Acórdão nº 634/19.0T8VCT.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 08 de Outubro de 2020

Magistrado ResponsávelANTÓNIO SOBRINHO
Data da Resolução08 de Outubro de 2020
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães: I – Relatório; Recorrente: M. F., (AA.); Recorridos: J. L. e mulher R. L. (Réu); *****Pedido: A autora intentou a presente acção de processo comum contra os réus, pedindo que:

  1. Se declare que é legítima proprietária e possuidora do prédio identificado no artigo 1º da petição inicial; b) Se declare que o caminho que se situa a norte do prédio da autora e que serve o caminho desta é um caminho de servidão; c) Se condenem os réus a reconhecerem que a autora tem o direito de passar nesse caminho; d) Se condenem os réus a não turbarem o exercício deste direito da autora sobre o dito caminho, abstendo-se de qualquer ato que limite o exercício livre desse direito a servidão por parte da mesma; e) Se condenem os réus a pagar à autora, por cada ato concreto que pratiquem de que resulte a turbação do direito de servidão detido pela autora, uma sanção pecuniária de € 1.000,00, acrescida de € 5.000,00 por cada dia que perdure essa mesma turbação e de todas as despesas que resultem para a reposição da situação anterior à turbação.

    Causa de pedir: A autora alegou que é dona de um prédio urbano sito no Lugar de ..., freguesia de ..., concelho de Monção, com a área total de 369 m2, a confrontar a norte com J. L., a sul com herdeiros de A. B., a nascente com J. L. e a poente com caminho público, descrito na conservatória sob o n.º ... da respetiva freguesia e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo ..., prédio registado a seu favor pela Ap. 7, de 1981/02/06, e que lhe adveio por doação que lhe fizeram os seus pais, I. F. e T. B., no ano de 1970. Desde então que a autora vem exercendo atos de posse sobre tal prédio, como foi o caso das obras de reconstrução na casa de moradia que integra o referido prédio e que ficaram concluídas em 1981, ano em que a autora, o seu então marido e a filha mais velha passaram a habitar.

    Que desde então ali habita continuamente, procedendo às obras de melhoramento e conservação, agricultando os respetivos rossios, colhendo e fazendo seus os frutos respetivos, o que fazia à vista de toda gente, sem oposição de ninguém e na convicção de exercer direito próprio e correspondente ao direito de propriedade.

    Há mais de 20, 30, 40 e mais anos que o acesso ao prédio da autora sempre se fez pelo caminho de servidão a norte do seu prédio e que dá acesso ao caminho público denominado Rua do …, sendo que nunca a autora ou os seus antepossuidores tiveram qualquer outro caminho para aceder ao seu prédio, tanto a pé como com veículos de quatro rodas.

    Há cerca de um ano, aquando da aquisição pelos réus do prédio que confronta a nascente com o prédio da autora, estes passaram a ocupar o caminho de servidão, designadamente, aí colocando tojo, gravilha, depositando plástico para o lixo, pedras (mormente pedras de médio porte que ali colocaram em finais de Dezembro de 2018. Em meados de Janeiro de 2019, os réus depositaram dois montes de tojo no caminho, ocupando praticamente toda a sua largura, impedindo a autora de aceder livremente ao seu prédio.

    O caminho de servidão inicia-se junto ao caminho público, com 4,9 metros de largura, estreita até ao prédio a nascente do da autora, local onde mede 2,160 metros, sendo que na entrada do prédio da autora, esse caminho de servidão tem apenas 1,85 metros, e, face à ocupação de uma parcela desse caminho pelos réus, a passagem de veículos de quatro rodas fica condicionada.

    Quando é possível circular, os veículos têm de circular junto ao muro de suporte de terras do prédio da autora. O réu marido, quando tem necessidade de passar de tractor, necessariamente tem de passar com as rodas do tractor a tocar no muro da autora, o qual, edificado há mais de 30 e 40 anos, começa agora a ceder, apresentando perigo de queda para o caminho, temendo a autora, não só pela queda do muro, como pela desestabilização da sua casa, já um dos pilares da mesma assenta muito perto do muro.

    Que a ocupação do referido caminho de servidão inviabiliza o aproximar de uma ambulância ou dos carros dos bombeiros para a casa da autora.

    Citados, os réus contestaram, afirmando que jamais questionaram ou perturbaram o direito de propriedade da autora sobre o prédio identificado em 1º da PI.

    Quanto ao invocado direito de passagem da autora, afirmam que existe, efetivamente, mas é meramente pedonal, com exclusão de trânsito carral, qualquer que seja.

    De acordo com os réus, o prédio da autora não é prédio encravado, já que confronta, pelo poente, com caminho público que oferece excelentes condições de circulação a pé e de carro, sendo que na extrema poente do prédio identificado em 1º da PI existe há mais de 20 e 30 anos, uma entrada de acesso às edificações urbanas da autora, com largura de 2 metros, que permite o trânsito de veículos e pessoas de modo ininterrupto, durante todas as horas do dia e ao longo de todos os dias do ano, em perfeitas condições de segurança e conforto e que, aliás, a autora vem usando, há mais de 20 e 30 anos, ininterruptamente, à vista de toda a gente e sem qualquer oposição.

    É absolutamente desnecessário o uso do caminho de servidão de passagem pedonal (cujas características são até evidenciadas pelo portão de acesso existente no prédio da autora) que vem onerando o prédio dos réus.

    Os réus, conquanto não impeçam ou dificultem o trânsito pedonal da autora, podem usar, fruir e dispor do seu prédio como melhor lhes aprouver.

    No que concerne ao muro da autora - e negando peremptoriamente que o seu trânsito de tractor haja alguma vez causado dano ao muro – aceitam que o mesmo está em risco de desmoronamento, mas apenas e só porque nos últimos 20, 30 e 40 anos nunca procedeu a obras de reparação, manutenção ou sequer limpeza do muro, que, em toda a sua extensão se encontra em progressiva inclinação, na parte superior, no sentido sul-norte, com risco real de desabar para o caminho de servidão que integra o prédio dos autores.

    Alegam ter o réu marido, adquirido por sucessão de seus pais, M. L. e B. R., os prédios descritos em 29º da contestação/reconvenção, prédios de que, por si e seus antepossuidores, há mais de 20, 30 40 e 50 anos, os réus estão na posse pública, pacífica, exclusiva e sucessiva, posse traduzida na utilização das edificações urbanas para armazenar fenos e rações destinados à alimentação dos seus animais, para armazenar batatas, cebolas e vinho e para albergar tractores, alfaias agrícolas e outros utensílios à atividade agrícola que ali desenvolvem, na limpeza e cultivo da parte rústica, (de que retiram potencialidades e frutos e cultivam e tratam), mais pagando os encargos tributários dos prédios, fazendo-o à vista de toda a gente, com o ânimo de exercerem o direito de propriedade de que são titulares exclusivos, sem oposição de ninguém, mormente da autora.

    No dia 1 de Fevereiro de 2017, por contrato de compra e venda, adquiriram a M. C. e A. C., o prédio rústico denominado “Eira”, na freguesia de ..., Lugar de ..., Monção, composto de terreno de cultura com a área de 150 m2, a confrontar do norte e nascente com M. L., do sul com M. R. e do poente com I. F., inscrito na respetiva matriz predial sob o artigo ... e descrito na CRP sob o n.º ..., mostrando-se a aquisição a favor dos réus registada pela Ap. 432 de 2017/02/02.

    Não sendo o prédio da autora encravado e dispondo ela de entrada carral e pedonal com 2 metros de largura, que lhe permite transitar em segurança e comodidade de e para o caminho público, torna a servidão pedonal desnecessária, onerando injustificadamente os réus que se vêem, desde logo, impedidos de delimitar o seu prédio da via pública e de cultivar o seu prédio em toda a extensão.

    Pedem que se considere extinta, por desnecessidade, a servidão que existe.

    Para a eventualidade de improceder tal pretensão, alegam que a abertura de nova entrada, pelo poente é viável e não implica incómodo que se repute de relevante para a autora, tanto mais que os custos sempre seriam a suportar pelos réus.

    Concluem peticionando que seja a ação julgada improcedente e, em sede de pedido reconvencional, peticionam: - Que se declare que são proprietários dos prédios que identificam sob alíneas a) e b) do artigo 29º e no artigo 41º da contestação/reconvenção; - Que o direito de servidão de passagem pedonal que onera os seus prédios a favor do citado prédio da autora deverá ser declarado extinto por desnecessidade, já que tem outra entrada mais segura e cómoda; E, subsidiariamente, para a eventualidade de se considerar que tal entrada não é suficiente, - Que seja declarada extinta por desnecessidade, por ser viável e estarem os réus obrigados a custear as obras com vista a tal desiderato.

    Na réplica, veio a autora reafirmar que sempre o acesso ao seu prédio se fez pelo caminho de servidão que onera o prédio dos réus, que é o único acesso de que dispõe e o único que usou, seja pedonal, seja carral.

    Refuta que seja possível construir acesso pelo lado poente, dada a elevada cota de terreno relativamente ao caminho público.

    Quanto ao trânsito carral, afirma que sempre a própria e o ex-marido se serviram do caminho para carregar objetos pesados, descarregar ração para os animais, descarregar os gigos de uvas resultantes da vindima, para coloca-las na adega, na entrada da casa da autora, o que sempre aconteceu há mais de 20, 30 e 40 anos, à vista de todos e sem oposição de ninguém, incluindo os réus que só após a aquisição primeiro por sucessão e depois por compra vem modificando os prédios para negar o evidente, sobretudo após aquisição do prédio a que se alude em 49º e agora que a autora não vindima e menos frequentemente transita por ali de carro, assinalando ser pessoa de idade avançada, que vive sozinha e que pode, a qualquer momento, necessitar de recorrer a algum veículo de emergência de suporte de vida.

    Mais refere que a entrada que os réus afirmam ser sua integra o prédio que é pertença da herança indivisa aberta por óbito de C. B..

    A acrescer, toda a edificação da casa e anexos estão voltados para o caminho...

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