua morte. A pagar à 2ª autora quantia não inferior a €15.000,00 pelos danos não patrimoniais sofridos na sequência do óbito da sua mãe. Tudo acrescido de juros legais desde a citação.

Alegando para tanto e em síntese que: No dia 1 de junho de 2014, pelas 18 horas e 26 minutos, na E.M. 539, a cerca de 1200 metros da placa indicativa da localidade de "...", freguesia de ..., concelho de Bragança, circulava o trator agrícola de matrícula HI, no sentido .../..., conduzido por J. P.; durante a sua marcha saiu da faixa para o lado direito saindo da estrada; e as três pessoas que transportava na caixa de carga a saber V. V., A. C. e A. I., esta, mãe dos autores, com o solavanco originado pelo desnível da estrada e o sítio por onde passou a circular provocou a queda dos passageiros, o seu ferimento e por consequência a morte da referida A. I. por paragem cardíaca respiratória ; tendo o condutor de seguida abandonado o local; antes de falecer teve dores e previu a morte, vivendo momentos de grande sofrimento físico; tinha 69 anos, era saudável, alegre e cheia de vida; com o seu falecimento o direito à indemnização pelos danos sofridos transferiu-se para a esfera patrimonial dos autores, seus únicos e universais herdeiros. Os quais ficaram tristes, abalados e revoltados com a morte da sua mãe.

Violou o condutor uma série de normas do C. Estrada, pela que é o único responsável pelo acidente, agindo com culpa. A qual se transferiu para a ré X, Companhia de Seguros S.A, através do contrato de seguro com o nº de Apólice …….

Contestou a ré primeiro por exceção perentória alegando a caducidade da ação com base no disposto no art. 298º, nº 2 do C.C. uma vez que não deduziram o pedido de indemnização civil no processo crime, não o podendo deduzir agora em separado. Contestou por exceção deduzindo exceção perentória da caducidade da ação por não terem respeitado o princípio de adesão ao não deduzirem o pedido de indemnização no processo crime. E também por impugnação, não contrariando em nada o circunstancialismo alegado pelos autores, apenas contrapõe que o mini reboque não tinha qualquer dispositivo que os prendesse ao veículo; os ocupantes sabiam que esse mini reboque não se destinava ao transporte de passageiros, não dispunha de cintos de segurança nem arco de proteção; o condutor, no momento do acidente, apresentava uma taxa de alcoolémia de 2,38/g/l; o que lhe causava diminuição de reflexos; os passageiros sabiam do estado do condutor; mesmo assim a A. I. aceitou ser transportada nessas circunstâncias, pelo que só ela agiu com culpa ou culpa exclusiva. Finalmente alegou serem os montantes pedidos exagerados. Requereu a intervenção acessória do condutor J. P.. Para tal, além do mais, alegou a possibilidade de vir a exigir o reembolso do montante pago na eventual condenação, através do direito de regresso que fosse também demandado. O qual, foi demandado conforme requerido não logrando contestar.

Foi realizada audiência de julgamento e proferida sentença que decidiu nos seguintes termos: “a) -Julgar a alegada exceção perentória da caducidade da ação improcedente e não provada; b) -condenar a ré nos exatos termos do pedido, à exceção no segmento do direito à vida que se reduz para € 40.000,00 e assim, decide-se condenar a ré a pagar aos autores: Pela perda do direito á vida da sua mãe a quantia de € 40.000,00; mais €10.000,00 pelo sofrimento da sua mãe ocorrido no período entre o acidente e a sua morte. A pagar a cada um dos autores, M. F., A. F. e L. M., a quantia de € 10.000,00 a cada um dos autores, a título de danos de natureza não patrimonial; E á autora L. A., também a título de danos de natureza não patrimonial a quantia de €15.000,00. Juros moratórios contados da decisão.

Custas por ambos de acordo com o decaimento.” Inconformada com o decidido a ré seguradora interpôs recurso de apelação formulando as seguintes conclusões: “1.ª Vem o presente recurso interposto da douta sentença dos autos em referência e é o mesmo apresentado na firme convicção de que a prova produzida, a matéria de facto – que será impugnada com recurso à prova gravada – e a matéria de direito sujeitas à apreciação do Tribunal a quo mereciam outra apreciação.

  1. O presente recurso tem por objecto a totalidade da sentença que condenou a Recorrente no pagamento aos Autores de 40.000,00 € pela perda do direito à vida da sua mãe e de 10.000,00 € pelo sofrimento da sua mãe ocorrido no período entre o acidente e a sua morte, a cada um dos Autores M. F., A. F. e L. M. de 10.000,00 € a título de danos de natureza não patrimonial e à Autora L. A. de 15.000,00 € a título de danos de natureza não patrimonial.

    DA NULIDADE DA SENTENÇA 3.ª A Recorrente, entre os artigos 1.º e 17.º da Contestação, defendeu-se por excepção peremptória, invocando a caducidade do direito de accção dos Recorridos, alegando para tanto que o acidente de viação que constitui causa de pedir da presente acção deu origem a um processo-crime, que correu termos sob o n.º 38/14.0GDBGC, no Juízo Local Criminal de Bragança, e que a primeira autora da presente acção figurava naqueles autos como lesada, foi notificada para deduzir, querendo, o pedido de indemnização cível e não o fez em violação do artigo 71.º do CPP, razão pela qual o direito de acção caducou, nos termos do disposto no artigo 298.º, n.º 2 do Código Civil.

  2. Na audiência prévia de 11/04/2019, a Recorrente juntou aos autos certidão comprovativa dessa factualidade e os Recorridos exerceram o contraditório contra a referida excepção.

  3. O Tribunal a quo incorreu em manifesto lapso ao afirmar que a Recorrente “não juntou documental comprovativo do alegado”, conforme melhor se explanará em sede de impugnação da decisão de facto.

  4. Por outro lado, embora o Tribunal a quo tenha afirmado que não se verifica a caducidade do direito de acção, o que apreciou na sentença foi o instituto da prescrição do direito (artigo 498.º do Código Civil).

  5. Assim, o Tribunal a quo apreciou questão que não deveria ter apreciado – a suposta prescrição do direito de indemnização dos Recorridos – e deixou de pronunciar-se sobre uma questão que deveria ter apreciado por ter sido expressamente invocada pela Recorrente na Contestação – a excepção de caducidade do direito de acção dos Recorridos, nos termos do disposto no artigo 298.º, n.º 2 do Código Civil.

  6. Em face do exposto, a douta sentença é nula, nos termos do disposto no artigo 615.º, n.º 1, alínea d) do CPC, nulidade que aqui expressamente se argui para todos os efeitos legais.

  7. Caso assim não se entenda, verificar-se-á a nulidade prevista no artigo 615.º, n.º 1, alínea c) do CPC, que expressamente se argui a título subsidiário, dado que o Tribunal a quo apresentou uma fundamentação baseada no instituto da prescrição do direito (artigo 498.º e 306.º do Código Civil) e concluiu pela não verificação do instituo da caducidade do direito de acção (artigo 298.º, n.º 2 do Código Civil), havendo assim oposição entre os fundamentos e a decisão ou uma ambiguidade que torna a decisão ininteligível.

  8. A douta sentença ser revogada e substituída por outra que, suprindo qualquer uma das nulidades arguidas, aprecie e decida se se verificou a caducidade do direito de acção dos Recorridos.

    Sem prescindir, DA IMPUGNAÇÃO MATÉRIA DE FACTO 11.ªA Recorrente considera que os seguintes factos, por si alegados na Contestação, deveriam ter sido julgados provados: - O acidente de viação em causa nos presentes autos e as respectivas consequências deram origem a um processo-crime, que correu termos sob o n.º 38/14.0GDBGC, no Juízo Local Criminal de Bragança [artigo 2.º da Contestação]; - A Autora M. F. figura no referido processo-crime como lesada e foi notificada e foi notificada do teor da acusação e para, querendo, deduzir o pedido de indemnização civil em requerimento articulado, na pessoa do seu Ilustre Mandatário em 20/02/2017 e pessoalmente em 21/02/2017 [artigo 4.º da Contestação]; - Em virtude da taxa de alcoolemia com que J. P. circulava no momento do acidente, a sua capacidade de reacção e seus os reflexos estavam fortemente diminuídos, bem como a sua capacidade de se concentrar na tarefa da condução do veículo e de o controlar e fazer seguir sempre integralmente dentro da faixa de rodagem e na sua mão de trânsito [factos alegados nos artigos 38.º e 39.º da Contestação].

    - J. P., fruto do álcool de que era portador no sangue, estava incapaz de exercer uma condução segura para si e para os demais intervenientes [facto alegado no artigo artigo 40.º]. - A. I. e os demais ocupantes bem sabiam que o condutor do trator tinha ingerido bebidas alcoólicas [parte já constante do facto provado 38] e que, por isso, estava no estado descrito nos factos provados 37, 37-A e 37-B [facto alegado no artigo 41.º da Contestação, a aditar à parte já constante do facto provado 38].

  9. Os concretos meios probatórios que impõem uma decisão diversa da recorrida são a certidão emitida pelo Juízo Local Criminal de Bragança relativa ao processo 38/14.0GDBGC, junta pela Recorrente na audiência prévia realizada em 11/04/2019, constante do processo físico e digitalizada no Citius em 11/04/2019, identificada no histórico dos actos processuais com a ref.ª 18951315, os Docs. 1 e 2 juntos com a P.I. e os depoimentos das testemunhas J. A. (prestado no dia 25/10/2019, com início pelas 10:44:46 e fim pelas 11:17:11, gravado no ficheiro áudio...

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