Acórdão nº 1498/18.6T8VCT.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 01 de Outubro de 2020

Magistrado ResponsávelMARGARIDA SOUSA
Data da Resolução01 de Outubro de 2020
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães: I. RELATÓRIO: E. V. e mulher J. C. instauraram contra a sucursal de Ponte de Lima do BANCO ..., S.A. ação declarativa sob a forma de processo comum, pedindo que: seja o Réu condenado a restituir aos Autores a quantia de 100.000,00 €, correspondente ao valor do capital depositado no Réu, vencido e garantido; seja o Réu condenado a pagar aos Autores os juros de mora vencidos e vincendos calculados à taxa legal de 4%, desde 28 de Outubro de 2014 até efetivo e integral pagamento; assim não se entendendo, seja declarado nulo qualquer contrato de adesão que o Réu invoque para ter aplicado os 100.000,00 € que os Autores lhe entregaram; seja declarado ineficaz em relação aos Autores a aplicação que o Réu tenha feito desse montante; condenar-se o Réu a restituir aos Autores os referidos 100.000,00 €, acrescidos dos juros de mora vencidos e vincendos calculados à taxa legal de 4%, desde 28 de Outubro de 2014 até efetivo e integral pagamento; em qualquer dos casos, seja o Réu condenado a pagar aos Autores a título de indemnização por danos não patrimoniais a quantia de 5.000,00 €, acrescida dos juros de mora que se vencerem após a citação e até integral pagamento.

Alegaram para tanto e em suma, que realizaram operação bancária de subscrição de obrigações por indicação do Banco Réu, que, através de seu funcionário, lhes disse que o produto era em tudo semelhante a um depósito a prazo, mas com taxas de juros melhores, com total garantia de reembolso do capital investido, sendo produto do próprio banco, sucedendo que, em outubro de 2015, já depois de lhe ter sido negada a restituição do capital aplicado, o Autor ficou a saber que, ao contrário do que lhe havia sido referido, nenhuma garantia existia de reaver o seu dinheiro; subsidiariamente, alegam, nunca qualquer contrato lhes foi lido ou explicado, nem entregue cópia sobre as obrigações subordinadas da SXN, sendo, pois, nulas as cláusulas de quaisquer contratos, naquelas condições, assinados pelos Autores. Mais alegaram que, com a sua atuação, o Réu colocou os Autores num permanente estado de preocupação e ansiedade, causando-lhes tristeza e sofrimento moral.

Contestou o Banco R., excecionando a incompetência territorial – exceção que já foi julgada improcedente – e a prescrição, bem como impugnando os factos alegados pelos AA, defendendo que, ao invés do invocado por aqueles, cumpriu todos os deveres de informação que sobre ele recaíam.

Efetuado o julgamento, foi proferida sentença que julgou a ação parcialmente procedente, condenando o Réu no pagamento aos Autores da quantia de 100.000,00 € (cem mil euros), acrescida dos juros de mora, à taxa legal, contados desde 27 de Outubro de 2014, até efetivo e integral pagamento.

Inconformado, o Réu interpôs recurso, na sequência do qual esta Relação veio a anular a decisão da matéria de facto proferida pela primeira instância no que tange ao ponto 3) dos “Factos provados” e a determinar a ampliação da decisão relativa à matéria de facto de modo a que esta passasse a abranger a apreciação da questão sobre se o funcionário do Banco Réu referiu ao Autor que o produto era do próprio banco, pelo que o retorno do dinheiro aplicado era igualmente garantido pelo banco.

Repetido o julgamento, foi proferida nova sentença com segmento decisório igual ao da primeira, sendo dessa nova sentença que agora vem interposto recurso pelo Réu, que nele apresenta as seguintes conclusões: I. O Banco Recorrente concorda não pode concordar com a matéria de facto dada como provada nos pontos 3, 5, 6, 10, 11, 12, 17, 18, 19, 20 e 22.

II.Esta discordância tem com base o depoimento da testemunha J. P., no seu depoimento gravado no sistema citius no f‌icheiro com a referência 20190312113551_1477841_2871823 de da testemunha A. R., no seu depoimento g r a v a d o n o s i s t e m a c i R u s n o f‌i c h e i r o c o m a r e f e r ê n c i a 20190312110149_1477841_2871823 e ainda com base nos documentos relativos ao produto em causa nos presentes autos, nomeadamente a ficha informativa e a nota interna juntos aos autos, bem como no depoimento da testemunha J. P., gravado no sistema citius com a referência 20200127105417_1477841_2871823, que no essencial confirma as suas declarações cujas passagens acima referimos.

III.O facto provado 17 deverá assim passar a ter a seguinte redacção: 18) As orientações e comunicações internas existentes no Banco e que este transmitia aos seus funcionários incumbidos de comercializar aquele produto, consistiam em af‌irmar a segurança dele, a sua solidez e a boa rentabilidade.

IV. Deverão ser dados como não provados os factos provados 3, 5, 6, 10, 11, 12, 19, 20 e 22.

V. Entende ainda o recorrente que deverá ser dado como provado o seguinte facto: a) - O funcionário bancário explicou ao Autor que o produto em causa se tratava de obrigações da SXN, entidade que era dona do Banco Réu, que era um produto a 10 anos, com uma remuneração superior à dos depósitos a prazo e que a liquidez antecipada poderia ser obtida através do endosso do mesmo a um outro cliente interessado.

VI.A putativa desconformidade entre o comportamento exigido ao Réu e o seu comportamento verif‌icado tem que ver com o facto do Tribunal considerar que, a circunstância do funcionário do Banco Réu ter assegurado ao Autor (conforme ele próprio estava convencido) que a aplicação f‌inanceira era um produto sem risco, com capital garantido, equivalente a um depósito a prazo, não transmitindo a característica da subordinação, conf‌igura a prestação de uma informação falsa.

VII.Porém, tal realidade não conf‌igura qualquer violação do dever de informação por prestação de informação falsa.

VIII.Não adianta aliás a sentença qual o risco que associa às Obrigações SXN e que entende deveria ter sido informado aos AA, sendo que não podemos deixar de entender que se refere ao verif‌icado incumprimento do reembolso… IX.O único risco que percebemos existir na emissão obrigacionista em causa é exactamente o relativo ao cumprimento da obrigação de reembolso.

X. Este risco corresponde ao incumprimento da prestação principal da entidade emitente! Ou seja, corresponde ao chamado RISCO GERAL DE INCUMPRIMENTO! XI.A possibilidade deste incumprimento não corresponde a qualquer especial risco inerente ao modo de funcionamento endógeno do instrumento f‌inanceiro... antes corresponde ao normal e universal risco comum a todos, repete-se... a todos, os contratos! XII.Do incumprimento da obrigação de reembolso da entidade emitente, em 2014 e 2016, não podemos, sem mais, retirar que esse o risco dessa eventualidade fosse relevante – sequer concebível, à excepção de ser uma mera hipótese académica -, em 2004 e 2006, dez anos antes! XIII.A SXN era titular de 100% do capital social do Banco-R., exercendo, por isso o domínio total sobre este.

XIV.O risco associado ao reembolso das Obrigações correspondia, então ao risco de solvabilidade da SXN.

XV.E sendo esta totalmente dominante do Banco-R., então este risco de solvência, corresponderia, grosso modo, ao risco de solvabilidade do próprio Banco! XVI.A segurança da subscrição de Obrigações emitidas pela SXN seria correspondente à segurança de um Depósito a Prazo no Banco ....

XVII.O risco Banco ... ou risco SXN, da perspectiva da insolvência era também equivalente! XVIII.A única diferença consistiu no facto do Banco ter sido resgatado através da sua nacionalização, numa decisão puramente política e alicerçada num regime aprovado propositadamente para atender a essa situação e não em qualquer quadro legal previamente estabelecido.

XIX.A menção do dito risco praticamente inexistente, como de resto do capital garantido, não pode senão ser entendida no contexto da atribuição de uma segurança acima da média ao produto, de conf‌iança no normal cumprimento de todas as obrigações da emitente, sustentada em factos e juízo objectivamente razoáveis e previsíveis.

XX.A menção à expressão capital garantido não tem por si só a virtualidade de atribuir qualquer desaparecimento de todo o risco de qualquer tipo de aplicação… XXI.A expressão capital garantido mais não é do que a descrição de uma característica técnica do produto – corresponde à garantia de que o valor de reembolso, no vencimento, é feito pelo valor nominal do título e correspondente ao respectivo valor de subscrição! Ou seja, o valor do capital investido é garantido! XXII.A este propósito o Plano de Formação Financeira em site do Conselho de Supervisores Portugueses – www.todoscontam.pt! descreve as características de produtos f‌inanceiros, entre os quais as Obrigações, e explica a garantia de capital, exactamente nos termos que vimos de expor.

XXIII.Ainda que se entenda que esta expressão mereceria uma densif‌icação ou explicação aos clientes, a f‌im de evitar qualquer confusão, o certo é que, transmitindo uma característica técnica, não se poderá af‌irmar que o banco, ou os seus colaboradores agiram com culpa, e muito menos grave! XXIV.O Banco limitou-se a informar esta característica do produto, não sendo seu obrigações assegurar-se de que o cliente compreendeu a af‌irmação.

XXV.A interpretação das menções “sem risco” ou de “capital garantido” não é susceptível de ser feita apenas com recurso à impressão do destinatário, nos termos do previsto no artº 236º do CCiv. uma vez que esta disposição aplica-se, apenas e só, às declarações negociais.

XXVI.A comercialização por intermediário f‌inanceiro de produto com a indicação de que o mesmo tem “capital garantido” não implica a corresponsabilização do referido intermediário pelo prejuízo decorrente da falta de reembolso por parte da entidade emitente.

XXVII.O dever de informação ao cliente, não se trata de um direito absoluto do cliente à prestação de informações exactas, mas apenas de um dever de esforço sério de recolha de informações o mais f‌iáveis possível pelo banco.

XXVIII.O grau de exactidão em relação às informações será variável, consoante o tipo de informação em causa.

XXIX.No caso...

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