Acórdão nº 115/18.9T8VNF.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 08 de Outubro de 2020

Magistrado ResponsávelANIZABEL PEREIRA
Data da Resolução08 de Outubro de 2020
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES: *I. Relatório: Das partes.

J. C. veio requerer contra F. P. SGPS S.A.

acção declarativa em processo comum.

Para o efeito, alegou ter sido eleito administrador da Ré e, em novembro de 2017, ter sido confrontado com o registo da sua renúncia ao referido cargo, sem que tivesse renunciado ao mandato correspondente ao quadriénio então em curso (2015 a 2018). Argumentou que a carta de renúncia que havia entregue aquando da sua primeira eleição e que perdera razão de ser - por ter sido convidado para continuar como administrador e, mais tarde, por ter sido novamente eleito -, tinha sido adulterada e apresentada por quem não representava a sociedade, existindo, pois, falsidade do título apresentado e inexistência do acto cujo registo havia sido requerido.

Concluiu, pedindo que fosse declarado nulo o registo lavrado sob o av. 2, Apresentação 45/20171117, referente à Inscrição 10, Ap. 10/20150821.

Após se ter julgado verificada a falta de citação da Ré e se ter determinado a sua repetição, foi apresentada contestação.

A Ré defendeu que a renúncia tinha sido apresentada pelo Autor e que era válida e, consequentemente, pugnou pela improcedência da acção e pela condenação do Autor como litigante de má fé.

Houve lugar à audiência prévia (fls. 201/205).

Ali se decidiu inexistir motivo para julgar extinta a instância por inutilidade superveniente da lide.

Fixou-se, também, o objecto do litígio e os temas da prova.

Houve lugar à realização da audiência de discussão e julgamento, como emerge da respectiva acta.

*Após a competente audiência de julgamento, foi proferida sentença nos seguintes termos : “ a) julgar a acção procedente e julgar nulo o registo lavrado sob o Av. 2, Ap. 45/20171117, relativo à cessação de funções do Autor enquanto vogal do Conselho de Administração da Ré F. P. SGPS, S.A., por renúncia.

b) determinar o cancelamento do registo indicado em a).

c) julgar improcedente o pedido de condenação do Autor como litigante de má fé e absolvê-lo desse pedido.

Custas da acção a cargo da Ré. ”.

*É desta decisão que vem interposto recurso pela R., a qual terminou o seu recurso formulando as seguintes conclusões ( que transcrevemos): 1. A douta sentença recorrida enferma erro de julgamento, (error in judicando) que resultou de uma distorção da realidade factual (error facti) e na aplicação do direito (error juris), de forma a que o decidido não corresponda à realidade ontológica ou à normativa , pois erra na enunciação de alguma da matéria provada de forma tal que blinda a decisão a nova avaliação da factualidade e integração em solução jurídica diferente, erra na integração da factualidade com a decisão e com a matéria dada como provada em g), h), i), l) e y), tudo numa contradição insanável que redunda em erro de julgamento (violação dos arts 607º e 615º, al. c do CPC); 2. SDR e SMO, mais erra na forma como foi dada como provada a matéria ínsita nas al) k, t) e x), que deve ser alterada ou revogada porque bloqueia outras interpretações e aplicações do Direito à matéria factual em causa, aplica erradamente o art 22º do CRC 3. Mais ainda considerando a integração e conjugação de toda a prova e da provada incoerência (leia-se falta de credibilidade do A./recorrido) e do administrador/ cliente F. P., com as regras de experiencia comum e consequente aplicação do Direito de forma alternativa à ortodoxia seguida.

  1. Devem ser retirados do elenco da prova as alíneas l),t) e x) e deve ser alterada a alínea k) retirando a parte do convite.

  2. É o que resulta da lógica das coisas que bem vem expressa e relatada na sentença (se retirarmos essas alíneas eminentemente conclusivas e tendentes para uma factualidade que só encaixará numa solução de direito), o que resulta da avaliação da própria carta de renúncia (entregue sem data) e o que resulta da reavaliação dos depoimentos de D. M., que o tribunal a quo considerou com depoimento espontâneo e credível (ficheiro áudio 20190918105921_5533269_2870550, 18-09-2019, com inicio em 16:00:10 a 16:24:18), P. J. (ficheiro áudio 20190918120200_5533269_2870550, 18-09-2019, com inicio em 12:02:02 a 12:22:48), F. M., (ficheiro áudio 20190918152828_5533269_2870550, 18-09-2019, com inicio em 15:28:28 a 15:58:05), todos com trechos a relevar citados nas alegações, e da avaliação do enorme caudal de mentiras ou inverdades (na abordagem politicamente correcta), meias verdades, omissões e deturpações que o A/recorrido trouxe aos autos nas suas declarações e acolitado pelo administrador e cliente, F. P. e, finalmente do que disse o próprio A/recorrido (ficheiro áudio 20190918105921_5533269_2870550, 18-09-2019, de 10:59:22 a 10:00:30) que continuou como administrador não executivo e ao minuto 08:45 até 8:50 que “verificou em 2011, depois da AG que justificou a sua nomeação como administrador, que a renúncia não havia sido registada e alertou para isso”. Se assim fosse, nunca a carta de renúncia entregue em sequência de uma AG (que dura um dia) teria sido entregue sem data por um advogado experiente e sabedor. Obviamente que conteria o dia seguinte ao da A.G.

  3. O erro de julgamento crucial foi a avaliação que a douta sentença fez de que a carta de renúncia foi entregue em 2011 para ser levada a registo nessa altura. Se fosse assim, NUNCA A CARTA DE RENUNCIA SERIA ENTREGUE SEM DATA POR UM ADVOGADO MUITO EXPERIMENTADO. (conclusão decorrente até do factos provados em i), nomeadamente da condição da confiança inerente ao exercício do cargo como não executivo.

    Tal alínea – até porque com enunciação eminentemente conclusiva - tem de ser retirado do elenco da prova, pois bloqueia outras apreciações da factualidade.

  4. A carta de renúncia era incondicional, “em aberto” porque sem data, situação absolutamente normal e lícita nestas situações de administrador de Direito, “de favor”, sempre válida e depositada na sociedade recorrente e para ser usada.

  5. Válida, desde logo na medida em que a assinatura foi aposta, pelo próprio A., na carta de renúncia, bem conhecendo tanto o conteúdo da mesma, como os efeitos decorrentes da respetiva formalização (e independentemente da data em que tenha sido assinada), até como advogado. Válida porque estava na posse da R. Válida porque a renúncia que nunca foi revogada. Válida como o A/recorrido até fez questão de relembrar aos acionistas que a ele recorreram em duas reuniões em 2017.

  6. A carta de renuncia sempre esteve válida e em vigor exactamente nos mesmo termos em que foi entregue pelo recorrido e exactamente enquanto vigorasse o estatuto de administrador porque a renovação do mandato em 2014 não concedeu ao A/Recorrido quaisquer poderes executivos (e isso é claro e transversal a toda a sentença).

  7. Ao actuar executivamente – com um acto que teve um custo de 1.000,000,00 euros para os acionistas – o R/Recorrido despoletou a razão de ser da carta de renúncia que ele, tão bem, antecipou necessidade em 2011 e justificou ou legalizou a sua apresentação a registo, sendo-lhe aposta a data consequente à verificação da condição e fazendo cumprir a sua vontade.

  8. A verdade é que a apresentação da carta de renúncia a registo foi a manifestação de vontade do recorrido em consequência da verificação da condição que ele e os acionistas haviam contratado em 2011.

  9. A carta de renúncia foi apresentada a registo exactamente nos termos, tempo, modo e para o efeito para a qual foi fabricada, assinada e entregue pelo A/recorrido, 13. Por tudo, deve o A/recorrido ser condenado como litigante de má-fé, pois, até como advogado, trazer inverdades ao tribunal não pode passar impune..” *Contra-alegou o R, pugnando pela improcedência do recurso e a título subsidiário veio deduzir ampliação do objeto do recurso, apresentando as seguintes conclusões: 1º) Apesar do esforçado e cuidado julgamento da matéria de facto por parte do Tribunal a quo, entende o Autor existirem determinados pontos deste elenco que, para espelharem com ainda com mais rigor a realidade dos factos, carecem de ser revistos, para o caso, que resolutamente se espera, de poder vir a proceder qualquer questão levantada pela Recorrente; 2º) Em relação ao ponto f), requer-se que o mesmo seja completado com a seguinte menção “tendo o Autor intervindo efetivamente naquela Assembleia que teve lugar no ano de 2011”: é isto mesmo que decorre, sem oposição de qualquer outro meio de prova, das declarações de parte do Autor (cfr. depoimento gravado de minutos 04’02’’ a 07’29’’ do ficheiro áudio 20190918105921_5533269_2870550), do depoimento de parte do administrador F. P. (cfr. depoimento gravado de minutos 04’45’’ a 07’02’’do ficheiro áudio 20190918141937_5533269_2870550); 3º) No que respeita o ponto g), requer-se que seja alterada a menção que do mesmo consta em assembleias gerais para na assembleia geral que se alude no ponto anterior, prendendo-se a requerida alteração com a circunstância do uso do plural se ter devido certamente a lapso involuntário do douto Tribunal a quo, uma vez que só a menção no singular é que se coaduna com o facto provado na alínea f), que não foi objeto de impugnação pela Recorrente.

    1. ) Em relação ao ponto h) requer-se a eliminação do mesmo uma vez que a condição a que se alude no ponto em causa não foi objeto de qualquer prova (antes decorreu da instrução da causa os motivos que determinaram a eleição do Autor para o mandato de 2011 a 2014 [expressos na alínea f) e g)]: isto mesmo decorre das declarações de parte do Autor (cfr. depoimento gravado de minutos 04’02’’ a 07’29’’ do ficheiro áudio 20190918105921_5533269_2870550) e ao depoimento do administrador F. P. (cfr. depoimento gravado de minutos 04’45’’ a 07’02’’ do ficheiro áudio 20190918141937_5533269_2870550), únicas pessoas que depuseram diretamente sobre estes factos e ainda, à contrário, dos depoimentos de P. J. (cfr. depoimento gravado de minutos 00’00’’ a 01’29’’ do ficheiro áudio 20190918122446_5533269_2870550), F. M. (cfr. depoimento gravado de minutos 22’00’’ a...

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