Acórdão nº 1242/03.8TBBCL-Y.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 23 de Janeiro de 2020

Magistrado ResponsávelFERNANDA PROENÇA FERNANDES
Data da Resolução23 de Janeiro de 2020
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães I. Relatório.

  1. C., residente em .., Rue …, França, veio interpor a presente acção de verificação ulterior de créditos, agora pendente na 2ª Secção de Comércio de Vila Nova de Famalicão – Juiz 2, Comarca de Braga, por apenso ao processo de insolvência com o n.º 1242/05.8TBBCL, contra Construções MR., Lda, a Massa Insolvente da Construções MR., Lda e os seus credores pedindo que lhe seja reconhecido o crédito sobre a massa insolvente no montante de € 152.500,00 com os respectivos juros legais contabilizados até integral pagamento, e graduado no lugar que lhe competir.

Tal pedido teve como causa de pedir o trabalho de empreitada executado pelas Construções MR., lda, relativo a trabalho de pedreiro na construção do prédio descrito na CRP ... registado sob o nº ..., sendo pedido o reconhecimento de um crédito, decorrente de um incumprimento contratual e de actos geradores de responsabilidade por parte da Construções MR., Lda.

Assim, alegou o autor/apelante que celebrou com a Construções MR., Lda., entretanto declarada falida, um contrato de empreitada em 05 de Novembro de 2002, e que, nos termos daquele contrato, o levantamento e pagamento da licença de construção da 2º fase de construção junto da Câmara Municipal ficavam a cargo daquela empresa, sendo que a mesma não procedeu ao seu levantamento, e procedeu à execução dos trabalhos sem alvará.

Mais alegou o autor/apelante, que aquela empresa não procedeu ao envio de facturas ou pareceres favoráveis do responsável técnico da obra, conforme se encontrava obrigado pelo contrato de empreitada.

Alegou ainda que a obra padece de diversos vícios e defeitos de construção, e que não estava a ser executada de acordo com o projecto aprovado na Câmara Municipal e sem que a Construções MR., Lda. fosse detentora de alvará de empreiteiro.

Elencou os vícios e defeitos da obra, que segundo o aí invocado, representam incumprimento parcial e cumprimento defeituoso do contrato de empreitada por parte daquela empresa, assim como se encontra invocado o abandono da obra e a não aceitação da mesma por parte do autor/apelante.

Conclui assim, ter direito a uma indemnização de 37.500,00 euros pela mora na conclusão da obra e respectiva entrega, assim como uma indemnização pelos danos não patrimoniais por ele sofridos em quantia não inferior a 15.000,00 euros, e ainda uma indemnização de 100.000,00 euros que será a quantia necessária para o aqui autor/apelante mandar reparar os vícios e defeitos e concluir os trabalhos em falta, por terceiros.

Contestou a ré Massa Insolvente de Construções MR., lda, invocando a excepção de litispendência, por esta acção não ser mais do que a repetição de tudo quanto o aqui autor articulou, em sede de reconvenção, na acção nº 1242/05.8TBBCL-K, que também corre por apenso ao processo de insolvência. Mais requereu a suspensão dos presentes autos, por ser prejudicial a estes a decisão a proferir naqueloutro apenso K. No mais impugnou toda a factualidade alegada.

Replicou o autor, pugnando pela improcedência da invocada excepção de litispendência, e requerendo também a suspensão dos presentes autos.

Por despacho de 29 de Março de 2007, foi declarada suspensa a presente instância, até à decisão a proferir no referido apenso K.

Nessa acção (apenso K), Construções MR., Lda (aqui ré), havia interposto acção declarativa de condenação sob a forma de processo ordinário, contra A. C. (aqui autor), pedindo que este fosse condenado a pagar à autora as quantias de € 62.959,00 a título de capital em dívida, de € 3.567,66 de juros de mora vencidos e de € 30.865,74 a título de indemnização devida, num total de € 97.392,40, a que acresciam juros vincendos até efectivo e integral pagamento.

Tal pedido teve como causa de pedir também o trabalho de empreitada executado e não pago relativo a trabalho de pedreiro na construção do prédio descrito na CRP ... registado sob o nº ....

Nesse Apenso K, alegou a Construções MR., Lda., na petição inicial por si apresentada, em síntese, que no exercício da sua actividade de construção civil e a solicitação do aí réu A. C., foi celebrado entre ambos um contrato de empreitada em 05 de Novembro de 2002, que tinha por objecto a continuação de construção, parte de pedreiro, de edifício pertencente ao réu.

Alegou ainda que o réu estava em atraso em relação aos pagamentos que tinham sido contratualizados e que no dia 03 de Abril de 2003 a aí autora deixou de trabalhar na obra, e que o trabalho prestado na obra, entre serviços contratados e extras/alterações, importou a quantia de 102.469,00 euros, pelo que o réu devia ainda a quantia de 62.959,00 euros, a que acrescem juros de mora que na data da apresentação da acção montam a 3.567,66 euros.

Alegou também a aí autora que teve avultados prejuízos com materiais, inutilização de grua, a central de betonagem, betoneira e armadura de ferro, escoras e diversa cofragem e taipais, assim como teve prejuízos com os seus trabalhadores por não ter trabalho imediato para eles, com juros de mora, custas judiciais e honorários de advogado, e alegou ainda uma perda de confiança, crédito e nome no meio no qual trabalhava, Pelo que, num total quanto a alegados prejuízos, reclamou o valor global de 30.865,74 euros, do qual entendeu ser o aí réu responsável por ter faltado ao alegado pagamento da obra, tal qual contratualizado no contrato de empreitada.

Nesse Apenso K foi apresentada uma contestação por parte do réu, aqui recorrente, onde foi deduzida reconvenção. Pese embora a contestação/reconvenção tenha vindo a ser desentranhada por o réu não ter demonstrado o pagamento da taxa de justiça devida pela apresentação daquela contestação (razão pela qual não é possível aceder à mesma), o facto é que, resulta da réplica aí apresentada e à qual se pode aceder electronicamente, bem como resulta do art. 2º da petição inicial deste apenso Y, que os fundamentos da contestação e da reconvenção apresentada no apenso K e que foi desentranhada, são os mesmos invocados na petição inicial apresentada neste apenso Y.

Aqueles autos (apenso K) viriam a prosseguir como se o réu fosse revel, pelo que se consideraram confessados os factos articulados na petição inicial.

Em 24/04/2019, foi proferida sentença, de onde resulta que se consideraram confessados os factos articulados pela autora (aqui ré), e que, foi condenado o réu, A. C., aqui autor, a pagar à Construções MR., Lda, as quantias de € 62.959,00 a título de capital em dívida, de € 3.567,66 de juros de mora vencidos e de juros à taxa legal, desde a citação até efectivo e integral pagamento. Foi ainda condenado o réu A. C. (aqui autor) a pagar à Construções MR., Lda, (aqui ré) a quantia de € 30.865,74 a título de indemnização, a que acrescem juros à taxa legal, desde a citação até efectivo e integral pagamento.

Transitada em julgado a sentença proferida nesse apenso, foi ordenada a notificação das partes para se pronunciarem sobre a verificação da excepção de autoridade de caso julgado.

Nada disseram.

Foi dispensada a realização de audiência prévia.

Proferiu-se então saneador sentença, com o seguinte teor: “… Cumpre decidir.

Para se verificar a exceção de caso julgado é necessário que se verifiquem em duas ações a identidade de partes, pedido e causa de pedir.

Mas ainda que os pressupostos para que exista a exceção de caso julgado (exceptio rei judicatae) não se verifiquem na totalidade, pode estar em causa o prestígio dos tribunais ou a certeza ou segurança jurídica das decisões judiciais se uma decisão, mesmo que proferida em outro processo, com outras partes, vier dispor em sentido diverso sobre o mesmo objeto da decisão anterior transitada em julgado, abalando assim a autoridade desta.

No Acórdão do STJ de 27-9-2018 in www.dgsi.pt pode ler-se: “…a autoridade do caso julgado implica o acatamento de uma decisão proferida em ação anterior cujo objeto de inscreve, como pressuposto indiscutível, no objeto de uma ação posterior, obstando assim a que a relação jurídica ali definida venha a ser contemplada, de novo, de forma diversa. V. Para tal efeito, embora, em regra, o caso julgado não se estenda aos fundamentos de facto e de direito, «a força do caso julgado material abrange, para além das questões diretamente decididas na parte dispositiva da sentença, as que sejam antecedente lógico necessário à emissão da parte dispositiva do julgado”. E no TRP, em Acórdão de 21-11-2016: “…julgada, em termos definitivos, uma certa questão em acção que correu termos entre determinadas partes, a decisão sobre essa questão ou objecto da primeira causa, se impõe necessariamente em todas as acções que venham a correr termos, ainda que incidindo sobre objecto diverso, mas cuja apreciação dependa decisivamente do objecto previamente julgado, prespectivado como relação condicionante ou prejudicial da relação material controvertida na acção posterior”.E AC TRG de 15-3-2018.

Assim, no caso dos autos a causa de pedir é a mesma que a formulada no apenso K, embora aí apenas fosse Autora a sociedade insolvente e Réu o aqui A, A. C. e na presente ação os RR sejam não apenas a sociedade insolvente, como a massa insolvente constituída com os bens apreendidos à insolvente e todos os credores da insolvência.

E o pedido também não é exatamente o mesmo pois na presente ação pede-se uma quantia substancialmente superior à pedida na ação do apenso K.

Mas a causa de pedir é indubitavelmente a mesma: o trabalho de empreitada executado e não pago relativo a trabalho de pedreiro na construção do prédio descrito na CRP ... registado sob o nº ....

Pelo que se verifica nos presentes autos a impossibilidade de decidir a mesma por se verificar a exceção de verificação da autoridade do caso julgado que impede que o tribunal conheça novamente da mesma causa de pedir, correndo o risco de proferir julgamento diverso, assim prejudicando o prestígio dos tribunais.

Pelo exposto, declaro verificada a exceção de autoridade de caso julgado, que obsta a...

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