Acórdão nº 920/19.9T8GMR-B.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 16 de Janeiro de 2020

Magistrado ResponsávelMARIA LUÍSA RAMOS
Data da Resolução16 de Janeiro de 2020
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães Confecções X, Lda., Autora nos autos principais em que é Ré Y, Lda., veio interpor recurso de apelação das decisões proferidas em 23/9/2019, nomeadamente, da decisão que indeferiu a remoção/ substituição da perita W – Laboratório Têxtil, Lda., e, da decisão que indeferiu o desentranhamento das traduções apresentadas pela Interveniente K, Lda., que indeferiu a nomeação de perito para traduzir os documentos juntos pela interveniente com a sua contestação e que fixou em 2 UCS as custas do incidente.

Relativamente á decisão que indeferiu a remoção/ substituição da perita W – Laboratório Têxtil, Lda., por invocada suspeição, não foi admitido recurso nos termos do artº 471º-nº3 do CPC.

E, no mais decidido o recurso foi recebido como recurso de apelação, com subida em separado e efeito meramente devolutivo.

Nas alegações de recurso que apresentam, os apelantes formulam as seguintes Conclusões: I - O presente recurso versa exclusivamente sobre matéria de Direito, incidindo sobre todas as questões de direito compreendidas no despacho com referência n.º 165034207, datado de 23-09-2019, nomeadamente: Da decisão que indeferiu a remoção/ substituição da perita W – Laboratório Têxtil, Lda., da decisão que indeferiu o desentranhamento de todas as tradições apresentadas pela Interveniente K, Lda., que indeferiu a nomeação de perito para traduzir os documentos juntos pela interveniente com a sua contestação e que aplicou uma multa de 2 UCS à Recorrente, bem como a ocorrência de uma série de nulidades do referido despacho (preterição de formalidades legais, falta de fundamentação, omissão de pronúncia).

II - O Tribunal de Primeira Instância, sem resposta/pronúncia das partes e da perita nomeada, indeferiu a remoção/substituição da perita nomeada, o que não se pode consentir, por ocorrer uma clara preterição de formalidade legal obrigatória, que provoca, necessariamente, a nulidade do despacho em crise.

III - Ora, conforme ocorre nos casos de impedimento ou suspeição de juízes, nos termos do art. 122.º, ex vi aplicável art. 470.º, n.º 1 do CPC, o Douto Tribunal de Primeira Instância deveria ter ordenado a notificação do perito, cuja idoneidade se coloca aqui em causa, para responder à alegação da Autora, sob pena de se não o fizesse se terem considerado confessados os factos alegados pela Autora, o que in casu não aconteceu.

IV - Mais acresce que, para além de não ter ordenado a notificação do perito nomeado para exercer o direito de contraditório (nos termos do artigo 122.º do C.P.C), o deveria ter feito, nos termos expostos, o Tribunal a quo também deveria ter ordenado a notificação da Ré para exercer o seu direito de contraditório (artigo 3.º, n.º 3 do C.P.C).

V - Ou seja, a consideração no despacho, ora em crise, de que “as demais partes nada disseram”, resulta apenas da falta de notificação do Tribunal à entidade nomeada (para resposta sob pena de confissão dos factos) e à Ré (por necessidade de esclarecimentos e cabal descoberta da verdade material no seu papel de julgador), omissão essa que consubstancia uma nulidade processual, nos termos do art. 195.º do CPC e que aqui vai invocada.

VI - Em bom rigor, o Tribunal de Primeira Instância decidiu proferir decisão quanto à substituição/ remoção do perito sem notificar a Ré e sem notificar o perito para ambos exercerem o seu direito de contraditório e/ou responderem à alegação da Autora.

VIII - O incumprimento pelo Tribunal de Primeira Instância do disposto no artigo 122.º, n.º 1, ex vi art. 470.º, n.º 1 do CPC, e do artigo 3.º, n.º 3 do C.P.C, integra a prática de uma nulidade processual prevista no art. 195.º n.º 1 do mesmo diploma legal, pois foi omitido um ato que a lei prescreve, que consistia em dar a possibilidade às partes de exercerem o contraditório e a perita de responder ao pedido de remoção que contra si foi dirigido.

IX - Estamos perante uma omissão do Tribunal com bastante influência/ preponderância no decorrer e no desfecho do processo e da boa decisão da causa, omissão essa que, a nosso ver, tem obrigatoriamente de conduzir à nulidade do despacho, ora em crise.

X - Pelo que, é nulo o despacho proferido pelo Tribunal de Primeira Instância em 23-09-2019, devendo ser o mesmo revogado e substituído por outro que ordene a notificação das Rés para exercerem o seu contraditório e da entidade nomeada como perita para apresentar resposta, sob pena de confissão dos factos, quanto ao requerimento apresentado pela Autora em 12-09-2019, o que aqui vai invocado, com as demais consequências legais.

XI - Sem prescindir, e caso assim não se entenda, o que apenas se admite por mera hipótese académica, sempre se diga que padece o despacho ora em crise de outra nulidade: a sua falta de fundamentação, nos termos do art. 154.º, n.ºs 1 e 2, e 615.º,n.º 1, alínea b) do CPC.

XII - O dever de fundamentação das decisões judiciais resulta igualmente de uma imposição constitucional, nos quadros do n.º 1 do art.º 205.º da Constituição da República Portuguesa, densificando-se legalmente no art. 154.º do CPC.

XIII - Tal dever constitucional e legal tem por objetivo a explicitação por parte do julgador acerca dos motivos pelos quais decidiu em determinado sentido, dirimindo determinado litígio que lhe foi colocado, de forma que os destinatários possam entender as razões da decisão proferida e, caso o entendam, sindicá-la e reagir contra a mesma.

XIV - Ora, no nosso caso em concreto, o Tribunal de Primeira Instância limitou-se a referir que não foi oferecida prova – até porque a isso em bom rigor obstou - para os factos alegados pela Autora, o que não pode senão ser visto como um despacho tabelar, genérico, vago e impreciso, tendo no demais ignorado os factos concretos trazidos ao conhecimento do Douto Tribunal, não tendo fundamentado de forma devida e sustentada a decisão que tomou.

XV - É que incumbe ao Tribunal a quo o dever de analisar os factos trazidos aos autos pelas partes, fazendo-o com espírito crítico, com rigor e diligência na procura incessante pela descoberta da verdade.

XVI - Contudo, neste caso em concreto, o Tribunal de Primeira Instância simplesmente ignorou o alegado e a sua tarefa de julgador e limitou-se, de forma não fundamentada, a indeferir a pretensão da Autora apesar dos claros e manifestos indícios de conflito de interesses, o que, diga-se, de forma alarmista, pode influir de forma expressiva e significativa no normal desenrolar dos autos e obstar à cabal descoberta da verdade material.

XVII - Ora, atenta a falta de fundamentação, e sem necessidade de mais considerações, deve ser julgado nulo o despacho recorrido, com as demais consequências legais.

XVIII - Se ainda assim não se entender que o despacho recorrido não é nulo, nos termos supra expostos, o que não se consente, mas apenas se admite por mera hipótese académica, certo é que, de todo o modo, é admissível recurso do despacho de 23-09-2019, nos termos do artigo 116.º, n.º 5 do CPC, ex vi art. 470.º, n.º 1 do CPC, já que consideramos inconstitucional (violação dos artigos 13.º e 20.º do C.R.P), e por isso inaplicável, o artigo 471.º, n.º 3 do C.P.C.

XIX -...

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