Acórdão nº 185/15.1T8BRG.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 01 de Outubro de 2020

Magistrado ResponsávelAFONSO CABRAL DE ANDRADE
Data da Resolução01 de Outubro de 2020
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães I- Relatório M. B.

, solteira, maior, contribuinte fiscal n.º ………, residente na Estrada …, n.º …, na Ilha da Madeira, intentou contra X – COMPANHIA DE SEGUROS, NIPC ……...

, com sede na avenida …, n.º … Lisboa, Portugal, a presente acção declarativa sob a forma comum, tendo pedido a condenação da Ré no pagamento: i.

Da quantia de € 150.000,00 (cento e cinquenta mil euros) a título de indemnização pelos danos patrimoniais e não patrimoniais decorrentes do sinistro em crise; ii.

Das quantias a liquidar em execução de sentença ou ampliação do pedido relativo ao agravamento do dano futuro e às despesas inerentes ao recurso a ajudas técnicas, como sejam, material médico, medicamentoso e necessidade de acompanhamento médico, conforme alegado nos artigos 109.º e 110.º, da petição inicial; iii.

Dos juros moratórios calculados à taxa legal e contados desde a citação até efectivo e integral pagamento.

Para tanto, alegou, em síntese, que no dia 06.06.2013, pelas 11h10, enquanto seguia transportada no banco do meio do veículo Fiat, modelo Doblo Dies, matrícula XX, pertencente a I. P., segurada da Ré, conduzido por A. T., sob as ordens e interesse da primeira, na A7 no sentido Guimarães – Vila Nova de Famalicão, foi vítima de acidente de viação causado por culpa exclusiva daquele condutor.

Em decorrência directa desse acidente teve de suportar graves lesões físicas e sofrimento psicológico, pelo que pretende ser indemnizada pelos danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos.

Regularmente citada, a Ré apresentou contestação, a fls. 42 a 48, na qual, impugnando a velocidade e o motivo da derivação do veículo para a esquerda, referiu que a Autora teve alta a 16.05.2014, com as lesões consolidadas, tendo sido determinado um período de incapacidade geral total de 90 dias, quantum doloris de 5/7, dano estético de 2/7 e IPG de 10 pontos, sem rebate profissional e sem necessidade de assistência médica ou medicamentosa futura.

Suscitou ainda o incidente de intervenção acessória do condutor A. T., alegando que, na sequência de exame efectuado a amostra de sangue que foi colhida, acusou uma TAS de 0,50 g/l e resultado positivo no exame toxicológico de determinação e quantificação de THC-COOH de 35,8 ng/ml.

Deferido o incidente por despacho de fls. 76 a 77, pelo Interveniente Acessório A. T., residente na rua … Porto, foi apresentada contestação, na qual aquele alegou que o acidente se deveu à intervenção da pessoa que seguia à sua direita, pelo que pediu, a final, a intervenção de M. M., o que foi indeferido por despacho de fls. 121 a 122/verso.

Dispensada a realização de audiência prévia, foi proferido despacho saneador, onde se afirmou a validade e a regularidade da instância, tendo-se ainda seleccionado o objecto do litígio e os temas da prova, sem que tenham sido deduzidas reclamações.

Realizada prova pericial, a autora ampliou o pedido, através de articulado superveniente, no sentido de passar a ser o da condenação da Ré no pagamento: i.

Da quantia global € 290.000,00 (duzentos e noventa mil euros) acrescida de juros legais vincendos, calculados sobre o capital em dívida, contados desde a citação até integral e efectivo pagamento; ii.

Das quantias a liquidar em ampliação do pedido ou execução de sentença, conforme peticionado nos artigos 109.º e 110.º da petição inicial.

A ampliação do pedido foi admitida pelo despacho de fls. 394, assim como o foi o articulado superveniente, através do despacho de fls. 393 a 394.

A Ré deduziu oposição ao articulado superveniente onde, em súmula, manteve o teor da contestação inicial, alegando o carácter excessivo da indemnização peticionada (desde logo, porque a incapacidade apurada na perícia é inferior à invocada na petição inicial e porque a situação profissional da Autora revela que ela não ficou diminuída ao nível da sua capacidade de ganho).

Realizou-se então a audiência de julgamento, finda a qual foi proferida sentença, que julgou a acção parcialmente procedente, e, em consequência: 1.

Condenou a Ré a pagar à Autora: i) A quantia indemnizatória de € 115.000,00 (cento e quinze mil euros), para compensação da perda de capacidade de ganho/dano biológico, acrescida dos juros de mora civis, à taxa legal de 4%, desde a data da presente sentença até integral pagamento; ii) A quantia indemnizatória de € 30.000,00 (trinta mil euros), para compensação dos danos não patrimoniais, sobre a qual vencem juros de mora civis, à taxa legal de 4%, desde a data da prolação da presente decisão até integral pagamento; 2. Absolveu a Ré do restante peticionado.

Inconformada com esta decisão, a ré X dela interpôs recurso, findando a respectiva motivação com as seguintes conclusões: 1- Na douta sentença de que se recorre o Tribunal valorou de forma exagerada e injustificada os danos patrimoniais atribuíveis à Autora.

2- No respeitante à quantificação do dano patrimonial futuro, que para a Autora representa um Défice Funcional Permanente da Integridade Física e Psíquica de 10 pontos, há que considerar que a Autora não viu a sua capacidade de ganho afectada e que, por conseguinte, em nada vê limitada a sua vida profissional, bem como a respectiva remuneração.

3- Com efeito, o lesado que pretenda obter uma indemnização a título de lucros cessantes em consequência da lesão sofrida, terá de fazer prova do pressuposto médico-legal sem o qual não há lugar a lucro cessante.

4- Ora, a Autora não logrou provar a diminuição da capacidade de ganho, pelo contrário, limita-se a invocar ser portadora de um défice funcional de 10 P para assim fundamentar a perda da capacidade de ganho e justificar a indemnização por lucros cessantes.

5- A prova mais irrefutável de que a Autora não viu a sua capacidade de ganho diminuída é o principesco rendimento que aufere na Holanda, onde actualmente se encontra a trabalhar.

6- Salienta-se que do Relatório do IML consta “Neste caso as sequelas são compatíveis com o exercício da actividade habitual mas implicam esforços suplementares”.

7- A repercussão negativa do DFPIFP de que a Autora é portadora apenas se traduz num maior esforço no desenvolvimento de algumas actividades, não implicando uma diminuição da capacidade para o normal exercício da sua actividade profissional.

8- A indemnização a título de danos patrimoniais futuros de carácter essencialmente biológico, não afectou a capacidade de ganho da Autora, considerando a remuneração que esta aufere, conforme jurisprudência referida no corpo das alegações que se transcreve parcialmente (“Ora, os danos patrimoniais, nomeadamente os que se consubstanciam nos respeitantes aos lucros cessantes, reportam-se àquelas situações em que, por força da lesão de que foi vítima, o respectivo lesado vê reduzida a sua capacidade laboral, actual e futura, com a daí decorrente repercussão da redução da sua força laboral na contrapartida económica auferida pela actividade profissional pelo mesmo desenvolvida”.

“… Assim … embora o A. tivesse ficado afectado na sua integridade física de uma incapacidade permanente geral de 5%, desta não decorre, em termos de rebate profissional qualquer repercussão económica traduzia na diminuição de rendimentos auferidos no exercício da actividade profissional de médico dentista, situação essa, porém, já distinta da necessidade da realização de maiores esforços no exercício da mesma…, ") 9- A remuneração actual não deve ser considerada como elemento determinante para o cálculo dos danos patrimoniais futuros, uma vez que, não constituem lucros cessantes dado que não houve perda da capacidade de ganho.

10- Para um correcto entendimento da justiça e dos normativos legais em vigor é imprescindível a uma rigorosa ponderação de todos os elementos factuais para não surgir uma situação de locupletamento indevido.

11- Este ponto assume particular importância quando na situação concreta a incapacidade não afecta sob qualquer aspecto a capacidade de ganho da lesada, mormente, a título salarial.

12- Não se pode fazer depender a indemnização de um mero calculo matemático baseado no rendimento.

13- Pelo que não deve ser a remuneração considerada como elemento determinante para o calculo dos danos patrimoniais futuros, 14- Bem ao contrário, a remuneração da Autora é demonstrativa de que o sinistro não afectou a respectiva capacidade de ganho.

15- A Autora à data do acidente tinha 18 anos de idade e era estudante na Faculdade de Engenharia do …, não auferindo, qualquer remuneração.

16- A Autora acabou o percurso académico, tendo em 01.09.2018 ido exercer a sua profissão para a Holanda onde aufere a retribuição base bruta de 3 199,00 mensais e liquida de € 2 500,00.

17- É a própria A. que em sede de declarações de parte afirma que chegou onde as colegas não chegaram, situação confirmada pela amiga J. M. “sua antiga colega na universidade que mencionou, inclusive, que tentou, sem sucesso, idêntica colocação profissional” 18- A ora recorrida encontra-se a laborar na Holanda, país com um nível de vida substancialmente mais elevado do que o português.

19- Assim, não pode ser considerado o salário auferido pela Autora, até porque, recorrendo às regras da experiência de vida, e particularmente no país em causa, o avultado salário auferido está indubitavelmente associado a um custo de vida elevado e aos gastos substanciais ligados à sua obtenção.

20- O Tribunal ao desconsiderar estes factores arrisca a concretizar um enriquecimento injustificado à Autora pela quantia indemnizatória atribuída.

21- A jurisprudência determina que o valor de referência para o cálculo do dano patrimonial (lucros cessantes) deve ser o salário mínimo nacional à data do acidente – Neste sentido Acórdão do STJ de 22/01/2009, disponível em www.dgsi.pt.

22- Nesta perspectiva, no cálculo da indemnização por danos patrimoniais o rendimento a considerar para o cálculo do montante indemnizatório é o salário auferido pelo lesado aquando da verificação do acidente.

23- À data do acidente a Autora era estudante, não...

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