Acórdão nº 4213/17.8T8VCT.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 05 de Março de 2020

Magistrado ResponsávelANTERO VEIGA
Data da Resolução05 de Março de 2020
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Guimarães.

R. M., veio propor a presente ação especial emergente de acidente de trabalho contra “X Companhia de Seguros, SA”, e contra “C. S., Lda” Pede que a Ré Seguradora seja condenada: na pensão anual e vitalícia, remível, no valor de Euros 1.027,60; no pagamento de Euros 750,76 a título de ITS; nas despesas com deslocações ao tribunal e ao GML no valor de Euros 10,00; nos juros de mora legais, calculados sobre os valores referidos.

Pede ainda que a Ré Entidade Patronal seja condenada: na pensão anual e vitalícia, remível, no valor de Euros 3,18; nos juros de mora legais, calculados sobre os valores referidos.

Para tanto, alega, em síntese, que no dia 25 de outubro de 2017, pelas 10 horas, no seu local de trabalho, em ... e ao serviço da 2ª Ré, quando utilizava uma máquina de fazer redes foi atingida no dedo indicador da mão esquerda, amputando-lhe a ponta do dedo.

Mais alega, que exerce a atividade de operadora de máquinas sob as ordens, direção e fiscalização da segunda Ré, mediante a retribuição anual de Euros 8.924,50.

Finalmente, alega que a segunda Ré transferiu a responsabilidade por acidentes de trabalho da Autora para a Ré seguradora apenas pelo montante de Euros 8.897,00.

A Ré Seguradora veio contestar, dizendo, em suma, que a Entidade Patronal lhe transferiu a responsabilidade civil emergente de sinistros laborais ocorridos com os seus empregados, nomeadamente da aqui sinistrada e pelo vencimento anual de Euros 8.897,00; que o sinistro ocorreu devido à violação por parte da Sinistrada das condições de segurança estabelecidas pela sua Entidade Patronal, nomeadamente a obrigatoriedade de desligar a máquina para aceder às partes móveis desta; que o mesmo resultou exclusivamente da falta de cuidado, grave e indesculpável, da Sinistrada, uma vez que sabia que não podia aceder às partes móveis da máquina sem a desligar primeiro; que a o acidente também foi consequência direta e necessária da inobservância das regras sobre a segurança, higiene e saúde no trabalho, por parte da Entidade Patronal, que não colocou ao dispor da Sinistrada a formação e equipamento adequado ao trabalho a realizar; que a máquina não possuía o devido resguardo de proteção de rolos do tear contra risco de contacto mecânico, bem como sinalização que indicasse que o acesso à zona dos rolos era proibido ou que existia o risco de esmagamento; que a avaliação de riscos que se encontrava em vigor à data do acidente, não identificava especificamente a tarefa realizada pela Autora, nem tão pouco determinava quaisquer medidas preventivas por forma a evitar / controlar os riscos.

Pelo que conclui pela improcedência de todo o peticionado.

*A Ré Entidade Patronal, não veio contestar.

No apenso foi decidido que a A. se encontra curada, com uma IPP de 16,50% e que esteve com ITA de 25 de outubro de 2017 a 7 de dezembro de 2017 (44 dias).

*Realizado o julgamento e respondida a matéria de facto foi proferida decisão julgando a ação nos seguintes termos: Pelo exposto, o Tribunal julga procedente a presente ação e, em consequência, decide: 1- Condenar a ré seguradora, “X Companhia de Seguros, SA” a pagar à Autora as seguintes prestações reparatórias: 1.1- A título do capital de remição correspondente à pensão anual e vitalícia de Euros 1 027,60, com início no dia 8 de dezembro de 2017; 1.2- A título de indemnização pelos períodos de incapacidade temporária absoluta, o valor de Euros 750,64; 1.3- A título de reembolso das despesas em deslocações, a quantia de Euros 10,00; 1.4- A pagar os juros de mora contados à taxa civil legal em vigor sobre: o capital de remição desde a data da alta até à entrega efetiva deste; a indemnização das ITs desde a data do vencimento da obrigação do seu pagamento; o montante das despesas reclamadas desde o dia subsequente à sua reclamação no processo (despesas com atos médicos e de transporte), conforme artigos 126º, n.º 1 e 2, do RRATDP e 805º, n.º 2, alínea a) e 559º, n.º 2, do Código Civil, e até integral pagamento; 2- Condenar a ré empregadora, “C. S., Lda”, a pagar à Autora as seguintes prestações reparatórias: 2.1- A título do capital de remição correspondente à pensão anual e vitalícia de Euros 444,94, com início no dia 8 de dezembro de 2017; 2.2- A título de indemnização pelos períodos de incapacidade temporária absoluta, o valor de Euros 325,16, acrescido de juros de mora vencidos e vincendos, à taxa legal, conforme artigos 126º, n.º 1 e 2, do RRATDP e 805º, n.º 2, alínea a) e 559º, n.º 2, do Código Civil, e até integral pagamento; 2.3- A pagar os juros de mora contados à taxa civil legal em vigor sobre: o capital de remição desde a data da alta até à entrega efetiva deste; a indemnização das ITs desde a data do vencimento da obrigação do seu pagamento; o montante das despesas reclamadas desde o dia subsequente à sua reclamação no processo, conforme artigos 126º, n.º 1 e 2, do RRATDP e 805º, n.º 2, alínea a) e 559º, n.º 2, do Código Civil, e até integral pagamento…” Inconformada a ré patronal interpôs recurso apresentando as seguintes conclusões: A – Quanto à matéria de facto: 1ª Devem ser aditados à matéria de facto os seguintes números: 16. Durante toda a existência da C. S., Lda, com esta designação, que já vem de antes de 1990, nunca houve qualquer acidente de trabalho, nomeadamente com máquinas/teares de redes de pesca.

  1. Na empresa existem dez máquinas teares de redes, e mais de dez operadoras, visto que, sempre que falta alguma é preciso substituí-la.

  2. Na empresa, antes de ocorrer o acidente com a A., já tinha havido ações de formação, nas quais as trabalhadoras, incluindo a A., foram informadas de que, para mexerem nas partes móveis das máquinas tinham que desligá-las primeiro.

  3. A entidade patronal também avisara sempre que ninguém podia mexer nas partes móveis das máquinas com estas em movimento. “Estão fartos de nos falar nessas coisas. Segurança, segurança, segurança.” como diz a testemunha C. V. (cf. gravação do depoimento aos minutos 08:48 até 08:53).

  4. Nunca qualquer trabalhadora, incluindo a A., mexeu nas partes móveis das máquinas com estas em movimento; exceto a A. no momento do acidente.

    1. Devem ser alterados os números 10., 12. e 13 da matéria dada como provada, do seguinte modo: 10. A A., para sinalizar o referido defeito, retirou fio que estava num rebordo da máquina, mas este caiu-lhe sobre os rolos da máquina; a A. decidiu apanhar o fio sem desligar a máquina, ou seja, com os rolos em movimento, momento em que o dedo indicador esquerdo ficou entalado entre os rolos, originando a lesão melhor descrita no relatório do IML.

  5. Mais sabia que, de acordo com as ações de formação que tivera e com ordens expressas e repetidas da ora recorrente e dos engenheiros ao seu serviço, para aceder às partes móveis da máquina tinha primeiro que a desligar.

  6. A máquina não possuía resguardo de proteção dos rolos, resguardo que nunca foi imposto à empregadora, visto que a máquina dispunha de sistema de travagem imediata; por isso, tal resguardo só veio a ser colocado depois do acidente, mas sob a forma de resguardo amovível, e por mera sugestão da A.C.T., que sabia que a sua existência não era obrigatória no caso (cf. art. 16º, nº 1, da Lei 50/2005).

    B – Quanto à matéria de direito: 3ª Nos termos do art. 133º do C. P. Civil, a língua a empregar nos atos processuais é o português.

    1. Por isso, para os estrangeiros que tenham que depor, nomeiam-se intérpretes, e para os surdos, mudos e surdos-mudos estabelecem-se regras próprias e adequadas a apreender o que declaram.

    2. Para quem, sabendo falar português, e tendo até deposto falando, não responde ao que lhe perguntam, deixando o tribunal sem saber o que exatamente poderiam dizer sobre questões da máxima importância para a decisão da causa, não pode o tribunal substituir-se-lhe, adivinhando pormenorizadamente o que presuma que o inquirido poderia querer dizer só pelo seu silêncio e expressão corporal, como aconteceu, com referência à A. e ao seu depoimento quando não quis descrever a forma como se deu o acidente.

    3. Com este procedimento, foram violados os princípios estabelecidos nos arts. 133º e 135º do C. P. C.

    4. Como parte que é na ação, a recusa a depor da A. deve ter as consequências inerentes em termos de prova, porque está obrigada a responder.

    5. Nos termos do art. 357º, nº 2, a recusa a depor por uma das partes permite ao tribunal apreciar livremente o valor da conduta da parte para efeitos probatórios – mas de modo nenhum lhe permite substituir-se à parte e ficcionar o que é que a parte recalcitrante teria para dizer.

    6. No caso, o que se poderia apreciar não iria além de avaliar se se deveria ou não considerar provada contra a A. a matéria de que não quis falar, e, pela nossa parte, parece-nos evidente que deveria.

    7. Por consequência, no mínimo, não pode ter-se como provado que o acidente se deu pela forma descrita no nº 10 da matéria dada como provada.

    8. Tem assim que concluir-se que o acidente se deu por culpa exclusiva da A. que desrespeitou uma norma incontornável imposta pela entidade patronal, e que corresponde a uma medida de segurança imposta pelo nº 1, segunda parte, do art. 16º da Lei 50/2005, de 25 de Fevereiro, disposição esta que estabelece como alternativa para casos como o presente, ou a existência de protetores que impeçam o acesso às zonas perigosas ou dispositivos que interrompam o movimento dos elementos móveis antes do acesso a essas zonas.

    9. A existência de uma barra extensa cujo acionamento faz imobilizar imediatamente a máquina é muito mais eficaz, pelo que a Recorrente preferiu-o sem hesitação. Mas qualquer outro processo de fácil imobilização seria suficiente.

    10. E os seus funcionários usaram-no por décadas com resultado absolutamente positivo, sem qualquer acidente.

    11. Até porque, como declarou a testemunha C. V., os responsáveis da empresa “estão fartos de nos falar nessas coisas. Segurança, segurança, segurança! (cf. gravação do depoimento aos minutos...

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