Acórdão nº 4410/16.3T8VNF-B.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 16 de Janeiro de 2020

Magistrado ResponsávelANA CRISTINA DUARTE
Data da Resolução16 de Janeiro de 2020
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães I. RELATÓRIO M. A., executada nos autos em que é exequente “Caixa ..., SA”, veio deduzir embargos de executada, pedindo a sua absolvição da instância por ilegalidade na cumulação de execuções e, sem prescindir, que seja declarada a falsidade da livrança junta como doc. n.º 3 no valor de € 3.659,51 e consequente inexequibilidade do título relativamente à embargante, que sejam os títulos dados à execução considerados nulos, por terem sido preenchidos abusivamente e em violação do pacto de preenchimento estabelecido entre a embargante e o embargado, sendo declarados inexigíveis os juros de mora calculados e incluídos nas livranças dadas à execução. Alternativamente, pede que seja declarada inexistente a cláusula 23 dos contratos subjacentes à entrega das livranças dadas à execução, por violação das regras impostas pelo DL 446/85, declarando-se a nulidade dos títulos dados à execução por violação do pacto de preenchimento estabelecido entre a embargante e o embargado e, subsidiariamente, julgar-se que o embargado agiu em abuso de direito, contra os ditames da boa-fé contratual e da segurança jurídica, declarando nulos os títulos dados à execução.

A embargada contestou.

Por despacho de 09/10/2018, reconhecendo-se a coligação ilegal, a exequente foi convidada a escolher contra quais dos executados e por que títulos e pedido inerente pretendia fazer seguir a execução, sob pena de absolvição da instância de todos os executados, tendo a exequente requerido o prosseguimento da execução, apenas quanto às livranças referidas em a) e b) do requerimento executivo.

Teve lugar a audiência prévia, no âmbito da qual se deu a conhecer às partes a possibilidade de decisão de mérito imediata da causa.

Foi proferida sentença, cujo teor decisório é o seguinte: “Nestes termos, vistos os princípios expostos e as indicadas normas jurídicas, julgo os presentes embargos de executado parcialmente procedentes e, em conformidade: a) Absolvo todos os executados da instância executiva, quanto ao pedido respeitante à livrança da importância de € 3.659,51, com o n.º 500467943021646430, e, em conformidade, determino a extinção da execução no que respeita ao montante peticionado, a esse propósito, no valor global de € 3.798,47 (três mil, setecentos e noventa e oito euro e quarenta e sete cent); b) Determino a redução da quantia exequenda, quanto a todos os executados, ao montante global de € 81.610,49 (oitenta e um mil, seiscentos e dez euro e quarenta e nove cent), acrescido de juros de mora vencidos e vincendos, à taxa civil legal (4%), contados desde 09.11.2015, até efetivo e integral pagamento.

Custas pela embargante e pela exequente, na proporção do decaimento”.

A embargante interpôs recurso, tendo finalizado a sua alegação com as seguintes Conclusões: A- As livranças dadas à execução foram entregues ao exequente em branco, no caso concreto, não continham a data do vencimento da obrigação, nem o respetivo montante; B- A embargante interveio no contrato que deu causa á emissão das identificadas livranças, apondo-lhe a sua assinatura na qualidade de avalista; C- A embargante só através da citação para a execução, tomou conhecimento da existência de dívidas por parte da sociedade avalizada “X”, desconhecendo, até então, aquela, qual era o respetivo montante, porquanto não foi notificada por parte do banco exequente que iria preencher as livranças que lhe haviam sido entregues; D- Desconhecendo a embargante, a situação de incumprimento da sociedade avalizada, jamais teve possibilidade de obstar mormente a que o banco exequente, lograsse contabilizar juros e penalizações desde o início do incumprimento.

E- O embargado considerou incumpridas as obrigações da sociedade avalizada, pelo menos, desde o final do ano de 2013, calculando então, a título global, uma dívida que ascendia a €73.529,87, (aí se incluindo dívidas não avalizadas pela embargante); F- A embargante está confrontada com uma exigência de cumprimento por parte do banco exequente, bem diferente daquela com que foi confrontada a sociedade avalizada/insolvente, o que também por este motivo, evidencia a situação de abuso de preenchimento, por parte do exequente.

G- Ainda que se venha a concluir ser acertada a decisão proferida quanto á improcedência da invocação da inexigibilidade da dívida, pela omissão da prévia comunicação de que o embargado iria proceder ao preenchimento da livrança, é certo que, assistirá razão á embargante, quando a mesma alega não lhe ser exigível o pagamento dos juros que se venceram após o vencimento da obrigação, ou seja, após o final do ano de 2013. De facto, H- Ainda que, doutamente se considere que o embargado, portador das duas livranças, se encontra legitimado para as preencher, nos termos que lhe aprouver, não se concebe que o possa fazer, apondo-lhe um montante, que resulte da soma de juros e penalidades de diversa índole, efetuados no pressuposto de um incumprimento que permaneceu no tempo, quando, de facto, essa situação de incumprimento da obrigação, não chegou ao conhecimento da “ pré- avalista”.

I- O preenchimento das livranças, apondo, nas mesmas, montantes pecuniários inexigíveis, porque extravasam o montante da obrigação vencida, (atenta a falta de comunicação do seu vencimento) colide com o paradigma da atuação de boa-fé. Consequentemente, há um abuso no preenchimento das livranças atento o valor nas mesmas aposto, porquanto é o mesmo, em parte, inexigível.

J- A defesa da posição da entidade bancária embargada tem por consequência, dupla penalização para a embargante; seja pela pretensão de obtenção de pagamento de quantia substancialmente superior àquela exigível no momento do vencimento da obrigação, seja ainda, pelo facto de tal decurso do tempo ter impossibilitado, de facto, a embargante, de poder vir a exercer, com sucesso, o direito de regresso sobre os demais obrigados cambiários.

K-Face á inexistência da dita comunicação prévia do vencimento da obrigação, o facto é que a embargante apenas tomou conhecimento da existência de tal obrigação vencida, em Maio de 2017, decorridos mais do que três anos.

L- Como tal, a defesa de tal faculdade concedida ao portador de uma livrança em branco, de a preencher no momento em que considere mais conveniente, coadjuvada, ainda, com a defesa de que o mesmo portador também se encontra isento da obrigação de comunicar em tempo razoável o vencimento da obrigação garantida, permite ao portador de tal livrança ficar totalmente desobrigado perante as regras da prescrição dos títulos cambiários; M- Tal interpretação legal, salvo mais douta opinião, colide frontalmente com os ditames da Constituição da República Portuguesa, mormente os princípios, da segurança jurídica e da proteção da confiança dos cidadãos, e dos princípios da proporcionalidade e igualdade dos cidadãos, estes interpretados no sentido de que, no caso concreto, os avalistas não fiquem numa posição de total dependência, da vontade e livre arbítrio do portador da livrança em branco, (no caso uma entidade bancária), bem com, e ainda, insista-se, na violação do principio da boa-fé. O que aqui se deixa expressamente invocado.

Por outro lado, sem prescindir, N - Nos valores inscritos nas livranças encontram-se englobados, juros calculados desde a data do vencimento da obrigação, ocorrido no final do ano de 2013 e até á data do preenchimento das livranças, ou seja, cerca de dois anos após tal vencimento, valores esses que acresceram ao montante devido no momento do vencimento da obrigação e sem que disso a embargante tivesse conhecimento.

O -Tendo-se por princípio que, os juros são, na sua essência, uma forma de indemnização, face ao incumprimento de uma obrigação pecuniária que deveria ter sido cumprida num certo momento e não o foi, (ou seja, indemnização do credor pela mora do devedor); P - Na situação concreta, tendo-se vencido a obrigação e disso a embargante/devedora não tendo tido conhecimento, jamais a mesma...

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