Acórdão nº 1873/19.9T8VNF.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 23 de Janeiro de 2020
Magistrado Responsável | HELENA MELO |
Data da Resolução | 23 de Janeiro de 2020 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam em conferência no Tribunal da Relação de Guimarães: I – Relatório M. G.
e marido H. S.
vieram instaurar processo especial para acordo de pagamento.
Alegaram, em síntese, exercerem respectivamente a profissão de gerente comercial e de administrador comercial, tendo assumido a título pessoal consideráveis obrigações junto de instituições de crédito. Deixaram de exercer a actividade comercial por conta própria e passaram a trabalhar por conta de outrem. Não dispõem de meios que lhes permitam o pagamento integral e pontual de todas as suas obrigações, pelo que só com muito esforço e sacrifício têm suportado o pagamento de alguns créditos. Não obstante a existência de passivo acumulado, os requerentes estão a exercer a sua actividade profissional e reúnem as condições necessárias para estabelecerem negociações com os seus credores, de modo a concluírem um acordo de pagamento.
Concluídas as negociações, procedeu-se à votação do plano de fls 42 e ss, tendo sido aprovado por quórum deliberativo de 100% e 66,90% dos votos emitidos em sentido favorável, todos correspondentes a créditos não subordinados.
Foi homologado por sentença o plano de pagamentos de fls 42 e ss dos autos.
Os credores Banco ..., SA e A. F. e mulher, M. C. vieram interpor recurso dessa decisão.
O Banco ... SA concluiu as suas alegações do seguinte modo: 1. A recorrente pretende que seja reapreciada a decisãode homologação do acordode pagamento, não se verificam os requisitos necessários.
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O acordo proposto viola o princípio da igualdade -não diferenciando credor hipotecário do credor comum. O mesmo plano trata de forma idêntica realidades distintas prevendo o mesmo regime de perdão e de pagamentos para os créditos comuns e para o credito do Banco ... SA, cujo credor sem nisso consentir vê praticamente dissolvida a garantia do crédito de que é titular.
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Viola o princípio da proporcionalidade, iniciando-se os pagamentos 48 meses após aprovação do plano, apenas propondo-se regularizar 20% do capital implicando um perdão de 80% do restante capital. Ora a proporcionalidade afere-se pela verificação de uma medida que é avaliada como sendo justa, adequada e razoável. O perdão de 80% de capital é absolutamente desproporcional.
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Caso assim não se entenda e por mera cautela, novamente se invoca que os devedores se encontram em situação de manifesta insolvência.
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O PEAP não é aplicável a devedores em situação de insolvência.
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A redução de um crédito garantido por hipoteca sobre um bem que constitui o único património dos devedores não pode ser considerada uma medida de recuperação dos devedores.
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Tal pretensa medida de recuperação colocaria o credor garantido numa situação inaceitavelmente mais desfavorável do que se fosse promovida a imediata liquidação do ativo.
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Compete ao juiz o dever de avaliar oficiosamente a legalidade do plano proposta, mesmo quando este possa ter sido aprovado por uma maioria de credores.
Termos em que, deve a presente decisão de homologação do acordo ser reapreciada mediante os princípioseregras que regem e estão presentes nos artigos215ºe 216º do CIRE.
E os credores A. F. e mulher, M. C., concluíram as suas alegações do seguinte modo: 1.Com o presente recurso os recorrentes alegam a nulidade dos presentes autos, por violação do artº 17º - G, nº 6 e 222º G, nº 7 do CIRE. Por força do trânsito em julgado do Proc. 1716/17.8STS, os requerentes à data da proposição dos presente autos já eram insolventes, estranhando-se sobremaneira por que razão o tribunal do Comercio de Santo Tirso não atuou em conformidade com a lei, violando-a de forma imprópria.
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“O termo do processo especial de revitalização efetuado de harmonia com os números anteriores impede o devedor de recorrer ao mesmo no prazo de dois anos”. Os requerentes intentaram ação equivalente de PEAP, contra legem quando se encontravam em situação de insolvência.
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Nulidade que foi suscitada pelo credor hipotecário Banco ... S.A em sede de reclamação de créditos nestes autos e que agora se reafirma, sobre a qual o tribunal a quo não se pronunciou, requerendo-se por conseguinte a nulidade dos presentes autos por violação da disposição legal indicada, devendo os mesmos serem imediatamente remetidos para processo de insolvência, a suscitar pelo sr. Administrador provisório (AJP) dos autos indicados (Dr. M. A.), como é de lei.
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Os recorrentes pretendem, em segundo lugar, que seja reapreciada a decisão de homologação do acordo de pagamento, já que não se verificam os requisitos necessários. O acordo proposto viola o princípio da igualdade -não diferenciando credor hipotecário do credor comum. O mesmo plano trata de forma idêntica realidades distintas prevendo o mesmo regime de perdão e de pagamentos para os créditos comuns e para o crédito dos recorrentes, cujos credores sem nisso consentirem veem praticamente dissolvida a garantia do crédito de que são titular, com processo executivo ainda aberto.
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Há violação do princípio da proporcionalidade quando se propõem pagamentos 48 meses após a aprovação do plano, apenas propondo-se regularizar 20% do capital, implicando um perdão de 80% do restante capital. O perdão de 80% de capital é absolutamente desproporcional, incompreensível, fraudulento e injustificável, tanto mais que existe um bem, um imóvel dado como garantia (descrição na CRP de … sob o nº …/20001005 – artº 2923 U, in Rua …, nº … e …, ..., …, vide certidão nos autos), onde os requerentes não vivem ou sequer utilizam, podendo o mesmo constituir forma de pagamento aos credores hipotecários, tanto mais que a venda do mesmo proporciona com toda a segurança a liquidação das dívidas dos mesmos, ou seja, dos recorrentes e do Banco ..., credor reconhecido em primeira hipoteca.
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Por mera cautela se invoca que os devedores se encontram em situação de manifesta insolvência. O PEAP não é aplicável a devedores em situação de insolvência. A redução de um crédito garantido por hipoteca sobre um bem que constitui o único património dos devedores não pode ser considerada uma medida de recuperação dos devedores.
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Tal pretensa medida de recuperação colocaria os credores garantidos e ora recorrentes numa situação inaceitavelmente mais desfavorável do que se fosse promovida a imediata liquidação do ativo e compete ao juiz o dever de avaliar oficiosamente a legalidade do plano proposto, combatendo o abuso de direito e provendo pela aplicação da justiça, da equidade, respeitabilidade e honestidade quando veja, como é o caso, que está a ser violado fraudulentamente o crédito dos credores garantidos.
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O juiz a quo violou o disposto nos artºs 215º e 216º do CIRE, o que deve ser doutamente corrigido por este Venerando tribunal.
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Sendo certo que também foi violado o artº artº 222º F do CIRE, dado que o acordo não foi assinado por todos credores, nem teve subjacente qualquer discussão, parecer do Sr. Administrador ou fundamentação, muito menos acompanhado da documentação que comprova a sua aprovação, atestada pelo administrador judicial provisório nomeado.
Termos em que, Primariamente deve ser declarada a nulidade dos presentes autos, por violação do artº 17º G, nº 6 e do artº 222º G, nº 7 do CIRE.
Concomitantemente, e se necessário, Deve a presente decisão de homologação do acordo ser reapreciada mediante os princípios e regras que regem e estão presentes nos artigos 215º e 216º do CIRE, permitindo-se a venda do bem imóvel indicado nos autos, hipotecado, e já atrás identificado, para liquidação dos credores hipotecários...
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